FOZ TUA: Costurar vinhos no Douro

O percurso entre Alijó e a foz do Tua faz-se estrada abaixo, percorrendo a serpenteante EN 212. Deixando para trás São Mamede de Ribatua, olhamos sobre o ombro esquerdo e somos engolidos pela impressionante beleza dos socalcos do Douro, esculpido a golpes de picareta e teimosia dos homens que transformaram uma região inóspita numa paisagem […]
O percurso entre Alijó e a foz do Tua faz-se estrada abaixo, percorrendo a serpenteante EN 212. Deixando para trás São Mamede de Ribatua, olhamos sobre o ombro esquerdo e somos engolidos pela impressionante beleza dos socalcos do Douro, esculpido a golpes de picareta e teimosia dos homens que transformaram uma região inóspita numa paisagem única no Mundo. Há muitos anos, João Fernandes percorria quase todos os fins de semana estas mesmas estradas em busca de um segundo “Shangri-La”. O primeiro, havia-o descoberto José António Ramos Pinto Rosas, na sua Quinta da Ervamoira muitos anos antes.
A paixão de apreciador foi algo conquistada há cerca de uma vintena de anos, quando, finalmente, começou a ter tempo para dedicar aos seus.
CRESCIMENTO EMPRESARIAL
De origens humildes, João Fernandes nasce numa família onde à mesa não havia fartura. Eram onze os irmãos que partilhavam uma casa e a infância era fidalguia que não lhes estava destinada. Olhando para trás, João sabia que só com ligeireza e muito trabalho havia de singrar na vida. Na sua Barcelos natal terminavam-se os poucos anos de estudo e só havia duas alternativas, arranjava-se trabalho na indústria têxtil ou emigrava-se para França, como alguns dos seus irmãos fizeram. A escola da vida ensinou-o bem, moldando-lhe a têmpera para percorrer todos os setores da indústria de confeção, onde, quando chegou a cargos de chefia, já dominava todo o processo de fio a pavio. A emancipação chega há 40 anos, quando, à semelhança de outros, cria a sua primeira empresa de confeção numa pequena garagem. O resto é uma história de crescimento empresarial, com alguns dissabores pelo meio, fruto das cíclicas crises do setor. Já chegou a empregar quase 200 pessoas nas suas empresas, mas hoje centra-se somente no setor têxtil de luxo, criando peças de vestuário para algumas das mais renomadas marcas mundiais.
A chegada ao mundo da produção de vinhos vem por estrada. A paixão de apreciador foi conquistada há cerca de uma vintena de anos quando, finalmente, começou a ter tempo para se dedicar aos seus. Os fins de semana faziam-se pelas curvas do Douro, iniciando uma busca de algo que apenas o seu interior compreendia. Ao longo dos anos, percorreu todas as pequenas aldeias do Baixo Corgo ao Douro Superior. Ganhou a confiança dos locais, que lhe abriam as suas portas e, tantas vezes, lhe davam a provar verdadeiros tesouros guardados em cascos centenários no escuro de adegas sem história. Será este vivenciar de perto o Douro profundo que faz crescer em si uma indómita vontade de ali ter um pedacinho de terra a que pudesse chamar sua, cultivando vinha, plantando laranjeiras e oliveiras, mas, sobretudo, e ainda timidamente, fazendo nascer um grande vinho duriense.
O achamento dá-se em 2014, quando um telefonema o alerta para umas parcelas de vinha que estariam para venda na zona do Tua. A inquietude e uma certa aura mística levaram-no a pensar, ainda sem conhecer o local, que podia estar perante a oportunidade de uma vida. Foi o sexto sentido que tantas vezes o impulsionou nos negócios que o levou a não adiar a viagem de Barcelos ao Douro. A mesma EN 212 levou-o ao local onde era aguardado. Uma vista de sonho de vinhedos, plantados ainda durante os anos 80, que vão encontrar o Tua a abraçar o Douro. Pelo meio, ladeado por muros de xisto, um mar de laranjais e olival. Nesse dia descobriu que há beleza que vale todo o dinheiro do Mundo e, não olhando a tostões, apalavra o negócio concretizando-o rapidamente.
Com o encepamento distribuído pela trilogia mágica duriense – Touriga Nacional, Touriga Francesa e Tinta Roriz – a principal preocupação nestas parcelas é a concentração e a preservação do poderio da fruta.
A adega, edificada no século XIX, teve um passado ilustre. Nos primórdios, foi uma das muitas unidades de vinificação de vinho do Porto de D. Antónia Adelaide Ferreira.
A ADEGA DURIENSE
“E agora, o que fazemos com estas vinhas?”
A pergunta de reação ao impulso do industrial João Fernandes, surge do filho César, arquiteto de formação que, inicialmente, terá ficado com um ligeiro temor daquela compra. Nunca tinham feito um litro de vinho na vida e, agora, eram proprietários de mais de 3 hectares de vinhedos num local de exceção que, desde o século XVIII, produzia uvas para o vinho do Porto. A sorte e a fortuna bateram-lhes à porta quase de imediato. Se, no ano da aquisição, em 2014, a vinificação e estágio dos vinhos foram uma verdadeira aventura, com as uvas a serem transportadas para Valdigem (Baixo Corgo), sob coordenação da equipa de enologia de então, logo em 2015, é-lhes servida a possibilidade de adquirir à Sogrape uma adega a poucas centenas de metros das vinhas. Desativada desde os anos 90 e parcialmente em ruínas, a adega da Rua dos Ferroviários, paredes meias com a linha do Tua e vista sobre o Douro, parecia feita à medida das necessidades de vinificação da empresa Foz do Tua. Edificado no século XIX, o edifício teve um passado ilustre. Nos primórdios, foi uma das muitas unidades de vinificação de vinho do Porto de D. Antónia Adelaide Ferreira. De lá para cá, esteve nas mãos da Cockburn`s, Sandeman e terminou a sua vida ativa na posse da Sogrape, que a aliena à família Fernandes.
Com lagares de pedra no piso superior e grandes toneis no piso térreo, parcialmente em ruínas, a adega era agora uma tela em branco, ávida por ser delineada com arte e criatividade. Para César, ainda totalmente dedicado ao design e arquitetura de recuperação, o edifício era um daqueles desafios em que o ouro reluz sobre o azul.
Desenhar uma adega devidamente apetrechada e perfeitamente funcional foi conciliado com a preservação do edificado, ao qual se mantiveram todas as características da traça original, nomeadamente o travejamento das coberturas. O espaço foi maximizado com a demolição de cinco das sete cubas de cimento ali existentes, cada uma delas com capacidade de vinificação superior à produção atual do produtor. As cubas que se mantiveram foram transformadas em laboratório, cozinha e cafetaria. No piso superior permaneceram intactos os três lagares de pedra, um deles adaptado com aço inox e sistema de refrigeração das massas.
Por ora, a capacidade de vinificação não ultrapassa os 30 mil litros. Os tintos reinam, ou não fosse este o território por excelência para a produção de vinhos do Porto. Com o encepamento distribuído pela trilogia mágica duriense – Touriga Nacional, Touriga Francesa e Tinta Roriz – a principal preocupação nestas parcelas onde os verões fazem jus ao ditado “Nove meses de inverno, três de inferno”, é a concentração e a preservação do poderio da fruta. Convenhamos, criar vinhos de baixo teor alcoólico no Douro Superior é uma bizarria sem sentido!
DouTua, Foz Tua e o topo de gama Costureiro, são as marcas comercializadas pela empresa. O Costureiro tinto, cuja primeira edição nasce em 2016, surge de uma justa homenagem à tradição têxtil de Barcelos. É um vinho de memórias que apenas é lançado nos anos verdadeiramente excecionais, em que a conjugação dos elementos naturais e humanos (sim, aqui vive-se a escassez séria de mão de obra para trabalhar a vinha e a uva tem humores muito próprios, carecendo de ser vindimada no seu ponto perfeito, na hora ideal) proporcionam a criação de vinhos marcantes. Com a edição de 2018 a terminar o seu tempo de vida nos mercados, surge agora o 2019 que, como todos os vinhos respeitadores da sua origem, traduz todo o encanto do ano vitícola.
Não existindo castas brancas no encepamento da Foz do Tua, optou-se por trazê-las dos Altos. Ali, ao redor de Alijó, onde as vinhas se encontram nas cotas mais elevadas do Douro, entre os 600 e os 700 metros de atitude, celebraram-se acordos de cavalheiros com um número reduzido e muito confiável de viticultores, que fornecem Viosinho, Gouveio e também um pouco de Arinto, que compõem os lotes a partir dos quais se elaboram os DouTua e Foz Tua Reserva branco. Na forja, ou como quem diz, na barrica (carvalho francês com capacidade de 500 litros), encontra-se o futuro Costureiro branco, naquela que será a sua primeira edição, ainda sem data de comercialização.
