Uma aguardente “divinal” da Moldova

aguardente moldova

Nos tempos em que a Moldova fazia parte da União Soviética, qualquer aguardente vínica chamava-se “Cognac”, a ser entendido como um tipo de bebida e não uma denominação de origem. Depois de se tornar num estado independente e à procura de novos mercados, a República da Moldova começou a trabalhar no sentido de respeitar as […]

Nos tempos em que a Moldova fazia parte da União Soviética, qualquer aguardente vínica chamava-se “Cognac”, a ser entendido como um tipo de bebida e não uma denominação de origem. Depois de se tornar num estado independente e à procura de novos mercados, a República da Moldova começou a trabalhar no sentido de respeitar as regras do jogo e juntou-se ao Acordo de Lisboa, que visa assegurar a protecção das denominações de origem, como é o caso do vinho do Porto ou Champagne, por exemplo. Lançou-se, assim, no desafio de arranjar um novo nome para as aguardentes produzidas no país.
A primeira sugestão para substituir o habitual “Cognac” foi “Distvin” juntando as palavras “Distilat de Vin” (destilado de vinho) até que foi proposto um tuning mais sonante, transformando “Distivin” em “Divin”, o que na língua romena/moldava significa “divinal”. E desde 1993, este ficou o termo oficial para aguardente vínica produzida na Moldova. Em 2012 foi assinado o Caderno de Encargos que estabeleceu as regras de elaboração de Divin.
A área geográfica delimitada para a produção de aguardentes vínicas abrange todo o território do país, mas insere-se, praticamente toda, na zona continental localizada nos planaltos dos Cárpatos, no Norte, e inclui a área de Codru, no Centro, e as estepes de Bugeac, no Sul.
Entre as castas autorizadas para a produção de Divin, constam as variedades locais como a Fetească Alba, Alb de Onitcani, Alb de Suruceni, Riton e Luminita; as do Cáucaso como a Rkatsiteli e de países territorialmente próximos da Moldova, como Bianca, Pervenet Magaracea, Suholimanski belii; e castas internacionais, entre elas Chardonnay, Sauvignon Blanc, Riesling, grupo Pinot, Ugni Blanc, Silvaner e Aligote. Para os Divin em prova, foram utilizadas as castas Aligote, Chardonnay, Sauvignon, Fetească e Rkatsiteli.
A destilação é permitida em sistemas contínuos ou descontínuos. O tempo mínimo de estágio é de 3 anos para V.S. (Very Special); 5 anos para V.S.O.P. (Very Super Old Pale); 7 anos para X.O. (Extra Old) e 20 anos para X.X.O. (Extra Extra Old). O teor alcoólico mínimo do produto final deve ser 40%.
A Molddavshii Standart é um dos maiores produtores de aguardentes na Moldova, que iniciou a sua actividade em 1998. A gama de produtos destilados é vasta, entre os quais se destaca “Legenda Moldovei” que significa “Lenda da Moldova”, baseado numa lenda relacionada com a criação do Principado da Moldova no século XIV. Reza a história que o príncipe Dragoș andava à caça nas montanhas. Ao perseguir um bisonte, o seu cão, Molda, caiu nas águas de um rio e não sobreviveu, enquanto a presa foi morta pelas flechas dos caçadores. Em homenagem ao seu cão, o príncipe nomeou o rio de Moldova e o nome extendeu-se ao principado.

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2023)

Organizado todos os anos pela ViniPortugal, o Fórum Vinhos de Portugal teve mais uma edição no dia 22 de Novembro, em Leiria. No evento, no qual marcaram presença várias entidades do sector, esteve em destaque a apresentação das novas regras de rotulagem dos produtos vitivinícolas; foram comunicados, como habitualmente, os números e o balanço de performance do vinho português no mercado nacional e internacional entre os meses de Janeiro e Setembro de 2023; e foi, ainda, divulgado o Plano de Marketing e Promoção para 2024 da ViniPortugal — entidade responsável pelo desenvolvimento e execução de estratégias e planos de promoção dos Vinhos de Portugal em mercados internacionais — com a marca Wines of Portugal.

Nesta edição do Fórum Anual Vinhos de Portugal, o destaque foi para as novas regras de rotulagem de produtos vitivinícolas. A partir de 8 de Dezembro de 2023, será obrigatória a indicação na rotulagem da declaração nutricional, dos ingredientes e data de durabilidade mínima. Os vinhos e produtos vínicos que tenham sido produzidos antes dessa data podem continuar a ser colocados no mercado até ao seu esgotamento. O objectivo do legislador europeu é que esta informação sirva, sobretudo, a necessidade de os consumidores estarem mais bem informados para fazerem as suas escolhas. Através da proposta apresentada por Portugal, legislou-se no sentido de se disponibilizar a informação sobre a lista de ingredientes e a declaração nutricional, através de meios eletrónicos, por exemplo o Código QR.

Segundo Frederico Falcão, Presidente da ViniPortugal, “as novas regras de rotulagem são muito importantes para o consumidor estar na posse de todas as informações, para tomar melhores decisões em relação ao consumo de produtos vitivinícolas, na medida em que a informação presente contará com a declaração nutricional, como o valor energético, as quantidades de lípidos, ácidos gordos saturados, hidratos de carbono, açucares, proteínas, entre outros. Esta regra, já aplicada aos outros géneros alimentícios, vai-nos trazer mais informação sobre aquilo que consumimos e, assim, fazermos escolhas mais informadas”.

 

Fórum Vinhos Portugal rótulos

 

De acordo com os dados apresentados pelo IVV (Instituto da Vinha e do Vinho), em 2022, Portugal encontrava-se entre os 10 principais exportadores mundiais, ocupando o 8º lugar em volume e o 9º lugar em valor, sendo que os principais mercados foram Estados Unidos da América, Reino Unido e Alemanha. De Janeiro a Setembro de 2023, Portugal exportou 241 milhões de litros de vinho português, registando um valor de 682 milhões de euros, a um preço médio por litro de 2,83 euros. Quanto aos 5 maiores mercados de destino do vinho português, até Setembro deste ano, estes foram os EUA (77 milhões de euros), França (75 milhões), Reino Unido (68 milhões), Brasil (58 milhões) e Canadá (38 milhões).

