Quinta da Lapa: Estórias de um lugar no Tejo

Quinta da Lapa

Não basta produzir vinhos de qualidade. Também é necessário construir boas estórias para os ajudar a vender. Esta é a parte que Silvia Canas Costa, a responsável pela área comercial e de comunicação e marketing da Quinta da Lapa gosta mais: “a procura de vinhos que contem estórias”. Foi por isso que se envolveu, pessoalmente, […]

Não basta produzir vinhos de qualidade. Também é necessário construir boas estórias para os ajudar a vender. Esta é a parte que Silvia Canas Costa, a responsável pela área comercial e de comunicação e marketing da Quinta da Lapa gosta mais: “a procura de vinhos que contem estórias”. Foi por isso que se envolveu, pessoalmente, na criação dos rótulos das novas referências Fernão Pirão, Clarete e Castelão Clássico da casa, “três vinhos que reflectem o revisitar das tradições do Tejo, uma região difícil de comercializar, que foi um pouco abandonada durante algum tempo devido a muitos disparates que foram sendo feitos”, diz a responsável, que pertence à família proprietária, defendendo, no entanto, que hoje “está a melhorar muito”. Não só pelo trabalho feito pela Quinta da Lapa, mas também pelos outros produtores e pelos novos projectos que estão a nascer. “É importante estarmos todos a puxar pela região”, defende.
A ideia de lançar um clarete, a primeira inovação que surgiu, resultou de um convite do Professor Virgílio Loureiro, do Instituto Superior de Agronomia, para participar numa prova deste tipo de vinhos. “Depois de o fazer, achei que era bom enveredar também por este caminho”, conta, acrescentando que ela e a sua equipa optaram por o fazer através da co-fermentação de uvas de Castelão com Fernão Pires, 50% de cada. A ideia de produzir um Fernão Pirão veio na sequência do lançamento do clarete, que correu bem, e de conversas com André Magalhães, companheiro de vida de Sílvia, que é chef e proprietário de dois restaurantes em Lisboa, e Jaime Quendera, o enólogo consultor da Quinta da Lapa, “que têm originado novas ideias para a criação de produtos”.
Os rótulos foram construídos para revisitar as tradições, voltar um pouco atrás no tempo. Para os criar, Sílvia Canas Costas inspirou-se num muito antigo, que encontrou após algum trabalho de investigação, para desenhar os desta gama de vinhos.

A arquitecta que gosta de vinho
Sílvia sempre gostou de arte. Como queria ser arquitecta, começou por estudar na Cooperativa Árvore, do Porto, onde esteve durante quatro anos antes de se mudar para a Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa.
Terminou o curso em 1990. Entretanto já tinha começado a trabalhar no atelier do tio, João Fernando Canas, que se dedicava sobretudo à remodelação de casas. Mais tarde montou o seu, com um colega de curso, onde trabalhou durante mais de 15 anos. “Foi lá que criei o projecto de recuperação e remodelação da Quinta da Lapa, que foi sendo feito ao longo dos anos, desde que comprámos a propriedade em 1990, porque envolveu algum investimento que tinha de ser feito de forma sustentada”, conta. Quando a quinta foi adquirida já existia a casa, com o pátio e praticamente todos os edifícios, com excepção da adega. Desde essa altura, até hoje, foi tudo remodelado, numa obra que começou, como não podia deixar de ser, pelos armazéns do vinho.
Uma das primeira coisas que o pai, José Guilherme da Costa, fez quando adquiriu a propriedade, foi a substituição da vinha velha, por ter sido aconselhado a isso. Silvia Canas Costa não sabe qual era a área na altura, mas conta que tinha 32 hectares quando entrou na casa, há 14 anos. “Eram mais castas tintas do que brancas, que eram apenas de Arinto e Trincadeira das Pratas”, conta, acrescentando que não gostava nada do vinho a que esta dava origem e acabou “por substituir estas cepas”.
A casa foi terminada em 2011, quando o pai convidou Sílvia para trabalhar na Quinta. Acedeu com entusiasmo, sobretudo porque sempre gostara, e gosta, de vinho, mas também porque, na altura, já estava “um pouco farta” da actividade de arquitectura, sobretudo pelos processos burocráticos de que depende nas câmaras, para a concessão de licenciamentos. “Foi por tudo isso que decidi iniciar nesta nova vida, que tem sido uma verdadeira aventura até aqui”, explica.
Hoje Sílvia Canas Costa está mais ligada à área comercial da sua empresa. Para poder desempenhar o melhor possível o seu papel, prova muito e procura escutar de forma atenta o que os outros lhe comunicam, para continuar a aprender e perceber melhor o que tem, e como fazer. Mas diz que ainda está longe de saber tudo.
Como continua a precisar de ajuda para fazer bem as coisas, salienta que teve a sorte de encontrar as pessoas certas para isso, como Jaime Quendera, o consultor de enologia da casa desde 2008, e Jorge Ventura, que entrou ao mesmo tempo que ela na Quinta da Lapa para trabalhar na vinha, “e hoje faz um pouco de tudo, incluindo a também a produção de vinhos, a parte comercial e a gestão do pessoal”.
Sílvia Canas Costa diz que as coisas na sua empresa foram melhorando com o tempo. “A vinha está melhor, mais bem cuidada, parte foi reconvertida para castas que escolhemos com mais critério e fizemos alguma reconversão daquela que não estava bem plantada”, explica. Mas defende que ainda vai ser necessário percorrer mais caminho para chegar ao que quer em termos de qualidade.