FUTURO COM ENOTURISMO
A empatia de César Fernandes com a reabilitação e construção urbana fazem-no sonhar acordado com uma vertente mais ambiciosa de enoturismo, incluindo a construção de uma pequena unidade de alojamento, complementar à sua adega “boutique”. A linha do Tua traz ali o tão desejado turismo, cabendo uma fatia muito relevante aos viajantes internacionais. Com loja aberta e provas temáticas no programa de visitas, as boas intenções de expansão resvalam sempre nas dificuldades inerentes à escassez de mão de obra para trabalhos mais qualificados, seja para construção, seja para assessorar o enoturismo.
O Douro, ainda assim, é um verdadeiro diamante por lapidar, um gigante adormecido com potencial para ser um dos mais significativos e exclusivos destinos de Portugal. A família Fernandes e a Foz do Tua estão a fazer a sua parte para o acordar, criando vinhos que nos perpetuam a sua memória.
Nota: o autor escreve segundo o novo acordo ortográfico.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)
Colares contra Collares: A Lisboa do desassossego

Nem de propósito encaixo-me nas ondas que os tempos trazem. Ainda há pouco protestava que, fazendo uma prova de Lisboa, onde tanto acontece, me limitei a encarar tintos topos de gama que seguem cânones que já não são tanto destes tempos, salvas as devidamente assinaladas excepções e sem deixar de aceitar a grande qualidade dos […]
Nem de propósito encaixo-me nas ondas que os tempos trazem. Ainda há pouco protestava que, fazendo uma prova de Lisboa, onde tanto acontece, me limitei a encarar tintos topos de gama que seguem cânones que já não são tanto destes tempos, salvas as devidamente assinaladas excepções e sem deixar de aceitar a grande qualidade dos vinhos provados. Também há pouco tempo me lamentava, em tom sentimental, de como a minha terra tinha levado com o selo “Lisboa”, sendo eu da Leiria tão distante.
Pois agora a providência juntou-se com os actores certificados e não certificados e foi-me entregue um desafio: perceber o puzzle espacial, temporal, ampelográfico e estilístico (chega para começar?) de Colares. Já explico de que forma isto agrava todos os meus problemas anteriores, mas também adianto já a conclusão: enquanto houver ventos e mar, a gente não vai parar. Muito menos a gente de Colares. Ou será Collares?
Uma pequena região de velhas tradições
Começamos já com tempo e espaço. Colares é uma pequena região muito próxima de Lisboa, onde as velhas tradições impuseram regras rígidas na especificação dos vinhos. Incluída na segunda leva de criação de denominações de origem, em 1908, tinha já pergaminhos que remontavam ao século XIII, e gentes com convicções fortes sobre as regras. DOC Colares só de Malvasia ou Ramisco, com videiras plantadas em pé-franco (sem porta-enxerto americano) em terra de areia, numa área circunscrita a partes bem demarcadas de três freguesias: Colares, São João das Lampas e São Martinho. Há alguma discussão sobre a Malvasia, que é na verdade uma família de castas. Diz, quem sabe, que a Malvasia de Colares é uma casta diferente da Malvasia Fina, a Bual/Boal da Madeira. Aliás, diga-se que também na Madeira as discussões sobre as várias Malvasias são acesas e incluem a rara Malvasia Cândida e a hoje predominante Malvasia de São Jorge. Onde há diversidade há origens antigas.
A terra de areia + pé-franco tem origem na praga da filoxera, já que só em algumas condições a filoxera (americana) não destrói a velha Vitis vinífera (europeia), obrigando ao porta-enxerto de Vitis rupestris (americano). Uma dessas condições é a terra de areia, e temos Collares. Com dois Ls porque é antigo.
Estas histórias foram já todas contadas, mas há muitas, muitas mais. A Adega Regional de Colares (ARC) é uma cooperativa (1931) que agrupa vários papéis, que já incluíram o de certificador (hoje é a CVR Lisboa). Em 1941, a escassez de uvas levou à criação de uma lei que obrigava todos os produtores a entregar as uvas na ARC, que fazia o vinho para mais tarde ratear pelos seus associados. Esta obrigação durou muito mais do que a escassez de uvas, até cerca de 1994. O carácter híbrido da instituição impediu-a de se candidatar a subsídios europeus. E não se modernizou, nem pôde apoiar a modernização das vinhas da região. Hoje a ACR não tem vinhas, mas aceita uvas dos seus associados que as têm, elabora os vinhos (pela mão de Francisco Figueiredo e sua equipa), estagia-os e vende-os a produtores da região, com os quais está historicamente comprometida. Isto faz com que muitas empresas vendam na verdade o mesmo vinho, com ligeiras variações de lote e estágio. Por outro lado, a ACR faz hoje marcas próprias, incluindo os DOC Arenae, para além de outros vinhos de Chão Rijo, que aliás é sua marca registada.
Um puzzle complexo e fascinante
Em várias visitas de reportagem, e com o apoio do próprio Francisco Figueiredo e do dinâmico Diogo Baeta, da Viúva Gomes, procurei decifrar este puzzle até um ponto que vo-lo consiga explicar. Aqui importa explicar melhor o contexto. São 1000 anos de história, mas vou focar nos mais recentes.
Praticamente todos os actores de Colares são pessoas ali nascidas e criadas, que vivem profundamente um grande amor pelo seu sítio e têm um grande orgulho pela sua tradição. Se têm opiniões diferentes sobre o rumo a tomar, isso não se deve a falta desta devoção.
Ainda não falei das terras que não são de areia, o Chão Rijo, que engloba nessa definição todos os solos que não são de areia. Mas rijos ou moles, ambos têm muita variação, um incrível degradé de composições que explica a especificidade do terroir, se lhe juntarmos a proximidade ao mar (há vinhas literalmente a 40 m do Atlântico) e a exposição aos terríveis ventos salgados que tudo queimam e obrigam a carinhos e desvelos, incluindo técnicas e instrumentos próprios para evitar as humidades do solo e aproveitar os raios do sol que se podem tornar raros. Os muros e paliçadas são icónicas destas vinhas, que se fazem muito rasteiras, e ainda têm de disputar os terrenos com as muito apreciadas maçãs reinetas locais, que todos os anos têm o seu próprio festival. Terra de areia (ou seja, DO Colares) é um total de 24ha, na posse de 12 produtores de vinho e uns 20 viticultores (não necessariamente os mesmos).
Para explicar o imbróglio é preciso dizer que o amor dos locais pelo seu chão e o seu vinho não os impede de repetir, pelo contrário, paradoxalmente até o dizem com um certo orgulho, que em Lisboa se dizia amiúde: “este vinho ou está azedo ou é de Colares.” O Ramisco é uma casta feroz de taninos. A maturação não era assegurada, a enologia seria possivelmente optimista, e eu, na minha vida de provador de vinhos, habituei-me a tintos de Colares rústicos, herbáceos, magros, por vezes sujos, exigindo muitas dezenas de anos para amaciar, ou então não amaciando de todo. Mas por vezes uma réstia de esperança lá saía de dentro de uma garrafa e eu percebia algum do velho e prometido encanto.
Entram a enologia e viticultura modernas, o poder do povo, o vinho para o povo, e todos nos habituámos a vinhos mais encorpados, concentrados, macios, bebíveis mais cedo. Colares foi ficando para trás. Veja-se o que aconteceu na Bairrada, onde os Merlot e Syrah iam afastando a Baga, tal como a má moeda afasta a boa moeda. Veja-se como a Bairrada tradicional resistiu, sobreviveu e se impôs pelo carácter dos seus vinhos que respeitam o terroir local e a gastronomia. Pois o mesmo aconteceu em Colares. Começou de mansinho, com o vinho branco, a Malvasia impondo uma mudança súbita de métrica, onde a secura salina oferecia qualidades sedutoras, e depois o Ramisco, afinado aos tempos modernos, a oferecer salinidade e autenticidade com moderação da rusticidade. Em suma, num mundo mais global e globalizado, estes vinhos começaram a oferecer diferença, e a sua raridade impôs preços altos e o regresso aos radares do mercado.
Areia ou nada?
Se tudo isto é novo para o meu caro leitor, também o é para mim, só posso recomendar que volte a acreditar e vá provar os vinhos. Vai valer a pena.
O problema é que a região tem apenas 24 ha de terra de areia, e tudo o que não é terra de areia tem de cair no imenso tegão dos “Regionais Lisboa” (Como o vinho da minha terra Cortes, lembram-se? Só que as Cortes não têm o mesmo peso histórico). Os fervorosos produtores defensores de Colares querem, ao mesmo tempo, defender o seu velho cânone (chamemos-lhe, por argumento, Collares), um dos mais específicos e rigorosos de que há registo. Mas os mesmos produtores não conseguem viver das poucas garrafas que produzem (alguns fazem 200, outros 400). E para os vinhos oriundos do outro chão (que “chão rijo” é marca registada), não podem nem escrever a palavra Colares no rótulo, nem como endereço postal da sua adega. Collares vs. Colares, uma espécie de Kramer contra Krammer (cf. Google).
