Toda a diversidade do Tejo

Aventurarmo-nos pelo Tejo enoturístico arrisca-se sempre a ser uma experiência incompleta, se a ideia for abarcar numa só tirada toda a realidade de uma região tão vasta e diversificada. Desta vez, porém, fomos à procura de casos especiais. Porque o Tejo descobre-se um bocadinho de cada vez, devagar, ao ritmo das águas do maior rio […]

Aventurarmo-nos pelo Tejo enoturístico arrisca-se sempre a ser uma experiência incompleta, se a ideia for abarcar numa só tirada toda a realidade de uma região tão vasta e diversificada. Desta vez, porém, fomos à procura de casos especiais. Porque o Tejo descobre-se um bocadinho de cada vez, devagar, ao ritmo das águas do maior rio da Península Ibérica.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

Antes de mais, uma confissão. O título desta reportagem é manifestamente exagerado: ninguém consegue abarcar toda a diversidade da região vitivinícola do Tejo em dois dias. Na verdade, o que procurámos fazer foi ir à procura de locais que simbolizassem toda essa variedade de solos, microclimas, paisagens e realidades que dão origem a um mosaico de vinhos tão diverso. Nesse sentido, o que este título pretende salientar é essa riqueza, pegando em dois exemplos de como o Tejo tem sempre mais qualquer coisa para descobrir.

Antes de mais, a região é bastante grande: 17 mil hectares de vinha produzem cerca de 650 mil hectolitros de vinho, qualquer coisa à volta de dez por cento do total nacional. De Mação, a Leste, até Rio Maior, a Oeste. De Ferreira do Zêzere, a Norte, até Benavente e Coruche, a Sul. Sempre com o rio Tejo como espinha dorsal, a região abarca paisagens acidentadas e lezírias planas, zonas mais urbanas e outras de agricultura intensiva. E um dos pontos de união de todas estas peças do puzzle é o vinho.

No Tejo as vinhas fazem parte da paisagem e da vida das pessoas há milénios. Embora não haja evidências científicas absolutamente incontestadas, estima-se que se terá feito vinho em Portugal pela primeira vez por volta de 2000 a.C., pela mão dos Tartessos, a primeira grande civilização da Península Ibérica, varrida do mapa no século VI a.C. pelos Cartagineses e cuja capital se situaria no estuário do rio Guadalquivir. À boleia de contactos comerciais, a vinha terá começado a ser plantada nos vales do Tejo e do Sado há cerca de quatro mil anos.

Daí para cá, muita água passou por estes dois grandes rios da península, mas o vinho manteve-se sempre à tona. Na região do Tejo, no entanto, a longa história não chegou para manter o prestígio dos seus néctares, associados durante décadas à ideia de quantidade e não à qualidade. Produzia-se (e produz-se) muito no Tejo e muitos produtores, engarrafadores ou vendedores a granel de todo o país encontravam aí forma de compor os seus lotes. O vinho do Tejo estava em todo o lado, mas não tinha assinatura.

Os últimos anos trouxeram um movimento de recuperação do estatuto dos vinhos do Tejo, que procuram afirmar a sua qualidade e diversidade no panorama nacional. Para já, apenas cerca de 15 por cento (110 mil hectolitros) da produção é certificada, mas estes números estão em crescendo. E a qualidade vai-se afirmando.

 

O charme da fidalguia

A proximidade e a facilidade de acesso a partir de Lisboa (navegando o Tejo) levaram a que muitas famílias da aristocracia se virassem para esta região como zona de tempos livres. Nasceram as quintas e os palacetes, respirava-se o ar puro do campo em vez das pestilências da cidade, organizavam-se caçadas, criavam-se cavalos, realizavam-se touradas, comia-se, bebia-se e convivia-se em belas e românticas propriedades, algumas das quais conservaram todo o seu charme até aos dias de hoje.

