Caves Cálem: rumo ao futuro

Maiores, modernas e funcionais, interactivas. As Caves Cálem já reivindicavam o título de mais visitadas do país. Agora, após um investimento de três milhões de euros, querem ser as mais populares do mundo. O “boom” turístico no Porto alimenta as expectativas.   TEXTO Luís Francisco FOTOS Anabela Trindade O turismo no Grande Porto continua a […]

Maiores, modernas e funcionais, interactivas. As Caves Cálem já reivindicavam o título de mais visitadas do país. Agora, após um investimento de três milhões de euros, querem ser as mais populares do mundo. O “boom” turístico no Porto alimenta as expectativas.

 

TEXTO Luís Francisco FOTOS Anabela Trindade

O turismo no Grande Porto continua a crescer a ritmos anuais de dois dígitos e a Sogevinus, proprietária das marcas Barros, Burmester, Cálem e Kopke, sabe que tem uma quota-parte nessa equação. Com 235 mil visitantes em 2016, as Caves Cálem, em Vila Nova de Gaia, são um dos grandes destinos turísticos da região e os investimentos feitos este ano prometem reforçar esse estatuto. Sem beliscar a tradição, a visita foi enriquecida com experiências interactivas, que fazem a ponte entre o passado e o futuro. Setembro marca o início de uma nova era na mais visitada das caves de Vinho do Porto.

Mesmo sem inauguração oficial (estava agendada para o dia 13 de Setembro, mas a celebração foi adiada, devido à morte do bispo do Porto, D. António Francisco dos Santos), o agora chamado Museu Interactivo das Caves Cálem já está a funcionar em pleno, oferecendo aos visitantes todo um novo leque de possibilidades lúdicas, que aliam o entretenimento a uma assumida vocação didáctica. As instalações foram remodeladas, criando um circuito para grupos com marcação prévia e outro para os visitantes individuais, que podem agora “entreter-se” na área interactiva do museu até chegar a hora de seguirem na visita guiada pelas caves.

E visitantes é coisa que não falta por aqui. O corrupio de gente é constante, ali mesmo a um passinho da ponte Luís I, junto ao Douro pontilhado por barcos rabelo e embarcações turísticas, o cais da Ribeira e as suas esplanadas do outro lado do rio. A fachada branca debruada a pedra, a vetusta escadaria que nos leva ao interior e o brasão sobre a entrada garantem a atmosfera de autenticidade e tradição que compõe o apelo do Vinho do Porto. Mas lá dentro a modernidade irrompe nas linhas estilizadas da recepção e em alguns pormenores de decoração.

Caso existam dúvidas, somos convidados a espreitar por duas aberturas na parede (ao nível dos olhos dos adultos e das crianças), para confirmarmos que lá dentro nos aguarda a atmosfera solene e serena das caves onde envelhecem os vinhos vindos da zona demarcada do Douro. E então somos novamente surpreendidos.

Porque o primeiro espaço onde entramos até tem as paredes e a luz “certas”, mas o resto é completamente diferente do que esperávamos. Em vez de balseiros e barricas, mapas e ecrãs interactivos, painéis e vídeos informativos, um jogo de identificação de aromas que prende a atenção de toda a gente. Passamos por um mapa tridimensional do Douro, onde podemos consultar informação sobre a orografia e alguns indicadores meteorológicos; percebemos como se estendem as raízes das videiras num painel com um corte vertical do solo de xisto; identificamos as castas tradicionais do Douro que são usadas pela Cálem nos seus vinhos; são-nos explicadas as categorias de Porto e mostradas as cores que nelas podemos encontrar. No final, quem quiser pode responder a um questionário (são três questões) e receberá por mail a imagem de uma garrafa cujo rótulo tem o nome do inquirido.

Provas, compras e… fado
Por razões logísticas, este espaço não está integrado no circuito dos grupos organizados, a quem são proporcionadas experiências e informações similares mas num registo diferente. A partir daqui, a visita é semelhante, com as caves, a sala de provas e a loja no itinerário. E se é verdade que a grande novidade é mesmo a zona interactiva, também há muito para descobrir no resto do trajecto.

Começamos pelo enorme balseiro onde podemos projectar um conjunto de dados que seleccionamos num ecrã. Conhece os níveis da água no historial das cheias do Douro? Qual é a capacidade deste depósito em madeira? Quanto tempo demora a ser feito? E sabia que lá dentro cabe… bom, o melhor é mesmo cada um descobrir por si. Mais à frente encontramos um ecrã onde podemos aprofundar o nosso conhecimento sobre as famílias e tipos de Porto.

Uma elegante escadaria conduz-nos a um andar superior, criado especialmente para albergar a nova sala de provas, multifuncional graças às divisórias que podem ser corridas entre as filas de mesas, criando espaços maiores ou mais pequenos conforme as necessidades. A lotação total é de 210 pessoas, mais 100 do que no espaço anteriormente existente, junto à loja.

E é mesmo para a loja que descemos. Cresceu, claro, aproveitando o espaço deixado vago pela construção da nova sala de provas – com 283 metros quadrados, passou a ter o dobro da área. Mas, essencialmente, modernizou-se e adoptou uma filosofia extremamente “user friendly”, dividindo os vinhos por expositores temáticos. Os vinhos provados na visita, os mais premiados, os mais vendidos, os Tawnies Velhos, os Vintage, os Porto Branco… Enfim, aqui ninguém se perde nem deixa de comprar por não encontrar o que procurava. Gadgets, T-shirts e pequenas ofertas completam o lote de artigos expostos.

Os circuitos normais terminam aqui e somos devolvidos às margens do Douro com a sensação de termos feito uma verdadeira viagem no tempo. Mas há programas que prolongam a visita, levando-nos a conhecer ainda um outro espaço inédito: a sala de provas especiais, onde podemos apreciar harmonizações de Porto com diversos tipos de comida e, até, vibrar com uma sessão diária de fado. As reacções do público – que diferem conforme as origens e nacionalidades – dariam um verdadeiro tratado sociológico e não se espante se por lá encontrar japoneses a cantar “em português”…

O Porto continua a crescer como destino turístico e as caves de Vinho do Porto são uma das experiências mais marcantes da oferta local. Projectos como a anunciada Cidade do Vinho, da Fladgate, propõem-se capitalizar e reforçar essa identificação entre a cidade e o vinho, uma aposta que também explica o investimento feito agora pela Sogevinus nas caves Cálem. O objectivo assumido é passar dos 235 mil visitantes anuais que lhe dão o título de “campeã nacional” (o Bacalhôa Budha Éden, na Quinta dos Loridos, recebe mais turistas, mas o foco principal não é o vinho), para mais de 300.000, o que permitiria destronar a chilena Concha y Toro e tornar-se a adega mais visitada do mundo. O céu é o limite.

