Novas estrelas no universo Bacalhôa

Bacalhôa

A marca Bacalhôa é fortemente associada à Península de Setúbal, mas na realidade, a empresa Bacalhôa Vinhos de Portugal está presente em 7 regiões vitivinícolas de Portugal, tendo uma aposta forte na Bairrada através da Caves Aliança adquirida em 2007, um dos produtores mais prestigiados dos espumantes e aguardentes, agora conhecido como Aliança Vinhos de […]

A marca Bacalhôa é fortemente associada à Península de Setúbal, mas na realidade, a empresa Bacalhôa Vinhos de Portugal está presente em 7 regiões vitivinícolas de Portugal, tendo uma aposta forte na Bairrada através da Caves Aliança adquirida em 2007, um dos produtores mais prestigiados dos espumantes e aguardentes, agora conhecido como Aliança Vinhos de Portugal. Por isto não é surpreendente o lançamento do novo vinho branco Bacalhôa 1931 Bical 2021, feito na Bairrada, surpreendente é o vinho em si.

A Quinta da Rigodeira, que pertence à Aliança, é localizada em pleno coração da Bairrada, entre Fogueira e Ancas e dentro do seu património vitícola possui uma parcela plantada em 1931, exclusivamente com castas brancas – Bical, Maria Gomes, Sercialinho, Cercial, Arinto, Rabo de Ovelha, Alicante e Chardonnay. De todas as castas o Bical pareceu mais interessante para fazer uma vinificação em separado, até porque já havia o histórico na quinta de a produzir como monovarietal.
Com produtividade muito reduzida, era pouquíssima a quantidade de uva que chegava à adega por dia. Tiveram que guardar no frio o mosto depois da cada prensagem para acumular a quantidade que desse para vinificar. Fizeram-se quatro vinhos: um totalmente em inox, duas barricas novas, duas barricas de segunda utilização e mais duas de terceira utilização para construir um lote final o mais complexo possível. O estágio durou um ano e depois de engarrafado em Setembro de 2022, o vinho ficou mais um ano em garrafa. A câmara de provadores da região atribuiu-lhe a designação Bairrada Clássico e fizeram-se apenas 2891 garrafas.

Os Moscateis da Bacalhôa são um caso à parte, com uma abordagem algo diferente da prática habitual na região. Para além da extensa maceração pelicular, que visa extrair mais aromas e até estrutura das películas das uvas, o vinho é submetido à variação térmica em estufa própria, com o objectivo de enriquecer mais a vertente aromática e concentrar açúcares e ácidos, resultando num produto final mais intenso e rico em todos os aspectos.
Mas antes de chegarmos a esta técnica, é importante mencionar que o Moscatel de Setúbal é um produto de terroir a 100%. A principal variedade é Moscatel de Alexandria, localmente conhecida como Moscatel de Setúbal. É uma casta de maturação tardia, plantada no solo argiloso e argilo-calcário das encostas da Serra da Arrábida virada a norte, por uma razão muito simples – todas as encostas viradas a sul, são escarpas – explica o coordenador da enologia da Bacalhôa Vasco Penha Garcia. Nestas condições, a uva normalmente é apanhada em Outubro, mas com 11-12% de álcool provável e ácidos bem presentes, o que acaba por garantir a frescura e contrabalançar o elevado teor de açúcar nestes vinhos generosos.
A casta Moscatel Roxo (uma mutação do Moscatel Galego) é uma uva rosada que amadurece cedo e é vindimada no início de Setembro. Produz vinhos generosos riquíssimos, mas há 20 anos estava em vias de extinção. A Bacalhôa Vinhos de Portugal, já tendo videiras dispersas desta casta em vinhas de Moscatel de Setúbal, promoveu o plantio das duas maiores vinhas de Moscatel Roxo da região.

MOSCATÉIS DE SONHO

O processo de vinificação é igual para ambos os vinhos e começa com uma breve maceração pelicular. A fermentação é interrompida com aguardente vínica de 77% (por opção da empresa, pois o regulamento dá liberdade de escolha de entre 52% e 86%). A maceração continua por vários meses, normalmente até à primavera. Durante este processo, a aguardente força a extracção, por isso não é raro sentir o tanino e um certo amargo que sensorialmente equilibra a doçura. Quando este processo finaliza com a prensagem e trasfega, começa uma nova fase em “estufa”, onde o vinho é submetido a uma amplitude térmica significativa. Na realidade, é uma variante do método de canteiro, utlizado na produção do Vinho da Madeira. A “estufa” da Bacalhôa é um armazém cuja construção com a cobertura baixa, permite grandes amplitudes de temperatura e humidade ao longo do ano. Assim, a temperatura varia de 56,7˚C em Julho até 5,6˚C em Janeiro e a humidade vai dos 100% na altura mais chuvosa até 10,9% no pico do verão. Neste armazém, os vinhos permanecem em pequenos barris de carvalho de 180 e 225 litros, muitos deles previamente usados para estagiar o vinho de Jerez e whisky de malte. Nunca sendo atestados, os vinhos demonstram uma grande concentração por evaporação.

Bacalhôa

É assim que são feitos o Moscatel de Setúbal 20 anos e Moscatel Roxo de Setúbal 20 anos. A designação Superior é atribuída quando um vinho, com mais de 5 anos de estágio, apresenta uma qualidade destacada. Existe mais uma particularidade que tem a ver com a visão da empresa – estes vinhos com indicação de idade, não representam um lote de vários anos. Na Bacalhôa, os Moscateis são sempre provenientes de um único ano, sendo este indicado no rótulo. Assim, o Moscatel de Setúbal 20 anos é de 2000 e o Moscatel Roxo de Setúbal 20 anos é de 2002. O produtor acredita que desta forma “conseguem proporcionar a pureza de um ano só”.

