Outros Prazeres: Lunes, sangria de espumante

Confesso-me um detractor de sangrias. Não por princípio canónico, e muito menos por fidelidade canina ao vinho. Antes por experiência de décadas a provar sangrias demasiado doces e consistentemente malfeitas, em via de regra, segundo um estranho ritual de adicionar a um vinho tinto básico todas as demais bebidas disponíveis ao balcão; mais gelo e […]
Confesso-me um detractor de sangrias. Não por princípio canónico, e muito menos por fidelidade canina ao vinho. Antes por experiência de décadas a provar sangrias demasiado doces e consistentemente malfeitas, em via de regra, segundo um estranho ritual de adicionar a um vinho tinto básico todas as demais bebidas disponíveis ao balcão; mais gelo e soda, frutas da temporada, e por vezes canela e outros mistérios. Poder-se-á argumentar que existe, na sangria, uma certa alquimia, mas isso não é verdade, pelo menos nos restaurantes e bares que conheço. Alquimia existe nos bons vermutes e nos cocktails, mesmo aqueles em que se utiliza Champagne. Por isso, os melhores vermutes são feitos por enólogos, e os melhores cocktails por mixologistas. Com efeito, o problema principal da sangria é a falta de uma receita ou fórmula que fixe as melhores matérias-primas e as devidas proporções. Alguns dirão que há um fenómeno de democratização da sangria. Eu, que sou democrata, acho que o fenómeno é de abandalhamento. O pouco profissionalismo em redor da sangria explica-se, em parte pela sazonalidade do seu consumo, parte pela pouca formação de alguns profissionais do sector, aspecto que, importa realçar, tem melhorado muito nos últimos anos, precisamente devido à formação superior. No nosso país, todos fazem sangria, e de forma diferente. A regra é não a haver. Muda de restaurante para restaurante. E no mesmo restaurante, altera de dia para dia, conforme os ingredientes disponíveis e o pessoal responsável pela sua execução.
Certo que a sangria de espumante pode ser uma categoria à parte, desde que bem feita, entenda-se. Com um bom espumante seco de base, que possa contrabalançar a doçura da fruta a ser adicionada, e o vinho tinto jovem, e nada de licores calóricos capazes de baralhar qualquer papila gustativa. Mas a sangria de espumante, que tem uma vivacidade que a mera sangria não tem, também não deve ser sujeita a amadorismos. Mais a mais, com as tendências actuais bem determinadas, como seja, baixo grau alcoólico, baixo grau calórico, privilegiando-se um perfil de acidez vibrante e evitando os açucares adicionais. Por isso fiquei feliz por constatar que apareceu, recentemente, no mercado, a Lunes (ou Lu-nes). Define-se como uma sangria de espumante “ready-to-drink” e “ready-to-serve”, o que, em português, quer significar que pode ser bebida a solo ou servir de base para outras bebidas. Provada, podemos confirmar que serve ambos os propósitos. A solo, privilegia no aroma notas a hortelã da ribeira e um perfil vegetal e especiado, enquanto na boca revela referências a goiaba e hibisco, com uma boa acidez a amparar alguma doçura frutada. Como base para um cocktail, ou até para uma sangria de espumante 2.0, a imaginação ditará as regras, sendo que a base já lá está a ajudar a definir o produto final, como sucede com tantos cocktails. O consumidor de sangrias, ou de até de espumantes, já sabe com o que poderá contar sempre que pedir uma Lunes; não irá ao engano, e isso já me parece muito bom. Se pensarmos no potencial de crescimento, mais a mais com uma marca de semblante totalmente ibérico (Lunes significa segunda-feira em espanhol) e o turismo a atingir recordes no nosso país, ficamos com pena de não termos sido nós a ter a ideia… Gostei tanto que falei com os responsáveis do projecto que confirmaram o que a minha intuição pressagiava: um sucesso de vendas, incluindo na exportação, e o desenvolvimento em curso de novos produtos, o primeiro dos quais uma versão sangria espumante branca.
