Editorial Abril: Brancos de tintas

Editorial da edição nrº 96 (Abril de 2025) Vinhos brancos de uvas tintas não é coisa nova. Os franceses fazem-no há séculos para espumantes e, nomeadamente, para os Champanhe, onde a designação blanc de noirs é sinónimo de espumante branco feito exclusivamente de Pinot Noir e Pinor Meunier. Também em Portugal os espumantes brancos elaborados […]
Editorial da edição nrº 96 (Abril de 2025)
Vinhos brancos de uvas tintas não é coisa nova. Os franceses fazem-no há séculos para espumantes e, nomeadamente, para os Champanhe, onde a designação blanc de noirs é sinónimo de espumante branco feito exclusivamente de Pinot Noir e Pinor Meunier. Também em Portugal os espumantes brancos elaborados a partir de uvas tintas obtiveram assinalável sucesso, desde logo com a casta Pinot Noir a demonstrar uma capacidade surpreendente para, num clima quente como o nosso, originar grandes bases de espumante (já quando aqui vinificada em tinto, o resultado é muitas vezes inconsistente ou decepcionante). Mas também em casas como Murganheira ou Vértice, variedades nacionais como Touriga Nacional, Tinta Roriz ou Touriga Franca, a solo ou em blend com uvas brancas, são desde há muito usadas para elaborar excelentes espumantes.
O maior sucesso nesta área será certamente o da variedade Baga, que na Bairrada começou a ser ensaiada como base de espumante ainda nos anos 90 e a partir de 2015 deu origem a uma categoria regulamentada e certificada – Baga@Bairrada – que conquistou o mercado. Hoje são cerca de 31 as empresas da região a produzir Baga@Bairrada e mais se juntam a cada ano que passa. A Baga vinificada em branco constituiu uma espécie de 5 em 1: criou um negócio que não existia anteriormente, contribuindo para o crescimento do espumante Bairrada; lançou uma marca institucional que associou uma casta a uma região; aumentou a rentabilidade do produtor – uma vinha de Baga para espumante pode produzir o dobro sem afectar a qualidade; desviou da vinificação em tinto as uvas Baga menos capazes, elevando a qualidade média dos tintos Bairrada; e veio suprir a carência de uvas brancas, permitindo que estas fossem melhor aproveitadas e valorizadas.
O trajecto dos brancos de tintas em vinhos tranquilos é bem mais recente. Entre nós, o caso de estudo (diria que a nível mundial) é o Invisível, um branco de Aragonez produzido no Alentejo pela Ervideira. O vinho imaginado pelo produtor Duarte Leal da Costa foi criado na colheita de 2009, tendo-se enchido 9 mil garrafas. Da colheita de 2024, agora lançada, fizeram-se 135 mil garrafas, vendidas ao preço médio de €14. A próxima colheita será de 150 mil garrafas. O sucesso do Invisível deve-se, sobretudo, a dois aspectos: a consistência qualitativa e o factor diferenciador, sendo distinto na cor, aroma e sabor de qualquer vinho branco. Na senda do Invisível, ainda que em volumes muito inferiores, temos hoje quase duas dezenas de brancos de tintas tranquilos oriundos de todo o país. Confesso que não sou grande fã de brancos de tintas, sinto sempre que lhes falta a componente citrina que aprecio nas uvas brancas, mas reconheço a qualidade e, até, como já comprovei no Invisível, a versatilidade à mesa e longevidade.
O que me leva à grande questão: o que buscamos quando fazemos um branco de tintas? Se a ideia é marcar pela originalidade, então deverá ser o mais diferente possível de um branco “normal”. Mas existe um outro caminho, que pode e deve funcionar em paralelo com este, e que é imposto pela necessidade. Hoje, em regiões como Alentejo, Douro ou Dão, temos uvas tintas a mais e brancas a menos, um desequilíbrio que as tendências de consumo vão continuar a acentuar. Não deveríamos, sobretudo para os brancos mais simples, procurar que as uvas tintas, misturadas ou não com brancas, viessem suprir essa carência, como algumas casas já estão a fazer, discretamente, no Dão? Isso implica uma abordagem totalmente distinta: tentar fazer de um branco de tintas um vinho em tudo semelhante a um branco de brancas. Um enorme desafio, sem dúvida, para quem orienta a vinha e a adega. L.L.
Casa Américo Wines lança primeiro vinho resíduo zero

A Casa Américo Wines lançou recentemente, no mercado, o seu primeiro vinhos com a certificação resíduo zero pela ZERYA®, o Vinha dos Púcaros Touriga Nacional Resíduo Zero, após ter alcançado a primeira certificação ibérica Resíduo Zero, pela mesma entidade, para a vinha da Quinta do Paço na Serra da Estrela. A certificação foi o resultado […]
A Casa Américo Wines lançou recentemente, no mercado, o seu primeiro vinhos com a certificação resíduo zero pela ZERYA®, o Vinha dos Púcaros Touriga Nacional Resíduo Zero, após ter alcançado a primeira certificação ibérica Resíduo Zero, pela mesma entidade, para a vinha da Quinta do Paço na Serra da Estrela.
A certificação foi o resultado do trabalho das equipas de viticultura e enologia da empresa, lideradas por Luís Sousa e Pedro Pereira, respectivamente, que selecionaram um lote de Touriga Nacional para primeiro vinho resíduo zero da empresa, da vinha da Quinta do Paço
Na Casa Américo Wines todas as vinhas são geridas segundo o método de produção integrada, complementado, na produção deste primeiro vinho, por formas adequadas ao desenvolvimento das plantas que garantem que as uvas têm zero resíduos de pesticidas (abaixo de 0.01 mg/kg). Isso contribui para que a fauna e flora indígena da vinha que lhes dá origem se desenvolva mais, incluindo as leveduras essenciais à vinificação. “A enologia tem de entender bem as uvas para transpor, para o vinho, todas as características que o resíduo zero transmite lhes transmite”, realça Pedro Pereira.
Na adega, para além do processos que garantam a expressão do carácter e da qualidade potencial destas uvas, a produção de vinho com zero pesticidas obriga a serem seguidos procedimentos operacionais para não haver qualquer contaminação.
Para manter o equilíbrio entre a procura da sustentabilidade do seu ciclo produtivo e os valores da marca, a Casa Américo optou também por engarrafar o vinho numa embalagem leve, de 440 gramas, retirar os acabamentos em ouro do rótulo e reforçar o seu aspeto táctil com uma textura pronunciada que o torna multissensorial.
Enoturismo: Casa Ermelinda Freitas