Este ano, em estreia absoluta foi apresentado o Bacalhôa Moscatel de Setúbal 40 anos de 1983, um licoroso de qualidade excepcional. Permaneceu os primeiros 20 anos da sua vida na Estufa nº 1 com grandes emplitudes térmicas e de humidade; em 2004 foi transferido para o Armazém das Selecções, com pé-direito mais alto, suavizando as variações da temperatura e promovendo, a partir deste ponto, um envelhecimento mais lento. Criou-se um vinho extraordinário, onde a riqueza e a concentração estão interligadas de tal ordem que o teor de açúcar de 324 g/l está em harmonia com a acidez de 8,1g/l e o pH 3,14 e o prazer sensorial que oferece está por cima de qualquer parâmetro técnico existente. Nesta edição ultra limitada foram para o mundo apenas 300 garrafas de 0,5L.

Quando será o próximo engarrafamento desta magnifica colheita de 1983, só o tempo dirá.

 

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)

Teixinha: o toque de Midas da Malhadinha

Albernoa, de todo, não era uma região ligada a vinho, mas a família Soares conseguiu, através do seu labor e exemplo e em estreita ligação com outros produtores entretanto chegados ao local, conferir a esta zona do Baixo Alentejo uma rápida mas notória visibilidade no panorama dos vinhos alentejanos. Desde 2020 os mais de 80 […]

Albernoa, de todo, não era uma região ligada a vinho, mas a família Soares conseguiu, através do seu labor e exemplo e em estreita ligação com outros produtores entretanto chegados ao local, conferir a esta zona do Baixo Alentejo uma rápida mas notória visibilidade no panorama dos vinhos alentejanos. Desde 2020 os mais de 80 hectares de vinha têm certificação biológica, e a Herdade da Malhadinha Nova é auto-suficiente em uvas para as suas diversas marcas.

Este é um projecto com forte carácter familiar. Os irmãos João e Paulo, com as respectivas cônjuges Rita e Margarete, dão a cara e o corpo ao manifesto, e envolveram até os seus filhos logo desde o princípio, com os desenhos infantis a ganharem vida nos rótulos dos vinhos, como hoje veremos os seus textos a ilustrarem os novos vinhos, de que vos falarei já a seguir. E não falo já, porque, entretanto, devo explicar a referência a Midas. É que a CEO Rita liderou o projecto da Malhadinha para encarar com enorme e reconhecido sucesso um outro desafio: tornar a herdade um apetecível destino de turismo de luxo. Vejamos, os Soares vieram do Algarve, onde não faltam atracções. Na Albernoa quais são as atracções? Simples, mas arriscado e complexo: a atracção é a própria Malhadinha, e a sua capacidade de atrair e entreter com grande qualidade os seus hóspedes. A grande gastronomia sempre foi um eixo, o enoturismo outro, e o resto é uma panóplia de actividades que inclui passeios de balão ou de moto4, a vivência dos animais da quinta, desde cavalos a abelhas, os workshops de pastelaria ou panificação, nem consigo listar tudo, vejam o site deles na internet. Autenticamente, os Soares colocaram Albernoa no mapa, com vinho, turismo, hotelaria. Fazem sustentabilidade, oferecem aos seus funcionários mais do que um salário, com recuperação de casas para eles viverem, ou oferecer suporte familiar. Praticar o bem, e receber em troca o sucesso de um negócio autenticamente criado do nada, apenas com origem na ambição e convicção de fazer bem. Todos os louvores para eles.

E agora vieram para Norte. Não muito para Norte, vieram do Baixo Alentejo para o Alto Alentejo. Em 2021 visitaram a Quinta da Teixinha, propriedade com 105ha no Parque Natural da Serra de São Mamede, a 700m de altitude. Encantaram-se com o sítio, onde ainda por cima havia já 4ha de vinha, e passadas três semanas estavam a fechar negócio. Segundo Rita Soares, “as características únicas de frescura e elegância dos vinhos da região de Portalegre são um grande complemento ao portefólio da Herdade da Malhadinha Nova.” A Quinta tem 2ha de vinha velha com Aragonez, Alicante Bouschet, Bical, Fernão Pires, Salsa e Tamarez, mais um hectare de Aragonez e outro de Roupeiro, ambos plantados em 2017. Vão ser plantados ainda mais 8ha de vinha, para juntar aos 80ha de floresta de cerejeiras, sobreiros e castanheiros centenários. Também aqui há várias casas, umas mais velhas do que outras, e um ambiente campestre que fascinou os Soares e os vai levar a investir também no turismo.

Os novos vinhos da Quinta da Teixinha tiveram apresentação em Lisboa, no elegante Círculo Eça de Queiroz, um jantar elaborado pela equipa de chefes da Malhadinha (Joachim Koerper, Cintia Koerper e João Sousa) e iluminado pelas belas canções de Ana Paula Russo e o pianista Pedro Vieira de Almeida (lá está, sempre a querer fazer bem). Por agora são dois brancos e dois tintos, 1500 garrafas do Roupeiro e 3000 do branco “field blend”, e 3000 garrafas do tinto e 1000 de outro tinto a que chamam “Tava”, uma pequena ânfora de terracota usada na vinificação. Os rótulos são ilustrados por evocações escritas pelas crianças da família, o que os torna mais ternurentos. Mas a sua leitura não é fácil, pelo que vou usar as suas cores para identificar inequivocamente os vinhos na nota de prova. Os vinhos têm enologia de Nuno Gonzalez e Luís Duarte, e em 2021 foram ainda vinificados e estagiados na Malhadinha Nova, com as uvas a serem transportadas em camiões frigoríficos. A qualidade, como era de esperar, é excelente. Não quero terminar com encómios, por isso menciono apenas um pormenor: todo o jantar foi acompanhado por água que veio da própria Quinta da Teixinha, 700m de altitude e pureza, que soube tão bem como os vinhos. Um mimo carinhoso para os convivas.