 

MUSEU CALÉM
Morada: Av. de Diogo Leite, 344, 4400-111 Vila Nova de Gaia
Tel: 223 746 660 / 916 113 451
Fax: 223 746 699
(Taberna da Adega: 919 001 166)
Mail: turismo@sogevinus.com
Web: www.sogevinus.com
GPS: Latitude: 41º; 8’17.51”N; Longitude: 8°36’39.32”O
As caves estão abertas todos os dias excepto 25 de Dezembro e 1 de Janeiro, das 10h às 19h (fecho às 18h de Novembro a Abril). O bilhete standard custa 10 euros (crianças: grátis; dos 11 aos 17 anos: 5 euros), incluindo museu interactivo, visita guiada às caves e prova de dois vinhos; com upgrade para três vinhos passa a 15 euros. O bilhete que inclui a sessão de fado (ao final da tarde) fica por 21 euros. Informações em tour.calem.pt e reservas on-line em byblueticket.calem.pt.

Tapada de Coelheiros: A paixão pela planície

Foi de repente. Como todas as paixões à primeira vista. Entre ver e comprar pouco tempo mediou. Depois de muito viajar, este casal de brasileiros decidiu que não precisava de procurar mais. E ficou. Há assim vida nova nos Coelheiros. Com Luís Patrão no comando técnico, a Tapada vai renovar-se sem perder a identidade.   […]

Foi de repente. Como todas as paixões à primeira vista. Entre ver e comprar pouco tempo mediou. Depois de muito viajar, este casal de brasileiros decidiu que não precisava de procurar mais. E ficou. Há assim vida nova nos Coelheiros. Com Luís Patrão no comando técnico, a Tapada vai renovar-se sem perder a identidade.

 

TEXTO João Paulo Martins FOTOS Ricardo Palma Veiga

NUMA extensa área de 800 hectares cabe quase tudo, mas nos Coelheiros há uma atractiva diversidade que cativou os actuais donos logo na primeira visita que fizeram, em 2015. Gabriela Accioli, de ascendência italiana, e Alberto Weisser, com antepassados suíços e alemães, queriam mudar-se para a Europa e Portugal sempre tinha sido uma hipótese. Mas foi quando começaram a viajar pelo interior que perceberam que havia muito mais do que Lisboa e Algarve para conhecer. E foi assim que souberam de um monte que estava à venda na zona de Igrejinha, Arraiolos, e resolveram visitar. Coelheiros era perto e da visita nasceu a atracção.

Viram e gostaram, sobretudo da diversidade e do potencial dos Coelheiros. A maior parte da propriedade está em montado de sobro e por lá se passeiam veados e gamos – cerca de 130 – e 700 ovelhas. Existem também 40ha de nogueiras, um sonho concretizado da anterior proprietária Leonilde e, claro, 50ha de vinhas. Foi esta variedade e dimensão que tornaram a decisão de aquisição mais fácil. Depois de muito viajarem, de terem vivido muitos anos em Nova Iorque, Alberto e Gabriela resolveram que precisavam de um poiso, de um local que fosse ao mesmo tempo tranquilo mas não demasiado longe da grande cidade e do aeroporto, uma vez que Alberto ainda tem de viajar com alguma frequência. “Aqui é o local onde já durmo mais noites, é assim que eu conto. E irá ser cada vez mais no futuro.”

As paixões eram várias, a do vinho é comum, ele tem uma fixação quase obsessiva por queijos e Gabriela confessa mesmo: “Sonho com comida, sou louca por gastronomia.” Melhor se compreende assim a “química” que se estabeleceu entre eles e a herdade. A produção biológica e a apicultura são projectos a curto prazo. E Gabriela, com os conhecimentos que tem no mundo da cozinha, irá animar os Coelheiros com convidados, workshops e o que mais adiante se verá.

Renovação em marcha
O interesse pelo vinho encontrou também aqui razões de sobra para a compra. Sempre são 50 hectares de vinha, o que já é uma dimensão bem interessante. Destes, 30 estão em produção, 10 foram arrancados, sobretudo por razões de doenças de lenho, e outros 10 foram já plantados de novo. Foi feita a zonagem da vinha e identificadas quatro zonas distintas, sempre num solo de base granítica mas com variações que agora são levadas em conta nas novas plantações.

As primeiras vinhas foram aqui plantadas em 1982 (antes disso apenas havia pecuária e cereais) por Joaquim Silveira, então proprietário, e António Saramago, enólogo e responsável pelos vinhos até à entrada de Luís Patrão. Luís veio do Esporão, onde trabalhou com David Baverstock, e comanda agora os destinos técnicos da herdade, com o conselho de António Saramago, que assegura: “O futuro tem de ser assegurado e por isso a contratação do Luís é muito positiva.” Continua amigo da casa e é visita sempre bem recebida. Os coelhos, que deram nome à propriedade, eram criados para depois serem largados na propriedade para caça, mas foram abatidos após uma terrível febre hemorrágica que os dizimou. A criação não foi retomada.

Emblemática na propriedade é a vinha de Cabernet Sauvignon, cujos garfos vieram de Margaux, e que ocupa actualmente 4 dos 8ha daquela casta. Chegarão até aos 10ha de Cabernet. Na vinha existe também Alicante Bouschet, Petit Verdot, Trincadeira, Aragonez, Merlot e, mais recentemente, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Miúda. Já nos brancos vai haver mudanças: o Chardonnay foi arrancado e a última colheita foi o de 2016. “Não creio que seja uma casta interessante para este solo e clima”, diz Luís Patrão. Arinto e Roupeiro são as castas clássicas mas agora têm também Antão Vaz e Verdelho.

O portefólio vai sofrer grandes mudanças. Vão acabar quase todas as marcas, ficando apenas as clássicas, Tapada de Coelheiros (normal e garrafeira), uma segunda marca Coelheiros e vinhos com nome de vinha – o primeiro será o Vinha do Taco. O Garrafeira passará a ter mais estágio em cave e o 2012 só deverá sair em 2019.

