Feira de vinhos, para que te quero?

O que faz com que o consumidor se decida por uma marca em detrimento de outra? Para além do apelo do preço, que tem sobretudo maior relevância nos vinhos de entrada de gama, há um factor que tem uma força indesmentível no momento crítico da selecção: a identificação com a marca e as suas “estórias” […]

O que faz com que o consumidor se decida por uma marca em detrimento de outra? Para além do apelo do preço, que tem sobretudo maior relevância nos vinhos de entrada de gama, há um factor que tem uma força indesmentível no momento crítico da selecção: a identificação com a marca e as suas “estórias”

Texto: João Geirinhas

 Quando no já longínquo ano 2000, a equipa que está hoje na Grandes Escolhas, organizou a sua primeira feira de vinhos, muita gente fez esta pergunta. E, confesso, na altura não foi fácil de explicar, até porque o conceito não tinha ainda sido ensaiado em Portugal. “É uma montra para vender garrafas ao público?”, perguntavam-me quando solicitei reuniões a algumas das empresas mais importantes do sector para explicar o incipiente projecto.  “Serve para registar as encomendas dos clientes?” A todos respondia que não, não era bem isso que se pretendia.

Uns meses antes tínhamos visitado em Londres uma mostra de vinhos organizada por uma revista da especialidade num charmoso hotel, com toda a pompa e circunstância, com bilhetes e provas vendidas a preços estratosféricos. Sentimo-nos inspirados, mas com a certeza que em Portugal o modelo teria de ser diferente. Mas a ideia de uma mostra de vinhos promovida por uma revista começava a fazer todo o sentido. Estava-se a viver por esses tempos a eclosão de novos produtores, a explosão de marcas a inundarem o mercado, os jornais começavam timidamente a falar deste assunto e o vinho começava a ficar na moda e o interesse pelo tema era crescente. Afinal onde se encontravam aqueles vinhos feitos pela nova geração de enólogos de que tanto falávamos nas páginas da revista? Onde os podemos conhecer e provar? Que quintas e herdades são essas que enchiam as nossas páginas?

Foi esta necessidade de partilhar com os nossos leitores os vinhos de que toda a gente falava, mas que não existiam ainda nas prateleiras dos supermercados que levou a aquela equipa a organizar aquilo que podemos hoje considerar, sem falsas modéstias, a primeira experiência de uma feira pensada no e para o novo consumidor, mais exigente e ávido de experiências inovadoras. Chamámos então os produtores, muito poucos nessa primeira edição, e convidámos os nossos leitores para virem conhecê-los e provarem as novidades. Não por acaso chamámos ao evento de “Encontro”.

Este encontro de vontades foi um sucesso que ultrapassou as nossas melhores expectativas. O modelo vingou, cresceu e foi depois replicado por muitos outros e em vários locais. Hoje é unanimemente reconhecido que estas “novas” feiras de vinhos foram importantes para abrir horizontes, divulgar produtores e marcas que de outra forma teriam acesso dificultado ao mercado.

Mas se tudo isto é história, que aplicação tem no presente? E voltamos à pergunta inicial: para que serve hoje uma feira como a Grandes Escolhas Vinhos & Sabores? O modelo mantém validade ou está esgotado como alguns se apressam a vaticinar? Ou a feira apenas vale pelos contactos profissionais que o dia de segunda-feira proporciona, sendo o tempo dedicado aos consumidores uma maçada constrangedora? A verdade é que quem olha para o mundo através de uma folha de Excel e apenas contabiliza o deve e haver das encomendas firmes vê apenas uma parte da realidade. E ainda por cima distorcida.

Vejamos. Na longa cadeia de elos que compõem a fileira do vinho, produtor e consumidor estão em polos opostos. Para além de distantes, entre eles há uma barreira natural que decorre do normal funcionamento do mercado: distribuidores, grandes e regionais, comerciais retalhistas, etc. Uma garrafa de vinho passa por muitas mãos antes de acabar nas mãos de quem a bebe. Pelo meio deste percurso longo haverá sempre algo que se perde. O produtor e sua equipa de viticultura e enologia desenham um vinho para o mercado, essa entidade abstrata e invisível que decide às vezes misteriosamente a sorte do investimento e de todo o trabalho que eles colocaram na sua criação. Adivinhar qual será a reação do mercado a um novo produto é a tal pergunta de milhão que todos gostariam saber de antemão.