Ainda sobre a Lunes, a sua apresentação é óptima, com a bebida dentro de uma garrafa típica de espumante de qualidade (lembra-me algumas garrafas daquela que é para mim a melhor região de espumantes de Itália: Franciacorta), sendo toda a imagem inspiradora sobretudo para os dias de Verão. Quem se lembra da imagem das primeiras sangrias no mercado pode ficar com a ideia de que esta é totalmente diferenciadora, para melhor. Quanto ao espumante utilizado, o mesmo foi diluído para uns civilizados e consensuais 7% vol., e a pressão mantida entre os 5 bar, ou seja, média-baixa, outra tendência actual, sobretudo junto da restauração. Confirmo que duas pedras de gelo afectam – para melhor – a performance desta fascinante bebida, aconselhando também o seu serviço num copo a rigor, de preferência mais largo que as habituais flutes, pois os aromas exuberantes desta sangria de espumante merecem serem devidamente expostos. Termino como comecei: confesso-me um detrator de sangrias. Contudo, a experiência recente com a Lunes fez-me aproximar da variante sangria de espumante. Lunes ao sol!
(Artigo publicado na edição de Julho de 2023)
Vinhos & Sabores 2023: Já são conhecidas as Provas Especiais

Já é conhecida a lista de PROVAS ESPECIAIS COMENTADAS a decorrer durante o VINHOS & SABORES (14 a 16 de Outubro, na FIL, em Lisboa) As Provas Especiais são um momento único dentro do Grandes Escolhas | Vinhos & Sabores. Autênticas Masterclasses concebidas para consumidores que querem aprofundar os seus conhecimentos ou viver uma experiência […]
Já é conhecida a lista de PROVAS ESPECIAIS COMENTADAS a decorrer durante o VINHOS & SABORES (14 a 16 de Outubro, na FIL, em Lisboa)
As Provas Especiais são um momento único dentro do Grandes Escolhas | Vinhos & Sabores. Autênticas Masterclasses concebidas para consumidores que querem aprofundar os seus conhecimentos ou viver uma experiência memorável de provar vinhos raros, a maior parte deles não acessíveis no mercado, comentados pelos seus criadores.
Lista das Provas e bilhetes já disponíveis AQUI . Os lugares são muito limitados! Assegure já o seu.
Quinta do Regueiro sobe valor mínimo a pagar pela uva Alvarinho

Depois de, em 2022, ter elevado o preço por quilo a pagar aos produtores de uva Alvarinho para €1,25, Paulo Cerdeira Rodrigues, proprietário da Quinta do Regueiro, estabelece agora um novo mínimo, a aplicar já na vindima de 2023. “Este ano estamos a pensar subir mais um pouco, para €1,50”, declara o produtor de Melgaço […]
Depois de, em 2022, ter elevado o preço por quilo a pagar aos produtores de uva Alvarinho para €1,25, Paulo Cerdeira Rodrigues, proprietário da Quinta do Regueiro, estabelece agora um novo mínimo, a aplicar já na vindima de 2023. “Este ano estamos a pensar subir mais um pouco, para €1,50”, declara o produtor de Melgaço — criador de vinhos como Quinta do Regueiro Primitivo, Jurássico ou Maturado — que garante estar já “em condições de assumir este valor, sem pôr em causa o negócio”.
Segundo noticiou a vozdemelgaco.pt, o objectivo de Paulo Cerdeira Rodrigues é gerar mais reconhecimento para os agricultores dentro da sub-região de Monção e Melgaço, e abrir a discussão dos preços por quilo de uva, dando o exemplo.
“Antes de ser produtor de vinho, vejo-me como produtor de uva. Trabalhamos muito esse sector primário, tentamos percebê-lo e ver como deve funcionar no futuro para que seja rentável, não só para nós, mas para a região em si”, refere.