Na adega íamos gelando na câmara de fermentação de vinhos brancos em cascos de 500 litros. A filosofia passa pela utilização cada vez maior de barricas usadas, procurando obter vinhos mais frescos e menos marcados pelo carvalho. Falando em quantidade, Coelheiros passará a representar 150.000 a 200.000 garrafas, em vez das 400.000 que tinha antes (com muito vinho adquirido fora). Na cave de estágio de tintos, além das barricas de 500 litros há também tonéis (foudres) austríacos da marca Schneckenleitner. Os vinhos tintos terão assim 6 meses de estágio em barrica e um em tonel. A vindima deste ano foi, como em todo o lado, muito precoce: começaram a 16 de Agosto e terminaram a 28; no ano passado começaram a 28 de Agosto e terminaram a 22 de Setembro. Coisas do clima.

Ao balcão do Botequim
Conheci os actuais donos dos Coelheiros por acaso. Eu estava em Évora em 2015 a fazer as provas para o meu guia de vinhos de 2016 e fui almoçar a um dos meus locais preferidos, o Botequim da Mouraria. Muito difícil de arranjar lugar já que apenas tem balcão e são uns 8 lugares disponíveis. O facto é que naquele dia consegui. Na ponta do balcão estava um casal de brasileiros. Como é muito fácil haver conversas cruzadas entre todos os convivas, logo o senhor da casa informou quem eu era e a conversa pegou. “Oi cara, que te parecem as vinícolas por aqui? Nós gostamos de visitar, tem alguma sugestão?” Não lembro já o que referi, mas foram eles que avançaram: os Coelheiros valerá a pena a visita? Sim, claro, terei respondido, disse que conhecia bem, que já tinha visitado, que era uma propriedade já com uma história para contar. Gostaram do que ouviram mas, em boa verdade, não teria sido necessário o meu conselho porque, soube no dia seguinte, tinham fechado a compra de Coelheiros no dia do nosso encontro. É claro que o segredo é a alma do negócio mas esta história estava bem viva na memória dos dois que, logo que me viram, lembraram que já nos conhecíamos do Botequim. Só em Évora.

Vinhos degustados
A prova que fizemos durante a visita não foi muito extensa em virtude do encurtamento do portefólio. A marca Coelheiros em branco tem agora 3.000 garrafas mas no futuro próximo passarão a ser entre 8.000 e 10.000. Cerca de 70% do mosto fermenta em inox e o restante em barrica nova. No futuro aponta-se para o uso da barrica usada de 500 litros e apenas 10 a 20% de barrica nova. Fermenta em câmara frigorífica. No Tapada de Coelheiros branco há a pretensão de o ter 8 meses em barrica e um ano em garrafa. Assim, o da colheita de 2017 apenas irá para o mercado em 2019. O de 2016 foi totalmente fermentado em barrica nova de 500 litros. O Chardonnay 2016 é editado pela última vez, também ele totalmente fermentado em barrica nova.

Nos tintos temos um Coelheiros com 12 meses de estágio em barrica usada. A produção é de 10.000 garrafas mas a pretensão é chegar às 50.000. Os tintos provêm todos de vinhas de sequeiro mas no futuro haverá uma Touriga Nacional regada (já plantada). No tinto Tapada de Coelheiros temos Cabernet Sauvignon e 40% de Alicante Bouschet, com uma produção de 35.000 garrafas. Do Vinha do Taco estão em estágio os 2012, 14 e 16. Produção limitada a 3.600 garrafas. Esta chegada tardia ao mercado é intencional. O Garrafeira será lançado apenas em 2019. A distribuição em Portugal está entregue à Heritage Wines e no Brasil é assegurada pela Mistral.

Ir à Terceira e voltar

Fomos aos Açores “mergulhar” na colecção de um terceirense amante dos vinhos. Não “limpámos” a garrafeira (são demasiadas garrafas), mas provámos algumas dezenas que já ninguém sabia exactamente em que condição poderiam estar. E tivemos boas surpresas.   TEXTO João Paulo Martins FOTOS DR CONHECI António Maio há alguns anos num evento de vinho e […]

Fomos aos Açores “mergulhar” na colecção de um terceirense amante dos vinhos. Não “limpámos” a garrafeira (são demasiadas garrafas), mas provámos algumas dezenas que já ninguém sabia exactamente em que condição poderiam estar. E tivemos boas surpresas.

 

TEXTO João Paulo Martins FOTOS DR

CONHECI António Maio há alguns anos num evento de vinho e desde logo se criou um clima de cumplicidade vínica que tem durado até hoje. Desde então já orientei várias provas na ilha Terceira para consumidores locais e descobri mesmo que alguns deles eram meus velhos conhecidos cujo paradeiro desconhecia. À sua volta António foi juntando um conjunto de amigos que, de simples apreciadores, ganharam coragem para ir mais longe, saber mais e ter um prazer extra na prova dos vinhos. O gosto de António, esse, não é tão antigo assim, já que durante anos e anos a enofilia não lhe dizia muito, apesar de vir de uma tradição familiar onde o vinho estava presente. O pai tinha uma pequena vinha onde cultivava vinho de cheiro (o chamado “americano”), que depois vendia para o Pico, mas aquele vinho não lhe agradava e por isso não bebia. O facto de o vinho avinagrar ao fim de poucos meses também não ajudava. As caixas das prendas natalícias iam-se acumulando e… nada, até aos 35 anos pode dizer-se que era abstémio.

Foi com a viragem do século e o surgimento das grandes marcas que hoje povoam o nosso imaginário que António começou a beber e a gostar. Nasceu então o gosto do coleccionismo, a vontade de ter todas as edições dos grandes vinhos, do Barca Velha ao Vale Meão, do Vinha Maria Teresa ao Chryseia. O gosto pelas colecções e a cave foram aumentando, bem mais do que o consumo aconselhava. Mas esse tempo já passou e hoje já não é por aí que António quer seguir; parou de comprar em quantidades, embora mantenha o gosto de ter as colecções completas. A disponibilidade de espaço que tinha ajudou ao vício e as caixas de vinho multiplicam-se em todos os cantos da casa.