O consumidor por outro lado é bombardeado com comunicações, anúncios do lançamento de novas marcas, inúmeras referências e amiúde fica perdido no meio de tantas mensagens e apelos comerciais, promoções agressivas e grandes descontos, alguns deles aliás bem falaciosos. Em frente de uma prateleira de supermercado ou mesmo numa garrafeira da especialidade não raras vezes depara-se com a dificuldade da escolha. O que faz com que ele se decida por uma marca em detrimento de outra? Para além do apelo do preço, que tem sobretudo maior relevância nos vinhos de entrada de gama, há um factor que tem uma força indesmentível no momento crítico da selecção: a identificação com a marca e as suas “estórias”. Quando por detrás desta o consumidor reconhece uma imagem, uma cara, uma conversa, uma prova que lhe são familiares, quando um vinho lhe recorda uma experiência gratificante, estão encontrados os pressupostos emocionais que conduzem a uma escolha em detrimento de outra. A feira de vinhos, permitindo o contacto directo, com o produtor que expõe a cultura da casa, a explicação do enólogo que desvenda as particularidades daquele talhão ou as vicissitudes da vinificação, os segredos da construção de um lote, tudo isso ajuda a construir uma narrativa que se cola à marca e que fica para sempre na memória do consumidor curioso. Uma garrafa de vinho sem a contextualização da história que a suporta é… apenas uma garrafa de vinho!

Uma feira de vinhos, quando bem preparada e melhor servida por profissionais competentes, com atitude disponível para o acolhimento, simpatia quanto baste, ajuda na construção da marca, consolida a imagem do vinho e fideliza o consumidor. O sucesso nas vendas vem a seguir.

Vícios à mesa

O serviço de mesa é o calcanhar de Aquiles do negócio dos restaurantes. Outras áreas têm melhorado, mas esta, em muitos casos, está cada vez pior. Entre a arrogância, o desleixo e a falta de noções básicas de como lidar com o cliente, venha o diabo e escolha. É fundamental que os empresários do sector […]

O serviço de mesa é o calcanhar de Aquiles do negócio dos restaurantes. Outras áreas têm melhorado, mas esta, em muitos casos, está cada vez pior. Entre a arrogância, o desleixo e a falta de noções básicas de como lidar com o cliente, venha o diabo e escolha. É fundamental que os empresários do sector valorizem esta actividade.

 

POR razões profissionais e por prazer pessoal frequento há muitos anos, e com regularidade, restaurantes em diversos pontos do país. Não sou – longe disso – um especialista na matéria, mas considero-me… um cliente com experiência, digamos assim. E manda a verdade dizer que tenho assistido a uma notável melhoria de qualidade na nossa restauração em muitos itens, sendo os mais importantes, como é evidente, o maior cuidado na selecção das matérias-primas, o aperfeiçoamento das técnicas de confecção, a abertura a novas influências e, sobretudo, o cuidado com a apresentação. Melhorou muito também, na grande maioria dos casos, o conforto dos clientes, sendo vulgar já encontrar ar condicionado em muitas tascas populares, a decoração dos espaços passou a ser considerada (nem sempre com bom gosto, concedo) e até as casas de banho tiveram a sua dose de melhoria. Está ainda tudo muito longe de ser perfeito, mas é inegável a evolução verificada.

Dito isto, há ainda aspectos fundamentais no negócio dos restaurantes que tardam a acompanhar esta evolução positiva. Em alguns casos, até pelo contrário, notou-se mesmo uma degradação sensível no serviço prestado aos clientes. Falo hoje concretamente do serviço de mesa, aquele que considero ser o calcanhar de Aquiles desta actividade.

Abundam ainda as falhas grosseiras, a falta de profissionalismo campeia em muito lado, a ignorância e a arrogância e, mesmo em certos casos, a má criação, muitas vezes substituíram, sem vantagem, algumas das velhas pechas no atendimento ao cliente. Não em todos, mas em muitos dos nossos restaurantes. E aqui temos que ser democráticos, o panorama é transversal: tanto ocorre nos estabelecimentos mais populares e tradicionais (e nem sempre mais baratos) como naqueles mais pretensiosos a atirar para o fino e com contas finais bem mais carregadas.