Em contrapartida, Paulo Cerdeira Rodrigues reconhece que, com os preços actuais dos vinhos no mercado nacional (como indica a vozdemelgaço.pt, um Alvarinho clássico da Quinta do Regueiro pode custar entre 9 e 10 euros) o que equilibra as contas, e permite incorrer em despesas maiores, é a exportação. “O nosso país, por vezes, é pequeno para tanto vinho a esse patamar de preço. Acredito que um dos sucessos da região é que as empresas andem todas na ordem dos 30, 40% na exportação, onde se trabalha com mercados como os Estados Unidos, mercados nórdicos ou asiáticos, com valor acrescentado, e em países com poder de compra”, remata Paulo Cerdeira Rodrigues.
Geographic Wines: Uma entrada à la volée

O projecto Geographic Wines nasce da vontade de Nuno Morais Vaz em viver o mundo do vinho todos os dias de forma intensa. Quem o conhece, seja a fazer lotes, a acompanhar a vindima, ou a promover os seus vinhos, não fica com dúvidas, tanto é o seu entusiasmo. Quis o sentido da vida que […]
O projecto Geographic Wines nasce da vontade de Nuno Morais Vaz em viver o mundo do vinho todos os dias de forma intensa. Quem o conhece, seja a fazer lotes, a acompanhar a vindima, ou a promover os seus vinhos, não fica com dúvidas, tanto é o seu entusiasmo. Quis o sentido da vida que se juntasse a Daniela Matias, enóloga que, quando se conheceram, trabalhava no projecto Villa Oeiras, da responsabilidade da Câmara Municipal de Oeiras. Nuno e Daniela fazem o par dinâmico que suporta a criatividade da Geographic Wines, numa relação que se estende à a vida pessoal e familiar. Nuno é o mentor do projecto, faz dezenas de milhares de quilómetros por ano, tanto na busca das melhores vinhas, como na promoção entusiasta dos vinhos que concebe, desde os rótulos (bonitos, modernos e engraçados) aos lotes finais. Daniela acredita na ciência e no estudo, adora o trabalho da adega, mas sempre preferindo intervenções minimalistas. Ambos dizem que procuram criar vinhos únicos, tendo por base a autenticidade, a sustentabilidade social e ambiental, e a preservação e divulgação dos diferentes terroirs. Até aqui tudo muito bem… e, naturalmente, aplaudimos. Como aplaudimos também o facto de a empresa produzir vinhos em várias regiões do país, permitindo, assim, uma espécie de viajem dentro do país vitivinícola, mas com enfoque no Norte, mais concretamente na Bairrada, Douro e Vinhos Verdes.
Há cerca de um ano, provámos as primeiras edições dos vinhos, da colheita de 2021, criados por este jovem casal e centrados na marca Landcraft, um Sauvignon Blanc da Bairrada (de uma vinha próxima de Sangalhos) e dois Vinhos Verdes, um Alvarinho e um Loureiro. Esse trio repete-se agora na colheita de 2022, juntando-se ao portfólio a gama Lento — com um rótulo de belo efeito à semelhança de todos os produtos da empresa — na versão branco (surgirá um tinto que está a estagiar), e dois espumantes bairradinos, um branco e um rosé. Os Vinhos Verdes confirmaram as boas impressões da colheita anterior, apesar do ano difícil de 2022, com o Alvarinho, desta vez, em destaque. O Lento é produzido a partir de uvas de vinhas velhas, em field blend (com Rabigato, Síria, Folgazão, Viosinho, Malvasia, entre outras), de solos tendencialmente arenosos e com muito quartzo, e oferece uma versão duriense de um branco sofisticado e com patine (perfeito para fine-dining), a um preço muito ajustado. Todavia, foram mesmos os espumantes que deslumbraram, ambos a um nível muito alto, sendo a versão rosé absolutamente imperdível.