E agora? Que fazer?
António não nasceu para negociante de vinhos e por isso não compra com o intuito de vender. Mas não esconde o desejo de um dia poder abrir com os filhos um wine bar em Angra onde possa escoar muito do vinho que tem em cave, que estima poder rondar as 9.000 garrafas. Mas como isso é ideia associada à reforma, o assunto vai ter de esperar mais uns anos. O vinho, esse, pelo que vimos, vai aguentar bem a prova do tempo porque está quase todo guardado em ambiente frio e o próprio clima ameno da ilha ajuda a que a evolução seja lenta mesmo para as caixas que não estão na cave fria. Foi aqui que andámos, por sugestão do próprio, a juntar um conjunto de vinhos para a prova que decorreu no mês de Agosto em sua casa. Todos de férias, tempo agradável e clima a pedir a reunião de amigos para a prova.

Sabia que…
Se não tiver boas condições de guarda, não vale a pena armazenar os seus vinhos durante muito tempo

António começou por apreciar sobretudo tintos, mas considera-se agora cada vez mais brancófilo e é com orgulho que diz que foi grande contribuinte pelo gosto do Vinho do Porto que agora existe por aquelas paragens insulares. Ele próprio não perde uma grande prova aqui em Lisboa, tirando partido das muitas viagens que por razões profissionais tem de fazer ao continente. O gosto também foi mudando e agora é o equilíbrio que mais o seduz num vinho; ganhou, entretanto, o apreço pelos vinhos velhos e alguns deles foram também provados nesta ocasião. Quanto aos vinhos pelos quais tem mais carinho e que considera mais valiosos não hesita em referir a colecção completa dos Quinta do Crasto Vinha Maria Teresa (também em jeito de homenagem à sua mulher, Teresa). Nos vinhos do Porto ficaram-lhe dois na memória: o Constantino Colheita 1910 e o Ramos Pinto 1924. Madeiras? Aqui António não hesita: o Blandy’s Bual 1920. De caras! Responde de imediato.

E quanto aos néctares da Terceira não tem dúvidas: a vinda de Anselmo Mendes para os Biscoitos orientar a produção é uma oportunidade para que os vinhos ganhem outra dimensão.

Uma prova e tanto
De Lisboa fomos três: Luís Lopes, Nuno Oliveira Garcia e eu próprio. Da lista inicial proposta acabámos por seleccionar alguns que mais raramente temos provado no âmbito das nossas provas temáticas. Não fomos felizardos com alguns vinhos por apresentarem problemas de rolha, uma percentagem muito mais elevada do que o habitual, atribuível, creio, a um mero acaso. Ainda assim, foram 36 vinhos que se mostraram bem, ainda que em patamares de qualidade muito diversa. Dos anos 70 sobrou apenas um Colares Viúva Gomes 1974, mas já muito débil. Outros que tinham sido re-rolhados estavam cheios de problemas de gosto a rolha (TCA). Nos anos 80 tivemos um pouco mais de sorte com um Quinta do Carmo Garrafeira 87 em grande, grande forma, um Aliança Garrafeira 1985 ainda vivo e um Reserva 85 João de Santarém da Adega Cooperativa de Torres Vedras, magro e muito débil, uma mera curiosidade. Bem melhor a prestação dos anos 90 com três vinhos do Douro com classificação idêntica (16): Torna Grande 1999, Cabeça de Burro 1997 e Lello Garrafeira 1995; com 16,5 o Cartuxa 1998. Ainda desta década, mas em patamar bem mais acima, o Duas Quintas Reserva 1991, Tapada do Chaves 1992, D’Avillez Garrafeira 1998 e Fojo 1996 (todos com 17,5); excepcionais o Crasto Reserva 1999 e o Ferreirinha Reserva Especial 1997 (com 18 pontos).

Da primeira década deste século chegaram à prova muitos e bons vinhos. Destacamos dois pela excepcional prova que deram, o VT 2004 e o Batuta 2001 (ambos 18,5). Depois seguiu-se daí para baixo um conjunto alargado de vinhos: Anselmo Mendes Alvarinho branco 2007, Filipa Pato Cercial branco 2005, Quinta de Pancas Premium 2000, Quinta da Leda 2000, ME e JBC Selections 2001 (todos com 17,5); Esmero 2003, Muros Antigos Alvarinho branco 2007, Conde Vimioso Reserva 2000 (com 17); PL/LR branco 2008, Esporão branco 2006, Esporão Alicante Bouschet 2002, Quinta do Zambujeiro 2002 e Campo Ardosa RRR 2000 mereceram 16,5. E com 16, os Redoma branco 2006, Quinta dos Carvalhais Encruzado 2007, Campolargo 2002 e Quanta Terra 2001.

Para terminar, e em jeito de alerta para quem tem vinhos mais antigos em casa, refiro que nos deparámos com 10 vinhos contaminados por problemas de rolha e mais 4 já passados ou com defeito de prova grave. Em resumo, guardar vinhos tem muitas vezes a sua recompensa, e um branco ou tinto velhos podem originar momentos de excepção. Mas é preciso estar atento.

Um coleccionador recomenda
Nos anos que leva de coleccionador de vinhos, António Maio percebeu que há erros que se podem pagar caro e por isso deixa aqui algumas recomendações. Em primeiro lugar qualquer coleccionador nos Açores tem de estar preparado para a eventualidade dos tremores de terra. Assim, se os vinhos estiverem em prateleiras e já fora das caixas originais, é bom ter uma rede metálica à frente da prateleira que evite que as garrafas caiam para o chão quando a terra tremer. Em segundo lugar a temperatura da cave: se não tem possibilidade de ter uma cave fria não guarde vinhos por muitos anos; procure ter de vários segmentos — vinhos do quotidiano, de gama média e alta, sempre num equilíbrio entre a compra e o consumo. Ter em atenção onde se compram os vinhos, para termos a certeza que não há fraudes (elas são mais frequentes do que imaginamos nas grandes marcas). Por fim, o complemento de uma boa colecção são os bons acessórios: decantadores, bons copos e boa companhia. E para que não se deite tudo a perder, muito cuidado com a temperatura de serviço.

