Mirabilis: O tempo de construção de um ícone

Mirabilis

A escolha do “Encanto”, um dos mais recentes espaços de experienciação gustativa de José Avillez, no Chiado, para o lançamento da mais recente colheita do Mirabilis branco não foi casuística. Aqui, onde dominam a sazonalidade dos vegetais, as cores, texturas e emoções, quis criar-se uma ligação entre o vinho e a terra, vivenciando a sua […]

A escolha do “Encanto”, um dos mais recentes espaços de experienciação gustativa de José Avillez, no Chiado, para o lançamento da mais recente colheita do Mirabilis branco não foi casuística. Aqui, onde dominam a sazonalidade dos vegetais, as cores, texturas e emoções, quis criar-se uma ligação entre o vinho e a terra, vivenciando a sua origem num copo que nos transmite as sensações de calcorrear as pequenas parcelas de vinhas durienses, de pisar cada parcela onde a dureza e condições extremas testam as capacidades e a força daqueles que, no dia a dia, as cuidam e acarinham. O carisma Mirabilis branco, nascido há 11 vindimas atrás, é composto de várias premissas, sendo a principal gizada por Luísa Amorim, traduzida na vontade de, numa região sem tradição de brancos, criar um vinho que transcendesse a Quinta Nova e se afirmasse como um símbolo do Douro, região de inúmeras aptidões, entre elas vinhos brancos de eleição.

O caminho, aqui, sempre se fez de procura e estudo. A busca da uva que pudesse dar maior garantia de exclusividade foi, desde início, feita em pequenos lavradores e pequenas parcelas de vinhas velhas. A observação da evolução do clima, na última década, leva-os para outras altitudes, privilegiando as vinhas localizadas entre os 650 e 750 metros do planalto de Alijó. Não há alternativa quando o ano de 2022 foi o mais quente das últimas três décadas. Daí que o recurso a vinhas velhas se revista de uma escolha acertada. Mais resilientes, com maior resistência às elevadas temperaturas, as suas raízes rasgam as profundezas dos solos de transição dos xistos para o granito e encontram a água e os nutrientes necessários para providenciar uma maturação lenta e equilibrada da uva. O papel da viticultura é cada vez mais fundamental para a definição de vinhos que se desejam ser a mais límpida e cristalina expressão do seu ano, das vinhas velhas, algumas centenárias, e, naturalmente da mão que embala o berço e acolhe a sua maturação. E é na decisão do ponto perfeito da sua vindima que se define cada colheita. À enologia cabe, atualmente, um papel interpretativo das virtudes da uva, cabendo-lhe uma função menos interventiva e mais contemplativa, permitindo, ao tempo, esculpir o virtuosismo do néctar, fiel intérprete dos vinhos de montanha, de caráter único e inimitável.

 

O papel da viticultura é cada vez mais fundamental para a definição de vinhos que se desejam ser a mais límpida e cristalina expressão do seu ano.

 

Um vinho irrepetível
Na senda do que são as novas tendências mundiais, a Quinta Nova busca agora a elaboração de vinhos de maior expressividade natural e menor influência de elementos externos, mostrando, já nesta colheita Mirabilis, um pouco do que o futuro reserva. E, a verdade, é que a edição de 2022 pode ser a melhor de sempre, marcando também um fim de um ciclo, uma vez que foi a última vinificação na adega antiga que, este ano, deu lugar a um novo e remodelado espaço interior, onde dominará uma nova filosofia na arte de fazer vinho, em que a madeira se torna, a partir de agora, um elemento menos fundamental no processo de estágio dos vinhos.
“Entrar no mundo Mirabilis é transcender a territorialidade, é criar com energia e convicção um vinho irrepetível, que se perpetua no tempo. Uma promessa de descoberta”, defende Luísa Amorim, ceo da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo. “O tempo de espera em garrafa mostrou-se benfeitor, ao conceder ao vinho uma camada extra de complexidade e elegância, com destaque para a frescura, estrutura e acidez”, salienta.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Abegoaria Wines: O regresso do Terras do Suão

Abegoaria

Fundada em 1952, a Cooperativa da Granja tem mais de 70 anos a produzir azeite e vinhos, numa zona tradicionalmente seca e muito quente do Alentejo, na margem esquerda do Guadiana, agora amenizada pela influência da albufeira da barragem do Alqueva. Hoje faz parte do Grupo Abegoaria, que relançou este ano a sua marca mais […]

Fundada em 1952, a Cooperativa da Granja tem mais de 70 anos a produzir azeite e vinhos, numa zona tradicionalmente seca e muito quente do Alentejo, na margem esquerda do Guadiana, agora amenizada pela influência da albufeira da barragem do Alqueva. Hoje faz parte do Grupo Abegoaria, que relançou este ano a sua marca mais conhecida, Terras do Suão, com duas referências de vinho branco e duas de tinto.
O evento decorreu na Casa do Alentejo, em Lisboa, associação alojada num dos edifícios mais atractivos e distintos da capital. Trata-se de um palácio dos finais do século XVII, cujo interior foi parcialmente remodelado, no princípio do século XX, para a arquitectura que tem hoje, a do primeiro casino da capital, o Magestic Club, e o seu esplendor ainda perdura nos nossos dias.