(Artigo publicado na edição de Julho de 2023)
O-PORT-UNIDADE: 30 produtores de vinho do Porto unem-se em Vintage solidário

Exactamente uma década depois do início do O-PORT-UNIDADE, a segunda edição do projecto é agora lançada. A primeira, em 2013, reuniu 25 das mais importantes empresas de vinho do Porto, para juntas produzirem um Vintage de qualidade superior. Com este vinho, o projecto angariou 100 mil euros, que foram posteriormente transferidos para a Associação Bagos […]
Exactamente uma década depois do início do O-PORT-UNIDADE, a segunda edição do projecto é agora lançada. A primeira, em 2013, reuniu 25 das mais importantes empresas de vinho do Porto, para juntas produzirem um Vintage de qualidade superior. Com este vinho, o projecto angariou 100 mil euros, que foram posteriormente transferidos para a Associação Bagos d’Ouro, cumprindo-se, assim, o grande objectivo desta aventura. Esta é uma IPSS que, desde 2010, promove a educação de crianças e jovens do Douro, que vivem em situação de carência económica, como forma de inclusão social no território.
Com ainda mais participantes e apoiantes, do sector e da produção do vinho do Porto, o intuito da segunda edição do O-PORT-UNIDADE é “obter uma excelente fotografia de todos os produtores, juntos no lagar, engarrafar um Porto Vintage único que reflicta a personalidade de todo o vale do Douro e, mais uma vez, angariar fundos para apoiar a Bagos d’Ouro“, declara Axel Probst, autor de World of Port e impulsionador do projecto. Antigo piloto da força aérea alemã — que deixou em 2011 com o posto de tenente-coronel, para se dedicar a uma carreira no mundo do vinho — Axel Probst é apaixonado por Portugal e pelo vinho do Porto, categoria donde se especializou e onde é unanimemente considerado o mais influente wine writer a nível mundial.
Nesta edição do O-PORT-UNIDADE, participarão os seguintes produtores: Alves de Sousa, Andresen, Bulas, Churchill Graham, Combro, Quinta do Crasto, Dalva, DR, Quinta de la Rosa, Messias, Menin, Mourão, Niepoort, Quinta Nova, Quinta do Noval, Poças, Quinta do Portal, Quevedo, Ramos Pinto, Rozès, Sogevinus, Sogrape, Symington Family Estates, Quinta do Tedo, Quinta Vale D. Maria, Quinta do Vale Meão, Quinta do Vallado, Vallegre, Van Zellers & Co e Wine&Soul.
“É quase impossível não engarrafar algo com qualidade muito acima da média, quando se trata de produtores e apoiantes tão prestigiados, e todos estão a divertir-se muito com isto. Naturalmente, é necessário alguém de fora para os reunir e aproximar, contudo, este projecto não teria sido possível sem o fantástico apoio do Dirk Niepoort”, conclui Axel Probst.
Editorial: E no barro se fez vinho

Nas peregrinações que, desde finais dos anos 80, faço regularmente pelas tabernas e casas de petiscos do grande Alentejo, encontro talhas de todos os tamanhos e formatos, bem como inúmeras nuances na pesga do barro ou nos processos de vinificação, variando a tradição de concelho para concelho, quase de aldeia para aldeia. Editorial da […]
Nas peregrinações que, desde finais dos anos 80, faço regularmente pelas tabernas e casas de petiscos do grande Alentejo, encontro talhas de todos os tamanhos e formatos, bem como inúmeras nuances na pesga do barro ou nos processos de vinificação, variando a tradição de concelho para concelho, quase de aldeia para aldeia.
Editorial da edição nrº 75 (Julho 2023)
A publicação nesta edição de julho de um trabalho sobre o projecto XXVI Talhas, em Vila Alva, na sequência de um outro apresentado em junho sobre os vinhos Mamoré da Talha, em Borba, sugere uma reflexão sobre as diferentes formas de expressar esta milenar tradição vínica e cultural do Alentejo.