As uvas para DO Colares chegam a ser vendidas a €5 o quilo, e há sempre falta. Não ouvi ninguém a defender que Colares deixasse de exigir areia e pé-franco. Mas ouvi produtores protestando que há empresas e marcas que só querem ter um Colares no seu portefólio para aumentar o interesse nos seus outros vinhos, que depois vão comprar já feitos muito longe das encostas salgadas da Praia das Maçãs, Adraga ou Azenhas do Mar.
Quem acredita em Collares faz vinhos de extraordinário carácter, cada vez melhores e com uma identidade própria do lugar, um incrível terroir cuja dimensão impõe raridade e preços altos. São, sempre, vinhos para a mesa. À volta de Colares fervem projectos, com mais ou menos identidade, mas que são essenciais para manter vivas e sustentáveis as adegas. Se têm falta de um nome que os una, têm pelo menos uma vantagem. Estão próximos uns dos outros e conseguem sentar-se à volta de uma mesa. Apareça a identidade, que o nome aparecerá, porque este incrível amor pelo seu sítio vai dar frutos, e nós agradecemos esta teimosia milenar.
Quem é Quem em Colares
A Adega Regional de Colares tem 13 associados com 14ha de vinhas em chão de areia, ou seja, mais de metade da área disponível para DOC. Elabora o vinho destes associados e vende-o a alguns deles e alguns negociantes que pagam um royalty. Ou seja, há produtores com vinha e viticultores sem adega.
Viúva Gomes é um produtor já muito antigo, que passou por diversas e históricas mãos até que em 1988 foi comprado pela família Baeta. Hoje é liderado por José Baeta, pai de Diogo, que nasceu nesse mesmo ano. Diogo estudou enologia e insuflou uma nova tendência à Viúva Gomes, que pouco a pouco deixou de ser apenas “négociant” e passou a “vigneron.” O trabalho de Diogo na adega e principalmente na vinha leva a Viúva Gomes a ser um dos principais motores da renovação da região de Colares, em estreita colaboração com a ACR e em sintonia com valores locais e respeito pelo terroir e seu futuro.
António Bernardino Paulo da Silva, por vezes referido pelo nome da sua marca, Chitas, é um histórico da região. Sediado nas Azenhas do Mar, mesmo de frente para o oceano bravio, aos 96 anos ainda gere a sua companhia, com marcas históricas como o Colares Chitas ou o Beira-Mar. Não tem vinhas, compra o vinho na ARC (da qual a sua casa é sócia fundadora), e estagia-o, loteia-o e engarrafa-o na sua adega.
Daniel Afonso produz há vários anos o Baías e Enseadas. Apaixonado e rigoroso, tem fascínio pela prova e é a prova que o leva a respeitar o terroir e explorá-lo da forma menos interventiva possível, mas sempre seguindo as suas convicções.
O Casal de Santa Maria ficou famoso no mundo do vinho quando o Barão Bodo von Bruemmer plantou uma vinha, em 2006, já com a bonita idade de 96 anos. Ainda viveu muitos anos para ver o sonho de fazer o seu vinho em Almoçageme, no coração da DO Colares. Plantou castas internacionais, mas a propriedade também faz vinhos DOC de grande qualidade. Hoje liderada pelo neto, Nicholas von Bruemmer, tem enologia de António Figueiredo e Jorge Rosa Santos, que continuam a tradição dos vinhos da magnífica quinta.
João Corvo e a sua filha Ana Bárbara são os orgulhosos cuidadores das vinhas do Mare et Corvus, as vinhas mais ocidentais do continente europeus, a escassos 40m da falésia sobre a icónica – e cónica – pedra Vitoreira, uma visão deslumbrante que se eleva do mar selvagem. Os Corvos têm Ramisco e Malvasia, mas também Fernão Pires e Chardonnay, que não dão DOC, em vinhas belíssimas, cujas uvas são vinificadas à parte na ACR.
Alexandre Guedes é o responsável pela Vinhas e Vinhos, que produz os vinhos da Quinta de San Michel, com vinhas em Janas, freguesia de São Martinho. Com vinhas de Malvasia e Arinto plantadas em chão rijo, tem também Ramisco (meio hectare) e Malvasia (2ha) em terra de areia. Manuel Francisco Ramilo & filhos é um produtor familiar com vinhas no vale do rio Lizandro, incluindo a Quinta do Cameijo e a Quinta do Casal do Ramilo. Pedro e Nuno Ramilo foram desafiados pelo pai a retomar a tradição familiar de fazer vinhos e decidiram fazê-los à sua maneira, procurando inovar a tradição do chão de areia, fazendo rosés, espumantes (ambos não admitidos na DO Colares).
Haja Cortezia vinhos é explorado pelo casal Luís Duarte e Teresa Gamboa Soares. Luís é filho de António Maria Perpétuo Duarte, o proprietário das vinhas, que ficam em São João das Lampas. São 5ha, entre vinhas velhas e vinhas novas, situadas perto das praias da Samarra e São Julião. Cada parcela faz um único vinho. Os vinhos Infinitude de Osório & Gonçalves, têm João Lino na enologia, e exploram castas internacionais no chão rijo, enquanto mantêm os cânones DOC na areia. O seu Ramisco é o mesmo da ACR, com mais 6 meses de estágio. Esta tradição de vinificar em conjunto é usual na região, devido às pequeníssimas produções das parcelas.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)
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Mare et Corvus
Branco - 2022 -
Chitas
Tinto - 2015 -
Arenae
Branco - 2021 -
Viúva Gomes Viticultores
Tinto - 2022 -
Baías e Enseadas
Branco - 2022 -
Arenae
Branco - 2015 -
Quinta de San Michel Malvarinto
Branco - 2021 -
Collares Viúva Gomes
Tinto - 2017 -
Collares Viúva Gomes
Branco - 2021 -
Chitas
Branco - 2020 -
Baías e Enseadas
Branco - 2022 -
Casal Santa Maria
Tinto - 2011
Concurso Escolha do Mercado: Estão abertas as inscrições

A revista Grandes Escolhas organiza no próximo mês de MAIO a 5ª edição de um concurso exclusivamente dedicado aos vinhos brancos de Portugal. De características inéditas, este é um concurso totalmente focado no mercado e para o mercado. E por isso os jurados desta prova são seleccionados entre os compradores profissionais: restaurantes, sommeliers, lojas de […]
A revista Grandes Escolhas organiza no próximo mês de MAIO a 5ª edição de um concurso exclusivamente dedicado aos vinhos brancos de Portugal.
De características inéditas, este é um concurso totalmente focado no mercado e para o mercado. E por isso os jurados desta prova são seleccionados entre os compradores profissionais: restaurantes, sommeliers, lojas de vinhos, wine bars, compradores de grandes e médias superfícies e outros responsáveis de compras.
Um concurso com as regras do mercado.
Se é produtor de vinho e está interessado em participar, saiba todas as informações e inscreva-se AQUI.
Proximidades: Bacalhau, jeitos e preceitos

Diz o povo que há mil e uma maneiras de cozinhar bacalhau. Na verdade há apenas duas: a boa e a má. Boa é toda a receita que respeita o bacalhau e não o martiriza com excessos culinários. Má é a receita que faz exactamente o contrário, enchendo-o de temperos e outras desgraças. Longe de […]
Diz o povo que há mil e uma maneiras de cozinhar bacalhau. Na verdade há apenas duas: a boa e a má. Boa é toda a receita que respeita o bacalhau e não o martiriza com excessos culinários. Má é a receita que faz exactamente o contrário, enchendo-o de temperos e outras desgraças. Longe de ser consensual na forma entre os portugueses, o bacalhau é o nosso totem culinário e merece sempre que nos detenhamos sobre ele.
No maravilhoso livro “Receitas escolhidas”, a eterna Maria de Lurdes Modesto apresenta a seguinte receita do Bacalhau à Gomes de Sá:
“Coloca-se o bacalhau num tacho e escalda-se com água a ferver. Tapa-se e abafa-se o recipiente com um cobertor e deixa-se ficar assim durante 20 minutos. Depois escorregue-se o bacalhau, retiram-se-lhe as peles e desfaz-se em lascas. Põem-se estas num recipiente fundo, cobrem-se com leite bem quente e deixam-se ficar de infusão 1h30 a 3 horas. Entretanto, cortam-se as cebolas e o dente de alho às rodelas e levam-se a alourar ligeiramente com o azeite. Juntam-se as batatas, que se cozeram com a pele, se pelaram e se cortaram às rodelas. Junta-se ainda o bacalhau escorrido. Mexe-se tudo ligeiramente, mas sem deixar refogar. Tempera-se com sal e pimenta. Deita-se imediatamente num tabuleiro de barro e leva-se a forno bem quente durante 10 minutos. Serve-se no prato em que foi ao forno, polvilhado com salsa picada, e enfeita-se com rodelas de ovo cozido e azeitona preta.”