Na costa ocidental da Península Ibérica, envolta pela serenidade do Atlântico e pelos braços tranquilos do Rio Sado e do Tejo, encontra-se a fascinante Região Vitivinícola de Setúbal. Este local, onde a natureza se encontra em estado bruto com a engenharia humana das vinhas, conta uma história que transcende gerações e possui uma profundidade filosófica […]
Na costa ocidental da Península Ibérica, envolta pela serenidade do Atlântico e pelos braços tranquilos do Rio Sado e do Tejo, encontra-se a fascinante Região Vitivinícola de Setúbal. Este local, onde a natureza se encontra em estado bruto com a engenharia humana das vinhas, conta uma história que transcende gerações e possui uma profundidade filosófica inigualável.
Dominando a paisagem, a Serra da Arrábida ergue-se imponente com seus relevos calcários, formando um microclima que protege as vinhas dos ventos atlânticos. As encostas ensolaradas da serra oferecem drenagem natural, enquanto os solos pedregosos, ricos em calcário, conferem “mineralidade” às uvas. Essa é a morada de vinhos com estrutura e frescor, marcados pela influência direta do mar.
Ao sul e a leste, as planícies arenosas da Península de Setúbal estendem-se como um manto dourado. Esses solos pobres em nutrientes, mas com excelente capacidade de retenção térmica, favorecem a casta Moscatel, que encontra nesse terroir o segredo de sua doçura e intensidade aromática. Nas áreas mais baixas, solos argilosos e aluviais, enriquecidos pelos rios Sado e Tejo, sustentam vinhas robustas, com produção equilibrada.
A Região Vitivinícola de Setúbal, com sua paisagem única e clima privilegiado, é um verdadeiro santuário para os amantes do vinho, mas também para os que procuram compreender a relação intrínseca entre a terra e o produto que dela surge. O terroir da Península de Setúbal, influenciado pelas brisas frescas do oceano Atlântico e pelas condições climáticas amenas da região, é um espelho da complexidade do seu caráter. Aqui, a terra não é apenas um suporte para as vinhas, é um elemento ativo, capaz de se comunicar com a tradição e a inovação através da viticultura.
Persistência e paixão
Na sua essência, a paisagem de Setúbal é uma ode à persistência e à paixão. As videiras, com raízes que se estendem profundamente na terra rica e fértil, representam a ligação visceral entre o homem e a natureza. Aqui, o ato de vinificação é elevado a uma forma de arte, em que cada cacho de uvas é tratado com um respeito quase reverencial. O trabalho exaustivo dos viticultores, muitas vezes ao ritmo das estações, encapsula uma filosofia de vida onde o tempo é medido não por segundos, mas por colheitas.
A produção de vinhos na região é também um diálogo constante entre a tradição e a inovação. As vinhas antigas, que carregam o peso de séculos de saber acumulado, coexistem harmoniosamente com novas práticas e técnicas que aperfeiçoam e realçam a qualidade dos vinhos. Este equilíbrio delicado reflete a busca humana pelo progresso, enquanto se mantém firme nas suas raízes culturais e históricas.
A região é muito conhecida pelo famoso Moscatel de Setúbal, vinho generoso e doce que é uma prova tangível desta união. Cada gole deste néctar traz consigo, não só os sabores complexos das uvas, mas também as histórias dos que, ao longo de gerações, dedicaram suas vidas à perfeição desta arte. A sua complexidade e profundidade convidam-nos a refletir sobre a própria natureza da criação humana e sobre a forma de extrair a beleza e a harmonia dos elementos mais simples e fundamentais da vida.
O viticultor não apenas extrai da terra, mas também se torna parte de um ciclo contínuo, onde o respeito pela natureza e a preservação da tradição tornam-se princípios fundamentais. Ao mesmo tempo, as inovações nas técnicas de vinificação, a adaptação às mudanças climáticas e a introdução de novas variedades de uvas são desafios constantes que os produtores locais enfrentam, com um diálogo com o tempo que é construído sem perder a alma do que se cultivou nas colinas e encostas ao longo de tantos anos.
Mas a magia da Região Vitivinícola de Setúbal não se limita aos seus vinhos. A região é um microcosmo da diversidade biológica e da beleza natural. A planície, as colinas ondulantes, os vales verdejantes e a proximidade com o mar criam um ecossistema único que se reflete na singularidade dos seus vinhos. Cada elemento da paisagem contribui para a sinfonia de aromas e sabores que os vinhos de Setúbal proporcionam, transformando, cada garrafa, numa expressão pura e autêntica do terroir. É mais do que apenas um local de produção de vinhos. É um espaço de contemplação e conexão. Convida-nos a desacelerar, a apreciar o ritmo natural da vida e a encontrar significado nas tradições e nas práticas que definem a nossa humanidade.
Neste canto especial de Portugal, a vinha e o vinho não são apenas uma indústria, mas uma manifestação filosófica do tempo, do trabalho e da beleza inerente à interação entre o homem e a terra. Desta forma, ao degustarmos um vinho da Região Vitivinícola de Setúbal, participamos numa jornada que transcende a mera experiência sensorial. Tocamos na própria essência do que significa ser Humano: criar, preservar e encontrar significado nas pequenas maravilhas do mundo ao nosso redor.
Sabores sentidos
Entre o azul profundo do Atlântico e as colinas da Arrábida, a Península de Setúbal guarda segredos que se revelam à mesa. Aqui, a gastronomia é mais do que alimento: é memória, é identidade, é poesia em forma de sabor.
O mar conta a sua história em tons prateados: chocos, robalos, e o célebre salmonete, de carne delicada e sabor inconfundível. Mas é o choco frito que conquista corações — simples, dourado, e envolto num aroma que mistura tradição e mar bravio. A cada dentada, sente-se o sal das ondas e o calor das cozinhas que atravessam gerações.
Ao longe, as vinhas que se vislumbram por toda a região estendem-se como um tapete verde banhado pelo sol generoso. Nos campos soalheiros de Palmela e Azeitão, as vinhas tecem lendas. O Moscatel de Setúbal, com sua doçura envolvente e notas de mel e laranja, é um poema à paciência do tempo. Ao lado, os tintos robustos, com aromas de frutos vermelhos e um toque de especiarias, contam histórias de solos generosos e mãos dedicadas. Já os vinhos brancos, frescos e vibrantes, surpreendem com notas cítricas, florais e um leve toque mineral, ecoando a brisa do Atlântico e a pureza das manhãs luminosas da serra.