Dias quentes, noites frias
A Quinta da Lapa tem um terroir único, de solos argilo-calcários e microclima com grandes amplitudes térmicas, onde os dias são quentes e as noites frias. “São condições que contribuem para originar vinhos com grande perfil evolutivo”, diz Jaime Quendera, o enólogo consultor da empresa, salientando que “são frescos, com base na sua acidez natural, têm muita concentração fenólica, boa fruta e uma grande capacidade de evolução com o tempo”.
Todo o trabalho, do campo à adega, é controlado pelos profissionais da empresa, em função de cada casta e talhão de vinha, para que cada vinho produzido tenha um perfil distinto, conforme a casta que lhe deu origem. Ou seja, “a poda, as adubações e todos os trabalhos próprios do maneio das vinhas, tal como a vindima, a fermentação e o estágio, são todos controlados por nós, o que permite que os lotes sejam feitos com o perfil que pretendemos, para produzirmos vinhos gastronómicos, elegantes, com estrutura, boa acidez e longevidade”. O “Cabernet Sauvignon tem um perfil, o Syrah outro e por aí adiante”, conta o enólogo
Nesta casa, os tintos têm de ter pelo menos um ano de estágio em garrafa antes de irem para o mercado, “porque inicialmente são pujantes e intensos, brutos e musculados, com muito tanino e precisam de tempo para ficarem mais elegantes”, explica Jaime Quendera.

quinta da lapa
Nesta casa, os tintos têm de ter pelo menos um ano de estágio em garrafa antes de irem para o mercado.

Enoturismo é aposta
A Quinta da Lapa tem 100 hectares, dos quais 72 hectares de vinha plantada em parcelas com as castas separadas, que são mais de 20. “Temos, também, mais de 20 referências, pois vendemos um bocadinho de tudo”, revela a produtora da Quinta da Lapa, acrescentando que isso tem a ver com a estratégia comercial da empresa, mas também porque gosta de fazer coisas novas, aumentando e diversificando a oferta da casa.
No mercado nacional, onde a empresa vende 70 a 80% dos seus vinhos, para além dos bases de gama, as referências mais vendidas são as das castas estrangeiras, sobretudo para o canal Horeca (Hotéis, restaurantes, cafés e similares).
Lá fora, os principais mercados são os da Europa, como Bélgica, Alemanha e República Checa. “Mas vendemos para muitos outros sítios, não muito para cada país”, diz Sílvia Canas Costa, acrescentando que, no extremo oriente, comercializam vinhos para Japão, Taiwan, Singapura e China, mercado que decresceu muito após a pandemia de Covid-19.
O enoturismo foi um projecto destinado a ser desde que a Quinta da Lapa foi adquirida. “Tínhamos uma casa fantástica e sempre quisemos fazer isso, como forma de recuperar o património e promover o vinho e a região”, conta Sílvia Canas Costa. “Mas foi uma área um pouco difícil de desenvolver, sobretudo por falta de pessoal para isso e porque estive, até há pouco, mais dedicada ao negócio do vinho”, acrescenta, referindo que, agora, está a apostar um pouco mais na promoção do enoturismo da Quinta da Lapa. Para além dos 11 quartos sóbrios e espaçosos com vista para a propriedade, situados num edifício do século XVII, oferece refeições, provas de vinho e visitas à adega. Os turistas procuram-no para passar o fim de semana, com jantar e prova de vinhos. “A não ser no verão, quando prolongam a estadia um pouco mais”.
A falta de oferta próxima de restaurantes e outras atrações têm sido condicionantes ao crescimento da frequência do espaço. “Estamos a meia hora das cidades e vilas mais próximas e a 40 minutos do mar”, explica a produtora, referindo que, por enquanto, ainda há poucos restaurantes à volta, como a Tasquinha do Lagar, na Marmeleira, “que é sedutor e tem bom ambiente e, por isso, recomendamos às pessoas que nos visitam para lá irem”.
É coisa que eu também faço, sempre que vou de fim se semana à minha terra de adoção, a vizinha Assentiz. Há mais coisas na ementa, mas as ostras abertas ao natural e os mexilhões à belga são a minha perdição e aquilo que me faz voltar sempre para além de, é claro, a simpatia do proprietário e as suas boas estórias.