Um vinho da margem esquerda
Não podia haver local mais apropriado para o relançamento de uma marca de vinho alentejano da Cooperativa da Granja reconhecida no mercado. De tal forma, que, nas últimas décadas do século passado, podia ser encontrada um pouco por todo o lado. “Terras do Suão foi a primeira marca da margem esquerda do Guadiana”, salientou o presidente do Grupo Abegoaria, Manuel Bio, durante a cerimónia de apresentação dos novos vinhos da Cooperativa da Granja. “O seu relançamento tem, como objectivo, que a marca volte a ser uma das referências do Alentejo”, destacou, num evento onde esteve também presente António Saramago, o enólogo mais antigo em actividade em Portugal, que foi o primeiro responsável pela produção destes vinhos. “Na altura em que foram lançados, os Terras do Suão estavam presentes em quase todos os melhores restaurantes de Lisboa”, recordou este último.

Abegoaria

Ex-libris da casa
Os vinhos actuais são feitos sob a responsabilidade do enólogo António Braga, que salientou que as referências tintas apresentadas, incluem as castas tradicionais do Alentejo, em particular a Moreto, um ex-libris da casa que atinge, nesta zona do Alentejo, a sua expressividade máxima. Esta é uma casta de ciclo longo e maturação tardia, ideal para esta sub-região alentejana particularmente cálida no verão, onde as vinhas mais tradicionais se adaptaram. O contributo dos agricultores tem sido, também, essencial para isso, já que as conduzem em formatos mais baixos, que ajudam, as plantas, a resistir melhor a um estio atenuado, hoje, pelo efeito sobre o clima do maior lago artificial da Europa, o Alqueva. Para garantir a frescura e a expressividade aromática dos brancos, as uvas das castas destinadas a produzir o Vento do Suão e o Terras do Suão Reserva a brancos são vindimadas em junho, com o primeiro a passar apenas por inox e o segundo também por madeira.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Duorum: Dos varietais aos vinhos de vinha

Duorum

Passaram décadas de percurso profissional desde 1980, quando João Portugal Ramos iniciou a sua carreira no Alentejo como enólogo, e desde que plantou os primeiros cinco hectares de vinha em Estremoz, em 1995, quando arrancou com o projecto próprio. A expansão para norte começou com a entrada na Quinta da Foz de Arouce, fundada pelo […]

Passaram décadas de percurso profissional desde 1980, quando João Portugal Ramos iniciou a sua carreira no Alentejo como enólogo, e desde que plantou os primeiros cinco hectares de vinha em Estremoz, em 1995, quando arrancou com o projecto próprio. A expansão para norte começou com a entrada na Quinta da Foz de Arouce, fundada pelo seu sogro, na Beira Baixa, em 2005. Em 2007 a dupla João Portugal Ramos e José Maria Soares Franco deu largas à sua ambição de fazer algo marcante no Douro Superior. E assim nasceu o Duorum, “de dois”, em latim. Soares Franco deixou há algum tempo o projecto, mas este continua fiel à sua matriz inicial.

Duorum é um projecto pensado e feito de raíz. Para compor com vinha a quinta de Castelo Melhor, em Foz Côa, foram precisas 92 escrituras. As vinhas estão localizadas no Douro Superior e hoje também no Cima Corgo, em diferentes altitudes, desde a cota do rio com 150 m até 550 m. Incluem 60 ha de vinha própria, mais 50 ha de vinha arrendada e a Duorum ainda compra uva de mais cerca de 10 ha.
“O Douro é uma região muito difícil, com muita concorrência, mas acreditámos no projecto e está para durar” – afirmou João Portugal Ramos no lançamento das últimas novidades.
Em 2012, a Duorum foi a primeira empresa no Douro a aderir à Iniciativa Europeia Business & Biodiversity. O grupo J. Portugal Ramos desenvolveu um modelo de gestão que respeita a biodiversidade, permitindo a preservação e melhoria dos habitats naturais nas suas propriedades e adoptou medidas de desenvolvimento sustentável, incluindo a Produção Integrada e Produção Biológica. Como resultado desta política ambiental, em 2015 a Duorum recebeu o prémio de “Melhor projeto europeu de desenvolvimento rural sustentável, que consegue simultaneamente preservar a paisagem e biodiversidade, promovendo a cultura e economia do espaço rural”. E neste ano de 2024, segundo João Portugal Ramos, as suas propriedades bateram o recorde de novas espécies no local.

Duorum

 

As novidades
No Alentejo, João Portugal Ramos produz, com muito sucesso, vários vinhos de vinha. No Douro este é o primeiro. Trata-se de uma parcela de Arinto e Gouveio, situada a 500 m de altitude, limitada pelos muros antigos de xisto que protegiam a vinha, que foram restaurados. O Arinto é mais incisivo na acidez e o Gouveio, mais aromático, dá-se muito bem naquela zona. Já tentaram fazer este vinho vários anos e só em 2023 “atingiram o perfil pretendido”. Depois de maceração a frio por 12 horas, para extrair a parte aromática, seguiu-se a fermentação em inox. O estágio decorreu parcialmente (25%) em barricas de carvalho francês de 2º e 3º ano para conferir complexidade ao vinho. Dá um enorme prazer de beber já e tem tudo para evoluir com tempo. Foram produzidas 3.300 garrafas.