A maior culpa nem será dos próprios empregados de mesa, nem eles muitas vezes têm a noção das suas próprias limitações. Mas muitos empresários acham que vale a pena investir muitos milhares de euros em decoração, um pouco menos na contratação de cozinheiros e muito pouco na formação de quem recebe o cliente e o serve à mesa. E nem vou entrar hoje no capítulo do serviço de vinhos que merece uma reflexão à parte. A verdade é que a profissão, ainda com o estigma da palavra “criado” colada à função, não é considerada prestigiante de forma a atrair os profissionais qualificados que as Escolas de Hotelaria apesar de tudo vêm formando e os empregadores não a valorizam nem lhe reconhecem a importância.

Mostrar aos clientes que vale a pena ser exigente e que um melhor serviço é um valor acrescentado, que terá retorno, mais tarde ou mais cedo

Em alguns restaurantes ditos de fine dinning há agora a moda de ter um relações públicas, na maior parte das vezes uma simpática e bem parecida menina que nos conduz à mesa entre sorrisos e salamaleques. A verdade é que depois de sentados nunca mais lhe pomos a vista em cima, e os sorrisos evaporaram-se nesse instante. É então que acontece um fenómeno estranho. Por algum passe de mágica, adquirimos o espantoso dom da invisibilidade que permite que muitos empregados passem repetidamente por nós e não nos consigam ver por muito que esbracejemos ou que requeiramos apenas um pouco da sua atenção. Algumas vezes ficamos com a nítida sensação de que só somos atendidos quando eles finalmente consideraram que já penámos o suficiente por algum pecado passado que tenhamos cometido. Em muitos restaurantes populares a rudeza sem cerimónias é o prato do dia: a demora em levantar os restos da refeição anterior, a limpeza da mesa às três pancadas com um pano húmido que já passou por todas as outras mesas, os talheres atirados para cima do tampo, os pratos colocados em pilha e o freguês que os distribua, o pratinho com azeitonas que já vem com os caroços de outros clientes, são alguns dos mimos com que somos brindados, entre outro conjunto de delicadezas very typical indeed.

Nos restaurantes finos e elegantes, (só em alguns deles, temos que ser justos) por vezes o que mais se destaca é a requintada sobrançaria. As batas negras impõem respeito, a pose é empertigada, o sorriso condescendente. Mas a impertinência depressa desaparece quando o discurso com a descrição do prato se engasga num termo de que o pobre moço desconhece o significado ou quando perguntamos que ingrediente é aquele e ele bate em retirada a dizer que vai perguntar ao chefe. Santa nossa! É nessa altura que tenho por vezes saudade daqueles antigos profissionais, exímios de mãos, que despinhavam o peixe à nossa frente, trinchavam a carne com destreza ou desossavam uma ave com a precisão de um relojoeiro. A cozinha de sala está hoje infelizmente fora de moda mas era um regalo para os olhos. Aqueles crepes flambeados à minha frente valiam a refeição.

Como podem as coisas mudar? Não há segredos, toda a gente sabe! É saber, e sobretudo, querer investir em recursos humanos da mesma forma que se está disposto a pagar a decoração ou se é exigente nos equipamentos. É afinal pagar condignamente aos bons profissionais, de acordo com o seu mérito, e, claro, saber motivá-los e mantê-los empenhados no projecto. É mostrar aos clientes que vale a pena ser exigente e que um melhor serviço é um valor acrescentado que terá retorno, mais tarde ou mais cedo.

O Chefe não estava

O que nos faz decidir na hora de escolher o sitio onde vamos jantar? Localização, orçamento disponível, tipo de cozinha, gosto pessoal são factores usualmente determinantes que condicionam a opção do cliente que quer fazer daquela noite um momento especial. Com a recente (e fulgurante) mediatização dos chefes, a imagem destes começou a ter uma […]

O que nos faz decidir na hora de escolher o sitio onde vamos jantar? Localização, orçamento disponível, tipo de cozinha, gosto pessoal são factores usualmente determinantes que condicionam a opção do cliente que quer fazer daquela noite um momento especial. Com a recente (e fulgurante) mediatização dos chefes, a imagem destes começou a ter uma importância crescente nessa escolha e hoje são muitos os clientes que escolhem o restaurante pela única razão ser o de fulano ou de beltrano. Em bom português, isso pode ser um pau de dois bicos.