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)

Grande Prova Tintos do Douro: No reino da excelência

grande prova douro

Ao longo dos últimos anos temos vindo a constatar e a escrever nas páginas desta revista que a qualidade dos vinhos portugueses não tem parado de crescer ano após ano. A evolução dos vinhos brancos é absolutamente notória, num país que não dispunha, até há 20 anos, de brancos com verdadeira ambição. Mas o mesmo […]

Ao longo dos últimos anos temos vindo a constatar e a escrever nas páginas desta revista que a qualidade dos vinhos portugueses não tem parado de crescer ano após ano. A evolução dos vinhos brancos é absolutamente notória, num país que não dispunha, até há 20 anos, de brancos com verdadeira ambição. Mas o mesmo se diga quanto a outros tipos de vinhos, sendo que, nos tintos, temos mesmo qualidade e quantidade para rivalizar com os mais famosos países produtores.

Em todo o território português, independentemente das denominações de origem, se produz tinto de elevado nível, como se demonstra pelas altas classificações atribuídas pelas revistas da especialidade nacionais e internacionais a vinhos de norte a sul do país. Pois bem, mesmo neste meio de competitividade cerrada, onde cada região procura enaltecer as suas diferenças sem perder a qualidade, uma região teima em reinar, quando abordamos os topos de gama. Sim, falamos do Douro!
Com efeito, no final da avaliação de mais de quatro dezenas de tintos durienses topos de gama acabámos com uma certeza: nunca como agora apreciámos tão grandes vinhos numa única prova e, consequentemente, nunca como agora atribuímos um conjunto de classificações tão elevadas. O que pode explicar esta circunstância? Em primeiro lugar, a existência de muitos produtores da região totalmente familiarizados há décadas com os vários terroirs deste território inóspito que corre, a montante do rio, do Baixo Corgo até praticamente Espanha. Referimo-nos a produtores com notório zelo profissional que recorrem a assistência, muitas vezes de excelência, vitícola e enológica, e que conseguem ter o desafogo suficiente para um duro investimento em barricas e, muitas das vezes, longos estágios em garrafa com os inerentes custos de stock.

São produtores quase sempre ligados à terra, por vezes enólogos de profissão, outras vezes fazendo parte de terceiras e quartas gerações de vitivinicultores, que mantiveram o cultivo da vinha e, em algumas felizes situações, preservaram o grande património que são as (boas) vinhas velhas. É disso exemplo produtores familiares como a família Nicolau de Almeida (Quinta do Monte Xisto), Alves de Sousa (Quinta da Gaivosa), Roquette (Quinta do Crasto), Vieira de Sousa, Barros (Quinta Dona Matilde), Vasques de Carvalho (Velhos Bardos), entre dezenas de outros. Acresce, que a existência deste lote significativo de produtores justifica-se, também, pelo caso económico que a região vai conseguindo seguir, apesar das evidentes e crescentes dificuldades em escoar as grandes quantidades de uva produzidas (com a campanha de 2023 à cabeça). A este respeito note-se que, há já vários anos, que o Douro é a região vitivinícola com maior produção apta a vinho com denominação de origem protegida (DOP), com Minho e Alentejo a alguma distância.

grande prova douro

No final da prova de mais de 4 dezenas de tintos durienses acabámos com uma certeza: nunca como agora atribuímos pontuações tão elevadas.

 

CRIAÇÃO DE VALOR

Trata-se, já o escrevemos, de uma região com marca muito forte, associada a qualidade e requinte, de tal forma que os dados estatísticos são claros no sentido de que é uma das regiões que consegue mais valor no vector preço médio por litro (na restauração é evidente, só atrás do Algarve, fenómeno explicado pelo turismo a sul do país). Ora, este maior valor é muito bem-vindo numa região de dificílimo granjeio da vinha, marcado por grandes extensões de viticultura de montanha, e com baixas produções por videira (muitas vezes abaixo das 2 toneladas por hectare). Um topo de gama do Douro, como evidencia a nossa prova, pode, assim, custar facilmente €25€ ou €100, dependendo dos factores dos quais habitualmente o preço depende, ou seja, raridade, notabilidade e prestígio da marca, qualidade intrínseca, entre outros.
É certo que alguns dos vinhos de topo com valores actuais próximos dos €100, custavam, ainda há 20 anos (em alguns casos quando surgiram pela primeira vez no mercado), quatro ou cinco vezes menos. Mas até essa circunstância espelha bem a evolução da procura por esses tintos, parte pelos mercados internacionais, à qual não é alheia a admirável consistência da qualidade colheita após colheita dessas marcas. São vinhos de enorme carácter, com pergaminhos conquistados ao longo de algumas décadas, todos ao melhor nível do que se faz mundialmente. Referimo-nos a marcas que, nos anos ’90 ou no início do milénio, logo na primeira colheita nasceram sob o espectro de uma qualidade inegociável, casos, entre outros, de produtores como Quinta do Crasto, Quinta do Vale Meão, Pintas ou Poeira.

A par de produtores mais tradicionais, nas últimas dezenas de anos o Douro mereceu forte investimento nacional e estrangeiro (de França ao Brasil, passando pela Suíça e Angola), sendo actualmente vários os produtores com significativa dimensão que aqui operam, tais como Sogrape (uma das pioneiras a apostar forte na região, sobretudo com a compra das Caves Ferreira e Casa Ferreirinha), Bacalhôa/Aliança, passando pelo Esporão (Quinta dos Murças), sem esquecer as casas com tradição do Vinho do Porto, como a Symington, Quinta do Noval, Vallegre, Poças ou Rozès que também produzem excelentes tintos.

 

grande prova douro

Não há dúvidas que os vinhos de vinha e de parcela, vinhos luxuosos e de preço elevado, são a nova coqueluche do Douro.

 

VINHOS DE LUXO E DE PARCELA

Pois bem, os últimos tempos têm ainda sido marcados por uma “corrida ao excelso”, aproveitando os recentes bons anos agrícolas (excelente o 2021) e o conhecimento adquirido de cada vinha e parcela. Com efeito, hoje são vários os vinhos de produções limitadíssimas, que se distinguem do conceito de quinta privilegiando uma seleção minuciosa da fruta numa determinada vinha e mimando-a com os melhores cuidados possíveis. Com efeito, confrontamo-nos cada vez mais na região com o desenvolver de um mercado de luxo nos tintos do Douro. Esse aspecto é também visível noutras regiões do país, mas não encontramos fora do Douro tantos vários vinhos tintos acima dos €100 como nesta região.

