Estive lá: À procura dos bons sabores de Serpa

Estive lá Serpa

Se há coisa que gosto de fazer no tempo frio, é pegar no carro e dar uma volta de fim de semana prolongado à descoberta de terras de Portugal. Um deles levou-me até Serpa e às Minas de São Domingos, com direito a belos passeios a pé em dias límpidos e frios, que nos permitiram […]

Se há coisa que gosto de fazer no tempo frio, é pegar no carro e dar uma volta de fim de semana prolongado à descoberta de terras de Portugal. Um deles levou-me até Serpa e às Minas de São Domingos, com direito a belos passeios a pé em dias límpidos e frios, que nos permitiram viver um pouco daquilo que o Alentejo tem de melhor.
Serpa é uma das terras onde não me canso de voltar. Para passear nas suas ruelas de casario muitas vezes branco, que parecem ser sempre diferentes quando volto, para dar mais uma olhadela ao seu aqueduto e subir ao castelo para ver de novo as vistas.

Um pouco abaixo fica o restaurante O Alentejano, o destino do nosso almoço desse dia. Gosto de lá ir porque serve boa comida da região, o serviço é simpático e tem uma boa oferta de vinho, sobretudo alentejano, incluindo a de vários produtores locais.

O queijo, os enchidos e as azeitonas que vieram primeiro eram irresistíveis, e foram sendo saboreados na companhia de pão alentejano, como não podia deixar de ser. Como já tinha algumas saudades de uma boa sopa de cação e ali vale mesmo a pena saboreá-la, foi isso que escolhemos, apenas uma dose, que era farta o suficiente para dois. Para companhia foi-me sugerido, por quem estava a servir à mesa, o branco Encostas de Serpa da casta Antão Vaz e da colheita de 2022, de um produtor local, Monge & Filhas, que foi um bom parceiro do repasto. Uma encharcada a dividir por dois e um par de cafés terminaram um almoço bastante satisfatório, que nos reconfortou para o resto do dia.

Depois foi entrar nas mercearias e lojas da terra que vendem aquilo que melhor se faz por ali, desde o seu queijo de ovelha, único de aromas e sabores, ao seu pão e aos seus azeites e enchidos, que me sabem sempre de forma diferente. Entrámos na Casa Paixão e na Queijaria Tradiserpa para comprar um par de queijos para trazer para casa, e foi hora de pegar no carro para ir até às Minas de S. Domingos, um património mineiro histórico que gostei de visitar. Mas isso fica para outra estória.

Restaurante O Alentejano
Morada: Praça da República 15, 7830-389 Serpa
Telefone: + 351 284 544 335
E-mail: rest.oalentejano.serpa@gmail.com

Casa Paixão
Morada: Praça da República s/n, 7830-389 Serpa
Tel.: + 351 069 345 345
E-mail: casapaixaoserpa@gmail.com

Queijaria Tradiserpa
Morada: Rua dos Canos 6, 7830-412 Serpa
Tel.: 284 549 302
E-mail: tradiserpaqueijos@sapo.pt

Lusovini: Castas antigas, novos horizontes

Lusovini

Temos em Portugal muito orgulho em possuir uma enorme variedade de castas autóctones, mas, na realidade, em cada região trabalhamos com uma dúzia delas. Desde os anos 80, quando o fundador da Lusovini, Casimiro Gomes, resolveu iniciar um projecto vitivinícola no Dão, ouvia falar de castas “esquecidas”, das quais nunca encontrou os vinhos para experimentar. […]

Temos em Portugal muito orgulho em possuir uma enorme variedade de castas autóctones, mas, na realidade, em cada região trabalhamos com uma dúzia delas. Desde os anos 80, quando o fundador da Lusovini, Casimiro Gomes, resolveu iniciar um projecto vitivinícola no Dão, ouvia falar de castas “esquecidas”, das quais nunca encontrou os vinhos para experimentar. Até agora.
Em 2015, quando surgiu a oportunidade de adquirir a Vinha da Fidalga, propriedade do século XVIII com 25 hectares em Carregal do Sal, não pensou duas vezes. Ficou logo decidido expandir a selecção para além as castas habituais da região.
Em 2017 começaram a plantar a vinha experimental numa área de cerca de 3,5 ha com variedades minoritárias, algumas praticamente extintas. O processo demorou três anos. Inicialmente escolheram 22 castas, cerca de 1000 pés de cada. “É preciso perceber onde está o ponto crítico de cada casta”, diz Casimiro Gomes.
A condução das videiras foi delineada em monoplano ascendente, com poda longa por não existir informação técnica sobre a zona de frutificação destas variedades. O acompanhamento do comportamento das plantas na vinha foi um processo de aprendizagem que levou, também, a uma selecção que deixou algumas delas para trás (“ou apodreciam com facilidade, ou não produziam nada”). Hoje mantêm-se, nesta vinha, as 12 castas que conseguiram convencer os responsáveis da viticultura e da enologia: Arinto do Interior, Coração de Galo, Gouveio, Luzídio, Uva Cão, Terrantez, Barcelo, Rabo d’Ovelha, Douradinha, Malvasia Preta, Monvedro e Cornifesto. Este projecto gerou um grande entusiasmo dentro da empresa, conta Casimiro Gomes, sobretudo na altura das vindimas, pois todos queriam acompanhar uma nova história a ser construída.

Uvas no estado puro
Entre 2021 e 2022 fizeram-se microvinificações. Desta última colheita provámos os primeiros cinco vinhos, que saíram para o mercado em quantidades muito limitadas (entre 1000 e 1200 garrafas). A enologia idealizada por Sónia Martins foi a mais neutra possível para “testar as uvas no seu estado puro, como base para recriar muitas outras coisas”. Fermentação e estágio sem madeira, com levedura neutra, sem qualquer tipo de bâtonnage. No final foram retiradas as borras groseiras, com uma ligeira clarificação (com bentonite) e filtração. As uvas tintas foram desengaçadas, manta mexida manualmente duas vezes ao dia no pico da fermentação. A prensagem ocorreu em prensa vertical de madeira, seguida de fermentação maloláctica espontânea, clarificação natural e ligeira filtração antes de engarrafamento. A colheita de 2023 também foi feita nesta óptica, para ter mais anos de comparação e aprendizagem.
Cada um dos cinco vinhos tem uma imagem diferente no rótulo, transmitindo alguma ligação à casta que representa: Terrantez, Uva Cão, Douradinha, Malvasia Preta e Monvedro. O nome pode confundir, mas a variedade Terrantez cultivada no Dão não tem nenhuma ligação genética com a Terrantez da Madeira, nem do Pico, nem da Terceira. É uma casta referenciada na Península Ibérica desde o século XVI, disseminada no século XIX em quase todo o país, do Minho até ao Algarve. A partir do Século XX passou a estar presente quase exclusivamente no Dão, onde em 1986 representava menos de 0,03%. É das castas ainda pouco estudadas. Sabe-se que de ponto de vista agronómico é uma casta de abrolhamento e maturação em época média. Como é muito susceptível ao desavinho e bagoinha, necessita de bom arejamento na zona das inflorescências. Tem um porte retumbante e é assim que aparece no rótulo. Os mostos desta casta apresentam teor alcoólico relativamente baixo e acidez bastante alta. O vinho mostrou um grande equilíbrio num perfil fresco e consensual.