(Artigo publicado na edição de Abril de 2024)

Os frescos vinhos da Quinta da Lapa

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TEXTO António Falcão
FOTOS Ricardo Gomez

Manique do Intendente é uma povoação que tem de ser visitada pelo menos uma vez na vida. O seu ex-libris é a sumptuosa frontaria do palácio inacabado de Pina Manique, Intendente Geral da Polícia durante o reinado de D. Maria I e durante a vigência do Marquês de Pombal. Homem de confiança da realeza, Pina Manique acumulou cargos, terras e riquezas, mas, aparentemente, não o suficiente para terminar o seu palácio, em terras doadas por D. Maria I. Será que os fundos de que dispôs foram, entretanto, para a fundação da Casa Pia? Não o sabemos. Sabemos, isso sim, que esta zona produz vinhos brancos e tintos desde, pelo menos, 1744, certamente para abastecer algum mercado local e a cidade de Lisboa, com vinhos a granel enviados de carroça para a capital. Provavelmente por isso, Manique nunca foi muito conhecida pelo seu vinho. Isto, claro, até à entrada na região de um dos protagonistas da nossa história, José Guilherme da Costa, que adquire em 1989, a Quinta de Nossa Senhora da Conceição da Lapa, mais conhecida como Quinta da Lapa. Na altura tinha cerca de 90 hectares, mas reza a história que já tinha sido bem maior, quando estava nas mãos de uma cooperativa. Esta entrou em dificuldades e acabou por dividir o acervo em quatro, para venda. A parte da Quinta da Lapa, onde estavam as edificações, foi a última a ser vendida.

José Guilherme põe imediatamente mãos à obra. O homem forte da Tecnovia, uma grande empresa nacional do ramo da construção civil e obras públicas, cedo apontou a quinta para a agricultura, uma área de negócio que a sua família conhecia bem, desde há gerações.

A propriedade já tinha videiras, mas, verdade seja dita, foram todas arrancadas, dando lugar a novas castas, mais apropriadas para fazer vinhos ao gosto do consumidor moderno. A adega foi preparada a seguir e os vinhos foram aparecendo, mais para consumo e distribuição local que para o mercado global. No entanto, a qualidade ia criando consumidores fiéis e suscitando bastantes elogios. De tal maneira que o empresário começou a cismar em levantar a fasquia do investimento para uma ainda maior qualidade. Em 2007 entra assim Jaime Quendera para a enologia da casa, como enólogo consultor. Coincidência ou não, José Guilherme decide enviar vinhos para o Concurso Nacional de Vinhos Engarrafados. Entre as medalhas conseguidas, o Quinta da Lapa Reserva tinto 2008 obteve o prémio “Melhor Vinho” e medalha “Prestígio”. Este terá sido o factor decisivo que levou José Guilherme a investir mais tempo e dinheiro no vinho e numa gestão mais profissional na Quinta da Lapa.