O Sado de copo na mão

Num país com muito vinho, alma de marinheiro, belos rios e largas centenas de quilómetros de costa, seria de esperar que os cruzeiros vínicos fossem coisa comum. Estranhamente, não são. Mas no Sado eles fazem parte da paisagem já há quatro anos. Crónica de um final de tarde de copo na mão, entre vinhos, paisagem […]

Num país com muito vinho, alma de marinheiro, belos rios e largas centenas de quilómetros de costa, seria de esperar que os cruzeiros vínicos fossem coisa comum. Estranhamente, não são. Mas no Sado eles fazem parte da paisagem já há quatro anos. Crónica de um final de tarde de copo na mão, entre vinhos, paisagem e golfinhos. Viva o Verão.

 

TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo Palma Veiga

O sol ainda vai alto nesta tarde de Agosto, reforçando o apelo da brisa fresca e do brilho das águas no estuário do Sado. No cais, em Setúbal, junta-se um grupo relativamente heterogéneo de pessoas – portugueses e estrangeiros, novos e mais velhos, casais e grupos alargados – que aguarda o sinal verde para embarcar no “Mil Andanças”, a embarcação onde se renovará hoje uma tradição cada vez mais forte do Verão setubalense: o cruzeiro vínico de sábado. Desta vez, abrilhantado pelos vinhos da Adega Fernão Pó.

A ideia, fomentada pela Rota dos Vinhos da Península de Setúbal, surgiu há quatro anos e o número de produtores aderentes tem crescido todos os anos, até ao ponto de, em 2017, as 18 datas disponíveis no Verão (de 3 de Junho a 30 de Setembro) estarem todas ocupadas. E com muita procura. Pudera: a experiência é fantástica, mesmo para quem não seja fanático do vinho. A visão da Arrábida no enquadramento do pôr-do-sol, a península de Tróia e o casario de Setúbal, o plano de água e o movimento dos navios, as praias e os golfinhos. Sim, os golfinhos. Lá iremos.

O trajecto entre Setúbal e o cais de Tróia, segundo ponto de entrada de participantes no cruzeiro, serve praticamente de aperitivo. O sol ainda vai alto, as águas animam-se com carneirinhos de espuma, as pessoas arrumam-se nas cadeiras do deck superior ou nos bancos almofadados cá em baixo – a sala interior ainda está encerrada, enquanto se prepara a prova de vinhos.

A saída de Tróia marca o início das hostilidades. Toda a gente é convocada ao deck superior para se fazer a apresentação do produtor da semana, neste caso a Adega Fernão Pó. João Palhoça, enólogo, resume em duas ou três frases a origem familiar da empresa e lança uma primeira luz sobre os vinhos que iremos provar de seguida. Palavras não eram ditas e eis que toda a gente volta a descer, desta vez com o vinho em linha de mira. E a primeira rodada é sempre a mais difícil…

Seja porque a sede aperta, seja porque os balanços da barra pregam partidas a quem não está habituado, gera-se um ajuntamento na zona de serviço, onde também está disponível uma mesa com petiscos (pão, tostas, queijo, chouriço, presunto, entre outras iguarias)… Mas depressa o ritmo serena e podemos provar o branco de entrada de gama, a que se seguirão um rosé, outro branco (este um varietal de Viosinho) e uma série de tintos (quatro, no total) que culmina no Reserva da casa.

O passeio e o vinho
Aos poucos, as conversas distendem-se, os sorrisos alargam-se e os grupos misturam-se. Um pouco à parte, Kaeszar, um dentista londrino, e a sua mulher, Alia, estão mais confinados pela barreira da língua, mas todas as explicações sobre os vinhos e o passeio são também dadas em inglês. Estão de férias em Tróia – “No Reino Unido ninguém sabe que isto existe!”, espanta-se Kaezar – e um amigo alentejano sugeriu-lhes o cruzeiro. “Adoramos barcos e sunsets”, explica Alia; o vinho é uma espécie de bónus. E, por falar em extras, é por esta altura que soa o aviso: “Golfinhos à esquerda!” E por momentos tudo passa para segundo plano, enquanto os dorsos cinzentos dos roazes dançam na espuma mesmo debaixo dos nossos olhos.

A seguir o vento prega-nos uma partida e fustiga o navio durante alguns minutos, levando consigo algumas almofadas e obrigando toda a gente a abrigar-se no interior, face à ameaça dos salpicos. O “Mil Andanças”, que já há-de ter visto bem pior do que isto, apressa-se a rumar à linha de costa da Arrábida, onde ficará mais resguardado deste súbito mau humor da meteorologia. Curiosamente, mais do que susto ou enjoos, o que se vê a bordo são sorrisos rasgados pelo pitoresco da situação. E, claro, há quem nunca tenha pousado o copo e prossiga, impavidamente, com a prova dos vinhos Fernão Pó.

Giovani e Neia, marido e mulher, brasileiros, vivem em Setúbal há 16 anos e esta é a segunda vez que embarcam num destes cruzeiros vínicos. “Aproveitamos o passeio de barco – é uma cidade bonita, mas vista daqui é um espectáculo – e o vinho. Ela é mais de vinho do que eu, mas no Inverno também ponho de parte a cervejinha e troco por um tinto”, elucida ele, enquanto Neia garante que ambos são fãs dos vinhos da Península de Setúbal, mas que há uns de que gostam “mesmo muito”: “Os do Alentejo!”

O sol já se pôs lá fora e agora navegamos placidamente ao longo da costa, bordejando línguas de areia que em breve desaparecerão na maré cheia. Numa delas, um audaz (ou distraído) pescador continua a fazer lançamentos com ar compenetrado e água pelos joelhos, aparentemente alheio ao facto de em breve poder ficar sem luz e com o caminho de regresso a terra cortado pelas águas. Ele lá sabe…

Um pedido de casamento
Numa mesa, Joana, Tito, Teresa e Carolina, mais “o pai João e a mãe Paula”, uma família de seis que mora do Seixal, estão a confirmar as boas coisas que foram ditas à última por pessoas conhecidas e que os levaram a inscrever-se no cruzeiro. Mas há membros que estão “fora-da-lei” e bebem sumo… “Acho que as pessoas vêm pela experiência geral, os mais novos provavelmente mais pelo barco e pelo passeio do que pelo vinho.” Mas os argumentos vínicos têm em Tito um veemente tribuno: “Provas de vinhos há muitas; num barco é que não!”

E esta será, provavelmente, a frase a reter neste animado anoitecer setubalense. O apelo conjunto do passeio de barco, das paisagens, dos golfinhos e do vinho ajuda a compor um cocktail sedutor. Para os produtores, é uma excelente oportunidade de mostrarem os seus vinhos e recolherem reacções em primeira mão. “Este é o quarto ano em que aderimos aos cruzeiros. Mudámos a imagem há cinco anos, sentimos necessidade de nos darmos a conhecer”, explica Isabel Palhoça, da Adega Fernão Pó.