Grande frescura de boca
A Uva Cão é de origem desconhecida. Mas é famosa pela sua elevada acidez. É uma casta muito antiga, mencionada em 1711 por Vicêncio Alarte. No Dão existe principalmente nas vinhas velhas dos concelhos de Tondela e Carregal do Sal. De abrolhamento médio a tardio, tem boa fertilidade, com alguma sensibilidade ao desavinho. Amadurece tardiamente e precisa de estar bem exposta ao sol e em solos com pouca humidade. É resistente ao stress hídrico e aguenta bem as vagas de calor, o que lhe projecta um futuro interessante. Entretanto, foi referido que os mostos são bastante sensíveis à oxidação. O vinho surpreendeu pela sua amplitude aromática e ofereceu uma grande frescura de boca.
A Douradinha é filha das variedades Amaral e Alfrocheiro, mencionada pela primeira vez em 1851 e, depois, em 1880. Referenciada no Dão em 1986, com uma percentagem de plantação muito reduzida, foi desaparecendo ao longo do tempo, sendo hoje uma das castas antigas mais raras na região. Tem cacho com aspecto dourado quando atinge a plena maturação, o que provavelmente originou o nome. Muito sensível à podridão cinzenta, se não estiver bem exposta no período de colheita. Surpreendentemente, apresenta uma acidez ainda mais alta do que a Uva Cão. Este vinho talvez seja mais desafiante, mais intenso na acidez e mais austero na performance aromática.

O Dão a recuperar património
A Malvasia Preta é originada por cruzamento natural de Alfrocheiro com Cayetana Blanca (Sarigo). Com primeira referência em 1866, está mais presente no Nordeste de Portugal. Na região, figura em 1986 como “Negro Mouro”, com uma presença próxima dos 4% de plantação. Transmite acidez bastante elevada e aroma com fruta mais imediata e fácil de gostar.
A casta Monvedro é a filha de Alfrocheiro com outro progenitor desconhecido. Presente na região em quantidades diminutas (em 1986 menos de 0,01%), é medianamente produtiva, abrolha cedo e amadurece tarde. Mostrou-se bastante sensível às vagas de calor. Por isso precisa de estar numa zona mais fresca e sombria. Sensorialmente, é um caso para dizer: “primeiro estranha-se, depois entranha-se”. É menos consensual, com carácter muito próprio que exige uma prova atenta e alguma paciência para o descobrir.
É importante acrescentar que, depois da prova, todos os vinhos se portaram muito bem à mesa. São vinhos de nicho, alguns mesmo únicos no país (e no mundo!). Quando começarem a surgir mais, será muito bom sinal: o Dão a recuperar o seu património e a basear nele o seu futuro.

(Artigo publicado na edição de Março de 2024)

 

Ljubomir Stanisic lança nova gama de vinhos: Mestiço é mistura com amor

Mestiço

Ljubomir Stanisic é cozinheiro, sim. Mediático apresentador de programas de gastronomia, tem três restaurantes e muitas paixões. O vinho é uma delas. Há mais de 15 anos que os cria como um prato de comida: misturando as quantidades certas, buscando o equilíbrio mas também a surpresa – e às vezes até o choque. No seu […]

Ljubomir Stanisic é cozinheiro, sim. Mediático apresentador de programas de gastronomia, tem três restaurantes e muitas paixões. O vinho é uma delas. Há mais de 15 anos que os cria como um prato de comida: misturando as quantidades certas, buscando o equilíbrio mas também a surpresa – e às vezes até o choque.

No seu primeiro restaurante em Cascais (2004-2008), começou a brincar aos casamentos. Entre o copo e o prato. O vinho e a comida. Rapidamente passou da cozinha à vinha. Fincou o pé no acelerador e entrou pelo país adentro. Bateu à porta de amigos, furou pelas suas adegas. Alentejo, Douro, Lisboa, Açores, Serra da Estrela, Minho, Dão, Madeira. Não interessava tanto onde, mas com quem.  A fusão foi sempre feita entre amigos.

Em 2024, quis tornar este amor mais sólido. Decidiu escrever muitas cartas de intenções e encerrá-las dentro de cada garrafa. Para se beberem tantas convicções quanto estados de espírito. Com um abecedário de propósitos, cheio de letras, cheio de sonhos, construíram-se estes novos líquidos. Vindos de muitas latitudes – Douro, Côa e Alentejo, só para começar. Feitos de virtudes e vicissitudes, assumindo os “defeitos” e as imperfeições, sem fronteiras terrestres nem morais.

Mestiço é mistura. De defeitos e feitios. De vícios e vicissitudes. De Norte, Sul, Este e Oeste. O blend não se faz só de uvas. Faz-se de histórias, de amigos. Que discutem e riem. Discordam e brindam. Juntos. No vinho como na vida. Luís Louro e Inês Capão (Adega Monte Branco), Mateus Nicolau de Almeida e Teresa Ameztoi (Mateus Nicolau de Almeida), Luís Pedro Cândido, Dirk e Daniel Niepoort (Niepoort) dão rosto a este manifesto. Aceitaram os desafios. E o vinho aconteceu!

Com a família Niepoort, no Douro, Ljubomir produziu os Mestiço Bravo, Viçoso (brancos) e Maduro (tinto). Na Mateus Nicolau de Almeida, em pleno Côa, criou um Bruto (branco) e um Sólido (tinto). Do Alentejo, da Adega Monte Branco, trouxe cinco vinhos: Curioso, Atrevido (brancos), Perigoso, Amoroso e Raro (tintos). Uns são mais simples, outros mais complexos, uns clássicos, outros punk.

Os produtos Mestiço estão à venda através da distribuidora Temple Wines e na loja online do chefe Ljubomir: www.ljubomirstanisic.pt

Para breve, está previsto o lançamento de outras bebidas Mestiço, entre vinhos, cervejas e destilados.

 

TEJO: ODE WINERY

Ode Winery

Muitas interpretações ao longo dos séculos tem tido esta Ode, dirigida a uma mulher, Leucónoe. Na verdade, diz tão somente que não sabemos que vida nos espera para além da morte, os deuses sabem o que nos convém ainda que não o entendamos, por isso, aproveita o dia que passa. No fundo, tecnicamente, Ode é […]

Muitas interpretações ao longo dos séculos tem tido esta Ode, dirigida a uma mulher, Leucónoe. Na verdade, diz tão somente que não sabemos que vida nos espera para além da morte, os deuses sabem o que nos convém ainda que não o entendamos, por isso, aproveita o dia que passa. No fundo, tecnicamente, Ode é uma composição poética lírica, que se caracteriza pela eloquência e elevação de estilo, sobre um determinado assunto solene ou digno de registo, podendo versar sobre os temas mais diversos, sejam eles heroicos, amorosos, trágicos ou, porque não, vínicos! É também uma palavra quase universal, entendível por uma imensidão de idiomas.