O primeiro contacto que João Portugal Ramos teve com a Touriga Franca foi por influência de José Maria Soares Franco. É hoje a casta mais plantada na quinta, onde representa 30% do encepamento. Não exibe tantos aromas quanto a Touriga Nacional, mas tem volume e estrutura. Vinificada sempre à parte, desta vez valeu a pena engarrafar a Touriga Franca a solo. As uvas desengaçadas vão para um lagar robotizado, onde passam a maceração pré-fermentativa a frio e, quando começa a fermentação alcoólica, o mosto é transferido para cubas de inox onde acaba a fermentação. Estagia nove meses em barricas de carvalho francês de 2º e 3º ano. Um belo exemplo da casta, que nem sempre tem protagonismo na sua terra de origem, e de que fizeram 6.600 garrafas. No conjunto, dois belos vinhos, um branco e um tinto, que marcam a entrada da Duorum nos varietais e nos “vinhos de vinha”.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Aveleda: O vinho entre jardins

Aveleda

O uso da palavra jardins no título desta peça não é ocasional. O espaço ocupado pela quinta da Aveleda é todo ele um pequeno paraíso: árvores centenárias, vegetação luxuriante, fontes e riachos que nos tranquilizam, pavões a chamar as pavoas e (menos bucólico, digamos…) cães a correr atrás de cabritos para lhes ferrarem os dentes […]

O uso da palavra jardins no título desta peça não é ocasional. O espaço ocupado pela quinta da Aveleda é todo ele um pequeno paraíso: árvores centenárias, vegetação luxuriante, fontes e riachos que nos tranquilizam, pavões a chamar as pavoas e (menos bucólico, digamos…) cães a correr atrás de cabritos para lhes ferrarem os dentes e obrigarem os primos Guedes, na liderança da empresa, a correria desenfreada para salvar o animal! Para tranquilizar o leitor, podemos afirmar que o bicho foi salvo e o cão devidamente admoestado. A jardinagem é aqui levada muito a peito. São cinco os trabalhadores que zelam para que tudo por aqui esteja devidamente cuidado, incluindo as roseiras que, trepando árvores acima, se lembraram de florir a cinco metros de altitude. Esta exuberância vegetativa também já a tínhamos conhecido na casa da família, em Avintes, onde se nota o mesmo cuidado e o mesmo empenho dos seus membros que, como comprovámos, sabem os nomes de todas as plantas e a idade, ainda que aproximada, de todas as árvores. Estamos assim num microcosmos, rodeado de muitas vinhas, quase todas pertencentes à Aveleda.

150 anos de história
A empresa, que completou já 150 anos de história e é responsável pela produção de cerca de 20 milhões de garrafas/ano, não deixou de procurar novos vinhos, novas abordagens das castas de que dispõe, e alargou mesmo a sua zona de interesse e intervenção a outras regiões do país, como a Quinta da Aguieira (Bairrada) em primeiro lugar e, mais tarde, com aquisições no Douro e no Algarve.
Alguns dos ícones da casa mantêm a sua fama e prestígio, como a aguardente Adega Velha, agora em várias versões de diferentes idades, e cujo stock repousa, tranquilamente, em armazém próprio, onde nos contemplam cerca de 300 cascos. Todos os anos se destila e, ainda que o mercado dos destilados não conheça hoje o brilho de outrora, a marca Adega Velha continua a ser uma referência. A marca Casal Garcia, rótulo emblemático dos Vinhos Verdes, ultrapassa os 10 milhões de garrafas/ano e é verdadeiramente o ex-libris da casa. Nascida em 1939 continua a ser um vinho que leva, para fora, o nome do país.
A equipa foi reforçada recentemente com a contratação de Diogo Campilho (ex-quinta da Lagoalva) para a área de enologia, onde colabora com Susete Rodrigues, que já estava na empresa. A ancestral ligação à casta Loureiro, muito forte nesta zona dos Verdes, tem vindo a ser complementada com uma aposta cada vez mais evidente no Alvarinho. Joga-se, aqui, depois um puzzle com várias componentes: como lidar com as castas em terrenos de xisto e de granito? Como combinar, no lote final, as duas variedades para que o resultado expresse o local de onde vieram? E, na adega, como poderá ser possível criar modelos diferentes, jogando, por exemplo, com as borras e respectiva percentagem dentro das cubas? E se quisermos usar barricas para fermentação ou estágio, como poderemos conseguir equilibrar o lote, não prejudicando o perfil próprio de cada casta? Nada disto é fácil, até porque actualmente trabalham com 15 parcelas diferentes de Alvarinho, espalhadas pela região e estaremos muito errados se pensarmos que lá porquanto a região seja a mesma (Vinhos Verdes) e os perfis se assemelham; até a decisão do momento de vindima pode determinar o estilo do vinho que se obtém. Por aqui estão a fazer vindimas nocturnas de algumas castas e a começar em meados de Agosto. Só assim se consegue que o vinho seja mais fiel à casta e ao território.
Seguindo as novas tendências, na Aveleda está-se a trabalhar com menores teores de sulfuroso, o que é facilitado pelo pH mais baixo e acidez mais alta características da região, no caso da vindima ser feita no momento certo. A regra de não haver regra é levada a peito. Por exemplo, há vinhos que apenas estagiam no inox, caso do Aveleda Alvarinho e o Aveleda Loureiro mas já os Solos de Xisto e Solos de Granito fermentam em inox e aí estagiam com as borras por um período mais longo, sem contacto com a madeira. O Parcela do Roseiral, por sua vez, fermenta em inox e cerca de 30% estagia em barrica.