Resumindo, são três cozeduras para chegar ao excepcional resultado final do fabuloso bacalhau à Gomes de Sá, que, para mim, é a mais perfeita das formas de cozinhar o fiel amigo. É, segundo o que se sabe, atribuída a José Luís Gomes de Sá, estabelecido no Porto há cerca cem anos no negócio do bacalhau e é de facto de grande talante culinário. É também a receita mais aviltada de todas. Não há quem não lhe altere um aspecto ou outro. Mas isso é a vida e é facto inalienável. Além disso, só acrescenta à sua popularidade. Mesmo assim, está longe de ser a mais praticada em restaurante. Mas já lá vamos.
O prodígio está no peixe
A forte percentagem de colagénio contida no bacalhau torna-o desejado e apetecível. E deve evitar-se o excesso de cozedura. Acontecendo, seca o peixe, a posta ou a parte e lá se vão a utilidade e a textura mágicas. A riqueza é tal que do simples escaldar conseguimos já um caldo cheio de umami, que depois podemos congelar para utilizações futuras. As vulgares cuvetes que utilizamos para o gelo são óptimas para preservar o valor dos caldos, de bacalhau e não só. O caldo do cozido à portuguesa e o fundo de tomate são ambos belíssimas ilustrações do poder culinário que podemos e devemos conservar. Numa utilização quotidiana, rapidamente produz um molho excelente para um bife grelhado, por exemplo. Do bacalhau propriamente dito é que há que dizer que sem boa matéria-prima não há fórmula que resulte.
Temos várias declinações e atalhos sobretudo na forma congelada ao nosso dispor e, em rigor, devemos experimentá-las todas antes de escolher a nossa, que é, em princípio, a que mais se adequa à forma de cozinhar de cada um. Não tenhamos dúvidas de que estamos muito bem servidos, tanto em diversidade quanto em qualidade.
Se estamos empenhados na abordagem clássica, que é da demolha aturada por dois ou três dias com mudança periódica da água, estamos no caminho certo. É a forma de conseguir a regeneração plena do peixe, a partir do qual partimos com total segurança em direcção à receita que pretendemos executar. Não há nada de intrinsecamente errado na utilização de bacalhau demolhado e congelado, pronto a utilizar, note-se bem. É bem melhor do que deixar uma posta a boiar em água na bancada da cozinha por um par de dias. Além do cheiro nauseabundo, o peixe fica apodrecido e não serve mais para cozinhar, apesar de em muitos lares isso acontecer.
A Catalunha e o País Basco, servem desde, sempre as peças mais ricas em goma e colagénio do bacalhau. Kokotxas – papadas -, línguas e bochechas extraídas do peixe fresco fazem as delícias de todos, normalmente em ensopados ou outras soluções caldosas de massa ou arroz. Outrora, por cá essas partes estavam incrustadas nas caras de bacalhau que, com o restante peixe, se secavam e salgavam. Actualmente, graças ao extraordinário labor de produtores e transformadores de bacalhau dos nossos dias, temos acesso não só às ditas caras salgadas e secas, mas também a línguas e bochechas disponibilizadas em salmouras fortes. Feita a competente demolha, estão regeneradas e prontas a utilizar. E ainda temos os sames, que são as bexigas natatórias do bacalhau, de que herdámos importante receituário. Fazem parte do sistema de orientação do peixe pelas águas frias do norte e, por isso, são proteína rica e muito saborosa. A cozinha de pescador fez-lhes sempre as honras e hoje temos um prato ao nosso dispor, a feijoada de sames, que explora bem a riqueza destas pequenas bolsas, colocando-a ao lado de leguminosas diversas.
Igualmente valiosas são as línguas, de que os antigos percebiam bem as mais-valias culinárias. As choras de línguas vêm do tempo dos bravos dos bacalhoeiros na Terra Nova e após o necessários corte das cabeças preparava-se o maravilhoso caldo que era – e ainda é – de comer e chorar por mais. Nesta categoria caldosa, quando há tomate no fundo abra um bom Bical novo da Bairrada, com alguma madeira. Quando não há precisa desse fruto/legume, utilize um Arinto de Lisboa com madeira.
A forte percentagem de colagénio contida no bacalhau torna-o desejado e apetecível.
Os bacalhaus que amamos
Depois de tornar a variante Gomes de Sá como favorita, podemos e devemos acrescentar a lista de grandes pratos de bacalhau que representam condignamente o nosso grande totem. Como maridagem do Gomes de Sá, pode escolher entre um tinto alentejano sem madeira e um Loureiro dos vinhos verdes com madeira. Ambos brilharão junto do grande prato que é o bacalhau à Gomes de Sá. Eis os outros:
À Brás – A fascinante figura do galego Brás, da tasca montada, em tempos idos, na baixa lisboeta, continua a povoar fortemente o meu imaginário culinário. Bacalhau esfiapado fininho em seco e reservado, o sal sai naturalmente. Batatas palito de corte apertado, esmorecidas no azeite sem chegar à crocância da fritura plena, também reservadas. Chegava o cliente e o amigo Brás batia dois ovos, que, depois dos outros dois ingredientes a estalados na frigideira e com esta fora do lume, deitava por cima enquanto mexia. Há um bacalhau à Brás por cada casa, e a todos se pode assim chamar pela popularidade e facilidade da execução. O ovo macio e cremoso, aplicado com o preparado já fora do forno, vai determinar a eternidade do prato que ainda hoje gostamos de processar nas nossas casas. Um bom Alvarinho da região dos vinhos verdes vai fazer-lhe bem as loas.
À Narcisa – A receita é originária de um restaurante em Braga, chamado Narcisa, e era confecionado por uma cozinheira chamada Eusébia, entretanto falecida em 1972. Dada a sua origem, pode também ser chamado de bacalhau à Braga. Mas apesar da dor da perda irreparável da maravilhosa Narcisa, fixemo-nos na essência da receita. Dez postas altas de bacalhau que, após demolha, são abertas ao meio e em cada uma colocada uma fatia de presunto. É muito importante o tomate que faz o fundo do assado subsequente e que vai fazer a cama de cebola salteada em azeite. O presunto é parte interessada e, ao mesmo tempo, o único tempero do prato. O acabamento em forno quente vai decretar a natureza do prato, que apaladado com maionese vai gratinar na perfeição. Far-lhe-á boa justiça um tinto de castelão com menos de cinco anos de estágio em madeira, da região do Tejo.
À Zé do Pipo – O que faz a diferença neste prato é a utilização intensa e copiosa de maionese. As postas de bacalhau são cozidas em leite, parte do qual vai avivar o puré de batata que vai a gratinar em batatas duchesse, aplicadas com o saco de pasteleiro. Idealmente, o apaladar do Zé do Pipo consegue-se através da colocação de uma posta por frigideira de barro, orlada pelo puré de batata e depois coberta de maionese. Seguidamente vai ao forno gratinar e é servido assim, em dose individual. É brilhante e sofisticado o acompanhamento vínico com um bom Vinhão do Minho.
À Moda de Braga – É uma das mais vezeiras formas de processar bacalhau e, curiosamente, é a que mais frequentemente encontramos em Lisboa e no Porto. A posta é frita após demolha e é sempre acompanhada de cebolada forte e batatas fritas às rodelas. É porventura a preparação que mais abundantemente povoa o imaginário dos portugueses, variando no aspecto do pimento e do alho, o que sempre altera o sabor e a força do prato. Não posso deixar de referir a perfeição da confecção do chef José Dias, em Braga, no seu restaurante Bem me Quer, no Campo das Hortas. O vinho verde branco é o que é mais dado para acompanhar este prato ancestral da nossa tradição, sobretudo da casta Alvarinho, por permitir uma leitura ampla e tolerante do prato em todas as suas cambiantes.
Bolinhos/pastéis de Bacalhau – São emblema nacional e homenagem aprimorada ao bacalhau. Levam tanto de bacalhau como de batata e meia porção de cebola. Muito do segredo culinário está na correcção da fritura, da qual não deve haver excessos de gordura. Um bom pastel de bacalhau nem sequer deixa rasto de gordura nos dedos quando é comido à mão. E deve ser tão saboroso tanto quente como frio, pois tal como o ovo cozido, deve ser encarado como nibble, ou seja, para comer aos pedacinhos, para combater a fome súbita de qualquer português.