UM amigo meu contava-me noutro dia que tinha ido pela primeira vez a um restaurante estrelado numa cidade onde estava de visita. Fiquei curioso para saber como tinha corrido a experiência até porque é um espaço relativamente novo que eu também não conheço e para o qual tinha bastantes expectativas. Esse meu amigo, verdadeiro gourmand e grande conhecedor do meio, confessou-me que as coisas não correram nada bem e que a impressão final foi no geral decepcionante. Como eu já conhecia algum do trabalho anterior do chefe em questão e tenho dele uma boa impressão, estranhei o veredicto. A menos que… Ouve lá, o chefe estava presente? Não, não estava nesse dia, respondeu. Se calhar isso explica muita coisa, rematou

Pois, lá explicar, explica mas não deveria justificar. Mas esta é uma pecha que tenho encontrado muitas vezes em restaurantes portugueses com pretensões que ficam com a imagem afectada por uma sucessão de pequenas coisas que, não sendo cada uma delas especialmente grave, fazem no conjunto passar uma imagem não consentânea com o estatuto alcançado.

Seja pela desatenção de esquecer um ingrediente, ou às vezes até um prato na sucessão do menu, seja por deixar passar um ponto de cozedura, por encontrar uma espinha ou um osso onde eles não deveriam estar, por ter sal ou pimenta em excesso, pelo molho que estava deslaçado, ou a pele do bicho que não estava com o crocante que devia, seja ainda por uma falha grave no serviço, a verdade é que são já demasiadas vezes em que se notam diferenças sensíveis entre uma e outra noites que não eram suposto haver.

Muitos serão levados a pensar que o estatuto mediático que os chefes hoje em dia alcançaram faz deles muitas vezes estrelas incontornáveis e que assim a sua presença – ou ausência – nos restaurantes em que dão a cara se faça devidamente notar. E é compreensível que assim seja. O que seria um concerto dos U2 se o Bono não estivesse em palco? Por outro lado, somos humanos e até certo ponto podemos perceber que há dias e dias, certo?

Não penso assim. Primeiro, há que notar que o preço final que o cliente paga não varia de dia para dia em função do chefe estar ou não presente. Depois se se atinge um estatuto de excepção, se até lhe foi atribuída uma estrela, isso quer dizer que estamos perante um estabelecimento de altíssimo nível, que se faz pagar muito bem e que por isso não admite falhas de profissionalismo tão elementares.

Temos chefes muito bons, criativos e tecnicamente bem apetrechados. Temos uma cozinha de base deliciosa e com personalidade, assente em tradições ancestrais. Temos alimentos e ingredientes de qualidade irrepreensível que são disputados a peso de ouro por alguns dos grandes cozinheiros do mundo.

O que nos falta, então? Coisa pouca, apenas três itens, na minha opinião: consistência, consistência, consistência. Isto é, basicamente fazer o trabalho diário como se estivéssemos a jogar a final dos campeões. E claro, formar e manter uma equipa que não viva ofuscada pelo brilhantismo do chefe mas se sinta ela própria uma estrela que tem que provar todos os dias o seu virtuosismo.

A “minha” Vinalda

A distribuidora Vinalda fez agora 70 anos. Um número bonito, redondo, que evidentemente merece todos os encómios e os mais calorosos parabéns. Um número que é um marco assinalável, sobretudo num sector tão volátil e sujeito a tantos ciclos económicos como é o mercado de vinhos e das bebidas alcoólicas em geral. PARA mim, contudo, […]

A distribuidora Vinalda fez agora 70 anos. Um número bonito, redondo, que evidentemente merece todos os encómios e os mais calorosos parabéns. Um número que é um marco assinalável, sobretudo num sector tão volátil e sujeito a tantos ciclos económicos como é o mercado de vinhos e das bebidas alcoólicas em geral.

PARA mim, contudo, e enquanto consumidor, a Vinalda está longe de ter essa provecta idade e terá apenas nascido lá para os finais dos anos 80 do século passado, sendo que só passamos a “privar” mais de perto em meados da década de 90.