Uma Ode ao Tejo?
Fundada por uma família local em 1902, em Vila Chã de Ourique, ampliada e completamente remodelada em 2000, com a utilização e integração dos melhores equipamentos de processamento e armazenamento, e novas instalações de enoturismo, a agora baptizada Ode Winery passou por vários momentos até ser adquirida, em 2022, pelo Grupo Immerso Collective.
A Immerso Collective é uma empresa com foco no luxo e sustentabilidade, criada por David Clarkin, australiano, o qual conta com mais de trinta anos de experiência em investimento e desenvolvimento imobiliário de futuro, nos mercados asiático e australiano, e Andrew Homan, igualmente australiano, advogado de formação mas com vasta experiência em diferentes indústrias, nomeadamente na gestão de fundos de investimento imobiliários. Os projectos desenvolvidos pela Immerso, pretendem sempre dinamizar a região e a comunidade em que se inserem de forma integrada, desde propriedades comerciais e residenciais a ofertas mais direcionadas para o turismo, numa perfeita ligação entre o cuidado e respeito pelo ambiente e os altos padrões de luxo e conforto. A empresa começou a operar em 2021 em Portugal, primeiro país europeu em que está presente, com a aquisição da agora designada Ode Winery, Farm & Living.
Por sua vez, Jim Cawood, também ele australiano, é o “Director of Wines and Good Times” da Ode, conforme consta no seu cartão profissional. Anfitrião por excelência, apaixonado pelo projecto e pelo terroir Ode, tem mais de 30 anos de experiência em todas as vertentes do negócio do vinho, tendo sido sommelier, importador, distribuidor e retalhista, e também produtor em Espanha.
Jim confessou-nos que um dos motivos que os levou a apostar neste terroir onde está inserida a Ode foi a sua semelhança com o clima e o pH dos solos de Hunter Valley, situado a norte de Sydney, no Estado de Nova Gales do Sul, uma das principais regiões vinícolas da Austrália, com uma longa história ligada à viticultura que remonta ao Século XIX, reconhecida internacionalmente pelas variedades Sémillon e Shiraz.

Ode Winery

O solo rico em calcário, onde estão implantadas as vinhas da Ode, permite o cultivo de uma grande variedade de castas, desde as locais Arinto, Fernão Pires, Alvarinho, Touriga Nacional, Tinta Barroca, a variedades internacionais como a Sémillon, Viognier, Pinot Gris, Alicante Bouschet, Cabernet Sauvignon, Merlot e Syrah. A menos de uma hora de Lisboa, a Ode Winery localiza-se em pleno coração ribatejano, no concelho do Cartaxo e nasce em 2022 com o objectivo de dar outra dimensão à região, à sua cultura do vinho e, sobretudo, com o desejo de elevar o patamar qualitativo e a percepção do consumidor sobre a realidade dos vinhos do Tejo.
Integrado num projeto maior, designado Ode Winery, Farm & Living, tem cerca de 96 hectares, onde estão inseridos os 22 hectares de vinha, responsáveis por dez vinhos produzidos até ao momento, cinco brancos e cinco tintos, que marcam pelo seu carácter diferenciado, equilíbrio, e boa qualidade da fruta, aliada uma acidez fresca vinda do Tejo, sempre ali tão próximo.
Neste momento, a ODE Winery apresenta dez referências: os brancos Ode Semillon 2022, Ode Viognier 2022, Ode Fernão Pires 2022, Ode Arinto 2022, Ode Enóloga Arinto Fernão Pires 2022; e os tintos Ode Touriga Nacional 2022, Ode Quarteto 2022, Ode Lagares Touriga Nacional 2022, Ode Amphora Alicante Bouschet 2022, Ode Única Touriga Nacional 2023.
Num país com tradição de lote, na Ode a cultura é claramente internacional e monovarietal, o que não deixa de ser extremamente interessante também, vermos castas como a Viognier, por exemplo, tradicionalmente com baixa acidez, a receberem uma vida nova e toda uma frescura vinda do Tejo.

Ode Winery
Sob a coordenação da enóloga Maria Vicente, a Ode Winery segue os princípios orgânicos, sustentáveis e regenerativos.

Sob a coordenação da enóloga Maria Vicente, com mais de 20 colheitas no seu percurso profissional, sendo a maioria delas no Tejo, a Ode Winery segue os princípios orgânicos, sustentáveis e regenerativos para garantir solos saudáveis, matéria orgânica positiva e um ambiente livre de doenças, estando a Certificação Orgânica e Biológica prevista para 2025.
Para além da vinha e adega, complementam o projecto Ode as vertentes Farm & Living. A Ode Farm simboliza o respeito pelo ambiente, com foco na sustentabilidade, conservação e desperdício mínimo. É na quinta que são cultivadas não só as vinhas, mas também outros produtos utilizados no espaço de restauração da Ode Winery, Farm & Living, seguindo os valores da agricultura sintrópica, uma abordagem inovadora à agricultura sustentável. Este método regenerativo enfatiza a diversificação de espécies vegetais, que imitam a estrutura e a função dos ecossistemas naturais para gerar ciclos de crescimento autossustentáveis. Na Ode Farm, os visitantes podem, não só ver a utilização de práticas sustentáveis, mas também vivê-las. A Ode Living integra não só o espaço de eventos, um salão com mais de 1000m², como o restaurante Cellar Door, de inspiração asiática, onde se juntam os sabores portugueses, asiáticos e do mundo na cozinha, oferecendo uma experiência diferente do habitual nesta região. Adicionalmente, no Cellar Door o menu e os ingredientes são de acordo com a estação do ano, e vários dos ingredientes utilizados são plantados na quinta, numa aposta num conceito de “farm to table” – da quinta para a mesa. Para dar suporte a todas estas valências está projectado um resort de luxo, com vários modelos de alojamento. Tudo a menos de uma hora de Lisboa! E, nem de propósito, no próprio dia em que decorria a nossa visita, recebeu-se a notícia de que a aprovação do projecto havia finalmente sido emitida pelas entidades competentes. Um dia para recordar, portanto!

(Artigo publicado na edição de Março de 2024)

“Vigneron” é em Junho, nas Bágeiras

Vigneron

Os franceses chamam vigneron àquele que faz o vinho exclusivamente com as uvas que cria na sua propriedade. No país onde o conceito nasceu, o chamado “vigneron independant” recolhe, junto do mercado e do consumidor, um estatuto de singularidade e exclusividade muito especiais. Em Portugal, essa qualificação existe igualmente na lei, embora com um nome […]

Os franceses chamam vigneron àquele que faz o vinho exclusivamente com as uvas que cria na sua propriedade. No país onde o conceito nasceu, o chamado “vigneron independant” recolhe, junto do mercado e do consumidor, um estatuto de singularidade e exclusividade muito especiais. Em Portugal, essa qualificação existe igualmente na lei, embora com um nome bastante mais rebuscado e pouco “sexy”: vitivinicultor-engarrafador. O problema é que ninguém sabe o que isso é. Pior: nos últimos anos, por desconhecimento ou aproveitamento, vários agentes do sector têm usado o designativo de vigneron para assim qualificar os produtores de pequena dimensão, muitos deles não possuindo sequer vinha ou adega. Mário Sérgio Nuno, da Quinta das Bágeiras, há muito que se revolta contra aquilo que considera, nas suas palavras, “abuso e publicidade enganosa”. E manifesta frequentemente essa atitude na comunicação institucional das Bágeiras, onde faz questão de explicar o que é, efectivamente, um vigneron. O produtor bairradino não está sozinho nessa luta e, ciente disso, resolveu organizar um evento que congrega “verdadeiros vigneron” em torno de uma causa comum: “valorizar o que há de mais pessoal e genuíno no mundo do vinho – fazê-lo somente com uvas próprias.”