Ventos da moda
Os ventos da moda voltaram a trazer os vinhos brancos para a ribalta e a procura mantém-se intensa, mas hoje os consumidores exigem mais precisão, melhor definição do carácter de cada vinho, mais equilíbrio entre acidez e corpo e mais pureza de fruta. Tudo somado, pode dizer-se que o desafio é enorme, mas poderá ser, cremos, muito compensador para quem tem de tomar decisões. E à refeição pudemos também usufruir de alguns vinhos muito velhos que fomos buscar às caves da casa mas… já se sabe que a célebre frase continua válida: não há bons vinhos velhos, há boas garrafas de vinhos velhos! E assim foi, mas o verdadeiro enófilo não vira a cara a uma garrafa, com ou sem rótulo!
Os anfitriões, Martim e António Guedes, que nos guiaram toda a visita, fizeram questão de apresentar também a segunda edição de um branco-homenagem que funciona como o topo de gama de todo o portefólio dos Vinhos Verdes da casa. Trata-se de um vinho que resulta de um lote entre Alvarinho e Loureiro, que combina bem a fermentação em inox com a barrica. É um branco luxuoso, a um preço que está muito longe de ser de ourivesaria. Justa homenagem a Manoel Pedro Guedes, antepassado e que herdou, em 1870, a quinta da Aveleda. Foi aí que tudo começou.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Baga Friends: Amigos da baga trazem boas novas

baga friends

Reunir para agitar as águas, criar o movimento para reabilitar a Baga entre os viticultores e consumidores em Portugal e projectar a nossa casta autóctone lá fora é o objectivo dos Baga Friends, grupo de produtores que se uniram à volta desta variedade. A associação formou-se em 2012 e faz-se notar o renascimento contínuo da […]

Reunir para agitar as águas, criar o movimento para reabilitar a Baga entre os viticultores e consumidores em Portugal e projectar a nossa casta autóctone lá fora é o objectivo dos Baga Friends, grupo de produtores que se uniram à volta desta variedade. A associação formou-se em 2012 e faz-se notar o renascimento contínuo da Baga desde então.
“Quando comecei o projecto em 2001, não havia produtores novos a trabalhar com Baga. Merlot e a Cabernet Sauvignon tinham mais popularidade”, conta a produtora Filipa Pato. Os amigos da Baga são muito diferentes na sua visão. Trabalham cada um à sua maneira, mas todos adoram a Baga e a Bairrada. São um núcleo duro, e mesmo não fazendo muitos eventos, conseguiram fazer uma “pequena revolução” na região. “De norte (Fogueira) até ao sul (Souselas) voltou-se a aderir à Baga. Quem já a tinha retirado dos rótulos, voltou a colocá-la em letra grossa”, repara Mário Sérgio Nuno, da Quinta das Bágeiras, que, juntamente com Filipa Pato, foi impulsionador deste movimento.

Bairradino de gema
E quem são os Baga Friends? Desde logo, o bairradino de gema, Luís Pato, sempre foi o grande defensor e promotor da Baga, mesmo quando a maioria dos produtores dava preferências às castas estrangeiras. À Baga dedicou mais de 40 anos da sua carreira e o melhor argumento a favor da casta eram os seus vinhos que mostraram elegância e longevidade da casta, quando trabalhada com sabedoria. “Baga dura 25 anos certamente, 30 talvez, 40 – quem cá estiver que veja!” –, desafia o Senhor Baga. Mário Sérgio, um bairradino incontornável com ligação à viticultura de forma geracional, respira Baga desde 1989, quando começou o seu projecto familiar da Quinta das Bágeiras, produzindo vinhos de identidade inconfundível. Paulo Sousa, o engenheiro químico com 20 anos de experiência no departamento de qualidade de uma empresa produtora de vinhos na região, dedicou-se ao projecto familiar, iniciado pelo seu pai, Sidónio de Sousa, em 1990.
Uma história de pura paixão pela Baga e Bairrada começou quando o sommelier francês e proprietário de uma garrafeira em Paris, François Chasans, provou um vinho da Bairrada pela primeira vez. Instalou-se em terras bairradinas e na sua Quinta da Vacariça produz vinhos densos e longevos, cheios de carácter. Pratica uma viticultura biodinâmica, “não como argumento de marketing, mas para obter a precisão no resultado final”, diz. Filipa Pato é tão dedicada à Baga como o seu pai, Luís Pato, mas num projecto próprio juntamente com o seu marido, o conhecido sommelier belga William Wouters. Os seus Baga, puros e autênticos, nunca passam despercebidos e mostram o lado mais feminino e delicado da casta. O irreverente e carismático Dirk Niepoort, grande produtor de vinhos do Douro e do Porto, confessa que adora a Baga e a Bairrada. Seguindo esta paixão, há mais de uma década, adquiriu a Quinta de Baixo, com 25 ha de vinha, onde tem parcelas centenárias e de onde vem o Poeirinho, num estilo bem diferente do praticado antes – mais leve, com teor de álcool baixo e acidez vincada. Agora o seu filho Daniel continua a trabalhar com a mesma filosofia. O mais recente membro do grupo é o enólogo Luís Patrão, com o seu projecto Vadio, que teve o início em 2005 com 0,5 ha de vinha da família e cresceu até ao 10 ha actuais.