Tintos de qualidade raramente antes vislumbrada, com produções entre as 1000 (por vezes menos) e as 5000 garrafas, elevando e engarrafando micro-terroirs particulares e distintos. À cabeça é o caso da nova edição da Série Terroirs pela Quinta do Noval que resulta de uma vinha muito particular da Quinta do Passadouro recentemente adquirida. O mesmo se diga para a Vinha do Rio (da Quinta Vale D. Maria) para a Vinha da Granja (do Vallado), a Vinha do Carril (da Niepoort), a parcela Carrapata (da Quinta da Romaneira) e parcela M7 (Quinta dos Muros), mas também a Vinha do Pinto (da Quinta Dona Matilde) ou a Vinha Rumilã (da Quinta de São Luiz). Isto para não falar de vinhos que, desde a primeira edição, sempre provieram de uma vinha só, caso do Pintas. Ou seja, não há dúvidas que os vinhos de vinha e de parcela são a nova coqueluche do Douro, que assim se juntam a outros vinhos onde o luxo (e o respectivo preço) já era evidente como seja o Quinta da Ervamoira ou o Chryseia. Confrontámos vários enólogos e produtores da região e todos dizem que a procura da vinha perfeita é um desafio quase diário. Jorge Moreira (Poeira, La Rosa, Real Comp.ª Velha) diz ter encontrado a sua junto a Covas (a partir da qual produz o seu limitado Poeira Vinha da Torre), Dirk Niepoort finalmente engarrafou a sua “jóia da coroa”, um vinha mesmo ao lado da sua adega, e a Wine & Soul acaba de comercializar mais um vinho de parcela, agora na Quinta da Manoella).

grande prova douro

 

Mas, mesmo com o que se acabou de escrever, não se pense que não existem grandes relações qualidade-preços nos tintos de topo de Douro. Com efeito, há muito que a região nos habituou a vinhos que, não sendo propriamente baratos, são relativamente acessíveis em ocasiões especiais e de qualidade irrepreensível. Nesta nossa prova também esses brilharam sempre num perfil de fruta bem madura e com potencial de largo estágio na garrafeira. Dos €14€ aos €30 há muito por onde escolher no Douro com a certeza de um tinto assente em castas como Touriga Nacional e Touriga Franca, eventualmente temperadas com Tinta Roriz ou Sousão, e tendencialmente com estágio em barrica de carvalho. São tintos de enorme prazer, com estrutura e dimensão, e que reflectem o xisto da terra que os viu nascer.

 

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)

 

 

 

Dar de beber ao molho

O que é um molho? É um adorno do palato, a alma de um prato ou a essência do sabor de uma criação culinária? As definições sucedem-se e raramente convergem para uma resposta única e consensual. E haverá sempre um vector não contemplado que podemos adicionar ao leque de respostas possíveis. Reformulei por duas vezes […]

O que é um molho? É um adorno do palato, a alma de um prato ou a essência do sabor de uma criação culinária? As definições sucedem-se e raramente convergem para uma resposta única e consensual. E haverá sempre um vector não contemplado que podemos adicionar ao leque de respostas possíveis. Reformulei por duas vezes este artigo, o assunto merece e todo o espaço editorial é exíguo para um tema pouco frequente e tão estruturante. Não sou cozinheiro e nunca me substituirei aos muitos profissionais de grande gabarito que povoam a cena restaurativa nacional, mas é inevitável uma breve incursão aos fundamentos e à história do molho culinário e seu papel na cozinha e na mesa. Escolho como luzeiro a definição do Larousse Gastronomique que diz que “de forma geral, chama-se molho a todo o acompanhamento líquido dos alimentos”. E assim liberto-me do preconceito clássico e demasiado redutor, para me juntar ao colégio dos “normais”, que tanto chama molho a um velouté como a um vinagrete.

Podemos fixar o início épico da aventura do molho em 1651, com a publicação do calhamaço intitulado “o cozinheiro francês” pelo gigante clássico François-Pierre de La Varenne. Muito do que se pratica em alta cozinha e conhece bebe ainda desse instante luminoso primordial. Devemos-lhe pelo menos a invenção dos “roux”, preparados culinários com farinha em vez de pão que depois vão estar na base de muitos fundos de cozinha e caldos, por sua vez integrados em declinações culinárias diversas. Mais tarde, já no séc. XIX, com Marie-Antoine Carême foram fixados quatro molhos fundamentais, que Auguste Escoffier já no séc. XX (1903) viria a categorizar em cinco grandes grupos: béchamel, velouté, espanhol, tomate e holandês, no totem em torno do qual o mundo continua a girar e que dá pelo nome de “Le Guide Culinaire”. O enorme salto técnico deu-se quando por efeito directo da Revolução Francesa a cozinha de palácio deixou de existir porque os seus obreiros foram dispensados. Ainda bem, dizemos nós porque foi isso que fundou a venerável actividade da restauração. A nobreza e a alta burguesia passaram a frequentá-la, em vez de ter cozinhas nas suas casas. O conhecimento democratizou-se e os códices foram trazidos para a luz do dia. Felizmente a arte culinária não se perdeu, antes permitiu que se desenvolvesse e ramificasse.

A estrutura de um molho tem basicamente três componentes e determina entre outras a vocação vínica de que vamos munir determinado prato. São elas a líquida, a aromática, e a espessante. A base é sempre líquida; um molho é essencialmente líquido, todos concordamos. Chamamos-lhes caldos ou fundos quando há cozedura conjunta de proteína, pedaços de carne ou peixe e verduras classificamos como claro quando a extracção – leia-se cozedura – é curta e escuro quando é prolongada. Os veloutés e os molhos de tomate enquadram-se nos fundos claros, enquanto o espanhol parte de um fundo escuro. O leite é muitas vezes a base líquida de molhos diversos, especialmente o bechamel, pela riqueza de sabor e pela reacção positiva ao calor. Também fundamental como componente líquida é a manteiga clarificada, que resulta da separação pelo calor da água e do soro do leite, concentrando a densidade e sabor. É ingrediente fundamental do molho holandês e a base culinária por exemplo dos ovos Bénedict.