Cozido com todos – Por muitas voltas que demos, é a forma a um tempo mais clássica e mais sublime de comer bacalhau. Na quadra natalícia, é muito importante a cama de couve portuguesa curtida pela geada, a que se junta cenoura e nabo, além da óbvia rica e sápida posta de bacalhau, nunca demasiado cozida e servida com abundância de azeite e alho. É por excelência o manjar da consoada no país inteiro, excepção feita talvez ao Algarve e ao Alentejo, onde a carne de porco é imperativo familiar por excelência. Nos lares portugueses, tem assento real ao longo de todo o ano e é dos prazeres da mesa maiores que há, mais que não seja por evitar o peso nefasto da obrigação. A partir de um bom bacalhau cozido, tudo se pode fazer.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)
PRÉMIOS GRANDES ESCOLHAS 2024: OS MELHORES DO ANO NO VINHO E NA GASTRONOMIA

A revista Grandes Escolhas anunciou os cinco melhores vinhos de 2024, premiando o Melhor Espumante, Melhor Vinho Branco, Melhor Vinho Rosé, Melhor Vinho Tinto e Melhor Vinho Fortificado. Na cerimónia foram também atribuídos os 20 Troféus Grandes Escolhas a restaurantes, sommeliers, enólogos, produtores, projetos de enoturismo e viticultura, garrafeiras e adegas. “Os Prémios Grandes Escolhas […]
A revista Grandes Escolhas anunciou os cinco melhores vinhos de 2024, premiando o Melhor Espumante, Melhor Vinho Branco, Melhor Vinho Rosé, Melhor Vinho Tinto e Melhor Vinho Fortificado. Na cerimónia foram também atribuídos os 20 Troféus Grandes Escolhas a restaurantes, sommeliers, enólogos, produtores, projetos de enoturismo e viticultura, garrafeiras e adegas.
“Os Prémios Grandes Escolhas são já um marco nos sectores do vinho e da gastronomia. Os vinhos seleccionados no TOP 30 representam o que de melhor se faz, em todas as regiões e categorias. Já os Troféus Grandes Escolhas, igualmente prestigiantes, distinguem personalidades, organizações, empresas, instituições e profissionais que, na opinião da equipa editorial da revista Grandes Escolhas, mais se destacaram ao longo de 2024. É um evento único, onde os profissionais do sector se encontram, partilham experiências e têm a oportunidade de provar os vinhos dos seus pares”, refere João Geirinhas, director de negócio da revista Grandes Escolhas.
Dos 30 melhores vinhos portugueses, entre todas as regiões e todas as categorias, de acordo com a redação da Grandes Escolhas, foram distinguidos no TOP 5 o Kompassus Bairrada Espumante Pinot Noir Grande Reserva branco 2016, na categoria de Melhor Espumante, o branco Morgado de Oliveira, Alentejo, como Melhor Vinho Branco, M Mingorra Regional Alentejano Tinto Cão rosé 2023 como o Melhor Vinho Rosé. Já a distinção de Melhor Vinho Tinto foi para a região do Douro, para o Barca Velha 2015, e o Melhor Fortificado fica também no vale do Douro com a premiação do Graham’s PortoTawny 50 anos.

Durante esta gala anual, que reúne os melhores do sector dos vinhos e gastronomia, foram também atribuídos os 20 Troféus Grandes Escolhas, nas suas diversas categorias: Restaurante Cozinha Tradicional Portuguesa – ‘A Cozinha do Manel’, um espaço de referência na cidade do Porto, um valor seguro na preservação da cozinha tradicional portuguesa’; Restaurante Cozinha do Mundo – ‘Kabuki’, uma cozinha que evoca uma viagem de aromas e sabores que une o melhor de duas gastronomias únicas, a japonesa e a ibérica; Restaurante – ‘Plano’, um dos projectos de restauração que melhor expressa a nova culinária de inspiração rural, mas com um perfil moderno; e ainda no sector da restauração, mas já na sua vertente de maior ligação com o mundo dos vinhos, seguiu-se o prémio para o melhor Sommelier – Gonçalo Patraquim, wine diretor do grupo Plateform, que tem a seu cargo a gestão de cartas dos vários restaurantes, bem como a formação e acompanhamento de 17 sommeliers.
Como é já habitual, homenageamos todos os anos uma personalidade com o Prémio David Lopes Ramos, que este ano foi atribuído so chef Nuno Mendes que, com um percurso notável, feito de viagens em que conquistou prestígio e reconhecimento para a gastronomia portuguesa lá fora, chega agora a Lisboa.
Nas restantes, e não menos importantes, categorias foram premiados: Loja Gourmet – ‘Supermercado Apolónia’, que com uma ampla oferta, e um serviço exemplar é um caso de sucesso reconhecido no país e estrangeiro; Garrafeira – ‘Vinho & Eventos’, uma loja de vinhos em Meda, na Beira Interior, exemplar pela oferta disponível, pela qualidade do serviço e pelas iniciativas que desenvolve; Wine Bar – ‘Sala Ogival – Viniportugal’, no coração de Lisboa tem a sua uma sala de visitas do vinho português, em Lisboa, num local que respira história, cultura e tradição; Enoturismo – ‘Taboadella’, uma quinta no Dão com adega, loja e espaço de recepção de visitantes espetaculares, um marco no Enoturismo da região; Organização Vitivinícola– ‘PORVID’, a associação para a conservação e selecção de castas, prova que Portugal é líder destacado na preservação da diversidade da videira; Viticultura – ‘José Luís Marmelo’, responsável por muitas das vinhas do Parque Natural da Serra de S. Mamede; Adega Cooperativa – ‘CARMIM’, uma das maiores cooperativas do país, que produz vinhos exclusivamente a partir das uvas dos seus associados, com a qualidade que todos lhe reconhecem; Produtor Revelação – ‘ODE Winery’, em Vila Chã de Ourique, onde nascem vinhos de grande qualidade, produzidos numa unidade de vinificação de última geração, que surpreenderam critica e consumidores; Produtor – ‘Herdade da Mingorra’, negócio familiar que, ao celebrar 20 anos, surpreende com novos vinhos de perfil original e de grande carácter; Empresa Vinhos Generosos – ‘Justino’s Madeira Wines’ que, para além da inovação constante, é um guardião da tradição, tendo apresentando recentemente um conjunto de Frasqueiras de excecional qualidade; Empresa – ‘Winestone’, um grupo de forte ambição que começou na Ravasqueira, cresceu exponencialmente, e hoje se assume como um dos principais players do mercado. O Prémio Singularidade foi para a ‘Kompassus’ pela sua coerência e expressividade, mas também pelas práticas de viticultura ancestrais e vinificação minimalista assente no mais puro respeito por uma tradição familiar, que faz questão de preservar.
Antes de terminar, os convidados presenciaram ainda a entrega de mais três Troféus Grandes Escolhas, sempre aguardados com grande expectativa: Enólogo Vinhos Generosos – ‘Carlos Agrellos’, que desenvolve um trabalho exemplar – reconhecido internacionalmente -, em duas propriedades do Douro com história secular no vinho do Porto, como são a Quinta do Noval e a Quinta da Romaneira.; Enólogo– ‘Jorge Sousa Pinto, para quem os Vinhos Verdes não têm segredos, e que conhece com ninguém castas, climas e terroirs.
A grande noite termina com a revelação do prémio Senhor/a do Vinho 2024, este ano entregue a Domingos Alves de Sousa, um grande Senhor do Douro, que ao longo de mais de 30 anos lançou vinhos extraordinários de diferentes conceitos e abordagens enológicas, mas sempre de grande personalidade.
“Foi com grande satisfação que reunimos, uma vez mais, algumas das figuras mais marcantes do mundo dos vinhos e da gastronomia, personalidades e entidades que reflectem a qualidade e o talento presentes nestes sectores em Portugal. Reconhecer e premiar os melhores de 2024, entre produtores, chefs, enólogos, viticultores, sommeliers, comerciais, proprietários de restaurantes e outros profissionais da área, manteve-se como o principal foco desta iniciativa. A escolha, como sempre, não foi fácil, dada a enorme qualidade que caracteriza o sector vitivinícola e gastronómico do nosso país”, afirma Luís Lopes, director da revista Grandes Escolhas.
Para além dos prémios referidos, foram ainda anunciados os Melhores Vinhos por região, num total de 310 vinhos, com base nos milhares de provas que os críticos da Grandes Escolhas realizaram durante o ano de 2024.
Os Prémios Grandes Escolhas, organizados pela revista Grandes Escolhas, que vão já na sua oitava edição com a actual equipa, podem ser vistos ou revistos online no site da Grandes Escolhas, uma vez que a cerimónia foi transmitida em streaming, ficando assim disponível a todos, bem como as fotos do evento.
O evento que premeia os melhores vinhos, bem como empresas, profissionais e entidades na área de vinhos e gastronomia, em Portugal, contou com mais de 800 convidados, que se reuniram no Centro de Congressos do Estoril para uma noite dedicada aos Melhores do Ano.