Especificamente, o vinho tranquilo com DO/IG representou 110 milhões de litros exportados, um acréscimo de 1,6% face a 2022, e 327 milhões de euros, um aumento de 11 milhões de euros face a 2022, ou seja, 3,2%. O preço médio por litro também teve um ligeiro aumento, situando-se em 2,97 euros.

“Temos assistido a um crescimento significativo nas exportações dos vinhos portugueses de forma continua, ano após ano. Este aumento deve-se à excelente qualidade dos nossos vinhos e ao trabalho de promoção internacional que tem sido desenvolvido em conjunto com o sector, no sentido de dar a conhecer os nossos produtos. Para 2024, a ViniPortugal tem definido um programa de promoção com o objectivo de trabalhar a notoriedade de marca Wines of Portugal, desenvolver o posicionamento distintivo dos vinhos portugueses com vista a credibilizar a nossa oferta e afirmar Portugal como um ‘hot spot’ internacional do sector do vinho. Para o alcance destas metas teremos um investimento de 8,32 milhões de euros para trabalhar 22 mercados, sendo que 66% será fora da Europa”, adiantou Frederico Falcão.

 

Destaques do Fórum Vinhos de Portugal 2023:

Sogrape lança fundo destinado à inovação na indústria do vinho e bebidas

Sogrape fundo

Sogrape Ventures é o primeiro fundo de capital de risco do grupo Sogrape, gerido em parceria com a Beta Capital, destinado a startups com soluções inovadoras, enquadradas na cadeia de valor da indústria do vinho em particular, e das bebidas em geral. Com um capital inicial de 5 milhões de euros, o fundo Sogrape Ventures […]

Sogrape Ventures é o primeiro fundo de capital de risco do grupo Sogrape, gerido em parceria com a Beta Capital, destinado a startups com soluções inovadoras, enquadradas na cadeia de valor da indústria do vinho em particular, e das bebidas em geral.

Com um capital inicial de 5 milhões de euros, o fundo Sogrape Ventures pretende “investir em startups disruptivas e projectos early-stage, com abordagem positiva nas vertentes ESG (Environmental, Social and Corporate Governance) e com produtos ou modelos de negócio inovadores com potencial de escalabilidade”, explica a Sogrape, que adianta, ainda, que “o Comité de Investimento do Fundo é composto por quadros da Sogrape e membros independentes com experiência ao nível de capital de risco e agro & foodtech”. O âmbito é internacional, mas com especial foco nas start-ups portuguesas.

“Estamos muito optimistas com o lançamento do fundo Sogrape Ventures e com a oportunidade de darmos a inovadores, empreendedores e startups o apoio necessário para testar, desenvolver e expandir soluções inovadoras capazes de criar um verdadeiro impacto na indústria do vinho. Este projecto vem dar continuidade ao legado que nasceu do sonho do meu Avô e que tem sido construído ao longo de 80 anos através de várias gerações. Para a nossa família, o vinho, mais do que um negócio, foi sempre uma forma de ser e de estar na vida e este Fundo é mais um passo natural neste sentido”, comenta Fernando da Cunha Guedes, Presidente do grupo.

A Sogrape já se encontra em processo de identificação e análise de startups, em Portugal e noutros países.

Vesúvio: 200 anos de erupção

vesúvio

A Quinta do Vesúvio tem uma situação geográfica única no Douro. Fica na margem Sul, perto de Numão, em frente a Carrazeda de Ansiães, na zona onde desagua a Ribeira da Teja. Tem uma enorme frente de rio, e foi uma quinta decisiva no avanço da Região Demarcada do Douro para o Douro Superior, área […]

A Quinta do Vesúvio tem uma situação geográfica única no Douro. Fica na margem Sul, perto de Numão, em frente a Carrazeda de Ansiães, na zona onde desagua a Ribeira da Teja. Tem uma enorme frente de rio, e foi uma quinta decisiva no avanço da Região Demarcada do Douro para o Douro Superior, área que anteriormente não era zona de vinho.

Rupert Symington, CEO da Symington Family Estates, explicou a história da quinta. Logo a abrir disse “2023 porquê? Porque nós queremos.” Realmente, a quinta já tinha registos desde 1565, e era conhecida pela produção de citrinos, amêndoas e figos. No Douro Superior praticamente não havia produção de vinho. Enormes maciços de granito dificultavam a construção dos terraços. Só no século XVIII começou a produção de vinho, graças à utilização de dinamite. Também a navegabilidade do rio foi construída a pulso, e os acessos ao Douro Superior transformaram-se decisivamente. Todos nos lembramos das imagens de barcos rabelos puxados em zonas rasas por carros de bois a partir da margem.
António Bernardo Ferreira, tio e sogro de D. Antónia “a Ferreirinha” comprou a quinta em 1823 e já com a visão e decisão de plantar vinha. Isto foi mesmo depois das invasões francesas e num período de grande instabilidade política. A revolução liberal ocorreu em 1820 e culminou em 1822 com a ratificação e implementação da primeira Constituição Portuguesa. Foi também em 1822 que foram retiradas algumas das limitações da Região Demarcada do Douro. António Bernardo Ferreira plantou em 1823 nada menos que 150ha de vinha, o que implicou a construção de milhares de muros. Em 1827 foi construída a casa, e em 1830 mudou o nome para Quinta do Vesúvio. A obra demorou 13 anos, e chegou a ter diariamente 500 trabalhadores envolvidos. Ainda não se chamavam “colaboradores.” Esta adega de 1827 permanece operacional e na essência igual à que foi construída. Mais tarde, D. Antónia construiu a escola expandiu a capela e a casa. O marido e primo de D. Antónia, António Bernardo Ferreira Filho, morreu em 1844 e ela assumiu a liderança. Durante a filoxera, para não ter de despedir os trabalhadores, ordenou a construção de um muro a toda a volta da propriedade, e plantou amendoais, laranjais e olivais. O Vesúvio foi das primeiras quintas a engarrafar Vinho do Porto com marca própria, em 1863. A estação de comboios foi inaugurada em 1887, facilitando a viagem, que era difícil e demorada.

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Rupert Symigton, CEO da Symington Family Estates, explicou a história da Quinta. Logo a abrir, disse: “2023 porquê? Porque nós queremos”.