Nesta região não se vive apenas de pratos e vinhos, vive-se também de encontros. Nas tascas escondidas ou nos restaurantes à beira-mar, o convívio é o verdadeiro ingrediente secreto. É ali, entre risos e partilhas, que o sabor se torna experiência e a comida filosofia, uma celebração do presente com o respeito pelo passado.
E há a serra, cúmplice e silenciosa, que oferece queijos aveludados, mel dourado e ervas aromáticas que perfumam ensopados e caldeiradas. Sabores rústicos, simples, e, por isso mesmo, profundamente humanos.
A harmonia entre a comida e o vinho é filosofia vivida – um convite à contemplação. O queijo de Azeitão, cremoso e intenso, encontra no Moscatel um par perfeito, numa dança de contrastes que se completam. E, sob o céu dourado do entardecer, cada brinde é uma prece ao prazer de existir.
A gastronomia da Península de Setúbal é, assim, um convite à contemplação. Não se resume ao que se come, mas ao que se sente. É prova de que o verdadeiro prazer mora na fusão do paladar com a alma. Pois, como disse o poeta, “comer é uma necessidade, mas saborear… ah, saborear é uma arte!”, cada prato é uma história e cada gole uma promessa. O que se prova à mesa permanece para sempre no coração.
Como sou um eterno apaixonado, a visita à Península de Setúbal enquadra-se na perfeição no périplo que tenho vindo a fazer para encontrar a minha felicidade vínica e gastronómica e partilhar com os nossos leitores… A minha decisão foi obvia e rápida, pois sempre desejei conhecer a Casa Ermelinda de Freitas e a sua história.
À frente do seu tempo
A Casa Ermelinda Freitas fica na aldeia de Fernando Pó, concelho de Palmela, a 25 quilómetros a leste de Setúbal, e é bem visível à distância, pela presença imponente da nova adega, que se ergue no mar de vinhas da planície em seu redor.
É uma adega familiar com uma história que remonta a 1920. Fundada por Leonilde Freitas, continuada pela sua neta, Germana Freitas, e mais tarde pela sua bisneta, Ermelinda Freitas, a quem a Casa Ermelinda Freitas deve o seu nome. Com a morte prematura do seu marido, Manuel João Freitas, Ermelinda Freitas continuou a gerir a empresa com a sua filha, Leonor Freitas, que assumiu o seu comando e consolidou a liderança da casa no feminino, característica da marca. Destacando-se pela dedicação à produção de vinhos de qualidade, a Casa Ermelinda Freitas tornou-se uma referência na região de Palmela, com inúmeras distinções nacionais e internacionais. Sob a liderança de Leonor Freitas, desde 1997, a adega manteve a tradição familiar, investindo em inovação e expandindo a sua presença em mercados globais, sempre com o compromisso de preservar o legado iniciado por Leonilde Freitas. A empresa, que tem sido gerida por mulheres ao longo de quatro gerações, tem o futuro assegurado pela 5ª geração, Joana Freitas.
Sob a direção de Leonor Freitas, a Casa Ermelinda Freitas passou por uma transformação significativa, modernizando as técnicas de viticultura e enologia e expandindo a área de vinha para os atuais 550 hectares. A adega é reconhecida pela produção de vinhos de alta qualidade, tendo recebido inúmeros prémios nacionais e internacionais.
A filosofia da Casa Ermelinda Freitas assenta na combinação da tradição com a inovação. A empresa valoriza as castas autóctones da região, como a Castelão e a Fernão Pires, enquanto incorpora práticas sustentáveis e tecnologia avançada na produção de vinhos. Este equilíbrio entre o respeito pelo legado e a adaptação às exigências contemporâneas reflete uma abordagem consciente e responsável perante a cultura vitivinícola.
A dedicação à qualidade e à autenticidade dos seus vinhos é evidente na diversidade do portefólio da Casa Ermelinda Freitas, que abrange desde vinhos tintos encorpados a brancos frescos e aromáticos, passando por rosés elegantes e espumantes distintos. Esta variedade permite, aos apreciadores de vinho, uma experiência rica e multifacetada, evidenciando o potencial e a versatilidade da região de Palmela.
Hoje, a Casa Ermelinda Freitas é um vasto poema esculpido na terra, com 550 hectares de vinhas que contam histórias em cada casta. Ali, 60% da “alma” brota do Castelão, enquanto 20% dança nas nuances de tintas como Touriga Nacional, Trincadeira, Syrah, Aragonês, Alicante Bouschet, Touriga Franca, Merlot, Petit Verdot, Pinot Noir, Petite Sirah e Carmenère, castas que tingem o tempo com profundidade e mistério.
Nos outros 20%, brilha o reflexo da luz em uvas brancas: Fernão Pires, Chardonnay, Arinto, Verdelho, Sauvignon Blanc, Moscatel de Setúbal, Viosinho, Encruzado, Alvarinho, Pinot Grigio, Viognier, Vermentino e Gewürztraminer. Trinta castas, trinta vozes que entoam, em coro, a essência viva da Casa Ermelinda Freitas, onde a tradição se entrelaça com o sopro eterno da terra, superiormente orquestradas pelo enólogo Jaime Quendera.
A Casa Ermelinda Freitas exemplifica como uma empresa familiar pode prosperar através da harmonização entre tradição e inovação, mantendo um compromisso inabalável com a qualidade e a sustentabilidade. A sua trajetória ilustra a importância de uma liderança visionária e da valorização das raízes culturais na construção de uma marca reconhecida e respeitada no panorama vinícola global.
A Senhora…
Leonor Freitas, proprietária da prestigiada Casa Ermelinda Freitas, é mais do que apenas uma empresária de sucesso. É uma visionária cuja paixão transcende o mundo do vinho que a rodeia, cuja honestidade intelectual e humanidade se refletem em cada garrafa de vinho produzida pela sua adega. Com uma dedicação inabalável à sua terra e às suas gentes, Leonor personifica o espírito da Península de Setúbal, uma região rica em tradição e cultura.
Desde muito jovem, Leonor demonstrou um profundo respeito pelo legado da sua família, com raízes vitivinícolas que remontam a várias gerações. Ao assumir as rédeas da adega, não apenas continuou o trabalho iniciado pelos seus antecessores, mas também trouxe uma nova perspetiva e inovação ao setor. A sua visão era clara: elevar a qualidade dos vinhos portugueses e colocá-los num patamar de reconhecimento global, alicerçada nos seus próprios néctares.