baga friends

Os sete ilustres amigos da Baga juntaram-se para apresentar a segunda edição do vinho feito em conjunto

Tinto para já, espumante para mais tarde
No final de abril, em antecipação ao Dia Internacional da Baga, celebrado a 4 de maio (graças ao esforço dos Baga Friends, que abrem sempre as suas adegas ao público com festa rija e eventos especiais), os sete ilustres amigos da Baga juntaram-se para apresentar a segunda edição do vinho feito em conjunto – Baga Friends 2015, de que se encheram 1135 garrafas. É um blend comunitário, que expressa o carácter de cada produtor, de cada propriedade, através de um bouquet de filosofias distintas com o denominador comum – a Baga. O carácter e a voz de cada vinho são bem fortes e ainda se sentem. Talvez seja preciso mais algum tempo para estas vozes se tornarem um coro, e para os feitios de cada vinho atingirem a integridade plena. Este pormenor também traz uma complexidade adicional. No nariz dominam os Baga mais aromáticos, enquanto na boca fica bem presente a estrutura dos contributos mais tânicos e texturados. A primeira edição do vinho Baga Friends foi da colheita de 2011, já que não têm a intenção de o fazer todos os anos, só nos de excelência. E, já agora, fica o teaser: a próxima edição dos Baga Friends será um espumante de 2023, que já está em estágio e será lançado em 2029 para brindarmos à Baga e à Bairrada. Afinal, somos todos amigos da Baga no sentido mais lato.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Vieira de Sousa: Dois “novos” Portos Colheita com 20 e 30 anos

Vieira de Sousa

O evento decorreu na OCCA – Oficina do Olival Contemporary Arts, em Lisboa, o local escolhido por Luísa e Maria Vieira de Sousa, co-proprietárias e rostos do projeto Vieira de Sousa, para o lançamento de duas novas referências no mercado de vinho do Porto Colheita, o Vieira de Sousa Porto Colheita 1994 e o Vieira […]

O evento decorreu na OCCA – Oficina do Olival Contemporary Arts, em Lisboa, o local escolhido por Luísa e Maria Vieira de Sousa, co-proprietárias e rostos do projeto Vieira de Sousa, para o lançamento de duas novas referências no mercado de vinho do Porto Colheita, o Vieira de Sousa Porto Colheita 1994 e o Vieira de Sousa Porto Colheita 2004.
A Vieira de Sousa é uma empresa produtora de vinhos do Douro e do Porto, proprietária de cerca de 70 hectares de vinhas espalhadas por quatro quintas, localizadas na sub-região do Cima Corgo. A Quinta da Água Alta, que reúne as quintas do Bom Dia e do Espinhal fica no Ferrão, em Gouvinhas. A Quinta da Fonte, em Celeirós do Douro. A Quinta do Fojo Velho, em Vale de Mendiz e a Quinta do Roncão Pequeno, em Vilarinho de Cotas.
As uvas usadas para a produção dos vinhos do Porto Colheita agora lançados têm origem em dois terroirs distintos, que se complementam entre si. O primeiro, o da Quinta da Água Alta, tem sobretudo exposição a sul, e vinhas com altitudes que vão dos 120 aos 412 metros de altitude. O segundo fica na Quinta do Fojo Velho, e está encaixado no vale do rio Pinhão. Tem exposição a poente, numa zona protegida do calor escaldante tradicional da região duriense durante o verão.
O encepamento é semelhante nas duas propriedades e é dominado casta Tinta Roriz, “que é determinante no envelhecimento fresco dos nossos tawnies”, contou Luisa Vieira de Sousa durante a apresentação dos Portos. A ela juntam-se, entre outras, a Touriga Francesa e a Tinta Amarela. Após a vindima, as uvas são pisadas pé e fermentam em lagares antigos de granito, nas adegas de cada uma das duas quintas até à paragem da fermentação, o que aconteceu para os dois vinhos lançados.