Mais ou menos na mesma altura, 1890, a família Symington comprou uma quinta mesmo em frente ao Vesúvio, a Quinta da Senhora da Ribeira. A razão envolve o Vesúvio: havia a estação dos comboios a facilitar imenso a viagem desde o Porto, depois bastava atravessar o rio. Rupert Symington riu-se: “estivemos 100 anos a olhar o Vesúvio desde o outro lado do rio.” Os Symington têm a sua história bem documentada no seu website, que convido a visitar. Conta como Andrew James Symington chegou a Portugal em 1882, o que faz com que a actual administração seja a quarta geração à frente do grupo, com a quinta já a apontar-se para a sucessão. Mas através da herança da esposa de AJ, Beatrice Atkinson, são já 14 gerações que atravessam toda a história do Vinho do Porto, desde 1652. Os Symingtons acarinham este passado e também a sua ligação ao Douro e à terra. Os vários membros da família foram comprando quintas e casas no Douro. Quando, na sequência da II Guerra Mundial tiveram de vender a Quinta da Senhora da Ribeira, foi uma dor de alma, ferida que só foi curada em 1998, quando a recompraram para a Dow’s, uma das marcas do grupo. Entretanto, já tinham adquirido a Quinta do Vesúvio, em 1989. A venda do Vintage 1985 correu muito bem nos USA e no UK, e pela primeira vez em 30 anos havia alguma folga financeira.

Após séculos de lotes de diferentes sítios, o vinho do Porto explora agora o conceito de terroir. O do Vesúvio é único.

Os Symingtons tinham relativamente poucos terrenos próprios. Quando soube que o Vesúvio estava à venda, Ian disse à família “não podemos perder esta oportunidade, é a quinta com mais história do Douro.” Era a ocasião para garantir fornecimento de uvas de grande qualidade. O Vesúvio foi das primeiras quintas a ter plantação por castas e tinha uma adega de boa qualidade. Mas na época tinha 56 accionistas, foi preciso ganhar um leilão por carta fechada, na segunda ronda, e a assinatura dos documentos demorou mais de um longo dia. A adega ficou como estava, na vinha foram replantadas grandes parcelas. A vinha assegurou logo vinhos de nível superior para as marcas do grupo, Graham’s, Dow’s, etc. Logo em 1989 engarrafaram um Vintage de quinta, sendo assim um dos primeiros Single Quintas, em particular, um dos primeiros a serem lançados todos os anos, em vez de apenas nos anos “não-clássicos.”

UM ASSOMBRO DURIENSE

O Vesúvio produzia anualmente já na altura 20 a 30 mil caixas (de 12 garrafas, 9 litros) de vinho, mas só engarrafava 2 a 3 mil. Era assim possível todos os anos engarrafar um vinho da melhor qualidade, permitindo focar a produção no conceito de terroir, fortíssimo em outras grandes regiões vinícolas do mundo, mas não a primeira prioridade na DOP Porto, que preferia enfatizar a virtude dos lotes (várias localizações, por vezes vários anos). O terroir foi assim espreitando devagar nas motivações dos enólogos do vinho do Porto, e as duas frentes vão ainda hoje avançando lado a lado. Até 2007 foi sempre assim. Charles Symington, o actual enólogo, fez ali o seu primeiro vintage em 1995. Mais tarde introduziu a refrigeração nos lagares, depois o desengaçador, mas a pisa a pé foi mantida até hoje. Em 1989 havia 60 hectares de vinha, hoje são 128ha. A quinta tem no total 326ha. No fim dos anos 1990, o novo Douro apareceu em força, com as mesmas vinhas a produzir Porto e DOC Douro. As novas plantações procuraram lugares mais frescos, com maior altitude, para possibilitar a produção de DOC Douro. Depois de anos de experiência, em 2007 foram lançados o primeiro tinto Quinta do Vesúvio e o seu irmão Pombal do Vesúvio, há dois anos foi lançado o primeiro Comboio do Vesúvio, um tinto sem madeira, para beber mais jovem. O Vintage continuou sempre a ser produzido a não ser em anos mesmo trágicos em qualidade (1993 e 2002). Os primeiros vintages, dos anos 1990, mostram ainda hoje muita envolvência e encanto, tal como os primeiros tintos se mostram jovens e voluptuosos, filhos do seu sítio, maduros e poderosos, mas cheios de juventude e frescura. São vinhos para envelhecer e apreciar com calma.

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O enólogo Charles Symington fez, na Quinta do Vesúvio, o seu primeiro Vintage, em 1995.

O lançamento do Quinta do Vesúvio Douro tinto de 2021 foi pontuado por esta efeméride, 200 anos de produção de vinho na quinta. Aqui faz-se uma viticultura heróica, há muito pouca água, apesar do rio logo ali ao lado. O ano de 2021 ajudou do ponto de vista climático, os vinhos têm frescura, com aroma levantado, e o estágio na madeira foi feito de forma equilibrada, subtil, de forma a mostrar a propriedade, as castas, o Douro. As barricas foram de 400 litros, 80% madeira nova, incorporação cuidadosa. São vinhos ainda na sua infância, precisam de tempo e paciência.

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Emblemática propriedade que pertenceu a D. Antónia “Ferreirinha”, a Quinta do Vesúvio foi comprada pela família Symington em 1989 a 56 diferentes accionistas.

 

200 anos não é brincadeira, e durante dois dias viajei acima-abaixo no rio Douro, apreciando o Vesúvio a partir da água, como em outras ocasiões apreciei a exploração dos seus caminhos em terra. Visitar o Douro é sempre suster a respiração em assombro, e não me canso de apreciar cada detalhe: é um muro, é um mortório, um recanto inóspito do rio que a força humana ao longo de muitos anos conquistou e domou, é um tomate provado acabado de apanhar, em sua época perfeita, como mais tarde será uma laranja que hoje aparece ainda como uma bola de golfe pequena e compacta de verde. E são as pessoas, o brilho nos olhos quando falam da sua herança com um misto de orgulho, responsabilidade e determinação. Não é só terra, é a vinha, são os vinhos, são as quintas, são as marcas, são as pessoas, que passam gerações, preenchem posições, permanecem. Os visitantes, como eu, ganham também carinho por estes sítios, procuram a sombra, provam um canapé do sempre excelente Pedro Lemos, dão uma bicada nos novos vinhos, aparecem agora muitos brancos, pequenas experiências que prevejo desaguem em breve em novas marcas fortes. Tenho a sorte de ter acompanhado este projecto do Vesúvio desde o seu princípio, logo em 1989, e tenho um sereno orgulho alheio no que os bravos Symington conseguiram. Agora, venham mais 200…