O compromisso de Leonor com o rigor profissional é evidente nas suas práticas de negócio e na forma como gere a sua equipa. Ela acredita que um vinho de excelência nasce do respeito pela terra e pelas pessoas que nela trabalham. Esta filosofia tem sido um pilar fundamental na sua trajetória, garantindo que cada vinho produzido na Casa Ermelinda Freitas reflete a autenticidade e a pureza do terroir. Mas o que realmente distingue Leonor Freitas é o seu caráter humanista. Num mundo cada vez mais dominado pela tecnologia e pela produção em massa, Leonor mantém-se firme nos seus princípios de sustentabilidade e responsabilidade social, investindo na comunidade local, promovendo iniciativas que vão desde a educação até ao apoio a pequenos agricultores, assegurando que todos beneficiem do sucesso da adega.
A paixão de Leonor pela sua terra é palpável. Ela acredita que o vinho não é apenas uma bebida, mas uma expressão da cultura e da história do “seu” povo. Cada garrafa de vinho da Casa Ermelinda Freitas conta uma história – uma história de dedicação, amor e respeito pela natureza. Leonor Freitas é, sem dúvida, uma guardiã do legado vitivinícola português, mas mais do que isso, é uma inspiração para todos os que acreditam que o sucesso deve ser construído com integridade, visão e uma profunda ligação às suas raízes. A sua forma de ser, o seu inconformismo, a sua tenacidade e resiliência só tem reflexo grandioso nos atos de desbravar e defender as suas convicções ao estilo da “Maria da Fonte”. Guerreira e Mulher de família preocupa-se com o desenvolvimento da Terra que a viu nascer criando bases para que a Casa Ermelinda Freitas cumprisse o dever de construir um futuro melhor para as suas “gentes”.
Leonor Freitas, é uma verdadeira embaixadora dos valores humanos e culturais que definem o espírito português. Com cada passo que dá, molda um futuro onde a tradição e a inovação caminham lado a lado, sempre com o coração na sua terra e nas suas gentes. As minhas palavras sentidas em formato de homenagem, com um copo de vinho erguido brindando a uma das Mulheres cuja história e forma de ser e estar mais me impressionou. E se o caro leitor tiver a sorte de a encontrar na sua visita não perca a oportunidade de lhe falar.
O enoturismo… memórias e afetos
É neste quadro de cultura vínica e de história de uma família que nasce o Enoturismo da Casa Ermelinda Freitas. A visita começa na vinha pedagógica, onde a história passada se entrelaça com o presente. Ali, somos confrontados, de forma agradável, com as memórias da casa e da família com realce para as cinco gerações de mulheres que sustentam uma tradição centenária, e cultivaram não apenas uvas, mas uma paixão atemporal pelo vinho. A região vitivinícola revela-se pela voz profissional de quem nos recebe, criando imagens imaginárias das vinhas, com as suas castas autênticas, cada uma delas guardiã de um terroir único. É nesse solo fértil que a Casa Ermelinda Freitas construiu a sua herança, espalhando-se por hectares de pura dedicação à arte do vinho.
Seguimos então para o centro de vinificação, espaço onde a tradição se funde com a inovação. A primeira paragem é na Sala de Ouro, onde os prémios conquistados ao longo dos anos reluzem como testemunhos de excelência. Passamos pelo espaço de vinificação, um templo de transformação onde o néctar das uvas se transforma em poesia líquida, através de um processo meticuloso e cheio de sabedoria ancestral. A caminhada segue até o engarrafamento, momento de selar o trabalho árduo, e passamos pela Cave Secundária, onde o silêncio das barricas parece ecoar os segredos do vinho.
A visita aprofunda-se ainda mais no Espaço de Memórias e Afetos, onde cada imagem, cada texto, nos imerge num mundo de jardins proibidos que a família, graciosa e simpaticamente partilha com quem tem o privilégio de visitar a Ermelinda Freitas. Em cada rótulo, cada vinho, carrega consigo uma história única. Chegados à cave principal confirmamos a grandiosidade deste produtor. Aí dormem os vinhos que perpetuam o sabor, e as barricas que guardam o envelhecimento dos melhores néctares. O processo, com suas quantidades e precisões, é explicado com paixão e orgulho de pertença. A visita termina com uma vontade enorme de impregnar o nosso corpo e a nossa alma com uma prova comentada de vinhos, onde cada gole é uma viagem sensorial, uma imersão nas memórias, nos afetos e nas raízes que tornam aquele vinho um verdadeiro legado.
Visitar a Casa Ermelinda Freitas é mergulhar num oceano de aromas e sabores, onde cada taça conta a história de vinhas banhadas pelo sol, abraçadas pelo tempo. É sentir o calor da tradição em cada canto, ouvir o sussurro das videiras ao vento e brindar à vida com o néctar que dança entre o passado e o presente. É um passeio pela alma de quem transforma uvas em poesia, e momentos em memórias imortais. É caminhar por entre barris que guardam segredos líquidos, enquanto cada gole revela uma ode à terra, ao amor e à arte de bem viver. Portugal no seu melhor.
Caderno de visita
COMODIDADES
– Línguas faladas: inglês, francês, espanhol
– Loja de vinhos
– Varanda para 20 pessoas
– Sala de eventos para 350 pessoas
– Sala de Reuniões
– Diferentes atividades e refeições (sob consulta)
– Sopa “caramela” (sob consulta)
– Parque para automóveis ligeiros e para três autocarros
– Posto de carregamento de carros elétricos
– Provas comentadas (ver programas);
– Wifi gratuito disponível
– Visita às vinhas
– Visita à adega
EVENTOS
Eventos corporativos (sob consulta)
Atividades de team building (sob consulta)
PROGRAMAS
Visita com prova standard
Prova de cinco vinhos acompanhada por apontamento de produtos regionais.
Duração: 1h30
Preço: 10€ por pessoa
Visita com prova de três regiões
Prova de quatro vinhos das três regiões onde a casa produz, Minho, Douro e Península de Setúbal, e de azeite extra-virgem do Douro, acompanhada por produtos regionais.
Duração: 1h30
Preço: 10 € por pessoa
Visita com prova de monovarietais
Prova comentada de cinco vinhos monovarietais, acompanhada de produtos regionais.
Duração: 1h30
Preço: 15 € por pessoa
Visita com prova premium
Prova de brancos tintos e moscatéis topo de gama da casa acompanhada de produtos regionais e de azeite extra-virgem.
Mínimo de quatro pessoas.
Duração: 1h30
Preço: 25 € por pessoa
CONTACTOS
Casa Ermelinda de Freitas
Rua Manuel João de Freitas, Fernando Pó
2965-595 Águas de Moura
Site: www.ermelindafreitas.pt
Email reservas: enoturismo@ermelindafreitas.pt
Email geral: geral@ermelindafreitas.pt
Tel.: (+351) 915 290 729 / 265 988 000
Nota: O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
QUINTA DOS CASTELARES: O sonho concretizado de Manuel Caldeira