O evento “Vigneron, As Nossas Uvas, Os Nossos Vinhos”, está assim agendado para o próximo dia 22 de Junho, na Quinta das Bágeiras, Fogueira, Sangalhos. O propósito de Mário Sérgio é acolher, na sua adega, cerca de duas dezenas de produtores que partilham a mesma filosofia – inscritos na categoria vitivinicultor-engarrafador do Instituto da Vinha e do Vinho – que irão apresentar os vinhos aos visitantes (consumidores, imprensa, profissionais de restaurantes e lojas especializadas) num evento onde as provas comentadas e a gastronomia também marcam presença. “Ser vigneron”, diz, “significa conhecer cada parcela, cada casta, cada videira, acompanhar o ciclo da vinha, faça sol, chuva, frio ou calor.” Além disso, acrescenta, “um vigneron trabalha sem rede: fazemos mais vinho quando temos mais uva, ou ficamos sem vinho se nos acontecer uma desgraça na vinha. Ao contrário de outros que compram a uva e o vinho que quiserem e onde quiserem, nós, por vontade própria, não o podemos fazer. Isso tem de valer alguma coisa. Um vinho de vigneron é, verdadeiramente, a cara de quem o fez, de quem tomou todas as decisões, da cepa até à garrafa.”

Mas, no copo, o que distingue estes vinhos dos outros? Mário Sérgio tem também resposta para isso: “Não são melhores nem piores, são diferentes. Criamos vinhos genuínos, vinhos de que sabemos exactamente a origem, vinhos que espelham a forma como trabalhámos a vinha e os efeitos que o ano climático teve naquelas uvas. São vinhos sem compromissos, vinhos que são tão nossos quanto as nossas uvas. Acreditamos que isso faz a diferença”, remata.
Os nomes já confirmados metem respeito, e abarcam casas de diferentes dimensões – “vigneron não tem a ver com tamanho, tem a ver com princípios, com uma forma de estar no mundo do vinho”, acentua o organizador – e distintas origens, de norte a sul do país. Por ordem alfabética, vão marcar presença os produtores António Selas, Casa de Cello, Casa da Passarella, José Madeira Afonso, Júlio Bastos, Quinta da Alameda, Quinta da Atela, Quinta das Bágeiras, Quinta da Boa Esperança, Quinta de Chocapalha, Quinta da Falorca, Quinta da Pedreira, Quinta do Perdigão, Rui Reguinga, Tapada de Coelheiros e Vale dos Ares. A coisa promete… L.L.

Tintos de 2014: A perfeição num ano imperfeito

tintos 2014

O ano em si até nem correu mal. De vários relatórios do ano vitícola concluímos que as temperaturas se mantiveram relativamente amenas, com alguma oscilação, mas sem ondas de calor no verão. A Sogrape, que tem produção no Douro, Alentejo, Dão e Vinhos Verdes refere que “a chuva foi uma constante ao longo do ano, […]

O ano em si até nem correu mal. De vários relatórios do ano vitícola concluímos que as temperaturas se mantiveram relativamente amenas, com alguma oscilação, mas sem ondas de calor no verão.
A Sogrape, que tem produção no Douro, Alentejo, Dão e Vinhos Verdes refere que “a chuva foi uma constante ao longo do ano, marcando também presença na época de vindima na maior parte das regiões vitivinícolas”.
A humidade elevada originou uma maior pressão de doenças criptogâmicas (míldio, oídio e podridão), obrigando à realização de um maior número de intervenções na vinha (desfollha, desponta) e tratamentos fitossanitários.
O mês de Agosto foi particularmente seco, mas boas reservas de água no solo permitiram que as videiras não entrassem em stress hídrico, ao mesmo tempo que as temperaturas amenas e noites frescas contribuiram para uma boa e equilibrada maturação das uvas e até faziam esperar uma vindima fantástica. A chuva de Setembro é que estragou as expectativas de muitos viticultores.
Em alguns locais choveu o dobro da média ou mais. Aqui, factores como a proximidade do litoral e orografia podem complicar ainda mais. Na Bairrada, por exemplo, não foi um ano feliz. Alguns dos produtores habituais nesta prova não mandaram vinhos. A Baga não teve hipótese de amadurecer antes das chuvas.

Antes ou depois da chuva

Tive a sorte de acompanhar a vindima de 2014 com as mãos na massa, na Quinta do Vallado. Durante duas semanas fiz controlo de maturação, selecção de uvas no tapete de escolha, remontagens manuais, pisa a pé, controlo de fermentações, análises de mostos e tudo que se faz numa adega. Lembro-me que cheguei à quinta no dia 8 de Setembro e já tinha chovido dois dias antes. A apanha de uva foi intermitente em função das chuvas. No tapete de escolha a selecção foi exigente, mas dependia muito dos locais e das parcelas de onde vinha a uva. E isto claramente constitui o factor diferenciador, sobretudo no Douro, onde as diferentes altitudes e exposições modificam significativamente as condições da região.
De um modo geral, a vindima 2014 ficou dividida em antes e depois da chuva. E aqui o terroir e a casta tiveram um papel preponderante.
O produtor e enólogo Rui Reguinga, que tem as vinhas no calhau rolado em Almeirim, não teve qualquer problema na vindima. Explica que aquela zona “é muito quente, ainda por cima o calhau rolado acaba por acelerar a maturação, o que permitiu colher as uvas maduras e em óptimas condições antes das chuvas”.
Na Herdade do Mouchão, no Alentejo, começou a chover a partir da segunda semana de Setembro, mas o melhor Alicante Bouschet da vinha dos Carapetos, implantada em solos de aluvião bem drenados, foi vindimado antes das primeiras chuvas. Estas uvas são a espinha dorsal do Mouchão 2014, que mostrou uma qualidade estrondosa nesta prova.
Francisco Olazabal conta que na Quinta do Vale Meão, Douro Superior, começou a chover no dia 7 de Setembro, mas eles conseguiram apanhar a maior parte das parcelas que entram no lote entre o 29 de Agosto e 6 de Setembro. As uvas apanhadas mais tarde estavam maduras e não foram muito afectadas pelas chuvas. O resultado está na prova.

tintos 2014

2014 foi o ano em que vingou o terroir e as decisões acertadas.

 