Nos últimos três anos, a organização dos cruzeiros vínicos passou a ser responsabilidade da SadoArrábida, com apoio da Rota dos Vinhos da Península de Setúbal. Joaquim Ferreira, director da empresa, não tem dúvidas: “É um sucesso. Muito público, quase sempre lotação esgotada, sempre boa disposição a bordo.” Os portugueses são os principais clientes e foi mesmo lusitano o momento mais inesquecível, quando, recorda Isabel Palhoça, num dos cruzeiros da Adega Fernão Pó aconteceu um pedido de casamento… “Era um grupo grande, toda a gente aplaudiu, foi muito bonito!”

Desta vez não houve joelho no chão nem anel no dedo, mas o ambiente foi sempre descontraído. À medida que a noite caía e o vento amainava, cada vez mais gente se foi dirigindo ao deck superior, a música dos Abba marcando o percurso final do passeio, o vinho lubrificando as conversas. Quando chegamos ao cais, agora com os Heróis do Mar a cantarem “Paixão”, é preciso fazer um apelo pela instalação sonora, explicando que a embarcação tem ainda de rumar a Tróia, para que os passageiros comecem a sair. Não há bem que sempre dure, mas a vantagem aqui é que podemos sempre repetir no sábado seguinte. E com vinhos diferentes para descobrir.

CRUZEIROS ENOTURÍSTICOS NO SADO
SadoArrábida
Tel: 915 560 342
Mail: geral@sadoarrabida.pt
Web: www.sadoarrabida.pt
O cruzeiro pelo estuário do Sado, baía de Setúbal, costa da Arrábida e Tróia inclui observação de golfinhos, música, provas de vinhos comentadas por enólogos das adegas convidadas e degustação de queijos, enchidos e doçaria tradicional. Tem uma duração de 2h30 e embarque às 18h30 (Setúbal, doca das Fontaínhas) ou 18h50 (marina de Tróia). Os bilhetes custam 30 euros para adultos e 17,5 euros para crianças dos 6 aos 12 anos. Sempre com marcação prévia. Em Setembro as datas incluem A Serenada (no dia 2), Quinta da Serralheira (9), Herdade da Comporta (16), Península de Setúbal (23) e o cruzeiro de encerramento (30).

Quinta Nova premiada pelo guia “Luxury Travel Guide”

O serviço premium e a elegância dos vinhos apresentados na proposta de enoturismo da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo foram reconhecidos pelo guia de luxo inglês “Luxury Travel Guide” através da atribuição do prémio Luxury Hotel & Winery Of The Year 2018. Esta distinção surge depois de a prestigiada “Conde Nast Traveller”, revista […]

O serviço premium e a elegância dos vinhos apresentados na proposta de enoturismo da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo foram reconhecidos pelo guia de luxo inglês “Luxury Travel Guide” através da atribuição do prémio Luxury Hotel & Winery Of The Year 2018. Esta distinção surge depois de a prestigiada “Conde Nast Traveller”, revista também britânica, ter descrito a Quinta Nova como a “jóia escondida” do Douro, na edição especial do seu 20º aniversário.

O guia inglês Luxury Travel Guide reconhece os melhores em cada uma das categorias no segmento de luxo, com um alcance de mais de meio milhão de pessoas em todo o mundo, e representa o auge das conquistas do setor das viagens e turismo. A atribuição destes prémios está sujeita a uma rigorosa avaliação realizada por profissionais internos, subscritores e parceiros.

“É um enorme reconhecimento para a Quinta Nova ser distinguida pelo terceiro ano consecutivo por um guia com esta relevância no setor”, assume Luísa Amorim, administradora da Quinta Nova. “Esta última atribuição é particularmente especial, uma vez que valoriza a essência da proposta da Quinta Nova, exaltando o projeto no seu âmago, ou seja, o casamento perfeito entre o mundo do vinho e do enoturismo.”

A oferta enoturística da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo, na margem direita do Douro, em Covas do Douro, inclui alojamento (11 quartos), restaurante (Conceitus), loja e sala de provas, jardim e piscina panorâmicos e museu (Wine Museum Centre).

Mapa Enogastronómico do Porto e Norte já está disponível

Que ninguém se perca quando a fome e a sede apertam! Já está disponível o Mapa Enogastronómico do Porto e Norte de Portugal, que enumera de forma simples e intuitiva todos os espaços enoturísticos da região. O mapa, lançado pelo Turismo da região, acaba de lançar o contém informações sobre locais a visitar, aconselha provas […]

Que ninguém se perca quando a fome e a sede apertam! Já está disponível o Mapa Enogastronómico do Porto e Norte de Portugal, que enumera de forma simples e intuitiva todos os espaços enoturísticos da região. O mapa, lançado pelo Turismo da região, acaba de lançar o contém informações sobre locais a visitar, aconselha provas gastronómicas e dá orientações sobre regiões demarcadas de vinhos.

O documento possui 23 produtos com Denominação de Origem Protegida (DOP), tem 11 pontos de visitação e 255 quintas de enoturismo. Esta ferramenta turística está disponível em duas línguas – português e espanhol. O mapa, em formato de bolso, está disponível nas lojas de turismo em toda a região Porto e Norte.

“Em 2016 a gastronomia representou 23% do fator de motivação para quem nos visita, logo a seguir ao City Breaks e Touring Cultural, o que nos mostra que é realmente um produto estratégico de extrema importância para a promoção da vinda ao território e por isso mesmo a exigir que haja respostas para quem nos procura”, adianta Melchior Moreira, presidente do Turismo Porto e Norte de Portugal.

Os mercados com mais apetência para este produto são os espanhóis e franceses, os mesmos que mais procuram a região. Em 2017, no acumulado entre Janeiro e Setembro e em comparação com 2016, regista-se um aumento de 11,2% nos visitantes cuja motivação é a gastronomia e vinhos. Os mercados mantêm-se os mesmos, ou seja, Espanha e França registam o maior número de turistas, sendo de salientar o aumento de cerca de 17% da procura por parte dos espanhóis.