Freixo de Espada à Cinta fica no distrito de Bragança. Mas em termos do mapa vínico nacional, pertence à sub-região do Douro Superior. Possui uma área aproximada de 245 km2, sendo limitada, a Norte, pelo concelho de Mogadouro, a Sul pelo concelho de Figueira de Castelo Rodrigo, a Oeste pelo concelho de Torre de Moncorvo […]
Freixo de Espada à Cinta fica no distrito de Bragança. Mas em termos do mapa vínico nacional, pertence à sub-região do Douro Superior. Possui uma área aproximada de 245 km2, sendo limitada, a Norte, pelo concelho de Mogadouro, a Sul pelo concelho de Figueira de Castelo Rodrigo, a Oeste pelo concelho de Torre de Moncorvo e a Este pela vizinha Espanha (Província de Salamanca). O rio Douro passa a cerca de 4 km da vila, demarcando, neste concelho, a fronteira entre Portugal e Espanha.
Há diversas explicações para o curioso nome desta vila. Uns dizem que teve origem no nome de um fidalgo godo “Espadacinta”, outros no brasão de um fidalgo leonês que tinha um freixo e uma espada ou, ainda, na lenda que diz que D. Dinis, rei de Portugal, quando fundou a localidade no séc. XIV, amarrou a sua espada a um freixo, antes de se encostar à árvore a descansar. Essa árvore, de grande porte, está há mais 500 anos no largo principal da vila e merece observação atenta.
Para além das amendoeiras em flor que levam muitos visitantes à vila, sobretudo na Primavera, para assistir a tal beleza da terra, há que explorar os diversos miradouros que atestam uma paisagem natural avassaladora. Freixo é também uma vila Manuelina, pintada de monumentos e casas com traços arquitetónicos desse tempo. Na vila pode ainda visitar a Casa Natal de Guerra Junqueiro, onde nasceu o poeta, político e jornalista português, situada na Rua das Flores e onde está a coleção de livros e as pautas da sua Marcha do Ódio. Pode ainda ser visitada a casa da sua família, onde está uma mostra de objetos agrícolas, roupa, utensílios de cozinha, de modo a exemplificar como vivia uma família abastada no século XIX.
O patriarca Manuel Caldeira
É neste contexto histórico, envolvido no Douro Superior, que se materializa o sonho de Manuel Caldeira. Homem da terra, nascido e criado em Freixo, desde muito cedo iniciou a sua vida na agricultura, tendo mais tarde enveredado pela construção civil. Em 2010 lança o desafio ao seu genro, Pedro Martins, de criar uma marca de vinhos própria.
“O Sr. Caldeira começou na agricultura com o pai, que era feitor de algumas quintas aqui. Criou a empresa dele, a sua atividade principal, mantendo sempre o foco na agricultura, e foi adquirindo mais terras, plantando vinhas e diversificando. Em 2010, nós tínhamos cerca de 600 ovelhas, éramos o maior produtor de leite da região e somos dos maiores produtores de amêndoa e azeitona de Freixo de Espada-à-Cinta. Ao todo, neste momento as propriedades com floresta e tudo, rondarão os 600 hectares de terra”, salienta, com entusiasmo, Pedro. Aceite o desafio feito pelo sogro, começa a desenhar as bases de um projeto que avança hoje para os 15 anos de idade, com crescimento sustentado e qualidade reconhecida no mercado. Assim nascia o projeto Quinta dos Castelares.
“Freixo de Espada à Cinta é conhecida pela arquitetura manuelina e tem uma igreja com uma porta fabulosa, que foi a inspiração do rótulo da Quinta dos Castelares. O rio Douro, na região demarcada, começa em Freixo, pelo que também tem destaque no rótulo, bem como a faixa castanha de terra como alusão a Espanha. Esfera Armilar porquê? Não somos família brasonada, mas ela é um símbolo dos Descobrimentos, em que nós portugueses conquistámos o mundo e eu usei esse símbolo, porque também quero conquistar o mundo através dos vinhos”, explica Pedro.
Atualmente, este projeto familiar explora cerca de 145 hectares de vinha, distribuídos por três quintas
Um projeto familiar
Atualmente, este projeto familiar explora cerca de 145 hectares de vinha, distribuídos por três quintas: A dos Castelares, com cerca de 100 hectares; a da Congida, que fica junto à praia do rio fluvial, na parte de cima da barragem de Saucelle, com 10 hectares; enquanto que na parte de baixo da barragem se situa a Quinta da Fronteira, com cerca de 42 hectares, que estava na posse da Companhia das Quintas e foi adquirida em 2017. Lá são produzidos tintos e Vinho do Porto.
“Com a estratégia que implementamos quando, em 2011, começámos com cerca de 70 hectares, números redondos, fomos crescendo ao ponto que chegámos, hoje, aos cerca de 145 ha, porque havia solicitações de mercado para mais vinho e mais segmentos”, conta Pedro Martins. “Em vez de entrarmos na aquisição de uvas, que não sabemos a qualidade que têm, decidimos optar por expandir e ter a certeza de controlar a qualidade da matéria-prima”, explica. E com a aquisição em particular da Quinta da Fronteira foi possível a empresa crescer na produção de vinho do Porto. Hoje tem cerca de 300 pipas de benefício, das quais vende parte a granel.
Se Manuel Caldeira é o eterno visionário, Pedro Martins é o homem que atualmente dirige todas as fases da empresa, incluindo a enologia. A admiração do primeiro pelo genro é inegável e a sua paixão pela terra, pelas vinhas e pelos vinhos que ajudou a construir e o projeto que viu crescer sob a sua alçada, transparece no brilho dos seus olhos e deve ser justamente destacada.
São cerca de 500 mil garrafas produzidas anualmente a partir de vinhas que se situam entre os 700 metros de altitude, na Quinta dos Castelares, e os 450 metros de altitude, na Quinta da Fronteira, permitindo assim criar vinhos de perfis distintos. O mercado nacional representa cerca de 60% das vendas, sendo os restantes 40% para exportação. A adega é moderna, ampla e contempla barricas de carvalho francês, húngaro e americano, utilizadas no loteamento dos vinhos. Toda a produção é certificada em modo biológico, o que também diferencia este projeto. Em termos de encepamentos, destacam-se, nas castas tintas, a Touriga Nacional (30% do total plantado), Tinta Roriz, Bastardo, Tinta Francisca, Touriga Franca, Alicante Bouschet e Pinot Noir, enquanto nas castas brancas podemos encontrar Códega de Larinho, Gouveio, Viosinho, Alvarinho, Rabigato, Moscatel e Chardonnay.
O caráter do Douro Superior
O portfolio é bastante alargado, com diversas referências distribuídas pelas marcas Quinta dos Castelares e Fronteira, havendo também espaço para vinhos especiais como o espumante 100% de Códega de Larinho (provavelmente o único no mercado desta casta) e outras referências que são já icónicas como o Quinta dos Castelares Sublime, expressão muito particular de um 100% Touriga Nacional, ou o Bicho da Seda, o topo de gama da casa, que apenas sai em anos excecionais e resulta do melhor das vinhas velhas da propriedade.
“A diversidade de barricas permite-nos engarrafar uma nova referência se identificarmos algo especial, mas o segredo está na vinha e nas uvas que possuímos”, diz Pedro Martins. O vinho Bicho da Seda, por exemplo, provém da Vinha do Almirante, um field blend com mais de 60 anos, localizado em altitude.
O objetivo é manter a qualidade e continuar o legado de Manuel Caldeira. É inegável a sua importância e presença mesmo quando está longe, bem como o carinho que todos nutrem por ele, em particular Pedro. “Em 2017 decidi fazer um grande branco ao estilo Borgonha em sua homenagem, um branco gordo mas muito prazeroso”, conta. Mais tarde fez o tinto, que teve origem nas uvas que Manuel Caldeira considera as melhores dos talhões. “Sem ele saber, peguei nessas uvas e criei o Manuel Caldeira tinto”, revela o genro. Ambos, que foram um sucesso comercial, representam muito para a marca e perpetuam para sempre a memória do sogro.
Após a visita às vinhas, às quintas e à adega foi tempo de provar várias referências do extenso portfolio da casa, das quais daremos respetiva nota de prova. A sala de provas é lindíssima, com uma vista fabulosa para as vinhas da Quinta dos Castelares protegidas pela Serra de Poiares. Para fim de festa, fomos testar alguns dos topos da casa à mesa no restaurante Cinta D’Ouro. São vinhos concentrados, eminentemente gastronómicos, expressão do Douro Superior, que brilharam à mesa com o menu preparado pelo Chef Diego Ledesma, com destaque para a salada de perdiz, o bacalhau e uma maravilhosa e suculenta costeleta de carne maturada de comer e chorar por mais. De visita obrigatória!
Nota: O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
(Artigo publicado na edição de Março de 2025)
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Quinta dos Castelares Bicho da Seda
Tinto - 2021 -