Decisões acertadas

Mas nem todos tiveram a sorte de apanhar as uvas antes das chuvas e tiveram que gerir a vindima em função do estado da maturação das uvas e do seu sexto sentido, tomando decisões rápidas e, por vezes, arriscadas.
Sandra Tavares (Wine & Soul) relata que o ano estava a correr muito bem. As uvas para o Pintas foram apanhadas antes da chuva, mas as vinhas da Quinta da Manoella ficam numa zona mais fresca e ainda não tinham sido colhidas. Quando souberam da previsão das chuvas, fizeram mais desfolha para os cachos ficarem mais expostos e secarem mais rápido. Optaram por vindimar à chuva e nunca pararam a vindima. O objectivo era colher tudo o mais depressa possível, porque as uvas demoram a absorver a água. Os solos drenam bem e as uvas não ficaram muito diluídas. O facto de serem vinhas velhas também ajudou. “Acabam por ser mais calibradas, mais resistentes às adversidades do tempo”. Tiveram atenção redobrada na selecção de uvas, naturalmente.
Segundo o enólogo da Quinta do Noval, Carlos Agrellos, no caso deles as uvas provêm das vinhas expostas a sul e a poente e, com esta localização, estavam quase maduras. A primeira parcela de Touriga Nacional foi colhida a 14 de Setembro e outra parcela no dia seguinte – as duas juntas fazem 80% do lote. A chuva não as afectou muito. Pela Touriga Franca tiveram que esperar até dia 5 de Outubro. Foi colhida já depois das chuvas. Conseguiu recuperar. “Era o risco total, mas valeu a pena”. Diria que estamos perante “um ano mais sóbrio, do que full-bodied” – conclui Carlos. Na adega fizeram delestage mais vezes para extrair mais estrutura (as uvas que entraram no lote estavam em óptimas condições sanitárias).
Jorge Moreira (Poeira) partilha a sua experiência da vindima 2014. “Quando os bagos começaram a rachar com as chuvas, primeiro pensei vindimar, mas depois resolvi esperar porque as uvas ainda não estavam maduras”. Com as vinhas viradas a norte, confessa que nunca consegue vindimar antes de 20 de Setembro. “Os vinhos acabaram por ter um pouco de diluição” – continua – “mas no Douro, com a tradição do Porto Vintage, medimos a qualidade pela concentração, estrutura e um pouco de sobrematuração. Nos anos 90 era o que procurávamos, mas o tempo ensinou-nos que os anos mais frescos, com pH mais baixo, evoluem melhor, pois temos estrutura na mesma. Por isto, no Douro é preferível ter maturação a menos do que a mais. Nos anos menos maduros tem de se ter mais cuidado com as extracções para não extrair taninos verdes.”
Manuel Vieira, enólogo consultor na Caminhos Cruzados, conta que também tiveram que esperar que a chuva passasse. A Touriga Nacional (maior parte das vinhas velhas do Teixuga) é uma casta importante no Dão, porque tem elasticidade suficiente na película para aguentar as chuvas sem rebentar (ao contrário da Alfrocheiro, por exemplo). Com vindima adiada para os finais de Setembro, obtiveram mostos com pH baixo, acidez alta e grau alcoólico mais baixo o que é normal.

Uma década depois

Há duas conclusões fundamentais que podemos retirar desta prova. Primeiro, as generalizações são sempre uma abordagem redutora no que toca à produção de vinho, porque muitas vezes o terroir sobrepõe-se às condições climatéricas, e ainda mais nos anos difíceis. Agora, passada uma década e com os vinhos provados, podemos constatar que mesmo num ano imperfeito como o 2014, existem muitos vinhos próximos da perfeição, cheios de vida e força. Depois, concluímos que com pH mais baixo e acidez mais alta estes vinhos acabam por ter uma evolução mais lenta (alguns parecem bem mais novos do que uma década de vida sugeriria), não pecam por falta de estrutura, e mesmo, perdendo algum corpo, vencem pela elegância.

O TGV e as vinhas da Bairrada

TGV Bairrada

É um dos grandes projectos estruturantes dos próximos anos em Portugal, para além do futuro aeroporto de Lisboa. A construção da linha de caminho de ferro entre Lisboa e o Porto, onde irão circular comboios de alta velocidade (Comummente chamados TGV, sigla da designação francesa Train à Grande Vitesse) e de mercadorias, já começou. Muito […]

É um dos grandes projectos estruturantes dos próximos anos em Portugal, para além do futuro aeroporto de Lisboa. A construção da linha de caminho de ferro entre Lisboa e o Porto, onde irão circular comboios de alta velocidade (Comummente chamados TGV, sigla da designação francesa Train à Grande Vitesse) e de mercadorias, já começou.
Muito se tem especulado sobre este tema, a nível político e não só. Devido ao seu custo, que deverá ascender aos seis mil, ou oito mil milhões de euros se a linha se prolongar até Valença para ligar depois a Vigo, em Espanha. Mas também por haver outras opções mais lógicas, como a ligação da capital a Madrid. E há quem não concorde com o traçado escolhido ou forma como foi estabelecido. Tem sido assim quase sempre em Portugal, seja por razões que vão das tricas políticas às mais terrenas, aquelas que afectam as pessoas e os seus bens, como a destruição de casas, terrenos agrícolas ou edifícios empresariais. É isso que irá acontecer na Bairrada durante a fase de construção, e depois da implantação da obra.

TGV Bairrada

12 milhões de passageiros
Os custos da obra foram anunciados por Frederico Francisco, secretário de Estado das Infraestruturas, à agência Lusa, no dia do lançamento do concurso para a sua primeira fase. O governante também disse que as previsões do governo apontam para o transporte de 12 milhões de passageiros entre Lisboa e Porto anualmente por esta via, que serão retirados aos transportes aéreo e terrestre, contribuindo para a diminuição de emissões e para a sustentabilidade ambiental do país. E, por consequência, para se atingirem as metas estabelecidas de emissões da União Europeia neste campo. É, por isso, que “é difícil de estar contra esta obra do ponto de vista institucional”, diz Pedro Soares, presidente da Comissão Vitivinícola da Bairrada (CVBairrada). Mas o número de passageiros “é muito semelhante aquele com que os políticos justificaram a construção da A8, que não se sabe onde estão”, salienta Mário Sérgio Nuno, proprietário da Quinta das Bágeiras, defendendo que em Portugal se aposta sobretudo em grandes obras mediáticas, e pouco nas pequenas, como a ligação ferroviária entre Sangalhos e Aveiro, onde se demora o mesmo tempo que há 40 anos, ou seja, muito. Ou seja, e como todos sabemos ou podemos constatar, há coisas feitas, mas ainda há muito para fazer entre aquilo que é necessário para o nosso país e as suas pessoas.

 

TGV Bairrada

“Substituir a vista de mar de vinhas verdes pela de um viaduto ferroviário é devastador, com a agravante de a linha não passar abaixo da cota das vinhas. Será uma ferida na paisagem” – Manuel Pinheiro, CEO da Global Wines

 

 

Um pedacinho de ferrovia
E fazer um investimento deste tipo, sem prever ligações a Vigo, a norte, que ainda está apenas esboçada, e Madrid, a capital do país vizinho, “significa que teremos apenas um pedacinho de ferrovia e que Portugal não poderá tirar todo o potencial de um investimento deste tipo, que é muito significativo para os cofres do país”, realça o presidente da CVBairrada.
Mas são sobretudo as opções para a implementação da linha ferroviária tomadas, certamente, com base no seu custo/benefício, mas sem consulta de quem está, vive e desenvolve os seus negócios no terreno, que estão em causa para Pedro Soares. Pelo menos “não foi isso que aconteceu com produtores da Bairrada que vão ser afectados de forma directa, ou indirecta, como a Adega Campolargo, a Quinta do Encontro, do Grupo Global Wines, ou as Colinas de São Lourenço, do Grupo Fladgate Partnership”. Apesar de ir ocupar apenas o equivalente a 250 hectares de vinha, é preciso não esquecer que a obra irá acrescentar, a uma paisagem que é um dos postais da região, uma linha de comboio.

 

Uma paisagem alterada
“O traçado escolhido não só prejudica e coloca em causa empresas e postos de trabalho, como inviabiliza qualquer estratégia enoturística da Bairrada, enquanto região demarcada”, defende Manuel Pinheiro, CEO da Global Wines. “Há vinhas que irão ser cortadas e algumas vinhas velhas passarão a ter aterros ou viadutos com uma linha por cima, o que irá transformar a capacidade de sedução da região”, salienta Mário Sérgio Nuno, da Quinta das Bágeiras. Pedro Soares acrescenta que “muitos dos cartões postais, que são hoje o seu valor imaterial, vão desparecer, e muitas fotografias que usamos na comunicação para a sua promoção já não a vão representar, porque o horizonte vai estar parcialmente preenchido por uma linha em aterro ou em viaduto”. Para além disso, a obra será também prejudicial para a Bairrada por afectar vários enoturismos, “que são veículos de divulgação e valorização dos territórios, das empresas e das suas marcas, e também constituem, em alguns casos, importantes fontes de receita através das vendas à porta”, salienta o responsável da CVBairrada. E não é só a faixa de terreno dedicada à alta velocidade que será afectada diretamente, porque haverá também vinhas, caminhos à volta e cursos de água que serão alterados durante a construção da obra.