 

Duas visões do Douro

São das propostas mais recentes do turismo duriense. Uma aposta num turismo mais massificado, a outra assume uma filosofia de recolhimento. De um lado o turismo de passagem, do outro a estadia. Diferentes como são, coincidem num ponto fundamental: com elas, o Douro fica ainda mais apelativo!   TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo Palma Veiga […]

São das propostas mais recentes do turismo duriense. Uma aposta num turismo mais massificado, a outra assume uma filosofia de recolhimento. De um lado o turismo de passagem, do outro a estadia. Diferentes como são, coincidem num ponto fundamental: com elas, o Douro fica ainda mais apelativo!

 

TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo Palma Veiga

O Douro continua a marcar pontos no panorama turístico português e reafirma-se como o exemplo mais perfeito de como o enoturismo se infiltrou tanto na imagem e na oferta de Portugal que já deixou de ser um nicho. Aqui, por entre encostas talhadas à mão e um rio que espelha a paisagem que o rodeia, tudo nos fala de vinho e dos homens que regaram a terra com suor para o fazerem crescer por entre placas de xisto. Mas, ao mesmo tempo que é omnipresente, o vinho também sabe partilhar a ribalta com outros argumentos destas paragens mágicas.

De carro, comboio ou barco (e até de helicóptero, para os mais abonados), descobrir o vale do Douro é sempre um espectáculo de perder a respiração. E para isso nem precisamos de gostar de vinho – embora ajude, caros abstémios! Não espanta, por isso, que a multidão de visitantes seja cada vez mais heterogénea, interessada nos vinhos e nas vinhas que lhes dão origem, mas não só: a natureza, o património histórico, as gentes. E também as experiências. Ninguém ficará desiludido.

À medida que cresce o fluxo turístico, também a oferta se alarga e diversifica. Com propostas muitas vezes bem diferentes, mas que se complementam. Desta vez, rumámos à zona do Pinhão para conhecermos duas apostas recentes – uma ambiciosa renovação e
uma estreia absoluta. De um lado, potenciam-se as visitas e as experiências de um dia; do outro, a aposta vira-se para a estadia, num clima de sossego e exclusividade.

Para quem chega ao Pinhão pelas cénicas EN222 e EN323, há agora motivos reforçados para sair à direita mesmo antes da entrada na ponte metálica que nos leva ao centro da vila duriense. A Quinta das Carvalhas, enorme (500 hectares) propriedade icónica da Real Companhia Velha, recuperou infra-estruturas e reformulou a oferta enoturística com propostas e paisagens irrecusáveis. Para quem prossegue na EN222 junto à foz do rio Torto, a viagem é um pouco mais longa, mas vale bem a pena: alguns quilómetros mais à frente, junto à localidade de Ervedosa do Douro, inflectimos na direcção do rio e vamos encontrar a nova Vineyard Residence da Quinta da Gricha, um piscar de olho da Churchill’s a quem sonha com o silêncio e a sedução dos grandes espaços.

QUINTA DAS CARVALHAS
O Verão estava a chegar e não haveria melhor altura para a Quinta das Carvalhas aparecer de cara lavada para seduzir os turistas que rumavam ao Pinhão. Logo no início de Junho,
era apresentado o resultado do investimento feito na remodelação da loja, agora mais moderna, funcional e sedutora. Mas, acima de tudo, o que vinha à tona era o trabalho imenso (e dispendioso…) de embelezamento e reabilitação de caminhos, canteiros, espaços de lazer e edifícios. Hoje, a Quinta das Carvalhas é um verdadeiro jardim panorâmico, com estradas alcatroadas, miradouros arranjados, canteiros bem cuidados, muros e passeios impecáveis. E isto sem nunca deixar de ser uma quinta dedicada à agricultura.

Desde a loja, à beira-rio, até ao ponto mais alto, a casa redonda que coroa a propriedade a 550 metros de altitude, não se encontra um pedacinho de lixo pelo chão, nunca circulamos
fora de superfícies pavimentadas (a não ser que optemos por andar a pé por entre as vinhas), há uma sensação de harmonia que se entranha quase sem darmos por ela. “E isso é muito importante quando, no final, provamos os vinhos da casa!”, sentencia Álvaro Martinho, o responsável pela viticultura das Carvalhas.

É com ele que vamos partir montanha acima, à descoberta da biodiversidade deste naco privilegiado de Douro. E é sempre da região que fala o nosso anfitrião, protagonista da visita Vintage (personalizada, em veículo todo-o-terreno) que, inicialmente, foi encarada como um produto de nicho e que agora se tornou campeã de popularidade.

Diga-se que o nosso anfitrião faz bem por merecer a preferência do visitante. Álvaro é um verdadeiro David Attenborough do Douro: trepa rochas, pendura-se em raízes nas barreiras da estrada, desenha a xisto sobre o asfalto, esmaga ervas com os dedos para lhes extrair aromas, trepa rochas e muros… A dada altura, perante uma menina chinesa que acompanha a família, ensaia mesmo uns truques de magia com uma moeda, antes de atacar, em inglês, a temática das vinhas velhas com castas misturadas.

E se o que faz é, por si só, um espectáculo memorável, convém não julgar o livro apenas pela capa: o que Álvaro nos diz é que, apesar da aparente pobreza, estes solos do Douro (e mais exactamente nesta zona central, grosso modo entre a Régua e a Foz do Tua) sustentam uma incrível variedade de espécies vegetais, que, por seu turno, são a base de uma vida animal abundante. Ou seja, o que Álvaro nos diz é que este solo é especial e que reside aí a explicação para o carácter único dos vinhos que aqui nascem.

Sempre com a fita espelhada do Douro lá em baixo, passamos por vinhas, mato virgem, miradouros e antigas construções; apreciamos vistas, geometrias, cheiros e texturas; coleccionamos emoções. E, justiça seja feita, também ficamos com sede… Quando regressamos à loja, a temperatura já baixou dos inclementes 37 graus que nos esmagaram ao início da tarde, mas a água é muito bem-vinda. E a seguir, o vinho. Belo vinho.