Quinta dos Castelares Sublime
Tinto - 2021 -

Quinta dos Castelares Manuel Caldeira
Tinto - 2021 -

Quinta dos Castelares Manuel Caldeira
Branco - 2022 -

Quinta dos Castelares
Tinto - 2020 -

Quinta dos Castelares
Tinto - 2021 -

Quinta dos Castelares
Branco - 2023 -

Quinta dos Castelares
Rosé - 2023
S. Salvador da Torre: Emancipação do Loureiro

Analisando os dados referentes às exportações de vinhos oriundos da região dos Vinhos Verdes, em relação logo ao primeiro semestre do ano transato, compreendemos porque motivo esta se mostra cada vez mais atrativa para investimentos de longo prazo. O ano de 2023 havia terminado com um crescimento, em volume, na ordem dos 8%, contabilizando 35 […]
Analisando os dados referentes às exportações de vinhos oriundos da região dos Vinhos Verdes, em relação logo ao primeiro semestre do ano transato, compreendemos porque motivo esta se mostra cada vez mais atrativa para investimentos de longo prazo. O ano de 2023 havia terminado com um crescimento, em volume, na ordem dos 8%, contabilizando 35 milhões de litros, de um total de 90 milhões de litros exportados, e cerca de 11% em valor. O primeiro semestre de 2024 surpreendeu com números pouco usuais para a conjuntura atual, representando, apenas nos dois primeiros meses do ano, um acréscimo de 30% no volume de exportações, o que mostra como a região se encontra dinâmica. Aparte isso, há uma toda uma nova conjuntura de consumo mundial que traz uma evidente vantagem competitiva à região.
O interesse da Granvinhos pela expansão além da sua zona de conforto, o Douro, já viria de há uns seis ou sete anos.
Perfil mais leve
Aliada à quebra do consumo mundial, há hoje uma busca mais premente por vinhos brancos, com um perfil mais leve e de mais reduzido teor alcoólico, algo que assenta como uma luva aos Vinhos Verdes.
Contudo, para Jorge Dias, CEO da Granvinhos, as decisões nem sempre se movem pela estrita e absoluta racionalidade. A aquisição da Quinta de São Salvador da Torre possuí essa mesma premissa.
O interesse da Granvinhos pela expansão além da sua zona de conforto, o Douro, já viria de há uns seis ou sete anos atrás, buscando novos projetos para alargar a sua área de influência. Inicialmente, o Alentejo foi aventado como uma hipótese, logo colocada de parte por se entender que não acrescentaria valor e diferenciação ao negócio. Numa perspetiva que alia a racionalidade à emoção, para Jorge Dias apenas duas regiões preenchiam, para si, as virtudes e características que pretendia acrescentar ao grupo: a Bairrada e os Vinhos Verdes. Colocada, por ora, de parte a Bairrada, com um negócio que não chegou a bom porto, o foco passou a incidir sobre os Verdes e, em 2022, surge a hipótese da Quinta de S. Salvador da Torre.
Alguns meses de negociações com o Grupo Soja de Portugal, proprietário da Quinta, e o negócio fez-se, mais uma vez com uma forte carga emocional pelo meio. Jorge Dias mantém, há mais de 30 anos, uma amizade forte com Anselmo Mendes, o enólogo e produtor que, à data, era o consultor do grupo agroalimentar, tendo sido já ele quem, em 2015, planeou a plantação das vinhas na vasta propriedade de Viana do Castelo.
No modelo para o futuro risonho desta quinta, o Loureiro é peça fulcral da engrenagem idealizada pela Granvinhos.
Cinco séculos preservados
É um extenso manto verde que envolve a quinta, cuja história remonta a 1512. São cerca de 37 hectares, 30 deles de vinhedos, que compõem uma propriedade totalmente murada, situada na margem direita do rio Lima e apenas 10 km de distância do Atlântico. No centro, e no seu ponto mais alto, ergue-se uma imponente casa senhorial, cuja edificação original remonta às primeiras décadas do séc. XVI, tendo, ao longo dos séculos, sido objeto de diversas intervenções e ampliações, remontando a última a 1925.
Percebendo a singularidade do património que ali se ergue, Jorge Dias entregou a sua reabilitação ao gabinete de arquitetura de Luis Pedro Silva, o autor da conceção do arrojado Terminal de Leixões. Com ele trouxe uma equipa de especialistas de arquitetura de reabilitação e história, vincando a pretensão de seguir, com rigor, uma obra que mantenha uma forte linha de coerência com um passado de cinco séculos.
É ainda na Idade Média que surgem as primeiras referências à Quinta, inicialmente parte integrante do Mosteiro Beneditino de S. Salvador da Torre, que recebeu carta de couto de D. Afonso Henriques em 1129. Ao longo dos séculos foram vários os proprietários que promoveram modificações de monta ao edificado original, destacando-se a família Rocha Brandão, que manteve a quinta na sua posse durante cerca de 400 anos, tendo sido, da sua lavra, a construção do solar, e a capela em devoção a Santo Isidoro, no século XVII, por Bula do Papa Júlio III.
Já no século XX, a quinta é adquirida pelo banqueiro José Carreira de Sousa, que, consigo, traz o arquiteto que, em 1912, ganhou o Prémio Valmor, pela “mais bela casa de Lisboa”, Villa Sousa. Manuel Joaquim Norte Júnior era o mais brilhante arquiteto da sua geração, representando um estilo eclético, com influências do geometrismo e do modernismo inspirado na Arte Nova. Em 1925, o solar acolhe, agora, a sua mais importante e recente obra de reabilitação, mantendo intacta a beleza das suas fachadas. Durante todo o século XX é desenvolvida, de forma mais sistemática e intensiva, a viticultura na Quinta, que chegou a produzir cerca de 120 pipas de vinho branco de qualidade admirada.
Em 1980, é adquirida pela Soja de Portugal, empresa que expande a atividade agrícola à pecuária, transformando a quinta num campo de ensaios nas suas áreas de atuação, tendo-a alienado à Granvinhos em 2022.
A consagração do Loureiro
No modelo para o futuro risonho desta quinta, o Loureiro é a peça fulcral da engrenagem idealizada pela Granvinhos para a sua entrada, com pompa, na região dos Vinhos Verdes. As condições naturais são perfeitas para qualquer modelo, seja ele de maximizar produções ou, como é o objetivo do grupo proprietário, criar vinhos de quinta, de absoluta diferenciação e produções que nunca ultrapassarão os 120 mil litros anuais.
A contiguidade ao Rio Lima e a abundância de água marcaram, durante séculos, o retrato da propriedade murada, com as suas charcas e fonte de mergulho medieval, dona da identidade que acaba por dar cor ao figurativo da marca. A água tem aqui duas vertentes umbilicalmente ligadas pela religião e pelas suas propriedades curativas.
A vinha domina a paisagem, cobrindo 30 hectares contínuos, cabendo ao Loureiro a maior mancha do vinhedo, com 14 hectares, sobretudo nas cotas mais elevadas da quinta, aí se encontrando também a parcela mais exclusiva, a Vinha dos Castanheiros, de onde são oriundas as melhores uvas da casta. Os solos estratificados permitem uma melhor avaliação da aptidão das suas diversas dimensões e composições – xisto, granito e aluvião – a cada uma das castas ali plantadas. Anselmo Mendes, que já desempenhava funções de consultoria há uma dezena de anos na propriedade, e foi o responsável pela plantação das vinhas atuais em 2015, desenhou-as de modo a delas extrair a máxima qualidade e identidade.
Os resultados começaram a surgir logo em 2023, tendo sido, recentemente, lançado o primeiro vinho com a chancela Quinta de S. Salvador da Torre, um Loureiro estreme, casta que, segundo Anselmo Mendes, encontra ali as condições ótimas para uma expressão de elegância e personalidade muito vincadas. Há, em Jorge Dias, uma crença muito elevada de que a Quinta se transformará, muito em breve, num referencial na região dos Vinhos Verdes. Para tal, afastaram-se ideias de volume, estando apenas a apostar-se na singularidade qualitativa, ensaiada numa componente de sustentabilidade ambiental muito forte que, por ora, passa pela produção integrada.
“Acredito no futuro do Vinho Verde e, em particular, nas castas Alvarinho e Loureiro. É um produto muito bem-adaptado aos novos tempos e hábitos de consumo, que necessita, contudo, de ser valorizado pela ligação às respetivas zonas de produção, bem como à dieta atlântica, na qual Portugal tem uma oferta ímpar”, refere Jorge Dias, Diretor-Geral da Granvinhos.
Para um futuro próximo, está planificada a construção de uma adega para vinificação própria, uma vez que, atualmente, os vinhos são elaborados numa adega externa, crendo-se que esteja concluída em 2027. Para a casa senhorial, cuja reabilitação segue a bom ritmo, ainda não há planos específicos, sendo certo que constituirá peça fundamental para o projeto de enoturismo que o grupo almeja para a Quinta.
Projetos de médio prazo, sob uma orientação disciplinada, mas apaixonada de Jorge Dias, homem cuja dimensão para sonhar e concretizar em nome da valorização do vinho português parece não ter limites.
(Artigo publicado na edição de Março de 2025)
Concurso Vinhos de Portugal 2025 é já em Maio