TOP 30 – OS MELHORES 30 VINHOS DO ANO | GRANDES ESCOLHAS
- Aliança XO – Aguardente Vínica Velha 50 anos – Aliança – Vinhos de Portugal
- Anselmo Mendes Tempo – Vinho Verde Monção e Melgaço Alvarinho branco 2020 – Anselmo Mendes Vinhos
- Barbeito O Americano – Madeira Malvasia 50 Anos – Vinhos Barbeito
- Barca Velha – Douro tinto 2015 – Sogrape Vinhos
- Casa de Saima – Bairrada Baga Garrafeira tinto 2016 – Casa de Saima
- Conde Vimioso Edição Comemorativa 30 anos – Regional Tejo tinto 2005 – Falua
- Cossart Gordon – Madeira Boal 1988 – Madeira Wine Company
- Élevage – Alentejo tinto 2022 – Herdade do Sobroso
- Gloria Reynolds – Regional Alentejano tinto 2014 – Reynolds Wine Growers
- Graham’s – Porto Tawny 50 anos – Symington Family Estates
- Kompassus – Bairrada Espumante Pinot Noir Grande Reserva branco 2016 – Kompassus Vinhos
- M.O.B. Gauvé – Dão branco 2019 – Moreira, Olazabal e Borges
- Mamoré de Borba Vinhas de Sequeiro – Alentejo Trincadeira tinto 2020 – Sovibor
- Marquês de Borba – Alentejo Reserva tinto 2021 – J. Portugal Ramos
- Montanha Real 80 Anos – Bairrada Espumante branco 2013 – Caves da Montanha
- Monte Branco XX – Regional Alentejano tinto – Adega do Monte Branco
- Morgado de Oliveira – Alentejo branco – Fitapreta Vinhos
- Outrora – Bairrada Clássico Baga tinto 2019 – V Puro
- Pêra-Manca – Alentejo tinto 2018 – Fundação Eugénio de Almeida
- Poeira – Douro tinto 2021 – Jorge Nobre Moreira
- Quanta Terra Golden Edition – Douro branco 2017 – Quanta Terra
- Quinta da Boavista Vinha do Oratório – Douro tinto 2020 – Sogevinus Fine Wines
- Quinta de Ervamoira – Douro tinto 2021 – Adriano Ramos Pinto
- Quinta da Giesta – Dão Grande Reserva branco 2021 – Soc. Agr. Boas Quintas
- Quinta da Manoella VV – Douro tinto 2021 – Wine & Soul
- Quinta das Bágeiras Pai Abel – Bairrada tinto 2017 – Quinta das Bágeiras
- Quinta do Noval Nacional – Porto Vintage 2022 – Quinta do Noval
- Vasques de Carvalho – Porto Tawny 50 anos – Vasques de Carvalho
- Villa Oliveira Vinha Centenária Pai D’Aviz – Dão tinto 2018 – Casa da Passarella
- Vinha da Micaela – Alentejo-Vidigueira tinto 2021 – Rocim
Quinta da Plansel: Mostrar as castas através dos vinhos

Dorina Angelica Lindemann, 59 anos, enóloga e gestora da Plansel, empresa produtora de vinhos alentejana, nasceu na Alemanha e vive em Portugal desde 1993. O pai, Hans Jörg (Jorge) Böhm, tem uma grande paixão pelo país desde uma estadia forçada em Lisboa, quando tinha 18 anos, depois de o veleiro que o transportava e mais […]
Dorina Angelica Lindemann, 59 anos, enóloga e gestora da Plansel, empresa produtora de vinhos alentejana, nasceu na Alemanha e vive em Portugal desde 1993.
O pai, Hans Jörg (Jorge) Böhm, tem uma grande paixão pelo país desde uma estadia forçada em Lisboa, quando tinha 18 anos, depois de o veleiro que o transportava e mais alguns amigos se ter afundado perto da capital. A volta ao mundo em perspectiva não foi feita, mas alguns dias de estadia em Portugal sim. Era o início dos anos sessenta, numa altura em que era difícil de sair ou entrar do país sem autorização e documentos como o passaporte, que tinham mergulhado e desaparecido nas águas com a embarcação. Era o tempo da ditadura e ainda existiam fronteiras a dividir toda a Europa, o que dificultava a circulação de pessoas de e para Portugal.
Os primeiros tempos foram dedicados aos viveiros, à selecção das castas, sua plantação e às necessárias microvinificações para avaliar o comportamento dos clones.
“Esse período de tempo levou o meu pai a apaixonar-se pelo país e a querer voltar”, conta Dorina Lindemann. Descendente orgulhosa de uma família que existe há 400 anos e trabalha há cerca de 200 no sector de vinhos na Alemanha, revela que o seu pai, Jörg Böhm, envolveu-se também no negócio e chegou a ser o maior importador de vinhos portugueses para o seu país de origem. “Era uma altura em que não tinham uma qualidade estável, que variava de ano para ano”, mas o pai insistia, devido à atracção que sentia por Portugal. No entanto, aquilo que mais o apaixonava eram as plantas, a inovação e a procura da sustentabilidade no sector vitícola, e foi isso que o fez vender os seus negócios na Alemanha e vir para Portugal. Comprou um terreno em Montemor-o-Novo, “porque achava que a zona tinha um terroir muito especial, com muita mineralidade e muita frescura”, como conta Dorina, com a ideia de estudar as plantas e fazer a selecção de videiras. A filha ainda era muito jovem na altura, mas já tinha também o “bichinho” pela procura de conhecimento sobre a videiras e as suas variedades.
Pioneira num mundo de homens
Quando era uma menina, o negócio da vinha e do vinho ainda estava apenas na mão de homens na Alemanha. Mas Dorina gostava de andar e correr pelas vinhas, participar nas vindimas e cheirar os vinhos desde pequena, ao contrário do irmão, “que não aprecia coisas que têm a ver com o vinho, nem de o beber”. Por isso, foi natural que tivesse optado pela formação em vinha e vinhos, no seu caso dual, em que a primeira parte decorreu num local de trabalho, uma empresa de vinhos, e depois na universidade. Durante a primeira parte trabalhou “naquela que hoje se chama Von Winning, a Dr. Andreas Deinhard, em Deidesheim, Alemanha, uma região muito importante para a produção de vinhos da casta Riesling”, conta, realçando que gostou muito de uma experiência onde, entre outros, aprendeu a guiar um tractor, a cavar e a plantar vinhas novas, numa casa onde era a única mulher a trabalhar. Passados dois anos foi estudar enologia para a universidade de Geisenheim.
Mas como ainda se estava numa época em que, na Alemanha, se considerava que apenas os homens podiam trabalhar no sector de vinhos, teve de ouvir vozes contra esta opção. E quando começou a frequentar o ensino superior, em 1987, “eramos apenas duas mulheres e o resto eram homens, 99”, conta. Mas guarda boas recordações de um curso onde, para além do conhecimento, fez amizades e criou relacionamentos que “têm sido importantes tanto para os negócios como para a vida”. E ainda hoje mantém contactos com Geisenheim, universidade para onde é convidada para falar sobre Portugal e os seus vinhos e vinhas.
A selecção de plantas
Quando terminou o curso “não tinha vinhas nem empresa de vinhos”. Naquela altura era difícil arranjar emprego” no seu país natal, onde demorou algum tempo até as mulheres puderem fazer o seu caminho na área da enologia. Mas como já tinha paixão por Portugal, porque passava cá as férias a ajudar o pai, convenceu o primeiro marido, Thomas Lindemann, e veio em Fevereiro de 1993. Foi numa altura em que “o pai não estava nada feliz”, porque a actividade viveirista, que está sujeita a regras muito apertadas e depende subsídios que variam com os problemas económicos e políticos do país, estava em crise.
Os primeiros tempos foram intensamente dedicados aos viveiros, à selecção das castas, sua plantação e às necessárias microvinificações para avaliar o comportamento dos clones. O trabalho foi feito sob supervisão do Professor Colaço do Rosário que era, na altura, para além de docente da Universidade de Évora, o enólogo da Fundação Eugénio de Almeida. “Ele fazia trabalhos de selecção e observação, em parceria com o meu pai, e as microvinificações das plantas escolhidas”, conta Dorina Lindemann. “Cada vez que encontravam uma que achavam que tinha as condições certas, traziam-na para baixo, para ser plantada numa linha para observações do material no campo”, acrescenta. Foi também nesse período que conheceu o enólogo Paulo Laureano, com quem trabalhou em parceria durante muitos anos.
Entretanto, a paixão por fazer o próprio vinho manteve-se sempre, sobretudo espumantes. Os primeiros que fez, cerca de três mil garrafas, foram da colheita de 1996, engarrafadas de forma manual. “Fui, inclusive, buscar máquinas de colocar e tirar caricas à Alemanha, que um amigo nos emprestou, para fazer o processo e, depois, levámos tudo de volta”, conta. “Foi o início desta aventura”, acrescenta.