Os aromáticos dividem-se em mirepoix – tipicamente cenouras, cebolas e salsa – e o chamado bouquet garni, pequenos aglomerados de talos de salsa, tomilho, louro e alho francês. Finalmente, os espessantes são instrumentais na afinação da textura de um molho. O principal ingrediente é, neste aspecto, o que conhecemos como roux – lê-se “ru” – e consiste de mistura em partes iguais de farinha e uma gordura, tipicamente manteiga. No tacho damos-lhe a cozedura de 2-3 minutos para ter roux branco, que utilizamos para chegar ao molho branco e ao bechamel. Qualquer deles nasceu para gratinar ou emulsionar e prefere vinho branco sem madeira a todos os outros. Muito bom com filetes de linguado no forno. Mais dois minutos de calor e passa a roux dourado, o segredo de um bom velouté e de tantos molhos básicos. Com 15 minutos chegamos ao roux castanho e acima disso entramos no roux exótico. Qualquer um pode ser feito com antecedência e guardado em quantidade no frio. Sangue, gema de ovo e amido de milho – Maizena – são espessantes eficazes. Descritos os fundamentos, avançamos para os cinco molhos mais importantes, agora descritos segundo o binómio ingredientes e harmonizações felizes.

 

O que fazer com este molho?

Molho Béchamel: Composto por leite, roux branco, ervas aromáticas e especiarias. Liga bem com ovos, legumes, peixe, frango, carnes vermelhas e massas. Gosta de Arinto sem madeira. de acidez pronunciada e de Fernão Pires com mais de três anos.
São diversos os pratos felizes com a assessoria deste molho, com a blanquete de vitela no topo da lista, seguida de muito perto por filetes de pescada, peixinhos da horta e bacalhau no forno. A pimenta rosa é um bom intensificador de sabor e consegue explorar com eficácia a maioria dos pormenores sem interferir demasiado no prato.
Molho de tomate: Composto por tomate, banha de porco, ervas aromáticas, roux branco, especiarias e mirepoix. Utiliza-se em diversas situações e é talvez o mais flexível de todos e geralmente pede mais vinho tinto que branco mas há que atentar à proteína dominante e ao “peso” tânico do vinho. A intuição e o processamento culinário contudo ditam o caminho a seguir. Entre as utilizações mais frequentes estão massas, pizas, todos os tipos de carne, pratos de tacho de peixe e cozinhas vegetarianas.

Molho holandês: Composto por gema de ovo, especiarias, manteiga clarificada e sumo de limão. Aproxima-se pacificamente de carnes vermelhas, ovos, peixe, frango e vegetais. Está no coração de clássicos como os ovos Bénedict e presta-se a muitas declinações. É, por exemplo o dip perfeito com peixinhos da horta, o mesmo é dizer tempuras na cozinha japonesa. Rega bem a parafernália marisqueira e é brilhante com leguminosas. Aceita vinhos encorpados brancos e tintos.
Molho velouté (aveludado): Composto por caldo de frango, roux dourado, ervas aromáticas e especiarias. Está na base de dezenas de molhos e é particularmente feliz em sopas. A tonalidade amarelada coloca-o na charneira entre carne e peixe e leva ao extremo os acompanhamentos com picles e picantes. Em matéria vínica, trabalha na perfeição com rosés com alguma idade e brancos fermentados em madeira. Presta-se além disso a montagens eficazes de cocktails e buffets. Pela acidez e mineralidade os brancos do Pico funcionarão bem.

Molho espanhol (espagnole): A cor retinta e carregada inspira desde logo a vocação para démi-glace. Composto por caldo de vitela, roux castanho, puré de tomate, mirepoix, ervas aromáticas e especiarias. Encontra parceiros fortes em carnes vermelhas, porco e borrego. Um carré assado fica automaticamente completa no palato em termos de nutrição. O rosbife à inglesa é outra vocação forte, assim como o bife grelhado ou o tornedó. Na cozinha de sala vinga bem todos os apetites carnívoros. Pede tintos vigorosos com acidez moderada.

Molho de tomate

E há mais, muito mais

Pegamos em óleo de sésamo ou azeite, juntamos vinagre ou limão, temperamos a gosto e temos o tempero de salada a que damos o nome de… molho vinagrete! Estamos fora do registo formal anteriormente descrito e ainda bem, que há vida para além da cozinha francesa! O molho de manteiga simples acrescentado ou não de mostarda está na base do molho cervejeiro mais frequente, que aceitamos como molho. Depois há todo um desfile de molhos que hotéis, cafés e tascas servem com orgulho e garbo a passantes e clientes habituais e com esses infelizmente bebe-se quase sempre cerveja. O tinto mais cervejeiro que conheço e por isso aconselho é o da casta Rufete produzido na Beira Interior.

Contribuem para essa extrema aptidão a pouca extracção na vinificação e a elevada acidez que a região prefigura. Certa vez em Londres provei um prato num restaurante de duas estrelas Michelin que constava de lavagante servido com molho diable – diabo em português – quando, sendo um molho castanho e denso, é normalmente servido com pratos profundamente carnívoros. Foi-me explicado que a estratégia passava pela textura, não tanto pelo sabor. A partir do momento em que absorvemos a teoria, temos mais capacidade de abordar novas situações e desafios.

A abordagem à cozinha vegetariana, por exemplo, representa para o chef de formação clássica um desafio grande que é desenvolver pratos sem proteína animal. Com isso, é bastante mais difícil estabelecer estratégias para chegar ao molho ideal. Os clientes gostam de ter molho no prato, quando não o encontram sentem-se perdidos, aprende-se na escola na formação superior que vai formar os chefs de amanhã. As cozinhas de inspiração oriental vulgarizaram o molho de soja na mesa e hoje não há peça de sushi ou sashimi que não se passe pela tacinha, resultando numa ingestão exagerada de sal e na consequente deturpação do sabor. As cozinhas de vanguarda aplicam muitos extractos e legumes fermentados que impossibilitam a ornamentação clássica com um molho. Os fundos de cozinha utilizados nas cozinhas de produção são não raras vez de fabrico em série e isso está a normalizar os palatos e a interromper a cadeia do gosto, impondo mais uma standardização. As ameaças estão por toda a parte e somos chamados a resistir e a ensinar os nossos filhos a discernir e escolher o caminho da autonomia.