Os vinhos de talha estão na moda, é um facto. À boleia de um nicho de mercado que quer experimentar a diferença, aquilo que era um produto do Alentejo profundo, das tabernas e casas particulares, transferiu-se das populações rurais para os produtores profissionais, ganhando dimensão e buzz mediático. Agora que toda a gente sabe o que é Vinho de Talha Alentejo seria bom não esquecermos os amadores (no verdadeiro sentido da palavra, “aqueles que amam”) que, teimosamente, ao longo das últimas décadas, mantiveram vivos não apenas a tradição como o conhecimento, o saber fazer. Sem essas muitas centenas de anónimos, o renascer do vinho de talha não teria sido possível.
Dito isto, desenganem-se os que se assumem como guardiões da “verdadeira” tradição do vinho de talha do Alentejo. É que o Alentejo é enorme em todos os sentidos, e o tamanho corresponde à sua diversidade. Nas peregrinações que, desde finais dos anos 80, faço regularmente pelas tabernas e casas de petiscos do grande Alentejo, encontro talhas de todos os tamanhos e formatos, bem como inúmeras nuances na pesga do barro ou nos processos de vinificação, variando a tradição de concelho para concelho, quase de aldeia para aldeia. Para pesgar a talha, nuns sítios usavam resina de pinheiro e cera de abelha, noutros só a cera ou só a resina; alguns pesgavam de 5 em 5 anos, outros usavam as talhas pesgadas pelo pai há duas décadas; enquanto uns colocavam todo o engaço na talha, outros só uma parte, outros ainda somente as uvas esmagadas. Esmagamento que, consoante o hábito local, podia ser feito directamente para a talha ou pisadas as uvas no chão de barro da adega, correndo o mosto para o “ladrão” (talha enterrada) e daí baldeado para as ânforas. A dada altura, algumas dessas talhas começaram a ser revestidas a epoxy (“tinta anti-mosto”, assim lhe chamavam nas aldeias) por razões de facilidade e higiene, perdendo embora o carácter do pez. Destas muitas tradições resultavam e resultam vinhos tão distintos quão diversos são os matizes do cante alentejano ou os ingredientes e temperos do cozido de grão. Há tantos Alentejos…
Em 2010 decidiu a CVRA, e muito bem, regulamentar o Vinho de Talha Alentejo, como forma de preservar a sua origem e identidade, impedindo assim a sua apropriação por terceiros. No entanto, ao só permitir este designativo em vinhos produzidos dentro das 8 sub-regiões, deixou de fora zonas emblemáticas para o vinho de talha. Ao mesmo tempo, aceitou todas as castas autorizadas para DOC. Como resultado, posso fazer um Vinho de Talha Alentejo 100% Syrah ou Touriga Nacional, uma perversão cultural de que, felizmente, os produtores não se têm aproveitado. Mas não posso fazer Vinho de Talha Alentejo, ou sequer utilizar a palavra “talha” no rótulo, se estiver em Campo Maior (histórico centro oleiro de talhas) ou em Cabeção (onde ainda subsistem dezenas de produtores artesanais e centenas de talhas). Será que, com algum bom senso, se consegue resolver esta absurda contradição? O Alentejo, tão diverso quanto único e inimitável, agradece.
Editorial: Verde

Poderia sugerir a estes novos cruzados do ambiente o seguinte: mais eficazmente sustentável do que recusar provar garrafas “pesadas”, seria fazer menos viagens intercontinentais. Um jornalista de vinhos recusar provar em garrafa pesada, por razões ambientais, é como um jornalista de automóveis recusar comentar Fórmula 1, pelas mesmas razões. Editorial da edição nrº 74 […]
Poderia sugerir a estes novos cruzados do ambiente o seguinte: mais eficazmente sustentável do que recusar provar garrafas “pesadas”, seria fazer menos viagens intercontinentais. Um jornalista de vinhos recusar provar em garrafa pesada, por razões ambientais, é como um jornalista de automóveis recusar comentar Fórmula 1, pelas mesmas razões.