Vinhos de castas portuguesas
Dorina Lindemann criou a adega e empresa Quinta da Plansel em 1997, ano em que comprou os primeiros depósitos e lançou o seu primeiro vinho feito nas instalações da Universidade de Évora, com o apoio de Paulo Laureano. “Fizemos aqui a escolha das uvas e lá os trabalhos da adega, de um vinho que já foi engarrafado com a marca Quinta da Plansel”, diz. Nos três anos seguintes lançou apenas esta referência, mas, depois, passou a colocar no mercado mais, entre elas o Dorina Lindemann, o primeiro vinho de topo da casa, feito com uvas da colheita de 2000.
“A ideia foi sempre produzir vinhos a partir das nossas castas selecionadas”, revela a produtora, acrescentando que foi por isso que decidiu lançar, em 2001, monovarietais de Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Barroca. Mas não os conseguiu vender em Portugal, porque a sua empresa “não era muito conhecida” num país ainda sem apetência suficiente para este tipo de vinhos. A solução foi virar-se para a exportação. Primeiro, para o seu país natal. Depois avançou para a Suíça, Luxemburgo, Polónia e Reino Unido, antes de começar a vender no continente americano e extremo oriente. “A diversificação de mercados é importante para o negócio e também me permitiu continuar a apostar nos monocastas”, explica.
Há cinco/seis anos, a exportação da Quinta da Plansel rondava os 75 a 80%. Hoje essa proporção baixou para 50%, “o que me ajuda muito”, diz. É sabido, o reconhecimento pelo mercado nacional tem reflexos positivos sobre as marcas de vinhos portugueses no mercado externo. “Era algo que eu não me tinha percebido antes, porque só queria fazer vinho, sem pensar muito na parte comercial”, revela a produtora, que confessa que ainda não tem, em Portugal, um responsável pela parte comercial e que, fora do país, esse trabalho é feito por si e agora também pelas suas filhas, Júlia e Luísa Lindemann.
É um trabalho importante, porque as três são as caras desta empresa familiar e o vinho é muito um negócio de pessoas. “É a nossa casa e temos de ser nós, mas é um trabalho muito desgastante”, revela, acrescentando que a importância desse trabalho de ligação com os clientes verifica-se em todas as provas e feiras onde participam. E como são relacionamentos que têm de ser cultivados para serem mantidos, é “um trabalho fundamental que temos de fazer”, salienta a produtora.

Adaptação às mudanças do clima
Hoje a Quinta da Plansel, que produz entre 350 e 400 mil garrafas de vinho por ano, tem uma gama variada onde se inserem também vinhos de lote. Isso talvez tenha facilitado o crescimento das vendas em Portugal, depois de muitos anos de insistência no lançamento de monocastas. “A minha ideia sempre foi mostrar o que Portugal tem de melhor, as suas variedades”, mostrando os vinhos que podem originar.
O nome Plansel, o da empresa, significa planta selecionada, ou seja, que os vinhos da marca têm origem em clones de vinhas da casa, com idades que podem ir até aos 25 anos, para as mais velhas. “Também usamos clones novos, como uma Trincadeira de bago mais pequenino, que não rebenta logo quando chove, que é a base de um monocasta muito interessante, verdadeiro, com notas de cassis, herbáceos”, conta Dorina Lindemann, acrescentando que a sua aposta foi sempre na sustentabilidade, nas plantas, na tipicidade da sua região.
Diz que ainda hoje mantém a procura de novas variedades, mais adaptadas às condições resultantes das mudanças climáticas, pois acredita que serão a salvação do sector vitícola nos próximos 20 a 30 anos. Uma das suas preferidas é a Touriga Nacional.
“Difícil de trabalhar na vinha porque é brava, cresce para todo o lado, tem muitos cachos e, por isso, custa muito dinheiro vindimar”, explica, acrescentando que “é, no entanto, resistente ao escaldão, tem tipicidade, uma grande personalidade e adapta-se a todos os tipos de terrenos, coisas que temos de ter em conta para o futuro”. Salienta também que, “para além disso, dá origem a bons vinhos, sobretudo em solos mais frescos que permitam abrir mais o volume e libertar aromas como as notas de violetas, sem serem doces demais”. Também aprecia, entre outras, a Touriga Franca que “dá origem a vinhos frescos, com grande personalidade”, salientando que tem em casa alguns com 10 anos, “cujas características principais não mudam”.
Hoje Dorina Lindemann tem 55 hectares de vinha dedicados à produção de vinho, sobretudo da casta Touriga Nacional, que representa 25 a 28% do encepamento, porque se porta bem na sua zona. Para além da Touriga Franca, tem Aragonês, Trincadeira, pouco de Tinta Barroca, “porque é atreita ao escaldão” e Alicante Bouschet, porque a sua filha Luisa “gosta muito”. Mas a empresa apenas está a criar agora o clone agora.
Quanto às castas brancas, diz que é fã de Viosinho, “uma casta muito interessante para o futuro, tal como a Loureiro”, gosta dos vinhos que está a fazer de Azal e de Verdelho, e quer experimentar plantar Rabigato e Arinto, “uma casta muito boa no Alentejo”. Já plantou castas que arrancou depois, “porque o clima está a mudar e os produtores têm de o fazer quando as plantas já não se adaptam bem ao local”. Mas mantém sempre a aposta nas castas nacionais, convicta que está de que o “berço das castas ibéricas é Portugal” e afirma ainda que tem “a certeza de que o país poderia ser considerado o melhor produtor de vinhos do mundo se soubesse contar bem a sua história e estórias das suas vinhas e vinhos”.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)
Estive lá: Cícero, Um restaurante em forma de arte

No cosmopolita e multicultural bairro lisboeta de Campo de Ourique, o restaurante é um espaço deveras singular. Primeiro, porque se apresenta como um restaurante que é também uma galeria de arte, com muitos quadros e esculturas expostos de artistas do país irmão. Depois, porque se assume como um representante da cultura brasileira, unindo cores, formas […]
No cosmopolita e multicultural bairro lisboeta de Campo de Ourique, o restaurante é um espaço deveras singular. Primeiro, porque se apresenta como um restaurante que é também uma galeria de arte, com muitos quadros e esculturas expostos de artistas do país irmão. Depois, porque se assume como um representante da cultura brasileira, unindo cores, formas e sabores onde abundam as referências tropicais. Mais ainda, porque o espaço é dividido em três pequenas salas, Modernista, Contemporâneo e Origem, uma no rés do chão e outras duas na cave, cada uma delas com a decoração e ambiente distintivos, marcados pela cores fortes das pinturas expostas, assegurando, em qualquer delas, uma atmosfera acolhedora e intimista.
Por último, na proposta gastronómica que é, afinal, o mais relevante quando falamos sobre um restaurante. Pois é aqui que Paulo Dalla Nora Macedo, um dos co-fundadores do espaço, arriscou nesta nova versão do Cícero e foi buscar a Chef brasileira Alessandra Montagne, há 25 anos sediada em Paris, onde tem dois restaurantes e uma reputação já bem firmada. Num jantar de apresentação à imprensa, onde estivemos, foi visível como a Chef Alessandra, em conjugação com a Chef executiva residente, Ana Carolina, procuraram unir a técnica francesa, a inspiração de Cícero Dias na composição cromática das apresentações e uma fusão de ingredientes brasileiros e apontamentos portugueses.
Visando nitidamente o fine dinning e com preços condizentes a essa ambição, Alessandra desenhou um menu rico e em alguns momentos surpreendente. Logo no amuse-bouche encantou com a crocância do dadinho de tapioca. Nas duas entradas servidas gostei do contraste entre a suavidade do creme de cenoura e a salinidade da bottarga e sabores terrosos do velouté de cogumelos. Nos pratos principais, o carabineiro, irrepreensível com o risoto de cevada, cremoso como se impunha, pediu meças com o bacalhau fresco, couve e arroz negro. O prato de carne foi poitrine de porco, aipo e beterraba, e talvez porque a refeição já ia farta e longa terá sido o que menos me entusiasmou. Mas o desenho cromático da sobremesa, que a Chef Alessandra assumiu ter sido inspirada numa pintura de Cícero Dias, rematou com brilho o jantar.
Destaque ainda para uma carta de vinhos bem pensada, da responsabilidade do sommelier Rodolfo Tristão, com sugestões interessantes para além do óbvio, mas com preços que não são meigos. Requintado restaurante, galeria multifacetada, tertúlia animada, o Cícero, na sua nova encarnação, tem muito para seduzir. Assim a bolsa o permita.