As uvas usadas para a produção dos vinhos do Porto Colheita agora lançados têm origem em dois terroirs distintos

Condições ideais
O da colheita de 1994 teve origem num ano que foi declarado para vintage clássico. O ciclo no campo iniciou-se com muita chuva e humidade, que originou rendimentos baixos na vinha. Mas, no período restante, as temperaturas nunca excederam os 38ºC e o clima manteve-se predominantemente seco, apenas entremeado com algumas chuvas oportunas. As vindimas decorreram em condições ideais, com as uvas no melhor estado sanitário e de maturação possível. Após a vinificação, foram escolhidos os lotes para o engarrafamento de Porto Vintage e, além destes, António Vieira de Sousa Borges, pai de Luísa e Maria, fez um outro que destinou para o envelhecimento a longo prazo em pipas, que foram sempre atestadas com vinhos de 1994. O lote do Porto Colheita deste ano teve origem nelas.
As uvas que originaram o Porto Colheita de 2004 também foram produzidas num ano particularmente favorável. No verão, as vinhas estavam em boas condições, mas já perto do stress hídrico. Mas decorreu alguma precipitação, num período de temperaturas relativamente baixas que originou uma maturação lenta. A vindima foi realizada sem chuva, nas melhores condições possíveis para o final do ciclo e do ano de trabalho na vinha. Após um inverno de estabilização e afinamento, António Vieira de Sousa Borges seleccionou também um lote para ser envelhecido em tonel, para guarda de longo prazo, que deu origem ao Porto Colheita 2004 agora lançado.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2024)

Lagoalva de cima: Um ícone do Tejo

Lagoalva

A Quinta da Lagoalva de Cima tem 660 hectares e fica muito próxima de Alpiarça, na margem Sul do Tejo, a Nordeste de Santarém. A quinta é muito antiga. Há referências datadas de 1193. É há muitos anos propriedade da família Louçã Campilho, hoje seis irmãos, filhos da recentemente falecida Dona Isabel Juliana, aliás devidamente […]

A Quinta da Lagoalva de Cima tem 660 hectares e fica muito próxima de Alpiarça, na margem Sul do Tejo, a Nordeste de Santarém. A quinta é muito antiga. Há referências datadas de 1193. É há muitos anos propriedade da família Louçã Campilho, hoje seis irmãos, filhos da recentemente falecida Dona Isabel Juliana, aliás devidamente homenageada ainda em vida com um vinho topo de gama com o seu nome. A família explora um total de 5500 hectares, com muita floresta de sobreiros, eucaliptos e pinheiros, produção animal, incluindo gado e coudelaria, e ainda milho, batata, couves, e muitas outras diferentes culturas. De vinha são 45ha, todos em Alpiarça. Com o nome da quinta, apenas chegam ao consumidor o vinho e o azeite.

Dias quentes e noites frias
A vinha fica muito próximo do rio Tejo e o clima dá dias muito quentes e noites frias. As castas foram plantadas em diversas parcelas, e ao longo dos anos têm sido feitas alterações para optimizar o seu desempenho. Muitas vinhas estão em solos de aluvião, e já aconteceu ficarem inundadas, apesar de hoje as cheias serem pouco frequentes. Com as vinhas em dormência, quando as águas baixavam voltavam a rebentar sem problemas. Outras culturas nestes solos estariam perdidas. Segundo Pedro Pinhão, há 20 anos enólogo na propriedade e hoje com a responsabilidade desta área, em 1979 a casa da quinta chegou a estar toda alagada. No início dos anos 1990 desenvolveu-se muito o regadio, para melhor controlar os ciclos vegetativos das várias castas. O Arinto é complicado na vinha, tem cacho grande mas pouca produção, precisa de muito trabalho. O Alfrocheiro vem de uma vinha velha, oriundo dos primos Soares Franco, da José Maria da Fonseca.
A Lagoalva chegou a ter 200 ha de vinhas, mas o enfoque era na quantidade, não na qualidade. Era o tempo do granel. Essas terras passaram a produzir culturas de Primavera e Verão. O primeiro rótulo da Quinta da Lagoalva é de 1989, quando começou a conversão da quantidade para a qualidade. Aliás, este é um ano inicial para muitos outros produtores ao longo de todo o país.
A Lagoalva foi pioneira no plantio da Syrah, com uma vinha de 1984. Na altura tinham parcelas de Tinta Carvalha, a produzir 40ton/ha, para granel. A casa apostou muito na exportação, e teve algumas combinações de sucesso entre castas portuguesas e internacionais, para atrair o olhar dos consumidores. Exemplos que se tornaram clássicos são o Arinto/Chardonnay e a Syrah/Touriga Nacional.
Recentemente, a restruturação das vinhas levou à plantação de castas brancas nos solos mais profundos. Um exemplo é o Sauvignon Blanc, que é podado à máquina, primeiro pré-poda e depois poda de precisão. É mais rápida do que a poda à mão e mais eficiente do ponto de vista de mão de obra. Os tintos estão plantados em solos mais pobres, arenosos. 95% da vindima é feita à máquina, sempre à noite, entre as 2h e as 8h da manhã, já que Outubro é muito quente. Apenas os topos de gama são feitos à mão, por uma equipa de 10 a 12 pessoas. A quinta tem muitas castas exóticas, por razões históricas. Por exemplo, tem Tannat em solos de aluvião, mas esta casta precisa de solos de areia, mais pobres. Do ponto de vista agrícola, é mantido um enrelvamento natural entre as linhas de videiras. Pode inclusive ser de sementeira, para ser mais vigoroso e consumir mais água. Faz-se uma agricultura de conservação, não lavram nem mobilizam muito o solo para controlar infestantes. Esta prática começou há 30 anos na cultura do milho. Todas as vinhas estão em produção integrada e o olival também.