 

“Os governos poderiam, talvez, usar as linhas de caminho de ferro já implantadas ou as estradas e autoestradas já construídas para implantar a linha do TGV. Mas não, tem de ser feita uma obra nova” – Mário Sérgio Nuno, proprietário da Quinta das Bágeiras    TGV Bairrada

 

As melhores soluções
É verdade que não é possível falar com todas as pessoas e empresas individualmente quando se projecta uma obra desta dimensão. Mas se tem de ser construída, e a Bairrada tem de ser atravessada, isso deveria ser feito após as entidades promotoras, e quem faz o projecto, falarem directamente com quem vai ser prejudicado para procurar, e encontrar, as melhores soluções em conjunto. “É isso que tem faltado”, conta Pedro Soares, referindo que esteve apenas “em duas ou três reuniões a reboque da Câmara da Anadia, e numa sessão pública de esclarecimento” com esse tema. “O processo de consulta podia e deveria ter sido mais relevante”, defende Manuel Pinheiro.
Sabe-se, hoje, que serão afectados cerca de 250 hectares de vinha na Bairrada. Mas, segundo Pedro Soares, ninguém procurou saber se havia, no seio dela, por exemplo um terroir específico, uma parcela especial que dê origem, hoje, a uma marca de um vinho de qualidade que é único por ter essa origem, que existe após ter dado muito trabalho na vinha e na adega para o encontrar, e muito esforço para comunicar a sua diferença ao mercado até se tornar um símbolo daquilo que a empresa que o produz faz bem, e pode agora desaparecer. “Será que não se deve pagar ao produtor, não apenas pelo terreno, mas também pela marca que desapareceu?”, questiona o responsável. São estas e outras perguntas que ainda estão por responder, numa altura em que as obras do futuro TGV entre Lisboa e o Porto estão a arrancar. Estamos a falar de algo que tem uma componente imaterial muito significativa, como algumas vinhas velhas, cujo valor tem a ver com a qualidade do vinho e a história e imagem da marca que tem no mercado.
“Sabemos quais são os valores pensados para indemnizações e a forma como foram calculados, mas não se pode pensar, aqui, da mesma forma como se faz para valorizar cada metro quadrado urbano”, defende Pedro Soares, acrescentando ainda que, para fazer as avaliações, deveria ser criada uma equipa multidisciplinar para avaliar os terrenos integrando todas as condições, “para fornecer as recomendações necessárias para mitigar o impacto brutal que vamos ter na nossa região”.

 

TGV Bairrada

 

“Muitas fotografias que usamos na comunicação para a sua promoção já não a vão representar, porque o horizonte vai estar parcialmente preenchido por uma linha em aterro ou em viaduto” – Pedro Soares, presidente da CVBairrada

 

 

 

(Artigo publicado na edição de Março de 2024)

CAS’AMARO: Vinho e turismo como vectores de negócio

CAS’AMARO

O projecto Cas’Amaro começou a ser construído há oito anos, com a aquisição do Casal da Vinha Grande, perto de Alenquer, por Paulo Amaro, porque este empresário, com negócios na área do imobiliário e da distribuição de instrumentos médicos e hospitalares, achou que seria um bom investimento imobiliário. A propriedade fica entre a Quinta de […]

O projecto Cas’Amaro começou a ser construído há oito anos, com a aquisição do Casal da Vinha Grande, perto de Alenquer, por Paulo Amaro, porque este empresário, com negócios na área do imobiliário e da distribuição de instrumentos médicos e hospitalares, achou que seria um bom investimento imobiliário.
A propriedade fica entre a Quinta de Chocapalha e a Quinta do Pinto e quando Paulo Amaro se apercebeu que tinha, no meio, uma adega antiga, sentiu que havia ali potencial para o negócio de enoturismo. Por isso, decidiu transformá-la numa unidade de luxo, hoje com três quartos, e plantar, há volta, cinco hectares de vinha, para lhe dar o melhor cenário envolvente, tal como está previsto para o resto dos investimentos no sector vitivinícola da Cas’Amaro em Portugal.

Visão objectiva
A paixão pelo vinho enquanto enófilo ajudou, mas foi a sua visão objectiva em relação a esta área de negócio que o levou a não ficar por aqui. “Depois, e muito rapidamente, a um ritmo quase compulsivo, foram compradas mais quatro propriedades em outras tantas regiões vitivinícolas portuguesas”, conta Rui Costa, diretor-geral da empresa há pouco mais de meio ano. Para além disso foi adquirida, ainda na Região de Lisboa, mais “uma vinha com dois hectares de Castelão com 30 anos, que temos estado a mimar para lhe aumentar a produtividade, pois tinha estado abandonada”, explica o responsável, acrescentando que a empresa está a plantar mais outra vinha, na zona da Abrigada, com as castas Vital e Ramisco, para acrescentar diversidade ao encepamento actual, baseado apenas em castas locais.
A única adega da empresa fica no concelho de Alenquer e começou a funcionar em 2021, dois anos após o lançamento dos primeiros vinhos. Ocupa o espaço de uma outra, com quase 100 anos, totalmente reconvertida e modernizada para permitir aos enólogos da casa, Ricardo Santos, o diretor de enologia da Cas’Amaro, e Gilberto Marques, que coordena a vinificação da empresa em Lisboa depois de se ter mudado da Quinta de Pancas, nas melhores condições possíveis.
A operação seguinte foi a aquisição da Herdade do Monte de Castelête, no Alentejo. Com 70 hectares, dos quais 48 de montado e 22 de vinha, fica perto de Estremoz, e tem um monte que a empresa está a transformar numa unidade de enoturismo, que inclui alojamento.
“Uma das preocupações na aquisição das propriedades foi que, para além da vinha, tivessem também um edificado atractivo, possível de reconverter em unidades de enoturismo”, diz Rui Costa, explicando que foi essa a filosofia base seguida na aquisição da Quinta da Fontalta, no concelho de Santa Comba Dão, que inclui um solar e 16 hectares de vinha, e também na propriedade da Região dos Vinhos Verdes, que inclui um solar muito antigo e apenas seis hectares de vinha, de um total de 40 hectares. “É uma quinta tradicional do Minho, que fica num vale estreito e comprido, com uma parcela de floresta e muito espaço para crescer”, conta o gestor, salientando que irão ser plantados, no local, mais dois hectares de vinha Alvarinho, processo que deverá ser moroso e dispendioso devido à quantidade de pedra que existe no solo.
No Douro, a Cas’Amaro adquiriu as Quintas de S. João e S. Joaquim, com 18 hectares de vinha e socalcos virados uma para a outra. Apesar de uma das propriedades possuir uma adega, não tinha condições para se vinificar. Por isso, os primeiros vinhos do Douro e Portos produzidos nesta região foram vinificados em Cheleiros, e está a ser pensada a construção de uma adega em Armamar.