Editorial da edição nrº 74 (Junho 2023)
Não tenho dúvida, haverá muita gente que, no seu dia a dia, actua de forma mais respeitadora do ambiente do que eu. Mas sei que, em casa e fora dela, sigo padrões de sustentabilidade acima da média. Alguns exemplos diversos: quase 90% da minha energia doméstica vem de painéis solares; as duas centenas de garrafas das provas que abro em cada mês são descarregadas no vidrão; a água da piscina nunca foi mudada em 25 anos, a evaporação é compensada pela chuva; nas deslocações inferiores a 200 km uso um carro eléctrico; o duche matinal dura três ou quatro minutos; alimento e abrigo a passarada no jardim; prefiro, sempre, bens e produtos produzidos nacional ou localmente. Podia continuar, mas já chega. Expus aqui em público, e muito a contragosto, uma parte da minha vida privada, apenas para acentuar que, no que a práticas ambientais diz respeito, acolho sempre ensinamentos, mas não aceito moralismos de ninguém.
Vamos então ao que interessa, um caso paradigmático de um certo populismo ambiental que me incomoda. Dois conceituados críticos internacionais anunciaram recentemente aos seus leitores que, de agora em diante, se recusarão a provar vinhos em garrafas de vidro “pesado”. Fica-lhes bem. De uma assentada aparecem como salvadores do mundo e apaziguam a consciência própria, também ela pesada. É que a principal fonte de receita destes dois profissionais passa por dar palestras e provas nos cinco continentes, viajando confortavelmente de avião (naturalmente) e em primeira classe (mais naturalmente ainda). Como sabemos, a aviação comercial tem o maior peso ambiental (em pegada de carbono) entre todas as actividades económicas. Já o número de garrafas “pesadas” face às “normais” ou “leves” é bastante reduzido, pois são unicamente usadas em (alguns) vinhos de topo. A título de exemplo, um produtor português que viu o seu vinho recusado por um dos críticos referidos, enche 5.000 garrafas “pesadas” num total de 2 milhões de “normais” e “leves”. Assim, poderia sugerir a estes novos cruzados do ambiente o seguinte: mais eficazmente sustentável do que recusar provar garrafas “pesadas” seria fazer menos viagens intercontinentais. Ou, quem sabe, comer fruta da época, em vez de “fruta de avião” colhida no outro lado do oceano. Um jornalista de vinhos recusar provar em garrafa pesada, por razões ambientais, é como um jornalista de automóveis recusar comentar Fórmula 1, pelas mesmas razões.
O que quero eu dizer com tudo isto? Primeiro, que o modelo “certo” de sustentabilidade ambiental não existe; segundo, que preservar o ambiente implica sacrifícios que devemos estar preparados para fazer; terceiro, que mais importante do que ser “verde” por fora, é sê-lo por dentro, ter verdadeira consciência ambiental, com bom senso, sem radicalismos, sem hipocrisias – a manta é curta, o que tapamos de um lado destapamos do outro: queremos carros eléctricos e telemóveis, mas a mineração do lítio que seja feita bem longe, de preferência na China…
Portanto, sejamos, todos, menos propagandistas e mais consequentes nas nossas acções privadas. A garrafa pesada vai, provavelmente, desaparecer do mercado nos próximos anos: só que, como em tudo, serão os consumidores a fazer com que isso aconteça. O vidro pesado é apenas uma gota num oceano de desperdício. É aquilo que estamos dispostos a fazer, nas nossas casas e nos locais de trabalho, que, verdadeiramente, vai promover a diferença.