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2023)

Chryseia 2021: A excelência de um ano fresco no Douro

Chryseia

Numa aliança que se iniciou em 1999, unindo o produtor de Bordéus e enólogo Bruno Prats (antigo proprietário do Château Cos d’Estournel) aos maiores proprietários de vinhas no Douro, a família Symington, nasceu a Prats & Symington. Esta parceria única, de conhecimentos e tradições de duas grandes regiões vitivinícolas mundiais, resultou na criação de um […]

Numa aliança que se iniciou em 1999, unindo o produtor de Bordéus e enólogo Bruno Prats (antigo proprietário do Château Cos d’Estournel) aos maiores proprietários de vinhas no Douro, a família Symington, nasceu a Prats & Symington. Esta parceria única, de conhecimentos e tradições de duas grandes regiões vitivinícolas mundiais, resultou na criação de um grande tinto do Douro, que ecoa além-fronteiras: o Chryseia.
A Prats & Symington é, ao dia de hoje, proprietária de duas quintas no Douro: a Quinta de Roriz (na fotografia) e a Quinta da Perdiz, ambas localizadas no Cima Corgo e a operar em modo de Produção Integrada. As uvas do Chryseia provêm das duas quintas, e também da vinha vizinha de Roriz, Quinta da Vila Velha, propriedade particular de Rupert Symington. A Quinta de Roriz foi adquirida pelas duas famílias em 2009 com foco neste vinho, um passo importante para a obtenção da qualidade e da consistência que hoje nele encontramos. Em solos de xisto, a propriedade tem exposição maioritariamente a Norte e totaliza 95 hectares, cerca de 43 de vinha. Aqui, as duas castas que compõem o lote do Chryseia são dominantes — Touriga Nacional e Touriga Franca — mas também estão presentes Tinta Roriz, Sousão, Tinto Cão e outras tradicionais da região.
A apresentação da colheita de 2021 do Chryseia (com estágio de 15 meses em barricas de carvalho francês de 400L), mas também do entrada de gama Prazo de Roriz (6 meses em barrica) e do tinto Post Scriptum (12 meses em barrica), teve lugar no restaurante do chef Pedro Lemos, no Porto, e foi conduzida por Rupert Symington, Bruno Prats e Miguel Bessa, enólogo residente do projecto. “O que fizemos aqui não foi propriamente ir à procura do sucesso do vinho, foi acreditar que os vinhos apresentados hoje podem ser pedidos todos os dias aqui e colocados no pairing sem limitações, e isso é conseguido pela elegância e grandiosidade dos vinhos”, comentou Pedro Lemos, sobre a harmonização com pratos da sua autoria.

Chryseia

Bruno Prats — que actualmente residente em Genebra e se mantém ligado a duas empresas, Klein Constantia, na África do Sul, e Prats & Symington — destacou a capacidade de envelhecimento destes vinhos do Douro, referindo que até mesmo um Prazo de Roriz 2012, recentemente provado, estava delicioso. “O Post Scriptum é o segundo vinho do Chryseia. Ao fazer o lote final deste, seleccionamos o melhor dos melhores. O que resta, e que é feito com igual cuidado e qualidade, e das mesmas vinhas, origina o Post Scriptum”, referiu o enólogo. “Lembro que, em geral na Europa, 2021 foi um ano muito quente, com ondas de calor horríveis, mesmo no Reino Unido. Mas não no Douro, onde tivemos um ano fresco. Isso foi bom para nós, que procuramos elegância e finesse. Pudemos aproveitar um longo período de noites frescas que mantiveram a acidez e frescura, e boas condições durante a vindima, com pouca chuva. Foi um ano de colheita muito semelhante às minhas memórias de Bordéus. Uma colheita que elevou, sem dúvida, as características do Chryseia, que são a elegância, finesse, ‘drinkability’ e frescura. Queremos continuar a fazer o Chryseia assim, no seu espírito muito próprio. A magia do Douro é que permite fazer vinhos com enorme potencial de guarda, mas muito acessíveis, em perfil, enquanto jovens”, comentou Bruno Prats.
Já Miguel Bessa, enólogo residente da Prats & Symington, confessou que, para si, “o dia de lançamento destes vinhos é como o dia em que levamos pela primeira vez os filhos à escola, pela mão. O ano 2021, no meio de dois anos muito quentes, foi para nós um ano fácil, que veio ao nosso encontro: fresco, com maturações muito lentas, transportando-nos no vinho para os bosques da quinta, num lado mentolado e de frescura. Estou muito satisfeito…”, rematou.

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2023)

Fraga do Calvo: O retomar de um sonho adiado

Fraga do calvo

Em 1951, José Marinho era apenas um jovem quando iniciou a aventura da emigração, longe das suas origens, do outro lado do Atlântico. As razões foram as mesmas de muitos conterrâneos e compatriotas: a busca de uma vida melhor. As longas horas de trabalho muito duro no Brasil não obstaculizaram alguns períodos de ócio que […]

Em 1951, José Marinho era apenas um jovem quando iniciou a aventura da emigração, longe das suas origens, do outro lado do Atlântico. As razões foram as mesmas de muitos conterrâneos e compatriotas: a busca de uma vida melhor. As longas horas de trabalho muito duro no Brasil não obstaculizaram alguns períodos de ócio que permitiram desenvolver ligações sociais. Num desses momentos de descontracção, conheceu Etelvina Alves, a mulher que o encantou e com a qual regressou a Portugal, na década de 60, para casar e constituir família.
Com o dinheiro amealhado resolveu retomar um velho sonho e comprou a Fraguita, uma propriedade no Douro com três hectares, situada em Cabeda, no concelho de Alijó, na qual desenvolveu com grande entusiasmo a produção de vinho, que depois vendia na movimentada taberna do centro da povoação, por onde passava a Estrada Nacional 15, sendo na altura a única ligação entre a cidade do Porto e os territórios situados para lá da Serra do Marão. Contudo, a finitude da vida colocaria um ponto final na sua paixão.
Em 2014, um dos netos quis dar continuidade ao legado do seu avô. “Foi preciso tempo e algumas pessoas para que o meu desejo de colocar as mãos na terra ganhasse a força necessária para eu recomeçar uma história e dar continuidade a um sonho antigo, o sonho adiado de José Marinho”. Refere Gil Taveira, o actual mentor e enólogo do projecto.