Vem aí ajuda

O outro grande protagonista da história é Sílvia Canas da Costa, filha de José Guilherme, que entra em 2011 para a Quinta da Lapa, mas para supervisionar a reconversão dos edifícios rústicos. Arquitecta de profissão, Sílvia não teve aqui falta de trabalho: havia muita coisa para recuperar e diversos edifícios para reconstruir e/ou criar de raiz. Descobriram-se coisas curiosos, como as pinturas de dois altares, escondidas por tinta castanha. A figura de Santa Teresa d’Ávila emergiu como porta-estandarte da casa, por causa do seu poema de fé, inscrito em pedra sobre a porta de entrada. Santa Teresa acabou por dar lugar a vinhos especiais em sua homenagem, na altura dos 500 anos do seu nascimento.
O resultado de tantas modificações foi magnífico e no meio surgiu, para além dos imóveis agrícolas e adega, um espectacular enoturismo com onze quartos. No geral, o acervo imobiliário da quinta é substancial, muito maior do que uma quinta com 100 hectares poderia fazer prever. Este ano, a implantação arquitectónica do conjunto cresceu ainda mais com a construção da nova adega, imprescindível pelo aumento que foi acontecendo na área de vinha.

Sílvia entra para a gestão do projecto num momento em que o pai decide profissionalizar mais a exploração. “Estava um pouco cansada da arquitectura e decidi mudar para o vinho”, diz-nos a gestora enquanto caminha connosco pela estrada de terra que separa duas parcelas de vinha da quinta. Sílvia gosta de ir até ao topo do moinho próximo da casa e admirar as redondezas. Deste local alto, avista-se a quinta toda, ou quase. O facto de estar quase completamente murada facilita a identificação dos limites. No total serão alguns quilómetros de muros e redes, um número que impressiona, mas que, verdade seja dita, empalidece se o compararmos com o da vizinha Torre Bela, uma das maiores propriedades muradas da Europa, com 18 quilómetros de muros! Ali ao pé, a aldeia de Arrifana, com os seus típicos casarios brancos. A quinta encosta à aldeia pelo cemitério e, curiosamente, é dali que vêm consistentemente das melhores uvas da Quinta da Lapa. Mais ao fundo, a uma dezena de quilómetros, a imponente serra de Montejunto.

Jaime Quendera e Sílvia Canas da Costa.

A vista é magnifica e permite ver bem o terreno suavemente colinoso da quinta. Predominam os solos argilo-calcáreos, mas, como é típico na região do Tejo, existem muitas manchas. Falamos de solos fortes, com boa fertilidade, embora a produção média raramente ultrapasse as 7 toneladas por hectare. Jaime Quendera diz-nos que se procura “sobretudo o equilíbrio da produção e por isso somos cuidadosos com adubos e água”. O resto é o clima que faz.

Um clima especial

A nível climático, a Serra de Montejunto faz alguma barreira aos ventos marítimos, condicionando o clima desta região. Jaime continua espantado, ano após ano, com as amplitudes térmicas, que contribuem para a criação de vinhos com belos teores de acidez. “Chegamos a ter aqui dias com 40 graus, mas à noite corre quase sempre um vento fresco”, diz Jaime. Sílvia confirma e conta-nos uma história que elucida bem esta característica climatérica: “Numa festa que fiz aqui em Março, começamos com 25 graus na hora de almoço e terminamos, já noite dentro, com zero graus! Mesmo em Agosto, é raro haver condições para as pessoas estarem cá fora à noite”.

A frescura adicional é benéfica para os brancos, espumantes, rosés e, claro, para os tintos. Contudo, estes ficam um pouco duros no início e é por esta razão que Sílvia e Jaime não têm pressa em os lançar para o mercado. Mesmo os colheita costumam ter dois ou três anos de garrafa. Este ano, Sílvia está a (re)lançar o Reserva 2011, de uma pequena quantidade que guardou. É uma nova experiência que acabou por demonstrar que, apesar dos seus oito anos, o vinho exibe ainda muita juventude, com bastante fruta, e se mostra muito distante da decadência.

“Parecem quase vinhos de montanha, como os do Douro ou do Dão”, declara Jaime. A altitude nem sequer é elevada: estamos aqui a cerca de 100 metros acima do nível do mar, que, em linha recta, dista apenas 40 quilómetros.

A região de Lisboa é vizinha e muito perto, mas, diz-nos Jaime, “os vinhos não têm nada a ver com estes”. Jaime não faz juízos de valor, apenas constata a diferença, provocada sobretudo pelo calor, que proporciona maturações mais rápidas e dá “vinhos maduros, mas com acidez”.