 

A equipa da Cas’Amaro está a construir um projecto que une a produção de vinhos a um conceito de enoturismo que alia, ao vinho, a arquitectura, o design e a arte

Produção sustentável
Os projectos desta empresa estão a ser desenvolvidos segundo dois eixos. O primeiro é a produção de vinhos de qualidade, preferencialmente de modo biológico e sustentável, destinados sobretudo aos mercados externos. O segundo é o enoturismo, porque é a forma de se conseguir o equilíbrio financeiro de um projecto vínico a produzir em zonas tão distintas do território nacional, com áreas pequenas área de vinha, que irão perfazer um total de 76 hectares. “No alojamento, no restaurante ou mesmo no wine bar, onde vendemos apenas vinho a copo, as margens são mais apetecíveis, o que torna a combinação muito mais viável do que apenas a produção e comercialização de vinho”, explica Rui Costa.
Apenas está terminado o projecto de enoturismo da região de Lisboa, que inclui, para além do restaurante e da unidade de alojamento em Alenquer, uma outra em Lisboa, o Madalena Orquídea Living, um alojamento local com apartamentos T2, um café brunch e um restaurante vínico por baixo. Todos estes projectos foram desenvolvidos por Paulo Amaro desde 2016, antes de criar, a meio do ano passado, “uma estrutura de gestão, marketing, viticultura e enologia, coerente com a sua visão de futuro para as propriedades e a empresa, cujo caminho está a ser implementado agora”, conta Rui Costa. Para além dele, a equipa inclui dois profissionais que gerem os projectos em desenvolvimento, Rui Vasco e António Sousa, que são os homens de campo para tudo o que diz respeito a obras, desde a construção e reconversão de edifícios até à plantação e reconversão da vinha. A empresa tem mais cinco viticultores a tempo inteiro, um por cada uma das suas cinco quintas. Quando há trabalhos mais específicos a realizar, é contratado pessoal local, “o que nos tem permitido fugir àquela mão de obra mais massificada, que às vezes estraga mais do que faz”, defende Rui Costa, acrescentando que a sua empresa paga um pouco acima da média para conseguir ter essas pessoas.

Adega própria apenas em Lisboa
Como a empresa só tem adega na Região de Lisboa, vinifica em instalações de parceiros nas outras. No Dão, na Adega das Boas Quintas, de Nuno Cancela de Abreu; no Alentejo, na Adega do Monte Branco, de Luís Louro; no Douro, na Adega Dona Matilde, com o apoio do seu enólogo, João Pissarra e, na Região dos Vinhos Verdes, na AB Valley Wines, de António Sousa. “São as adegas mais próximas das nossas vinhas e são geridas por pessoas com quem nos conseguimos identificar, com as quais criámos métodos de trabalho”, explica o gestor, salientando que, assim, é possível Ricardo Santos, o director de enologia, fazer um acompanhamento mais próximo de todo o processo, o que é essencial para se produzir, todos os anos, o perfil de vinho definido pela sua equipa para cada região.
Em frente à adega, em Alenquer, fica um restaurante vínico, com sala de provas, que passa a wine bar a partir do final da noite, cuja frequência tem estado esgotada este ano. A procura deve-se, sobretudo, ao trabalho que Rui Costa tem realizado para encontrar clientes para as áreas de vinhos e enoturismo da empresa.
Depois de ter constatado que é lá fora que estão a maior parte dos potenciais clientes, tem frequentado feiras de turismo para contactar operadores que tragam estrangeiros a Portugal, para mostrar a oferta da Cas’Amaro. Foi isso que aconteceu na Fitur deste ano, em Madrid, de onde tinha acabado de chegar quando se realizou esta entrevista. “Os nossos espaços oferecem algo mais do que apenas o habitual no enoturismo, pois também reflectem o interesse de Paulo Amaro pela arquitectura, design e arte, o que os torna ainda mais atractivos”, realça o gestor da empresa. “Quem dorme na nossa casa de Alenquer em Outubro e volta em Fevereiro, vê exposições diferentes, tal como acontece no restaurante, porque há sempre algo de novo a acontecer”, acrescenta.
Para apresentar a casa e os seus vinhos está a apostar também nas principais feiras de vinhos nacionais e em algumas das internacionais. “O objectivo é encontrar bons parceiros, que se apaixonem pelos nossos vinhos e apreciem o seu perfil”, salienta acrescenta que pretende estar muitas vezes com eles para os ajudar a vender nos seus mercados. Com esse objectivo vai estar, com os enólogos da empresa, três vezes em São Paulo, no Brasil, em 2024, em articulação com outras iniciativas nacionais, para ajudar os seus importadores a apresentar os vinhos da Cas’Amaro aos seus clientes. E como é que este investimento vai ser pago? “Cada pessoa a quem vendermos uma garrafa de vinho é um potencial cliente dos alojamentos e dos restaurantes da empresa, onde teremos sempre um retorno significativo”, explica Rui Costa.

 

O projecto começou, em 2016, com a compra do Casal da Vinha Grande, em Alenquer, cuja adega foi transformada num espaço de alojamento com três quartos, preparado para servir refeições aos hóspedes

 

Um vinho de cinco tourigas
Para além do Brasil, e do Reino Unido, onde a empresa já começou a vender vinho, o gestor quer apostar na Holanda, Bélgica e países escandinavos, para além da Coreia do Sul. “Os Estados Unidos irão ficar para mais tarde, quando percebermos bem esse mercado”, diz.
Para este ano Rui Costa prevê que a Cas’Amaro deverá vender 36 mil garrafas e ter 150 mil euros de facturação com a venda de vinho, mais 110 mil no enoturismo, o que representa um crescimento exponencial em relação ao ano anterior. Por enquanto, o objectivo da empresa é explorar todo o potencial dos seus 76 hectares de vinha, que ainda está longe de ser atingido porque uma parte está a ser reconvertida e outra ainda está ou vai ser plantada. Sempre com castas locais, de preferência, e algumas de implantação nacional, como o Arinto ou a Touriga Nacional. No futuro, Rui Costa diz que “gostaria de fazer um vinho de cinco Tourigas, com uvas das cinco regiões”. Mas isso ainda é apenas um sonho.

Os terroirs da empresa

A Cas’Amaro investiu em cinco regiões nacionais, com o objectivo de produzir vinhos e criar equipamentos de enoturismo, incluindo alojamento e restauração, que está ou irá construir nos próximos anos. O objetivo é que os dois negócios, o do vinho e o do enoturismo, estejam em pleno funcionamento em 2030.