Lagoalva
A equipa da Lagoalva é liderada há dois anos por Pedro Pinhão, e conta ainda com Luís Paulino na enologia e Cristina Barreira no controle de qualidade.

Mais brancos que tintos
A quinta tem um talhão de 2,5ha com Alfrocheiro em agricultura biológica (“há muita pressão comercial para ter biológico”, dizem-nos), parcela isolada das outras numa zona franca de transição entre campo e areia, com pouco vigor e sem muitos problemas para controlar o míldio, que é a principal doença vitícola na região. Esta vinha foi plantada em 1974 e origina o Grande Reserva Alfrocheiro. Com muita precipitação e muito vigor, não seria competitivo produzir biológico em todos os 45ha de vinha. A vinha do Alfrocheiro fazia monda de cachos para reduzir a produção. O míldio faz uma monda natural, a vinha passa a 3ton/ha. E assim mantém a qualidade desejada.
Com solos férteis, é preciso reduzir a produção. As novas vinhas têm cepas espaçadas a 2,3m por 1m. Em 2010 ainda plantavam a 3m para os tratores passarem. Não se compravam tratores próprios para a vinha. Assim, as produções são de 15 a 16ton/ha no Chardonnay e 28 a 30 ton/ha no Fernão Pires. O Sauvignon Blanc, que é casta de cacho pequeno, aguenta 20 a 25 ton/ha e mantém a qualidade. O Arinto chega a ter cachos de 1kg e dá produção a mais, cerca de 28 a 30/ton/ha. Mas na vinha velha a produção é de 7 a 8ton/ha e tem grande qualidade.
A poda mecânica de precisão é uma ferramenta útil, em particular pela falta de mão de obra e pelas alterações climáticas que exigem acção rápida: “não podemos vacilar”, diz Pedro Pinhão, e acrescenta: “Não consigo produzir grandes tintos com grandes produções, mas os brancos sim. Com qualidade que se reflecte no bolso do consumidor.” Claro que para o Grande Reserva branco, fermentado em barrica, recorre-se à vinha velha de Fernão Pires, com menos de 2ha, podada e vindimada manualmente.
A rega nas novas plantações é também uma ferramenta para controlar os fenómenos climáticos. Sustentabilidade sim, mas com sustentabilidade económica também. Em termos de distribuição de castas, a área é metade de tintas e metade de brancas, mas a produção de brancos é 70% do total. 70/30 também é a distribuição entre mercado nacional e exportação.
A equipa é liderada há dois anos por Pedro Pinhão, e conta ainda com Luís Paulino na enologia e Cristina Barreira no controle de qualidade. Com Rita Barosa como CEO da quinta, os desafios do crescimento têm sido encarados com coragem. De 650 mil garrafas em 2022, passaram para 1,4 milhões em 2023, muito graças a um vinho colocado no cabaz do Pinto Doce. Em 2024 o orçamento prevê 1,1 milhões de garrafas. O vinho na Lagoalva passa por dores de crescimento, com o rebranding de todos os produtos, novas propostas para o mercado e grandes projectos programados para o próximo biénio, incluindo grandes obras na adega. Os depósitos de cimento de 25 mil litros são muito estáveis em termos térmicos, e permitem encarar aumentos na produção. 2023 foi já o melhor ano de sempre, com mais de 3M€ de facturação. Ao mesmo tempo, os vinhos estão melhores que nunca. O portefólio tem 14 vinhos, incluindo Lagoalva e Quinta da Lagoalva. A Syrah e o Alfrocheiro plantados em 1984 e 1974 continuam a ser bandeiras da casa. O topo de gama Dona Isabel Juliana nasceu com o tinto em 2009 e o branco em 2018. Em verdade vos digo: são grandes vinhos que vale a pena provar. Regressa um dos grandes ícones da região Tejo, que tanto deles precisa.

(Artigo publicado na edição de Maio de 2024)

Casa Relvas: Um Pom Pom rosé e outras novidades

Casa Relvas

Já relatámos, noutros textos, que o percurso da Casa Relvas pode ser descrito como uma história de família. A anteriormente conhecida por Casa Agrícola Alexandre Relvas, nome que realçava a ligação ao empresário que a fundou em 1997, conta hoje com o papel essencial de ambos os filhos. De tal modo que Alexandre Relvas, o […]