Uma nova fase de expansão

Como seria de esperar, os novos empreendimentos vínicos não estão isentos de numerosos desafios e dificuldades. “O meu projecto de vida é pautado por muitos episódios de luta e persistência, que desaguam em singulares momentos de felicidade”, diz Gil Taveira.
Um dos maiores constrangimentos que teve de ultrapassar foi o arrendamento de novos vinhedos, com características semelhantes aos originais, que oferecessem garantias de qualidade. Actualmente, o projecto apresenta um total de cinco hectares de vinha, compostos pelas castas brancas Códega do Larinho, Gouveio e Viosinho. Relativamente às castas tintas, o encepamento passa por Touriga Franca, Touriga Nacional e Tinta Roriz.
Ano após ano, tudo foi crescendo, e o que começou com uma pequena vinha no Douro transformou-se num projecto vínico viável, que inclui uma parceria com viticultores na região da Beira Interior, iniciada em 2018, dando início a uma nova marca e a vários vinhos.
O sonho não acaba aqui porque, ao que parece, haverá novos desenvolvimentos. Diz o enólogo, “hoje sei que a emoção e o amor são duas das mais valiosas ferramentas que utilizarei para que este sonho não mais seja adiado. O futuro não está planeado, mas… é inevitável”.

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2023)

Herdade do Rocim juntou 58 produtores no Amphora Wine Day 2023

Amphora Wine Day 2023

Na edição de 2023 do maior evento português dedicado aos vinhos de ânfora, Amphora Wine Day, rumaram à Herdade do Rocim, na Vidigueira, no dia 11 de Novembro, 1700 visitantes e 58 produtores de vinho. Com 22 produtores estrangeiros — 12 da Geórgia e os restantes de Itália, França, Espanha e África do Sul — […]

Na edição de 2023 do maior evento português dedicado aos vinhos de ânfora, Amphora Wine Day, rumaram à Herdade do Rocim, na Vidigueira, no dia 11 de Novembro, 1700 visitantes e 58 produtores de vinho.

Com 22 produtores estrangeiros — 12 da Geórgia e os restantes de Itália, França, Espanha e África do Sul — e 36 nacionais, foram superados, segundo a organização, os números da edição anterior, também com mais apostas ao nível da gastronomia tradicional, entre restaurantes e queijarias. O evento proporcionou, ainda, várias provas comentadas por especialistas internacionais, como Mark Squires, Marcelo Copello, Paul White, Sarah Ahmed ou Suzana Barelli.

“Quando criámos esta iniciativa esperávamos, no máximo, umas três centenas de pessoas… já nesse ano, o número de visitantes foi muito superior, mas nunca esperávamos que este momento anual que queríamos fosse a celebração dos vinhos de talha alentejanos e dos vinhos de ânfora nacionais e internacionais, da Herdade do Rocim e de todos os produtores que se quisessem agregar a nós, atingisse este patamar. A equipa já está a pensar na próxima edição!”, afirma Pedro Ribeiro, enólogo e administrador do Rocim, fundador do Amphora Wine Day, que teve a sua primeira edição em 2018.

Às 18h00 abriram-se as talhas, momento que, segundo Catarina Vieira, proprietária e enóloga do Rocim, “representa o culminar de uma fase de muito trabalho, a nossa manifestação de respeito pela tradição, um momento de celebração”.

Adega de Cantanhede faz mudanças na equipa de enologia

Adega de Cantanhede enologia

A Adega Cooperativa de Cantanhede — produtora de reconhecidos vinhos da Bairrada, como Marquês de Marialva ou Foral de Cantanhede — está a fazer grandes mudanças na equipa de enologia. Osvaldo Amado anunciou que deixa agora de ser enólogo consultor da Adega de Cantanhede, posição que será ocupada por outro experiente enólogo, António Ventura, facto […]

A Adega Cooperativa de Cantanhede — produtora de reconhecidos vinhos da Bairrada, como Marquês de Marialva ou Foral de Cantanhede — está a fazer grandes mudanças na equipa de enologia.

Osvaldo Amado anunciou que deixa agora de ser enólogo consultor da Adega de Cantanhede, posição que será ocupada por outro experiente enólogo, António Ventura, facto confirmado hoje, por este, à Grandes Escolhas.

Em comunicado de imprensa, Osvaldo Amado — que trabalhou com a cooperativa durante mais de 12 anos — refere que, entre os vários vinhos da Adega de Cantanhede que assinou, os que mais o marcaram foram rótulos como Marquês de Marialva Confirmado, Foral de Cantanhede, Grande Reserva Baga e Grande Reserva Arinto, Baga Unoaked e Baga Complexo, Espumantes Primitivo Cuvée e Baga Cuvée.

“A Adega de Cantanhede representou um grande desafio, que considero superado”, declarou o enólogo.

GRANDE PROVA ESPUMANTES: As bolhas da nossa alegria

Grande Prova Espumantes

Entre um espumante barato de grande superfície e outro de uma grande marca de Champagne pode haver um intervalo de várias centenas de euros. Tudo terá começado em França mas hoje é um tipo de vinho que se produz em todo o mundo. Todos têm bolhas, mas são muitas as diferenças que os separam. Os […]