A vinha a crescer

A primeira plantação de vinha começou logo em 1990 e o total terá ficado pelos 30 hectares. Ao longo dos anos, foram ocorrendo várias mudanças: castas que não provaram bem deram lugar a outras que já tinham pergaminhos confirmados. E a área de vinha foi crescendo, até chegar hoje aos 72 hectares, uma área considerável que gera cerca umas centenas de milhar de litros de vinho. “Já não temos mais espaço para plantar vinha; agora para crescer temos que ir comprando terra aos nossos vizinhos”, diz-nos Sílvia. E assim tem acontecendo: nos últimos anos a família adquiriu 10 hectares. A vinha (e adega) está cargo de Jorge Ventura, jovem viticultor e enólogo residente. Aqui está-se em regime de Produção Integrada, e existe (e sempre existirá) arrelvamento na entrelinha: “não pode ser de outra maneira, porque sem o coberto vegetal, poderia haver erosão em altura de chuvas fortes”, explica Jaime. Aqui usa-se muito o estrume como fertilizante, que vem de outra quinta da família, onde se cria gado de leite. Não resisto e pergunto a Sílvia: “o negócio do vinho é capaz de ser melhor…” Sou respondido com uma sonora gargalhada.

Uma adega bem folgada

Passamos à cozinha do enoturismo e fazemos uma degustação de alguns vinhos. Jaime e Sílvia conduzem a prova, que, se ocorresse dentro de dois meses, seria realizada na nova sala de provas da nova adega. Esta já funcionou em 2019, mas alguns pormenores estão a ser ultimados, como a espectacular sala de provas, no piso mais alto dos 3 existentes. De resto, a adega tem tudo o que é necessário para fazer vinhos de topo, incluindo muito espaço. O piso inferior, para estágio de vinho e barricas, está subterrâneo.

Voltamos aos vinhos e um dos que mais impressiona é o Homenagem Reserva 2015. Diz Jaime: “este tinto passou 24 meses em barrica nova, 12 + 12”. “12+12”? pergunto. “Sim, ao fim de um ano saiu de barricas novas para entrar em outras barricas novas”. O vinho está excessivamente amadeirado? Nada disso. Teve estrutura para aguentar dois anos em dupla madeira nova sem ficar demasiado marcado. O tempo, é verdade, ajudou a suavizar tudo. Saber estas coisas da enologia é uma das facetas de Jaime, que faz muitos milhões de litros de vinho todos os anos, em vários produtores. E tanto faz vinho abaixo dos 2 euros a garrafa como assina néctares com preços muito elevados. Mas talvez a sua maior mais valia seja a compreensão do gosto dos consumidores, que ele avalia nos múltiplos eventos a que vai pelo mundo inteiro.

Aqui dá a sua opinião, claro, mas tem a ajuda preciosa de Sílvia, que também viaja com frequência por todo o mundo e ausculta as opiniões dos enófilos. A casa já tem clientes por esse mundo fora, embora a quota da exportação ainda não tenha chegado a metade do total. China, Alemanha e Bélgica são os maiores mercados. Curiosamente, no mercado nacional e por regiões, é a Madeira que leva a dianteira. E logo a seguir vem os Açores e depois o Algarve. Nenhuma garrafa vai para a moderna distribuição. O resto do país é feito com distribuição própria, mas Sílvia acha que este modelo terá de sofrer ajustamentos para acomodar os crescimentos previstos com as novas vinhas em produção. Ou seja, as quantidades envolvidas não só crescem todos os anos como também o portefólio, que hoje comporta mais de 20 referências, incluindo quatro espumantes e sete monocastas. Para breve serão lançados projectos especiais, como um branco especial ‘Fernão Pirão’ (com curtimenta), um clarete (mistura de tinto e branco), e um varietal de Castelão, feito à antiga. Projectos não faltam, e Sílvia nem nos revelou alguns que não chegaram a ver comercialmente a luz do dia. “Só engarrafamos o que vale a pena”, revela a gestora. O resto fica no segredo dos deuses.

A visita aproxima-se do fim e disparamos a última pergunta a Sílvia: valeu a pena largar a arquitectura para vir para o mundo do vinho? Sílvia nem hesita: “foi muito difícil ao início, especialmente na área comercial, até porque vinha de outra área. Mas é um mundo muito giro e não me arrependo de aqui ter entrado”.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]

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Edição nº 33, Janeiro 2020

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