Já relatámos, noutros textos, que o percurso da Casa Relvas pode ser descrito como uma história de família. A anteriormente conhecida por Casa Agrícola Alexandre Relvas, nome que realçava a ligação ao empresário que a fundou em 1997, conta hoje com o papel essencial de ambos os filhos. De tal modo que Alexandre Relvas, o fundador (um dos filhos tem o mesmo nome, lá iremos), diz que já não acompanha tudo o que se passa neste negócio agrícola. Mas não acreditamos… Até porque o sucesso raramente vem do acaso e o êxito da Casa Relvas é inegável. Os números comprovam. Pouco mais de 20 anos depois, a produção total é hoje de oito milhões de garrafas por ano.
A gama é extensa, bem pensada, com muitas referências a serem dedicadas ao mercado externo, sendo que a exportação para mais de 30 países representa cerca de 70% das vendas globais, com mais de 15 mil pontos de venda pelo mundo. Para tal, a empresa detém e controla hoje algumas centenas de hectares de vinha no Alentejo em várias localizações, mas como sempre sucede com os projectos sólidos, o começo foi mais cauteloso. Assim, o primeiro passo foi a aquisição da Herdade de São Miguel no Redondo, em 1995, que conta hoje com 35 hectares em produção, tendo a primeira plantação ocorrido só em 2001. Situada em São Miguel de Machede, é nesta propriedade que se mantém a adega fundadora, construída em 2023, aquela que mais recebe eventos de enoturismo. Esta é uma aposta do produtor, com oferta de programas sazonais e eventos personalizados, para além do evento anual “Um dia em São Miguel”, que ocorre na Primavera.

A exportação para mais de 30 países representa cerca de 70% das vendas globais da empresa

Projecto ambicioso

Mais tarde, o investimento passou pela aquisição da Herdade da Pimenta em Évora (geograficamente a meio caminho do Redondo a Évora), que conta com quase 70 hectares, parte em modo de produção biológico. É aqui onde fica a atual morada da empresa. Mais recente foi a aquisição da Herdade dos Pisões, sita na Vidigueira, ainda com maior dimensão do que as anteriores. Esta aquisição foi a que mais contribuiu para que a Casa Relvas seja, sem dúvida, um dos players alentejanos em destaque no que a vinhos diz respeito.
Alexandre Relvas Jr., filho do empresário, que estudou enologia e viticultura em Bordéus, conta-nos que se juntou ao projeto em 2006, ou seja, cinco anos depois da plantação das primeiras vinhas e da contratação do enólogo Nuno Franco, se mantém na empresa. Nuno, que antes da Casa Relvas teve passagens por outros produtores, com destaque para o também alentejano Monte da Penha (F. Fino), é atualmente o diretor de enologia e viticultura e parte de uma equipa com mais de 70 pessoas. Tendo em consideração a dimensão da operação actual, e a necessidade de criar valor em todas as gamas, Nuno Franco conta agora com a companhia do conceituado enólogo António Braga, consultadoria que espelha bem a ambição do projecto. Com efeito, com um passado longo na Sogrape – universo com a dimensão conhecida e vários vinhos topos de gama afamados – António Braga é um trunfo para qualquer produtor que quer ver analisados todos os seus processos, no sentido de crescer em qualidade e posicionamento, sobretudo nas gamas premium e ultra-premium.
A primeira colheita no mercado foi em 2004, a original do Herdade de São Miguel Colheita Selecionada Tinto, então com apenas 26 mil garrafas. A consistência e inegável relação qualidade/preço dos vinhos fez com que esse número se multiplicasse nos anos seguintes. Em 2008, o número de garrafas comercializadas chega já ao meio milhão e, dois anos depois, atinge mesmo um milhão de vendas. Não espanta que, em 2011, tinha sido necessário construir uma nova adega, agora na Herdade da Pimenta. Em 2016, foi a vez do filho António Relvas se juntar à equipa, para desenvolver um projeto de olival, que se concretizou no ano seguinte com a plantação das primeiras plantas na Herdade dos Pisões, na Vidigueira. Atualmente, os azeites são uma aposta evidente.

Paixão pelo Alentejo

Com paixão pelo Alentejo, a Casa Relvas tem desempenhado um papel importante quer na seleção de castas de origem portuguesa e no desenvolvimento tecnológico (trabalhando em conjunto com o Instituto Superior de Agronomia e a Universidade de Évora com o intuito de conhecer e compreender a complexa vida da videira), quer quanto à sustentabilidade dos vinhos, tendo sido o primeiro produtor a receber a certificação do Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA). A verdade é que a empresa tem um pouco de tudo, de castas aos tipos de vinificação. Mas em momento algum quis ficar de fora da tradição, tendo sido dos primeiros produtores de grande dimensão a recuperar a técnica de produção de vinho de talha com mínima intervenção humana.
Já atrás dissemos que a gama é alargada, com marcas que identificam o lugar onde são criadas (caso dos vinhos Herdade de São Miguel e Herdade da Pimenta), se referem a sub-regiões (caso dos lotes Redondo e Vidigueira) e privilegiam a variedade, caso dos vários monocastas disponíveis (do Tinta Miúda ao Syrah, passando pelo Rabo de Ovelha e Sauvignon Blanc). Uma novidade saborosa é o sofisticado Pom Pom, o topo de gama rosé do produtor. O sucesso com o rosé Herdade de São Miguel Colheita Seleccionada, que atualmente vende várias dezenas de milhares de garrafas, implicou, há muito, que parte de uma vinha só fosse dedicada a rosés. Ora da seleção de uma parte dessa vinha, e de uma vinificação ainda mais cuidada, surge agora um novo vinho, mais exclusivo e mais gastronómico, tudo numa bonita garrafa. É caso para dizer que a Casa Relvas só tem razão para festejar!

(Artigo publicado na edição de Maio de 2024)