Entre um espumante barato de grande superfície e outro de uma grande marca de Champagne pode haver um intervalo de várias centenas de euros. Tudo terá começado em França mas hoje é um tipo de vinho que se produz em todo o mundo. Todos têm bolhas, mas são muitas as diferenças que os separam. Os que são feitos segundo as regras da região francesa apelidam-se de Método Clássico, uma vez que a palavra “champagne” e derivados, como “método champanhês” estão interditos, são de uso exclusivo daquela região francesa. Falamos assim do método de produção que implica a segunda fermentação na garrafa. No entanto existe um outro método – Charmat – muito vulgarizado em Itália mas também presente entre nós em que a primeira e segunda fermentações são feitas em grande depósitos e não na garrafa. No caso dos espumantes da segunda fermentação na garrafa, existe ainda a divisão entre os que usam leveduras livres e os que utilizam leveduras encapsuladas (ver texto em baixo). Finalmente há que referir que existe um outro tipo de vinho com gás natural – o chamado Pet Nat – em que a efervescência deriva do facto do vinho ser engarrafado ainda antes da fermentação alcoólica terminar e, consequentemente, ao terminar na garrafa, acaba por libertar algum gás, conservando também as levaduras mortas que então se apresentam como depósito na garrafa, exigindo cuidados especiais no serviço. Este método – chamado de método antigo ou método rural – corresponde à pré-história do espumante e tem tido actualmente um certo renascimento pelo interesse demonstrado por alguns produtores, sommeliers e consumidores adeptos de produtos alternativos. A prova que aqui publicamos não contempla esses vinhos, tal como não contempla os vinhos feitos pelo método Charmat.
A produção de espumantes, se feita com os requisitos que o progresso científico vem aconselhando, é um trabalho de enorme exigência técnica e laboratorial, com muitas análises e procedimentos que não estão ao alcance de qualquer produtor. Tem pouco equipamento, instalações mal habilitadas, ausência de laboratório? Faça tinto em lagar, faça branco num tonel usado mas…esqueça o espumante!
Decorre da leitura de um texto técnico sobre a produção de espumante que esta é provavelmente a bebida mais manipulável com que nos cruzamos; requer intervenção e decisões em inúmeras fases da produção e por isso se começa também a perceber porque uns custam €5 e outros custam €200. É verdade que os de €5 podem ser muito bem feitos, mas só vende caro quem consegue e o verbo conseguir custa por vezes uma geração (ou várias) a conjugar.

Grande Prova Espumantes

 

Qualquer enólogo que faça espumantes dirá que a prensagem é uma etapa absolutamente crucial no processo produtivo. A razão para isso prende-se com a indispensável separação dos mostos.

Da vinha à garrafa

Quando falamos de espumantes feitos pelo método clássico da segunda fermentação na garrafa temos tendência apenas a valorizar essa etapa e esquecemo-nos de tudo o que se passa antes de introduzir o vinho na garrafa para então se dar a tal segunda fermentação. Para sermos correctos, a produção de espumantes reveste-se de muito planeamento porque tem de ser pensada quando as uvas ainda estão na cepa e não se iniciou a vindima. Vejamos então os passos que têm de ser dados para se produzir um bom espumante. Tudo começa na vinha com a escolha das castas a utilizar. Vamos passar esta parte, partindo do princípio que o produtor já fez essa selecção. A verdade é que a história da região de Champagne demonstrou que a Chardonnay e a Pinot Noir são das que melhor se adequam a este tipo de elaboração. Temos, no entanto, em Portugal algumas variedades que têm dado muito boa conta de si, desde as castas do Vinho Verde, sobretudo a Alvarinho e Loureiro mas com a Alvarelhão a recolher aplausos (como acontece com Anselmo Mendes), a Gouveio no Douro (espumante Vértice, por exemplo), a Baga e a Cercial na Bairrada e, claro, a Arinto, a ubíqua casta portuguesa de múltiplas utilizações.
Seleccionada a casta passamos à etapa seguinte que é a marcação da vindima. Aqui começam as decisões importantes porque é determinante colher as uvas com baixo potencial de álcool e uma acidez elevada. Na Bairrada, por exemplo, as castas que apresentam uma acidez mais elevada são a Arinto e Cercial e as outras variedades, Maria Gomes, Bical e Baga tendem a apresentar uma acidez um pouco mais baixa. Desta forma, uvas com bom equilíbrio para espumante deverão ser colhidas com um potencial alcoólico que não ultrapasse os 11% e uma acidez compreendida entre os 7 e 9 gr./litro (medida em ácido tartárico); deverão ser seleccionadas variedades com baixo teor de substâncias fenólicas (no caso das brancas) e baixo teor de antocianinas (cor) nas uvas tintas.
Seguidamente vem a etapa que antecede ainda a fermentação do vinho-base. Qualquer enólogo que faça espumantes dirá que esta – a prensagem – é uma etapa absolutamente crucial no processo produtivo. A razão para isso prende-se com a indispensável separação dos mostos. Ainda antes de começar a prensar e apenas devido ao peso, poderá haver mosto a sair da prensa; esse será descartado e junto às prensagens finais. A primeira prensagem importante – a cuvée – deverá ser separada da prensagem seguinte – a taille – ainda dividida em duas partes, uma primeira e segunda taille. Na cuvée vamos sobretudo recolher o sumo dos bagos e, no caso das uvas tintas pobres em cor (como a Pinot Noir), recolher um sumo que quase se apresenta idêntico ao das uvas brancas, um mosto rico em açúcares, ácidos e substâncias aromáticas; na taille vamos obter um mosto mais rico em polifenóis e taninos, sobretudo na 2ª taille. Na região de Champagne estabeleceu-se uma regra como segue: uma prensa com 4000 kg de uvas deverá permitir obter 2050 litros de mosto de lágrima (cuvée), 410 litros da 1ª taille e 205 litros da segunda taille. Por norma, após a prensagem os mostos são clarificados e filtrados antes de fermentação em cuba (ou barrica). Percebe-se assim porque se diz que é importante a vindima ser manual e não mecânica, afim dos cachos chegarem inteiros à prensa. Por razões económicas pode juntar-se parte da taille à cuvée, aumentando assim a quantidade final produzida.