Que nunca nos falte o molho nem o critério!

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)

Vinalda distribui vinhos da Herdade do Arrepiado Velho

A Vinalda estabeleceu um acordo com a Herdade do Arrepiado Velho, de Sousel, no Alentejo, para a distribuição exclusiva dos seus vinhos em Portugal e no mundo. Localizada a cerca de 40 km de Portalegre, a propriedade tem uma área de cerca de 100 hectares. A enologia é liderada por Filipe Perdiz e os vinhos […]

A Vinalda estabeleceu um acordo com a Herdade do Arrepiado Velho, de Sousel, no Alentejo, para a distribuição exclusiva dos seus vinhos em Portugal e no mundo.
Localizada a cerca de 40 km de Portalegre, a propriedade tem uma área de cerca de 100 hectares. A enologia é liderada por Filipe Perdiz e os vinhos tintos deste projeto são produzidos a partir das castas Touriga Nacional, Syrah, Petit Verdot e Cabernet Sauvignon. Nos brancos a escolha recai sobre a Antão Vaz, Chardonnay, Riesling, Viognier e Verdelho.
Neste projeto familiar, fundado por Isabel e Manuel Antunes, e agora liderado pela filha, Ana Antunes, quebram-se barreiras e ideias pré-feitas para a apresentação de vinhos únicos, sempre com a qualidade no topo das suas ambições. Sobre a nova parceria, a sua gestora diz que a opção foi feita porque acredita no potencial da Vinalda “e de toda uma equipa extremamente eficaz e profissional”.
“Não podíamos perder a oportunidade de a nossa empresa distribuir as marcas da Herdade do Arrepiado, pois produz vinhos distintos que expressam a versatilidade e frescura do terroir do norte alentejano”, explica, por seu turno, Bruno Amaral, administrador da Vinalda.

Anselmo Mendes e Mário Sérgio entram num bar…

corta fogo

Muitos momentos de conversa entre dois grandes amigos, circa 2019, originaram um grande vinho. Reza a lenda que foi numa caminhada nocturna, tarde e a más horas, que se “selou o negócio”. Anselmo Mendes, referência incontornável do Alvarinho de Monção e Melgaço, e Mário Sérgio Nuno, ícone da Bairrada, decidiram produzir um branco em conjunto […]

Muitos momentos de conversa entre dois grandes amigos, circa 2019, originaram um grande vinho. Reza a lenda que foi numa caminhada nocturna, tarde e a más horas, que se “selou o negócio”. Anselmo Mendes, referência incontornável do Alvarinho de Monção e Melgaço, e Mário Sérgio Nuno, ícone da Bairrada, decidiram produzir um branco em conjunto e à sua medida.

Para isso, o primeiro foi buscar o seu melhor Alvarinho, e o segundo o seu melhor Bical, ambos provenientes de parcelas especiais, “representativas do melhor que as regiões podem produzir”: a Vinha do Paço, na Quinta da Torre, em Monção — com solo de terraços fluviais e origem granítica — e a Vinha do Cabeço, na Quinta das Bágeiras — de solo argiloso com forte componente calcária — encaixaram que nem duas peças de puzzle. “Se não tivesse enólogo e pudesse escolher um, seria o Anselmo, sempre disse isto.

Há uma identificação não só no estilo de vinho, mas na parte humana. Crescemos os dois numa família de agricultores, e há muita coisa que temos em comum na nossa ‘meninice’”, confessou Mário Sérgio Nuno, na apresentação do Corta Fogo à imprensa. Na verdade, esta é a primeira vez que a Quinta das Bágeiras entra numa parceria deste género. “Eu nunca estive inclinado para este tipo de colaborações, porque o nosso projecto é muito focado em uvas próprias e na nossa região. Por isso, ao fazer um vinho ‘partilhado’, só poderia ser com o Anselmo, pela nossa afinidade”, desenvolveu o bairradino, nascido e criado na Fogueira, uma pequena aldeia da freguesia de Sangalhos, Anadia. Anselmo Mendes reiterou: “Pensámos, toda a gente se junta a fazer vinhos, porque não nós?”. O resto é história.

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Vindima da casta Bical na Quinta das Bágeiras.

A vinificação foi feita em separado, cada um na sua adega, mas da mesma forma, em barricas usadas de 400 litros no caso do Alvarinho, e de 500 litros no caso do Bical. O estágio foi de nove meses nas barricas, e depois juntaram-se os vinhos na adega de Anselmo Mendes, em Melgaço, para o engarrafamento em Junho de 2021. “Antes de chegarmos ao lote final, trouxemos várias hipóteses para cima da mesa, sobretudo para a mesa do Mugasa”, brincou Anselmo Mendes, referindo-se ao reconhecido restaurante de leitão, na Fogueira.

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Quinta da Torre (crédito hugo Pinheiro)

A escolha do Alvarinho por parte do monçanense, para integrar o lote do Corta Fogo, é óbvia. Mas Mário Sérgio Nuno poderia ter considerado outras castas brancas típicas da Bairrada, como Cercial ou Maria Gomes. Então, porquê Bical? “Porque, para ser com uma uva branca rainha da Bairrada, para mim teria de ser esta. Por exemplo, face à Maria Gomes, acho que a Bical daria sempre mais estrutura ao vinho”, explicou o produtor. “Eu já contactei de forma próxima com a Bical, e é uma casta que tem imensa personalidade. Em prova cega, consigo sempre dizer onde está a Bical”, completou Anselmo Mendes, que dá apoio enológico ao projecto bairradino Kompassus.