Morada: Quinta das Carvalhas, 5085-034 Pinhão
Tel: 254 738 050 / 925 141 948
Fax: 254 730 851
(Taberna da Adega: 919 001 166)
Mail: carvalhas@realcompanhiavelha.pt
Web: www.realcompanhiavelha.pt/pages/quintas/4
O leque da oferta enoturística das Carvalhas abre com a prova de vinhos na loja (à carta), acompanhada de petiscos regionais. A loja está aberta entre as 10h e as 13h e das 14h às 19h, no Verão; das 14 às 18h durante o Outono/Inverno. Há visitas guiadas em minibus (máximo 20 pessoas) com partida do Pinhão e horários fixos (10h, 12h, 15h, 17h – de terça a domingo entre Maio e Setembro; sob marcação no resto do ano). Custam 12,5 euros por pessoa (5€ crianças entre os 4 e os 11 anos). A visita Vintage, personalizada, está disponível todos os dias mediante marcação, custa 35 euros por pessoa e inclui prova de três vinhos no final. Refeições, piqueniques e caminhadas mediante marcação.

QUINTA DA GRICHA
Se em linha recta (leia-se: no mapa) a distância entre as Carvalhas e a Gricha parece diminuta, por estrada a tarefa é mais complicada. Nada de dramatismos: falamos de alguns
quilómetros, os últimos dos quais, reconheça-se, por estrada degradada e estreita com precipícios impressionantes à espreita. Mas é também esse o trunfo da recém-estreada Vineyard Residence da Quinta da Gricha, propriedade da Churchill’s… Aqui respira-se sossego e recolhimento.

Chegamos e é toda uma vertigem de linhas e rendilhados de vinha que se estende perante o olhar. Lá ao fundo, o Douro ainda brilha na luz doce do final da tarde – e só podemos imaginar como será a vista de lá de baixo… Na verdade, a viagem mais curta e mais gratificante para chegar a este recanto é mesmo pelo rio, rumo ao ancoradouro da Quinta de S. José, uma das várias de nome sonante que aqui se arrumam (Tecedeiras, Roriz, etc…), de onde podemos ser transportados até à Gricha, nome que deriva da palavra usada para descrever uma fonte que jorra das pedras.

E ela lá está, no ponto mais alto do espaço exterior da casa, presidindo, por entre muros de pedra e relvados, ao patamar que enquadra a piscina e a horta, bem como o terreiro das laranjeiras, locais de lazer e remanso onde um livro e um copo de vinho podem ser excelente companhia. São espaços independentes, mas comunicantes, formando um todo de grande harmonia e beleza, para mais cercados por este anfiteatro de céu azul e montanhas espectaculares.

A Vineyard Residence oferece alguns programas de actividades ao ar livre e sugere pontos de interesse para visitar, mas é sem surpresa que ficamos a saber que a maioria dos hóspedes
prefere mesmo é ficar quieta, gozando esta atmosfera de recolhimento. Talvez um dia, quando forem realizadas as obras de recuperação da verdadeira mãe de água e dos túneis que estão a montante da fonte, valha a pena dar uns passos para o lado e descobrir novas maravilhas. Por enquanto, está tudo aqui.

Ou não, porque se um copo de vinho se pode levar para todo o lado, chega uma altura em que apetece sentar à mesa. Antes, um passeio pela adega, com os seus lagares de granito esculpido, e uma boa conversa num dos grandes alpendres da casa – ainda e sempre a vista e o silêncio a comandarem as operações. A casa plana sobre as vinhas e as suas arrebatadoras geometrias, as paredes erguendo-se a meia encosta em tons de branco e cinzento, o laranja do telhado em vívido contraste com o mar de verde em volta.

Jantamos em ambiente familiar, sempre com belos vinhos por companhia, e regressamos ao alpendre para uma última dose de vertigem e silêncio, o pôr-do-sol ainda a reverberar em lampejos de luz sobre os cumes. A seguir, a escuridão instala-se e o céu acende-se de estrelas. Recolhemos aos quartos, espaçosos e confortáveis, mas despojados (não há TV nem ar condicionado – e quem for viciado em telemóveis tem de se esforçar para garantir rede…), com enormes casas de banho e duche espaçoso.

Está calor e temos de dormir de janela aberta. Tirando os grilos, não se ouve mais nada até ser de manhã e o sol voltar a iluminar esta paisagem extraordinária, agora apreciada de volta de um belo pequeno-almoço. A única má notícia é que temos de ir embora.

Morada: Quinta da Gricha, Ervedosa do Douro, 5130-108 S. João da Pesqueira
Tel: 254 422 136
Mail: quintadagricha@churchills-port.com
Web: www.churchills-port.com/quinta-da-gricha-vineyard-residence/
GPS: Latitude ºN – 41.18980; Longitude ºE – -7.47119
Os quatro quartos disponíveis custam, em média, 250 euros por noite para estadias mínimas de duas noites, com pequeno-almoço incluído. As refeições custam 45 ou 55 euros (para hóspedes e visitantes, respectivamente, incluindo a prova de 5 vinhos). As provas de vinhos ficam por 15 (Clássica, 5 vinhos) ou 40 euros (Ruby & Tawny Ports, 6 vinhos do Porto; ou The Gricha Terroir, 2 vinhos topo de gama). Há duas sugestões de tour – uma para
hóspedes, outra para visitantes, ambas envolvendo passeio de barco pelo Douro e com preços sob consulta.

Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo já tem museu

Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo, muxseu

Chama-se Wine Museum Centre Fernanda Ramos Amorim, nasceu na Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e é o mais recente museu do Douro. Com mais de 12.000 turistas anuais, o projecto enoturístico desta quinta situada na margem direita do rio, perto do Pinhão, que já contempla alojamento e restaurante, fica ainda mais completo. O […]

Chama-se Wine Museum Centre Fernanda Ramos Amorim, nasceu na Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e é o mais recente museu do Douro. Com mais de 12.000 turistas anuais, o projecto enoturístico desta quinta situada na margem direita do rio, perto do Pinhão, que já contempla alojamento e restaurante, fica ainda mais completo.
O museu resulta do sonho da coleccionadora, Fernanda Amorim, de preservar a memória cultural da região do Douro, partilhando-a com todos os amantes de vinho que a visitam. O edifício foi desenhado por Arnaldo Barbosa, considerado um dos “arquitectos do Douro”, e os conteúdos estiveram a cargo da empresa de museologia MUSE, com a colaboração da Fundação Museu do Douro. O espólio reflecte a tradição secular do Douro, agora apresentada num acervo representativo do ciclo produtivo do Vinho do Porto, com peças dos séculos XIX e XX, reunidas ao longo de vários anos por Fernanda Ramos Amorim.