A importância do vinho-base

Para se fazer um espumante tem de se fazer primeiro o vinho-base que fermenta como qualquer mosto, normalmente com leveduras inoculadas, sobretudo nos mostos que foram clarificados que têm mais dificuldade em fermentar com as leveduras indígenas. Por norma a fermentação decorre em inox mas, em caves com boa temperatura (que não ultrapasse os 15ºC) pode decorrer em barrica, uma prática que tinha sido abandonada mas está a regressar, sobretudo em produtores de pequena dimensão. Como noutros vinhos também aqui a fermentação tem de ser bem monitorizada, assegurando a total transformação dos açúcares e evitando paragens de fermentação e desvios. É a este vinho base (que poderá incluir vinhos de vários anos que permitem manter o “estilo da casa”) que, após clarificação e estabilização tartárica, se irão adicionar as leveduras e o açúcar que irão operar a segunda fermentação em garrafa fechada. O licor de tiragem, deverá respeitar, grosso modo, a proporção de 24 gr/açúcar por litro e a quantidade de leveduras poderá variar entre 10 e 20 gr por hectolitro, correspondendo a uma quantidade que varia ente 1,5 e 2 milhões de leveduras activas por mililitro de vinho. Após enchimento as garrafas serão colocadas na posição horizontal em cave fria e aí permanecerão por tempo a definir pelo produtor, podendo ir de 1 até 10 anos de estágio. Como vedante usa-se principalmente a carica, mas alguns produtores, após ensaios convincentes, estão a regressar ao antigo método de rolhar as garrafas usando um grampo para ajudar a manter o gás. Diz Celso Pereira que “no Vértice Chardonnay estamos, na sequência dos ensaios dos espumantes Gramona (Penedès), a usar rolha para a segunda fermentação e estágio” Considera-se que quanto mais tempo estagiarem cave, mais fina é a bolha no final. A etapa seguinte é o do removimento das leveduras mortas (remuage) operação cada vez mais automatizada pelo recurso a giropalettes que “mexem” 500 garrafas em cada movimento, poupando assim mão-de-obra, tempo e espaço.
Um outro método consiste na utilização de leveduras encapsuladas em vez de leveduras livres. O método tem várias vantagens, nomeadamente no limitado uso de mão-de-obra e na rapidez com se consegue um vinho pronto (dispensando a remuage das garrafas) e consequente poupança de espaço na adega. O método tem defensores (como o enólogo Osvaldo Amado) mas requer um controle rigorosíssimo da higiene para se evitar a contaminação de leveduras, quer na adega quer na linha de engarrafamento. Esta exigência afasta o método dos pequenos produtores, que têm muita dificuldade em controlar as leveduras “até do ar da adega”, como nos afirmou. Osvaldo recorda que esteve presente nos primeiros ensaios na Estação Vitivinícola da Bairrada com o seu responsável António Dias Cardoso em 1987 e 88 e que foi nas Caves Primavera que se produziu o primeiro espumante comercial de leveduras encapsuladas, com a marca Chave d’Ouro.
Também Francisco Antunes – responsável por cerca de 1,2 milhões de garrafas de espumante nas Caves Aliança – participou nestes primeiros ensaios que tiveram a chancela da Proenol, a empresa produtora das leveduras encapsuladas. Reconhece que é um pouco mais caro mas se se contar os custos de tempo, remuage e mão-de-obra, pode ser um recurso importante mas, também ele refere, “é um método muito exigente” que não está ao alcance de todos. Na Aliança “chegámos a usar no espumante Danúbio mas agora só usamos leveduras livres”. Também Marta Lourenço (Murganheira) recorda que “para se fazer um grande espumante são precisos 10 a 12 anos e que a autólise (degradação natural das leveduras), no caso das leveduras encapsuladas não acrescenta mais nada a partir dos 4 anos.” E, relembra “quanto menor o tempo de estágio mais agressiva é a bolha”, razão suficiente para ser defensora do método clássico, também aplicado na Raposeira.
Já Celso Pereira sustenta que o tempo de estágio é um dado muito importante mas, salienta, “a qualidade depende de tantos factores que não podemos afirmar peremptoriamente que com 8 anos é melhor que seis ou com 15 melhor que 12”. No caso de Champagne, as grandes marcas apostam, nos seus topos de gama, em estágios de cave muito prologados.
Quanto mais se lê sobre espumantização mais se percebe que fazer um vinho com bolhas é relativamente fácil mas fazer um grande espumante é um trabalho que resulta de uma enorme soma de pequenos pormenores, ensinamentos que foram sendo acumulados ao longo de séculos e aos quais a ciência deu validade. Todas a operações relacionadas com a espumantização estão minuciosamente descritas num trabalho académico de grande fôlego que vivamente se recomenda a quem quiser aprofundar o assunto: Pedro Guedes “Fizziologia”, Quântica Editora, 2021.

De Norte a Sul

O espumante produz-se em todas as regiões do continente e ilhas. Naturalmente que as regiões onde as quantidades são mais significativas são a Bairrada e Távora-Varosa, as mais clássicas zonas produtoras. A tradição bairradina remonta aos finais do séc. XIX e em Távora aos inícios do séc. XX. Actualmente a produção em todo o país pode ser dividida em dois grupos distintos: os espumantes com Denominação de Origem (DO e IG) e os restantes, os chamados espumantes IVV. Na Bairrada, por exemplo, os dados mais recentes revelam que a produção DO tem vindo a aumentar de 2017 até 2022. Assim, se se incluir vinhos Bairrada e Regionais (Beira Atlântico) brancos, rosados e tintos, a região tem originado, em 2022, 2 317 329 garrafas. Neste valor global há a destacar algumas tendências, como a produção de espumante tinto, mas com tendência a diminuir, sobretudo se comparado com 2017 (de 110 720 garrafas para 72 436 em 2022); outra tendência curiosa tem sido o crescimento da nova designação Baga-Bairrada (que a partir de 2019 obriga a 18 meses de estágio), e que cresceu de 330 000 garrafas em 2019 para 415 000 em 2021. Também o espumante rosé tem conhecido um crescimento significativo, passou de cerca de 208 000 garrafas em 2017 para 311 000 em 2022.
A região de Távora-Varosa certificou em 2022 cerca de 2 869 740 garrafas, não tendo certificado nada como IG, ou seja, Vinho Regional, dos quais cerca de 2 100 000 garrafas de vinho branco da variedade Bruto. Aqui as Caves da Murganheira assumem claramente o papel de maior produtor, com 1 100 000 garrafas na Murganheira e 2 500 000 na Raposeira. Marta Lourenço, à frente dos destinos enológicos da empresa, confirmou-nos que a Raposeira não certifica nada (ou seja, todos os espumantes têm selo IVV) porque os vinhos incorporam uvas quer do Douro quer de Távora-Varosa.
No caso do Vinho Verde há a salientar a produção de espumantes varietais — sobretudo de Loureiro, estável nas cerca de 36 000 garrafas entre 2020 e 22 — e Alvarinho com um aumento exponencial de 46 500 garrafas em 2020 para cerca de 88 000 em 2022. Como um todo, a região tem mantido a produção regular (com oscilações decorrentes das variações de colheita) entre 548 888 garrafas em 2020 e 493 052 garrafas em 2022.
Segundo informação recolhida junto do IVV, a produção nacional certificada andará em 2022 pelas 7 868 933 garrafas (valor mais alto desde 2014) e o espumante não certificado cifra-se em 15 769 600 garrafas, igualmente o valor mais alto desde 2014.