Cas’Amaro Vinhos Verdes
Inclui a Quinta do Bustelo, com 40 hectares, em Marco de Canavezes.
Área de vinha – 6ha, mais 2ha que deverão ser plantados este ano
Castas – Arinto, Alvarinho, Loureiro e Azal
Vinhos – Bustelo Alvarinho 2023, Bustelo Arinto 2023, Bustelo Arinto e Loureiro 2023

Cas’Amaro Douro
Inclui a Quinta de São João e a Quinta de São Joaquim, com um total de 39 hectares, no concelho de Armamar.
Área de Vinha – 18ha
Castas – Touriga Nacional, Tinta Roriz, Tinta Amarela, Tinta Barroca, Maria Gomes, Malvasia e Códega do Larinho
Vinhos – Acidentado e Enfeitado (Ainda não estão no mercado)

Cas’Amaro Dão
A Quinta da Fontalta tem 17 hectares e fica no concelho de Santa Comba Dão.
Área de vinha – 15ha
Castas: Touriga Nacional, Alfrocheiro, Jaén, Tinta Roriz, Encruzado, Malvasia Fina e Cerceal Branco
Vinhos: Caminho Branco 2022, Caminho Tinto 2022 100% Touriga Nacional e Mitologia Reserva 2022 100% Encruzado

Cas’Amaro Lisboa
A empresa possui o Casal da Vinha Grande, dois hectares de vinha na Labrugeira e mais seis na Abrigada.
Área de vinha – 7ha mais 6ha em plantação
Castas – Arinto, Fernão Pires, Sercial, Rabo de Ovelha, Touriga Nacional, Camarate, Bastardo e Tinta Miúda
Vinhos – Falatório branco, rosé, tinto e varietal de Bastardo, Madame Pió branco, monocastas de Arinto e Sercial e tinto

Cas’Amaro Alentejo
A Herdade Monte do Castelête tem 70 hectares e fica no concelho de Estremoz.
Área de vinha – 22ha
Castas – Antão Vaz, Roupeiro, Touriga Nacional, Trincadeira e Tinta Caiada
Vinhos – Implante e Castelete (No mercado a partir de Março)

(Artigo publicado na edição de Março de 2024)

Millèsime: A festa do espumante na Bairrada

Millèsime

(veja todas as imagens do evento AQUI) Durante dois dias, muitas centenas de pessoas rumaram de todo o país até à Curia, para viver de perto o Millèsime, festa que celebra o espumante e toda a sua essência. A festa decorreu, pelo segundo ano consecutivo, no Curia Palace Hotel, um pedaço de charme da arquitectura […]

(veja todas as imagens do evento AQUI)

Durante dois dias, muitas centenas de pessoas rumaram de todo o país até à Curia, para viver de perto o Millèsime, festa que celebra o espumante e toda a sua essência.

A festa decorreu, pelo segundo ano consecutivo, no Curia Palace Hotel, um pedaço de charme da arquitectura imaginado, no início do século 20, por Manuel Joaquim Norte Júnior, e inaugurado e conservado, até agora, pela família Alexandre Almeida como ícone de uma vida de outros tempos, mesmo após a renovações mais recentes.

Era difícil de encontrar um sítio melhor para um evento de encanto como aquele que reuniu 45 produtores de espumantes portugueses e internacionais.

Nos dois dias, quem comprou o bilhete foi trazido em carros dos anos 20 do século passado, motorizados e puxados a cavalo, passando pelos jardins fronteiriços ao Palace Hotel, para entrar no seu foyer de época, marcado pela grandiosa escadaria em caracol, pelo elevador e pela elegante varanda do andar superior. Lá dentro, um músico tocava piano de cauda e algumas personagens, que retratavam as pessoas dos dourados (ou loucos, segundo se diz também) anos 20, passeavam e conversavam com os visitantes sem sair dos seus papéis.

No interior dos grandes salões estavam os produtores, principalmente os da Bairrada, a apresentar os seus espumantes, mas também havia representações das regiões dos Vinhos Verdes, Douro, Távora Varosa, Dão, Beira, Tejo, Lisboa, Alentejo e Cava, em Espanha e decorria a festa, com muita gente interessada em provar os seus vinhos e conhecer melhor quem os fez. Para além da degustação de espumantes, havia também, nas amplas varandas viradas para os jardins da propriedade, uma mostra e venda de produtos gourmet. Em paralelo ao evento, decorreram visitas para jornalistas, escanções, profissionais de turismo e proprietários de garrafeiras, convidados pela organização para visitar os produtores Luís Pato, Quinta dos Abibes, Idálio Estanislau Wines e Caves da Montanha. J.M.D.

Márcio Lopes: Finos aromas do Norte

márcio Lopes

Os tempos em que tinha dificuldade em encontrar fornecedores de uva já lá vão. Mais longe ainda está a época em que, vivendo no Porto e estudando na universidade, fugia para o campo, mais propriamente para o Vale do Sousa, para ir ter com familiares próximos nesse território não muito distante, de onde hoje produz […]

Os tempos em que tinha dificuldade em encontrar fornecedores de uva já lá vão. Mais longe ainda está a época em que, vivendo no Porto e estudando na universidade, fugia para o campo, mais propriamente para o Vale do Sousa, para ir ter com familiares próximos nesse território não muito distante, de onde hoje produz alguns brancos.
Actualmente, Márcio Lopes controla e recebe uva de mais de cinco dezenas de viticultores, divididos nas duas regiões em que mais labora, a dos Vinhos Verdes e a do Douro (mantém ainda um pequeno projecto na ribeira Sacra, em Espanha). São 50 viticultores e 200 parcelas diferentes de vinha, muita dela velha, uma das suas paixões, entre brancas e tintas.
No total, falamos de 250 mil garrafas, o que já é obra! Para alguns, Márcio está sobretudo ligado aos brancos e, em especial, ao Vinho Verde, o que se explica por aí ter estagiado inicialmente. Mas o encanto pelos tintos também foi começou cedo, inclusivamente pelo vinho do Porto, dado que se lembra de, bem jovem, ter tido muitas vezes contacto com este néctar em dias de festas familiares.
Depois de um começo com vindimas em Melgaço, e de uma experiência na Austrália, Márcio Lopes instalou-se em nome próprio e apresentou várias marcas suas, precisamente dos Vinhos Verdes e do Douro. Já lá vão quase 15 anos e mais de duas dezenas de referências, entre tintos e brancos (e claretes), de pet nat até Porto Vintage.

Márcio Lopes

Vinhos imperdíveis
A vida passa num instante, como é sabido, e a operação de Márcio entrou, assim, em velocidade de cruzeiro, etapa determinante para qualquer projecto que se quer rentável, mantendo autenticidade e carácter e, pelo meio, fazendo novos lançamentos que mantêm a chama do consumidor bem acesa. Tudo isto mostrou Márcio Lopes em visita recente à capital, onde deu a conhecer vinhos do segmento premium e ultra-premium das colheitas 2021 e 2022 (e um de 2020), todos de muito curta tiragem e, por isso, bastante exclusivos.
Por mais que muita água (ou deveria escrever vinho) já tenha passado pela ponte da vida de Márcio, algumas coisas praticamente não mudaram: a sua modéstia, o tom sério com que fala e evita descrever os seus vinhos, mas sobretudo a dificuldade em largar o Norte, o seu pedaço do nosso País. Até por isso, estar com ele numa das poucas vezes em que vem a Lisboa é uma oportunidade a não perder! Foi o caso, tanto mais que provámos uma novidade absoluta, na forma de um belíssimo exercício de enologia a partir, ora bem, da casta Alvarinho e da sub-região Monção e Melgaço, de nome Viagem ao Princípio do Mundo.
Quanto aos novos lançamentos de marcas que já conhecemos, provámos os Pequenos Rebentos Vinhas Velhas (que já leva sete edições desde o respectivo surgimento) e o Permitido (que tem um irmão, o Proibido, com várias declinações em diferentes vinhas) e ainda a edição de 2021 do incrível Pequenos Rebentos Selvagem, um 100% Azal que, mais uma vez, resulta de uma vinha em sistema “de enforcado” (em que a vinha cresce pelas árvores e junto a muros, atingindo vários metros em altura), com quase 90 anos em Amarante. Vinhos imperdíveis…

(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2024)