É aí que a história da Vinalda se começa a cruzar com a minha aprendizagem pessoal do mundo dos vinhos. Esta não foi uma história linear e coerente. Foi feita de descobertas esparsas e muitas vezes ocasionais, sem método nem propósito. Na aldeia de província onde cresci e vivi os primeiros anos da vida adulta as novidades chegavam devagar e filtradas por uma espessa cortina de circunstâncias em que a distância, os parcos recursos económicos e a falta de informação dificultavam o conhecimento mas ao mesmo tempo tudo envolviam numa névoa misteriosa e inegavelmente sedutora.

Foi esse o tempo em que comecei a coleccionar o “Jornal dos Vinhos”, suplemento de um semanário de referência, como agora se diz, em que prontificavam nomes como José António Salvador e João Paulo Martins, na altura personagens sem rosto mas de experiências e saberes fascinantes. As descrições dos jantares vínicos que a publicação então promovia enchia a minha memória de nomes e marcas que tentava, na medida do possível, conhecer. A Vinalda surge aí, um vocábulo estranho e que rapidamente aprendi incontornável nessa demanda. Onde compro um Palácio da Brejoeira, o primeiro e durante muitos anos o único dos Alvarinhos que provei? Como chego a esses fabulosos Quinta do Carmo de Alicante Bouschet de que dizem maravilhas? Quem afinal tem o Quinta do Côtto Grande Escolha, o vinho que prometia resistir ao tempo e que desafiava os sentidos? Porque é difícil encontrar os Quintas de Pancas de que toda a gente fala? Que tem de especial esse Marquês de Borba que acabou de irromper sem aviso mas com estrondo suficiente para estar nas bocas do mundo? E o Porto LBV da Taylor’s – o Vintage era então uma miragem longínqua – como lhe posso por a vista em cima?

Não foi uma relação sempre pacífica, devo dizer. Os vinhos, sobretudo os vinhos de quem toda a gente falava e que todos procuravam, eram muitas vezes colocados a conta-gotas no mercado e as lojas rateavam, garrafa a garrafa, os preciosos néctares. “A Vinalda só me entregou uma caixa”, “só lá para o fim do ano voltam a distribuir esse vinho”, “e provavelmente virá com novo preço”, tantas vezes ouvi respostas semelhantes em lojas de vinhos que cheguei a pensar que haveria alguma intenção maquiavélica de fazer sofrer os consumidores. Para mim, que nada percebia de estratégias de marketing e conceitos como a construção de marca, tudo aquilo era estranho e frustrante.

Foi bastante mais tarde, já trabalhava no meio, que descobri que por detrás da Vinalda estava um rosto e um nome: José Casais. Um self made man, que deu corpo e consistência a esta empresa, que a moldou de tal forma que a sua história pessoal se confunde com aquela. É uma figura singular que evidencia uma forte determinação, um enorme conhecimento do mercado e do consumidor, uma dureza negocial acutilante, aliada a um trato pessoal encantador. É daquelas personagens que nos deliciam com uma conversa sem fim à vista com o desfilar de muitas histórias e episódios de uma vida cheia e de outros tempos. Mas é sobretudo, e é justo que isso se diga isso neste momento em que a Vinalda vive uma nova fase e ele se afastou da gestão, uma das pessoas a que os vinhos portugueses mais devem.

Distribuidor é uma palavra muito pobre, é um conceito bastante redutor, para definir o que José Casais fez nos anos que esteve à frente da Vinalda. Ele foi um verdadeiro construtor de marcas, foi o porto seguro e a tábua de salvação de muitos projectos vínicos que são hoje sucessos assinaláveis. Não é possível revisitar a história do vinho português nas últimas décadas sem ter presente o papel da Vinalda de José Casais na criação de um mercado de vinhos moderno e maduro.

Foi por isso bonito ver num recente jantar de comemoração dos 70 anos da Vinalda a homenagem que a actual gestão da empresa lhe prestou e onde recordou os principais marcos da sua história. Mas foi anda mais marcante ver como se quiseram associar à homenagem não só empresas e marcas que fazem parte do portefólio da casa mas muitas outras que entretanto os acasos da vida e dos negócios levaram por outros caminhos e que no entanto ali estavam, naquele momento simbólico, a reconhecer o óbvio. Que haverá poucas pessoas a quem o epíteto de “Senhor do Vinho” se encaixe melhor do que a José Casais. Como consumidor, também lhe devo o meu quinhão de agradecimento.