Editorial: Digital (E papel, também)

Renovar graficamente uma revista em papel numa era onde o digital assume um peso cada vez maior, pode parecer caminhar contra os ventos da história. Mas, para nós, continua a fazer todo o sentido investir numa revista de apresentação cuidada e conteúdos apelativos e, ao mesmo tempo, apostar muito forte, e de forma inovadora, na […]
Renovar graficamente uma revista em papel numa era onde o digital assume um peso cada vez maior, pode parecer caminhar contra os ventos da história. Mas, para nós, continua a fazer todo o sentido investir numa revista de apresentação cuidada e conteúdos apelativos e, ao mesmo tempo, apostar muito forte, e de forma inovadora, na digitalização.
Editorial da edição nrº 73 (Maio 2023)
O leitor da Grandes Escolhas vai ficar surpreendido (espero que positivamente) com a edição que tem agora em mãos. Renovar graficamente uma revista em papel numa era onde o digital assume um peso cada vez maior, pode parecer caminhar contra os ventos da história. Mas, para nós, continua a fazer todo o sentido investir numa revista de apresentação cuidada e conteúdos apelativos e, ao mesmo tempo, apostar muito forte, e de forma inovadora, na digitalização.
O mês de Maio traz assim muitas novidades ao universo Grandes Escolhas. A única menos positiva, mas inevitável face ao significativo crescimento dos custos, é o aumento de €0,50 no preço da revista em papel e no “vinho de capa”. De resto, tudo coisas boas. A revista (versão papel ou digital) está bem mais arejada (e arrojada) do ponto de vista gráfico, dando às fotografias um relevo maior do que no passado. A mudança no tipo de letra possibilita também uma leitura mais fácil e confortável. Em termos de conteúdos, o novo grafismo “obriga” a textos mais curtos, mas, também por isso, mais textos, mais concisos, mais diversos e mais focados. Nada que atrapalhe uma equipa redactorial que, enquanto director, é para mim motivo de orgulho, pelo conhecimento, dedicação e profissionalismo. Aqui não houve mudanças pois, como dizem no futebol, em equipa que ganha não se mexe.
Um princípio que, na verdade, não respeitámos quando nos virámos para o website Grandes Escolhas. É que o website estava a ganhar folgadamente e, mesmo assim, mudámos e mudámos muito. Os números oficiais da Google Analytics, relativos a 2022 são, sem dúvida, impressivos para um website tão especializado: 771 mil sessões iniciadas por 533 mil utilizadores (dos quais 67% novos utilizadores!) mais de 3 milhões de páginas visualizadas, e mais de 4 páginas por sessão, com uma taxa de rejeição de apenas 1,1%. Números destes levaram-nos a fazer um grande esforço, em parceria com a Upgrade, no sentido de potenciar ainda mais esta adesão por parte dos apreciadores de vinho. O novo website, já online mas ainda a ser diariamente aperfeiçoado, está “turbinado” em todos os sentidos, na forma e no conteúdo. Permitam-me referenciar aqui apenas dois aspectos, que considero, enquanto utilizador, de grande relevância, e ambos relacionados com a pesquisa de vinhos: primeiro, a extraordinária rapidez com que chegamos ao vinho pretendido após digitarmos as primeiras letras do nome; segundo, a possibilidade de, ao clicarmos no botão “Comprar”, sermos de imediato direccionados para a página onde esse vinho se encontra nos websites de 7 das principais garrafeiras de Portugal.
Na base desta pesquisa de vinhos estão mais de 14000 notas de prova produzidas pela equipa da Grandes Escolhas. Um património absolutamente único no seio dos vinhos portugueses, pela sua dimensão, qualidade e credibilidade, e que as ferramentas digitais nos ajudam a levar a todos os apreciadores. E desvendo aqui a próxima novidade: muito em breve iremos lançar uma app, com reconhecimento de rótulos, que permitirá a qualquer utilizador, entre outras funcionalidades, apontar o seu telemóvel para uma garrafa e obter as notas de prova e a classificação da Grandes Escolhas. No mês em que este projecto cumpre o seu sexto aniversário, acho que não poderíamos dar e receber melhores notícias.