Quanto ao nome, Corta Fogo, Mário Sérgio Nuno não se retraiu ao invocar alguma emoção. “Primeiro, fogo tem que ver com Fogueira. Depois, uma linha de corta fogo pode significar muita coisa, nomeadamente um caminho que estreita laços de amizade. Uma linha de equilíbrio. Além disso, ‘corte’ pode ser sinónimo de ‘lote’. Há várias interpretações possíveis”. E avançou, convicto: “Com este vinho, queríamos também fazer algo pelo vinho português. Se há algo que eu aprendi com as minhas viagens, sobretudo a França, é que temos de fazer alguma coisa por nós, enquanto país produtor. Mostrar ao mundo o que pode ser o vinho português. Lá fora dizem-me que os meus vinhos de 20 euros são mais caros que os de 100 de qualidade equivalente. E esta é uma percepção que temos de alterar. Um vinho como este pode ser um contributo”.

O Corta Fogo, de apenas 2622 garrafas, é, acima de tudo, um branco com a ambição e genuinidade dos seus criadores. “Isto não nasceu de um grande ‘business plan’, nem houve aqui um plano de marketing elaborado, a pensar que íamos fazer um grande negócio por nos juntarmos num vinho”, esclareceu Anselmo Mendes. Conhecendo a dupla, é fácil perceber que é assim mesmo. Um vinho que surgiu da vontade de dois amigos com os mesmos valores, inspirado nas vivências de quem ouviu muitas estórias dos avós à lareira.

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)

Prémios Grandes Escolhas «Os Melhores do Ano» dia 1 de Março no Estoril

Como habitualmente, prevê-se que centenas de convidados possam assistir ao vivo o anuncio das escolhas da redacção da revista Grandes Escolhas dos vinhos e das personalidades, empresas, instituições e profissionais da área dos vinhos e da gastronomia em Portugal. No que se refere aos vinhos, a grande espectativa é mais uma vez revelar o Top […]

Como habitualmente, prevê-se que centenas de convidados possam assistir ao vivo o anuncio das escolhas da redacção da revista Grandes Escolhas dos vinhos e das personalidades, empresas, instituições e profissionais da área dos vinhos e da gastronomia em Portugal. No que se refere aos vinhos, a grande espectativa é mais uma vez revelar o Top 30, aqueles que o conjunto de provadores e críticos da Grandes Escolhas consideram serem os 30 melhores vinhos absolutos provados durante o ano 2023, e dentro destes, qual o melhor espumante, o melhor vinho branco, rosé, tinto e fortificado. Ainda nos vinhos são também anunciados os melhores em cada região, aquilo que a revista designa como “Os Melhores de Portugal”.

 

 

Já no que se refere aos Troféus Grandes Escolhas, serão anunciados no final do jantar os 20 Prémios Especiais, cobrindo as áreas da viticultura, da enologia, da performance dos produtores e das empresas, com assim como sommeliers e restaurantes. Em qualquer destes domínios a equipa da Grandes Escolhas escolhe por consenso os premiados que mais se distinguiram no ano transacto nas seguintes categorias:

Produtor Revelação

Produtor

Cooperativa

Empresa

Empresa de Vinhos Generosos

Produtor Singularidade

Enólogo

Enólogo de Vinhos Generosos

Viticultura

Organização

Enoturismo

Garrafeira

Loja Gourmet

Wine Bar

Restaurante

Restaurante Cozinha Tradicional

Restaurante Cozinha do Mundo

Sommelier

Premio Gastronomia David Lopes Ramos

Senhor/a do Vinho

 

Toda a cerimonia vai poder ser seguida por transmissão em directo através das plataformas digitais.

Três séculos de Alorna

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Para celebrar 300 anos de vida, o produtor de vinhos da região do Tejo preparou especialmente 712 garrafas do vinho “Quinta da Alorna 1723 Grande Reserva tinto”, que será disponibilizado em edição limitada num belíssimo conjunto comemorativo, juntamente com o livro “Da Índia ao Tejo, do Tejo para o Mundo: 300 anos da Quinta da […]

Para celebrar 300 anos de vida, o produtor de vinhos da região do Tejo preparou especialmente 712 garrafas do vinho “Quinta da Alorna 1723 Grande Reserva tinto”, que será disponibilizado em edição limitada num belíssimo conjunto comemorativo, juntamente com o livro “Da Índia ao Tejo, do Tejo para o Mundo: 300 anos da Quinta da Alorna”, da autoria da jornalista Maria João de Almeida, com prefácio do Professor António Barreto.
A Quinta da Alorna foi fundada em 1723 por D. Pedro Miguel de Almeida e Portugal que, após ter conquistado a Praça Forte de Alorna, na Índia, regressou a Portugal e recebeu do Rei D. José I o título de Marquês de Alorna, concedendo à propriedade o nome que ainda hoje mantém. Poucos anos depois, em 1725, mandou construir o imponente Palácio, que sobrevive até aos nossos dias e cuja imagem está representada no logótipo da Quinta.
A Quinta da Alorna permanece na família Lopo de Carvalho desde há cinco gerações, após ter sido adquirida pelo Dr. Manuel Caroça em 1918 aos herdeiros do Visconde da Junqueira que, por sua vez, a havia adquirido, em finais do Século XIX, às filhas da 4.ª Marquesa da Alorna, D. Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre. Foi uma das mulheres mais cultas da sua época e a primeira escritora pré-romântica em Portugal. Mulher de letras, muito ligada à cultura e à política, e com influência junto das Cortes portuguesa e europeias, deve-se à sua persistência junto da Rainha D. Maria I, a abertura da primeira escola feminina em Portugal. Empresta o seu título aos vinhos premium da Casa.

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Martta Reis Simões, responsável de enologia.