 

Grande Prova Espumantes

Foi com a intenção de fazer dele uma bebida de comemoração que se generalizou em Champagne o consumo de vinho com algum açúcar residual.

 

Todos são momentos certos

Muito se escreve sobre a ligação do espumante com a comida. Por um lado, sabemos que se trata de uma bebida que frequentemente é consumida sem qualquer acompanhamento; por outro cada vez mais consumidores associam o espumante a vários momentos da refeição. Foi com a intenção de fazer dele uma bebida de comemoração que se generalizou em Champagne o consumo com algum açúcar residual, numa quantidade que apenas ajuda a que o vinho não seja tão marcado pela elevada acidez quando é consumido. Assim, a variedade Bruto, sem dúvida a mais generalizada, costuma ter de 5 a 8 gramas de açúcar, quantidade que ajuda consumir o vinho sem qualquer acompanhamento. Já à mesa são as variedades Extra Bruto ou Bruto Natural que melhor ligam com a refeição.
É aqui que começam as diferenças de opinião. Sendo uma bebida que tem a plasticidade de se ligar a qualquer prato, da entrada à sobremesa, quase todas as opiniões são possíveis. Seguindo no rasto de um sommelier americano, podemos considerar três hipóteses: o vinho é mais forte que o prato; o sabor do prato sobrepõe-se ao vinho ou, terceira hipótese, o prato faz com que o vinho saiba melhor e o vinho favorece o sabor do prato. Não parece difícil mas muitas vezes só se chega lá por tentativa/erro e nem sempre temos possibilidade de o fazer.
A escolha pode recair num produto local. Assim, conforme o sítio onde estamos poderemos querer associar um prato a um espumante da terra; é uma hipótese sempre interessante sobretudo como proposta para turistas que estão de passagem.
As ligações clássicas começam nos peixes fumados como aperitivo, mas podem estender-se rapidamente aos pratos de marisco e peixe com pouco tempero. Depois, ainda mais rapidamente podemos passar aos pratos de massas, risotos, pratos mais puxados nas especiarias e picantes e na culinária oriental. Também os pratos vegetarianos poderão ser perfeitos companheiros para o espumante. Deixe-se levar pelo instinto e procure ousar em ligações menos óbvias. Mas, claro, é sempre bom ter um plano B para quando a ousadia dá para o torto.
Provámos quase 30 espumantes de várias zonas do país e, pese o facto de algumas empresas terem “faltado à chamada” e outras não terem enviado o seu topo de gama, a verdade é que temos aqui muito por onde escolher e a preços muito razoáveis. Agora, só resta desfrutar.

 

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2023)

Van Zellers Ocean Aged: 102 garrafas de Porto Vintage recuperadas do fundo do mar

Van Zellers Ocean Aged

No dia 16 de novembro, Dia Nacional do Mar, Francisca van Zeller resgatou do fundo do mar 102 garrafas de Van Zellers & Co Ocean Aged Porto Vintage 2020, o primeiro Porto Vintage a estagiar debaixo de água. Esta iniciativa foi associada à campanha de educação ambiental “Planeta Oceano” do Oceanário de Lisboa, que tem […]

No dia 16 de novembro, Dia Nacional do Mar, Francisca van Zeller resgatou do fundo do mar 102 garrafas de Van Zellers & Co Ocean Aged Porto Vintage 2020, o primeiro Porto Vintage a estagiar debaixo de água. Esta iniciativa foi associada à campanha de educação ambiental “Planeta Oceano” do Oceanário de Lisboa, que tem o objectivo de sensibilizar as crianças para a importância dos oceanos e da sua conservação.

As 102 garrafas foram disponibilizadas aos clientes da Van Zellers & Co logo a 8 de Junho — dia do lançamento oficial do vinho e Dia Internacional do Oceano — e já foram todas vendidas. Cerca de metade fica em Portugal, e as restantes destinam-se a países como Suíça, Finlândia, Áustria, Canadá e Reino Unido.

O lançamento, inédito, ocorreu em parceria com a Zouri Shoes, uma marca de calçado eco-vegan responsável pela criação da embalagem do vinho em forma de concha. Este packaging foi feito com plástico recuperado da costa portuguesa (cerca de uma tonelada colectada com a ajuda de 600 voluntários) e com desperdícios de fábrica, originando uma caixa 100% reciclada.

O Van Zellers & Co Ocean Aged Porto Vintage 2020 tem um preço de venda ao público de €1000, sendo que parte das receitas tem como destino o programa “Planeta Oceano” do Oceanário de Lisboa. O programa é direccionado a mais de 600 crianças em idade escolar, do concelho de São João da Pesqueira, que tiveram a oportunidade, entre 15 e 17 de Novembro, de aprender sobre a diversidade da vida marinha e formas de a proteger.

O Porto Vintage Ocean Aged foi afundado em Dezembro de 2022 no Porto de Sines, em colaboração com a empresa Ecoalga – Adega do Mar, especializada em armazenamento subaquático. Francisca van Zeller, gestora de Marketing e Comunicação da Van Zellers & Co, expressou entusiasmo pela iniciativa: “Este projecto é uma verdadeira fusão de tradição e inovação, um testemunho do nosso compromisso em elevar o vinho do Porto a novos patamares. Submergir as garrafas nas águas do oceano, onde a natureza exerce a sua influência única, foi uma experiência emocionante. Estou muito entusiasmada pela oportunidade de resgatar estas garrafas no Dia Nacional do Mar, celebrando a herança da minha família e a importância dos oceanos para todos nós. Este é um vinho que carrega a história do passado e a promessa do futuro, e estamos muito felizes por partilhá-lo com o mundo”.