A 12ª edição do Concurso Vinhos de Portugal, que vai decorrer em Maio, reúne perto de 1300 vinhos nacionais. Organizado pela ViniPortugal, o evento distingue, todos os anos, a qualidade e diversidade da produção vitivinícola nacional, através de uma avaliação, realizada em prova cega, por um painel de especialistas de renome. A competição decorre em […]
A 12ª edição do Concurso Vinhos de Portugal, que vai decorrer em Maio, reúne perto de 1300 vinhos nacionais. Organizado pela ViniPortugal, o evento distingue, todos os anos, a qualidade e diversidade da produção vitivinícola nacional, através de uma avaliação, realizada em prova cega, por um painel de especialistas de renome.
A competição decorre em duas fases. A primeira, que terá lugar nos dias 5, 6 e 7 de Maio no Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas (CNEMA), em Santarém, um painel de 72 especialistas nacionais e internacionais, incluindo enólogos, sommeliers, jornalistas e wine educators, vão avaliar os vinhos candidatos em sessões técnicas de prova, entre as 9h e as 13h.
Na 2ª fase, que decorrerá nos dias 8 e 9 de Maio em Viseu, o Grande Júri irá eleger os Grandes Ouros e os Melhores do Ano, que serão revelados na cerimónia de entrega de prémios, durante o jantar de 9 de Maio na mesma cidade.
Entre os jurados internacionais, destacam-se nomes de referência no mundo do vinho, como Adam Odor, embaixador da School of Port no Reino Unido; Dong Yeon Ko, eleito 8º Sommelier do Ano na Coreia em 2024; Ketil Sauer, sommelier, jornalista e crítico de vinhos na Dinamarca; Luke Flunders, influenciador digital de vinhos no Reino Unido; Jon Berg, sommelier e autor de cinco livros sobre viagens, gastronomia e vinhos, além de escritor residente num dos maiores sites sobre vinho na Noruega; Gabriela Monteleone, Melhor Sommelier de São Paulo em 2024, curadora e colunista na rádio Novabrasil FM e no Spotify; Natalie Richard, reconhecida personalidade da televisão e jornalista canadiana; Michał Drozdowski, Melhor Sommelier da Polónia em 2024; Yoshiko Senju, Sommelier Sénior Certificado pela JSA e formador na Okyo Aoyama; e Ronald Wortel, editor e colunista da principal revista de vinhos dos Países Baixos, Perswijn.
Mais do que um galardão, o Concurso Vinhos de Portugal é um selo de qualidade e uma plataforma de promoção internacional, já que os vinhos distinguidos com as Medalhas Grande Ouro e Ouro garantem presença em prestigiados eventos internacionais, reforçando a visibilidade e credibilidade do vinho português nos mercados externos.
Editorial Março: Tempo de escolher