A tradição vinícola da Quinta da Alorna remonta praticamente à data da sua fundação, tendo sido nessa altura que foram plantadas as primeiras vinhas, juntamente com pomares, jardins de amoreiras, florestas e oliveiras, adicionando pontes levadiças, lagos e buxos, copiando o modelo francês, tão em voga entre as elites europeias da altura.
No entanto, foi apenas no início do Século XX que a produção de vinho foi encarada de maneira mais profissional, embora sempre como fazendo parte do todo universal em que consiste a “Alorna”.
A “Alorna” é hoje 2600 hectares ao longo de 16 quilómetros de comprimento, dos quais 1900 hectares são de floresta, inclusive com árvores centenárias que datam da época de D. João, filho do primeiro Marquês de Alorna, 500 hectares de área agrícola onde são produzidos azeite, cereais e horto-frutícolas, e 180 hectares de vinha. A casa também se orgulha bastante do seu Centro Equestre, com cavalos puro sangue lusitano, e é, inquestionavelmente, uma parte integrante da história da região, das antigas casas aristocráticas do Ribatejo, com as explorações agrícolas ligadas à terra, às gentes, aos cavalos e à tradição.

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Pedro Lufinha, Director Geral da Quinta da Alorna.

Quando em finais do Século XVIII os Marqueses de Alorna se deslocavam até Almeirim faziam-no de barco, Tejo acima, demorando uma noite inteira desde Lisboa, onde à chegada uma carruagem da casa prontamente aguardava para os levar alameda acima até ao Palácio. No passado dia 26 de Outubro chegamos à Quinta da Alorna pela Estrada Nacional, mais rápido é certo, mas com menos glamour todavia, passamos o imponente portão e atravessamos a mesma alameda que nos conduziu ao Palácio, onde nos esperavam Pedro Lufinha e Martta Reis Simões, director geral e enóloga, respectivamente, da Quinta da Alorna.

 

 

 

 

Oferta muito consistente

A festa que assinalou o 300.º aniversário da Quinta da Alorna decorreu nos jardins do Palácio e juntou mais de 150 convidados, contando com a presença de figuras ilustres do sector que se reuniram para brindar ao legado, impacto e história da Quinta da Alorna. A maior parte das vinhas da Quinta da Alorna encontra-se em área de charneca, na margem esquerda (Sul) do Tejo, em zonas de planície e planalto, onde se percebem claramente os solos de calhau rolado e areia, nada homogéneos, passando a areia pobre em apenas poucos metros. As vinhas mais antigas encontram-se precisamente nestas zonas. No entanto, Martta Reis Simões, enóloga na Quinta da Alorna desde 2003 e directora de enologia desde 2010, decidiu também apostar recentemente nos solos de transição, localizados junto ao palácio.
Nos vinhedos da Alorna existem 19 castas, portuguesas e internacionais, sendo as mais emblemáticas e representativas a Castelão, a Touriga Nacional, a Cabernet Sauvignon, a Alicante Bouschet, Fernão Pires, Arinto, Chardonnay e Sauvignon Blanc. A produção anual da Quinta da Alorna é de dois milhões de garrafas das quais se exportam 50%, divididas por 23 países.
Os vinhos da Quinta da Alorna são muito consistentes e bem representativos do carácter da região, como bem tivemos oportunidade de comprovar durante o cocktail que precedeu a apresentação do tão aguardado “1723”. Foram servidos os Reserva Alorna Alvarinho/Viognier 2021 e Alorna Arinto/Chardonnay 2022 para uns tacos de peixe no forno, almendrados de brie e cremoso de pêra, brigadeiros de alheira com espinafres e sementes de sésamo, mini cones de queijo da serra, mel e figo, entre outras iguarias, e o Reserva Alorna Touriga Nacional/Cabernet Sauvignon 2019, em garrafas magnum, para uns croquetes de rabo de boi com maionaise trufada, tiborna de perdiz em escabeche, maçã e agrião e espetadinhas de cordeiro com molho tandoori.

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Um vinho de celebração

E o momento mais importante da noite chegou com o Quinta da Alorna 1723 Grande Reserva tinto 2019. Este tinto comemorativo surge da chamada “Vinha do Planalto”, onde as castas Tinta Miúda, Castelão e Alicante Bouschet exibem a sua verdadeira essência, patente num vinho que sobressai pela sua elegância e carácter do princípio ao fim.
Foi feita vindima manual em caixas de 18 kg, seguindo-se selecção em mesa de escolha para tanques horizontais abertos de 500 Kg a simular lagares. A fermentação iniciou-se com cacho inteiro como se de uma maceração carbónica se tratasse, iniciando-se assim uma fermentação intracelular para promover a fruta. As uvas foram desengaçadas a 2/3 da fermentação, pisa a pé até final, seguindo para prensa vertical. Individualmente, o vinho de cada casta estagiou durante 10 meses em barricas de carvalho francês usadas anteriormente para o Marquesa de Alorna tinto 2016. O vinho foi engarrafado a 18 de Novembro de 2020.
Seguiu-se o jantar volante, onde começou por ser servido um creme de couve flor caramelizado com cogumelos e crocante de presunto, devidamente acompanhado pelo Quinta da Alorna Reserva das Pedras Branco 2018, um 100% Fernão Pires em solo de calhau rolado, que se apresentou delicado no nariz, com aromas de flores brancas, notas de limão e fruta de caroço, bom volume de boca, revelou desde logo o seu carácter gastronómico, com boa textura e bem suportada pela acidez, final de boca longo e marcadamente mineral.
Não poderia faltar os Marquesa de Alorna Grande Reserva, branco e tinto, servidos em garrafas magnum, o branco de 2021 acompanhando salmão selvagem com arroz negro, espinafres e molho de alcaparras, revelando enorme finesse, equilíbrio e frescura, enquanto que, a sua versão tinta, de 2019, acompanhou uma bochecha de vitela estufada com esmagada de batata, bacon, acelgas salteadas e cebola pérola, demonstrando um perfil sofisticado, exuberante e convidativo, mas sempre com grande requinte. Finalizou-se com um Colheita Tardia Tinto 2015 e um Abafado 5 anos, para acompanhar doçaria a condizer.
E assim, terminada a noite de celebração do tricentenário da Quinta da Alorna, voltámos a atravessar a alameda que nos havia conduzido ao Palácio, mas desta vez em sentido inverso, que nos conduziu de volta à Estrada Nacional… e de regresso a Lisboa.

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2023)