Cícero
Morada: Rua Saraiva de Carvalho, 171, Lisboa
Tel.: + 351 966 913 699
Site: https://cicerobistrot.pt/pt/home-pt/
Horário: De Domingo a Quinta das 19h15 às 23h45. Sextas e Sábados das 19h15 às 00h00
Preço médio: 90€
GRANDE PROVA: TOURIGA NACIONAL

O painel de prova que levámos a efeito contou com a resposta de 46 produtores. Com a expansão que a casta tem tido em todo o país, este painel poderia ter 100 ou mais vinhos presentes, um sinal evidente que as qualidades que esta variedade apresenta podem expressar-se em climas e solos diferentes, sem perda […]
O painel de prova que levámos a efeito contou com a resposta de 46 produtores. Com a expansão que a casta tem tido em todo o país, este painel poderia ter 100 ou mais vinhos presentes, um sinal evidente que as qualidades que esta variedade apresenta podem expressar-se em climas e solos diferentes, sem perda de qualidade. Essa é também a marca das grandes castas, as tais que mudam de país, mudam de ares, mas produzem sempre bem e originam grandes vinhos. Nem é preciso ir mais longe. Basta pensar em variedades internacionais como Cabernet Sauvignon, Merlot ou Chardonnay para exemplificar o que estamos a dizer.
Uma grande variedade
Recordemo-nos, sucintamente, que o percurso da casta não foi fácil. Era assumida como uma grande variedade, nomeadamente no Dão onde integrou as experiências do Centro de Estudos de Nelas. Alberto Vilhena, à frente daquele Centro, levou a cabo entre 1958 e 88 muitas microvinificações que mostraram as enormes qualidades da casta e as potencialidades para gerar vinhos de guarda. Muito estudada depois pelos cientistas da vinha, como Antero Martins e Nuno Magalhães nos anos 70 e 80, a casta foi depois objecto de plantio em campos de ensaio em várias quintas, sobretudo na Quinta da Leda (Douro Superior), onde foram ensaiados 179 clones e se procedeu então à selecção dos melhores, posteriormente disponibilizados para a produção. Foi com esse estudo que se conseguiram bons resultados nas primeiras experiências feitas na quinta dos Carvalhais (Dão) em 1992, e depois nos primeiros produtores do Douro que se aventuraram a fazer vinhos que, para a época, eram uma verdadeira novidade para os consumidores. Muito rapidamente os produtores perceberam que tinham, em mãos, uma casta de elevado potencial enológico e logo de seguida ela começou a ser mencionada nas garrafas. As más-línguas vieram logo dizer que a Touriga Nacional era “a casta mais plantada nos contra-rótulos”, tal a frequência com que aparecia essa informação. Terá sido assim, no início, ninguém hoje duvida, mas a verdade é que a área de vinha de Touriga ganhou uma dimensão que a trouxe para o patamar das grandes castas nacionais.
Vejamos alguns exemplos. No Douro poderá ter começado “nos contra-rótulos”, mas adaptou-se de tal forma às condições da região que hoje ocupa 10% da área de vinha duriense, ou seja, 4 400 ha. E para ajuizar da valia da casta bastará dizer que, se se fizer uma escolha de grandes vinhos do Douro, sobretudo dos mais conhecidos topos de gama, o que mais frequentemente encontramos é tintos que resultam de um lote de Touriga Francesa com Touriga Nacional. Também existem muitos varietais da casta. Mas a ligação das duas Tourigas parece ser fórmula garantida de sucesso. Não esqueçamos que as variações de terroirs que o Douro tem, as variantes de exposição e altitude, originam vinhos de perfis diferenciados. Mais uma das características das grandes castas, camaleónicas por natureza.
Se o Douro é a região com mais área de vinha de Touriga Nacional, o Dão vem logo de seguida. Ali, onde a casta deverá (ainda sem certezas) ter nascido, a área de Touriga Nacional é de cerca de 2750 ha, qualquer coisa como 21,3% da área total de vinha. Por enquanto a Jaen ainda é a casta mais plantada (com 22,8%). A Tinta Roriz queda-se no terceiro lugar com 17,6% da área de vinha. Pelo crescimento que tem tido, a Touriga poderá vir a ultrapassar a Jaen num futuro próximo.
No Alentejo, o crescimento da casta tem sido constante, ainda que num ritmo moderado. Se em 2019 ela ocupava 1 416 ha, essa área subiu, em 2023, para 1 543 ha. Para se ter uma noção comparativa, a Touriga Nacional é actualmente a 5ª casta mais plantada no Alentejo. Em primeiro lugar temos a Aragonez, com 4 155 ha, seguida (por ordem decrescente) de Alicante Bouschet, Trincadeira e Syrah. Num quadro comparativo das áreas de vinha da região entre 2019 e 2023, percebemos que as principais castas têm tido um crescimento, ainda que moderado, e nota-se alguma quebra nas Castelão e Moreto. Onde a Touriga Nacional tem crescido mais é em Borba e Reguengos. Anotem-se mais duas informações de duas regiões. Em Lisboa a casta ocupa cerca de 500 ha e, segundo informação da CVR Lisboa, esse quantitativo tem-se mantido estável. Já em Setúbal, com uma área muito grande, que se estende do Montijo até Sines, a Touriga Nacional, que ocupa 258,38 ha, tem tido um crescimento, moderado, mas constante, de 11 ha por ano.
Se o Douro é a região com mais área de vinha de Touriga Nacional, o Dão vem logo de seguida.
Uma leitura da prova
O perfil dos vinhos de Touriga Nacional tem acompanhado o gosto dos consumidores e tem sido desafiante para os enólogos a missão de ultrapassar alguns constrangimentos inerentes à própria variedade. No primeiro tema – o gosto dos consumidores – a Touriga de hoje afasta-se bastante do perfil que tinha no início do século. Enquanto durou a “era Parker”, com o gosto moldado pelo crítico americano Robert Parker, a Touriga Nacional foi macerada, extraída e abusada de madeira nova. Vemos agora que era difícil captar-lhe todas as subtilezas com esse perfil, como o seu lado mais floral, e que o excesso de madeira nova em nada contribuía para uma melhor apreciação do vinho. Ao mesmo tempo que este estilo vigorava, os enólogos foram percebendo que algo de particular se passava com a Touriga Nacional, uma vez que ela tinha a capacidade de, já depois de engarrafada, desenvolver fenóis voláteis, o famigerado suor de cavalo. A casta é também muito rica em ácido felúrico e cumárico, que existem naturalmente nas uvas e são necessários para o metabolismo da bactéria Brettanomyces formar os fenóis voláteis. Por isso, o controlo dos níveis de sulfuroso e as filtrações são fundamentais para diminuir os riscos. Hoje o problema está ultrapassado para os produtores que aceitam os avanços e conhecimentos que advêm da ciência.
Desta prova podemos tirar algumas conclusões: que continua a haver espaço para variados tipos de tintos de Touriga Nacional, uns mais estruturados, ricos e cheios, e outros mais elegantes e finos; que o que mais se ajusta à casta é um moderado estágio em madeira nova, sendo preferível um amadurecimento em barrica usada, que tudo possa envolver mas sem marcar muito o vinho; que a qualidade elevada não é exclusivo desta ou daquela região. Os vinhos provados revelaram uma qualidade muito alta, com uma evidente vocação gastronómica, característica que, sobretudo em Portugal, convém ter sempre presente.
A Touriga veio para ficar e hoje não há quintal, por mais pequeno que seja, que não tenha a casta plantada. Estranho fascínio, quase hipnotizante, poder-se-ia dizer. Acreditamos que outras variedades não se importariam de ter o mesmo desígnio.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)
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Maçanita Cima Corgo
Tinto - 2022 -
Falua Unoaked
Tinto - 2021 -
Coragem
Tinto - 2021 -
Bacalhôa Vinha da Garrida
Tinto - 2019 -
Adega Mayor
Tinto - 2022 -
Adega Mãe
Tinto - 2021 -
Zom
Tinto - 2021 -
Touriga Nacional da Malhadinha
Tinto - 2022 -
Scala Coeli
Tinto - 2020 -
Ribeiro Santo
Tinto - 2021 -
Quinta do Perdigão
Tinto - 2016 -
Quinta da Romaneira Três Parcelas
Tinto - 2020
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A Touriga Vai Nua
Tinto - 2022 -
Adega de Penalva
Tinto - 2020 -
Vallado
Tinto - 2019 -
Taboadella
Tinto - 2021 -
Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo
Tinto - 2022 -
Quinta dos Termos
Tinto - 2022 -
Quinta dos Carvalhais
Tinto - 2021 -
Quinta de S. José
Tinto - 2021 -
Quinta de Pancas Special Selection
Tinto - 2018 -
Quinta da Aguieira
Tinto - 2020 -
Paço dos Infantes
Tinto - 2021 -
Mingorra
Tinto - 2021
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A Serenada
Tinto - 2019 -
Quinta Vale de Fornos
Tinto - 2016 -
Bridão
Tinto - 2018 -
Adega de Pegões
Tinto - 2021 -
Solar da Ria
Tinto - 2020 -
Quinta de Ventozelo
Tinto - 2022 -
ODE
Tinto - 2023 -
Mainada
Tinto - 2021 -
Humilitas
Tinto - 2019 -
Howard’s Folly
Tinto - 2018 -
Casa Ermelinda Freitas
Tinto - 2022 -
Casa de Santar Vinha dos Amores
Tinto - 2019