Editorial da edição nrº 94 (Março de 2025) A excelência é fácil de reconhecer. Difícil é apontar, escolher, dizer “este é mais excelente do que aquele”. Confesso que é uma responsabilidade que, pessoalmente, aceito com algum desconforto. Quantas vezes penso: “porquê este e não aquele”? Felizmente, não escolho sozinho, e o meu voto vale tanto […]
Editorial da edição nrº 94 (Março de 2025)
A excelência é fácil de reconhecer. Difícil é apontar, escolher, dizer “este é mais excelente do que aquele”. Confesso que é uma responsabilidade que, pessoalmente, aceito com algum desconforto. Quantas vezes penso: “porquê este e não aquele”? Felizmente, não escolho sozinho, e o meu voto vale tanto quanto o de qualquer outro membro do núcleo de redactores e provadores desta revista. Mas nem essa diluição de responsabilidades ameniza a sensação de que podemos ter cometido injustiças (e certamente que o fizemos). A consciência, porém, está tranquila, assente na certeza de que procurámos ao máximo ser independentes, rigorosos, justos, dentro da subjectividade que qualquer escolha encerra, ainda mais quando é de vinhos que se trata.
Excelência, portanto, é disso que aqui falamos. Qualificativo que se aplica por inteiro aos 30 eleitos como os melhores vinhos provados em 2024 e, dentro destes, aos cinco grandes vencedores, um por cada categoria. Quem pode negar essa qualidade a monumentos vínicos como o espumante Kompassus Grande Reserva Pinot Noir 2016, o branco Morgado de Oliveira NV, o rosé M Mingorra Tinto Cão 2023, o tinto Barca Velha Douro 2015 ou o fortificado Graham’s Tawny 50 anos?
Em Portugal, regra geral, bebemos os vinhos à mesa. E que mesas experienciámos em 2024! Restaurantes como Plano e Kabuki, em Lisboa, ou Cozinha do Manel, no Porto, são referências, cada um na sua categoria e estilo. Os vinhos ganham em ser bem servidos, harmonizados, sugeridos. Por sommeliers como Gonçalo Patraquim, um profissional de mão cheia que está a criar escola em diversos espaços. E adquiridos em locais emblemáticos como a garrafeira Vinho & Eventos, na Mêda, acompanhados pelas imperdíveis iguarias das lojas Apolónia no Algarve ou degustados em bares especializados como a incontornável Sala Ogival da Viniportugal, em Lisboa, que tanto tem feito pelos vinhos nacionais. Tal como Nuno Mendes, vencedor do troféu David Lopes Ramos, tem feito pela cozinha portuguesa no mundo.
No enoturismo, premiámos a revolução que a Taboadella trouxe à região do Dão. Pelo trabalho absolutamente crucial para a preservação e desenvolvimento do riquíssimo património genético das castas portuguesas, mereceu destaque a PORVID. Quanto a produtores, a Ode Winery, do Tejo, foi fantástica revelação, enquanto a Herdade da Mingorra, no Alentejo, confirmou duas décadas de bem fazer, a WineStone reforçou a sua ambição multiregional, a CARMIM, de Reguengos, veio dizer que sabe conjugar dimensão e especialidades, a madeirense Justino’s viu os seus Frasqueira reconhecidos entre os melhores e a bairradina Kompassus comprovou que qualidade e diferença podem (e devem) andar juntas.
Empresas e projectos de sucesso vivem de pessoas, de grandes profissionais. Como o enólogo Jorge Sousa Pinto, que em muitas casas de Vinho Verde cria belos vinhos respeitando sempre a identidade de cada uma; ou, no lado dos fortificados, Carlos Agrellos, que mantém bem alto o nome icónico da Quinta do Noval. E como não há vinho sem uvas, que dizer de José Luís Marmelo, a quem os hoje famosos Portalegre da Serra de São Mamede tanto devem?
Finalizo, como sempre, com o máximo galardão, entregue a quem ao vinho dedicou uma vida de trabalho exemplar e deixou obra para as gerações seguintes. Domingos Alves de Sousa, é o nosso Senhor do Vinho. Esta é uma escolha que, acredito, não suscita dúvidas, só aplausos.
Bacalhôa reorganiza Enologia e cria Relações Institucionais

O Grupo Bacalhôa anunciou uma reorganização estratégica na sua equipa de enologia que visa reforçar a posição no mercado nacional e internacional. Esta mudança é liderada pelo CEO do Grupo Bacalhôa Luís Ferreira, que assumiu funções no passado mês de dezembro. Segundo comunicado da Bacalhôa, promove-se assim a “renovação geracional na sua equipa de enologia, […]
O Grupo Bacalhôa anunciou uma reorganização estratégica na sua equipa de enologia que visa reforçar a posição no mercado nacional e internacional. Esta mudança é liderada pelo CEO do Grupo Bacalhôa Luís Ferreira, que assumiu funções no passado mês de dezembro.
Segundo comunicado da Bacalhôa, promove-se assim a “renovação geracional na sua equipa de enologia, combinando experiência comprovada com novas perspectivas.” Deste modo, Francisco Antunes passa a assumir funções de Director de Enologia do Grupo Bacalhôa, substituindo assim Vasco Penha Garcia que desempenhou o cargo ao longo das últimas décadas. Francisco Antunes, até agora directo responsável pelos vinhos das regiões dos Vinhos Verdes, Douro, Beira Interior, Dão e Bairrada, alcançou, entre outras distinções, o prémio Enólogo do Ano 2023 da Grandes Escolhas.

Vasco Penha Garcia, por seu turno, vai liderar o novo departamento de Relações Institucionais, com o propósito de estreitar laços com parceiros estratégicos e instituições.
Quanto às equipas de enologia da Bacalhôa nas diversas regiões do país, a principal mudança prende-se com a aposentação de Filipa Tomaz da Costa, a decana das enólogas portuguesas e uma figura incontornável do vinho e da Bacalhôa, que após 42 vindimas deixa a direcção da Adega de Azeitão, na Península de Setúbal, continuando embora a oferecer o seu conhecimento à equipa como enóloga consultora. Para o seu lugar foi nomeado João Ramos, enólogo com anteriores experiências em empresas como Esporão e Venâncio da Costa Lima. Magda Costa, até agora, enóloga assistente de Francisco Antunes na Aliança Vinhos de Portugal, em Sangalhos, assume agora a liderança dos vinhos, espumantes e aguardentes, nas regiões do Douro, Beira Interior, Dão e Bairrada. E finalmente, Rui Vieira, na Bacalhôa desde 2022, continuará a desenvolver o seu trabalho como responsável pelos vinhos do Alentejo, na Adega da Quinta do Carmo, em Estremoz.

