E é aqui que o enoturismo entra, e em força. Um pouco por toda a região – a uma distância confortável de Lisboa e mais perto do Norte dada a sua posição central no país – produtores de vinho perceberam que os enoturistas hoje em dia são, essencialmente, turistas. Ou seja, não querem apenas conhecer adegas e provar vinhos. A experiência do vinho e da comida pode e deve estar associada a outros argumentos de sedução.

Um dos locais que visitámos nesta reportagem, a Quinta de Vale de Fornos, na Azambuja, é bem um exemplo disso mesmo: naqueles edifícios as forças francesas montaram quartel-general durante as invasões do século XIX e há quem defenda (numa versão ainda rodeada de alguns pontos de interrogação) que Cristóvão Colombo ali pernoitou – e talvez tenha mandado rezar missa – quando regressou das Américas e foi a Vale do Paraíso para se encontrar com D. João II.

Vale de Fornos tem ainda outra característica curiosa, esta directamente ligada ao universo vínico: nos seus 50 hectares de vinha, metade dos quais estão actualmente em remodelação, podemos encontrar os três terroirs típicos do Tejo: o Bairro, característico da margem direita do rio; o Campo, bordejando a linha de água; e a Charneca, na margem esquerda. Em si só, é um retrato da região, mas, curiosamente, podia nem ser, porque a sua localização coloca a propriedade mesmo na fronteira com a região vitivinícola de Lisboa. Foi dada aos proprietários a possibilidade de optar por uma delas e assim se decidiu que seria Tejo.

Um pouco mais a Norte, em Almeirim, também a Falua tem um contributo para dar à diversidade da região. Os solos do Tejo são maioritariamente constituídos por argilo-calcários na margem direita, mais acidentada; por aluviões, no leito do rio e seus afluentes; e por areias, na margem esquerda. Há também uma mancha de xistos perto de Tomar. E, depois, há a Vinha do Convento. Quatro metros de profundidade de pedra rolada, anacronicamente localizada numa colina, longe do curso do Tejo. Uma paisagem singular, talvez única em Portugal. Vamos até lá.

Fundada em 1994 por João Portugal Ramos, um dos nomes incontornáveis da história moderna do vinho português, a Falua passou entretanto a ser controlada maioritariamente pelo grupo agro-industrial francês Roullier, que aqui fez o seu primeiro grande investimento mundial no sector vitivinícola. Mas se a história é relativamente curta, essa contemporaneidade permite à empresa ter instalações modernas e muito funcionais, construídas de raiz aquando do lançamento do projecto. Adequar essa lógica de produção ao apelo enoturístico é agora um dos desafios deste grande (mais de seis milhões de garrafas/ano) produtor do Tejo.

O edifício cinzento-metalizado situado na zona industrial de Almeirim não é, manifestamente, um château… Mas há muito para descobrir lá dentro. Da sala da recepção passamos à nave das barricas, separada da zona social por uma parede em vidro e com acesso à adega do outro lado. O pé alto generoso, a ausência de luz exterior directa e uma climatização exemplar cumprem a dupla função de proporcionar excelentes condições de estágio para os vinhos e criar uma atmosfera especial.

Passeamos pelo meio das barricas e desembocamos na adega, primeiro na zona dos balseiros em madeira, depois através das alamedas de depósitos em inox. A higiene é aqui levada muito a sério, por opção da casa e por imposição das especificações internacionais que estão associadas à exportação para o Reino Unido. O resultado é impecável: não se vê nada fora do sítio, o chão está sempre a brilhar e toda a gente cumpre escrupulosamente as regras de limpeza – o que implica, por exemplo, que haja balneários com chuveiro para os funcionários.

Subimos ao andar de cima, para a sala de provas e refeições, também ela ligada visualmente à nave de barricas por uma parede de vidro. Duas grandes mesas em madeira dominam o espaço, onde também pontifica um ecrã para passar vídeos promocionais. Do lado oposto às barricas, uma varanda abre-se sobre a fachada do edifício. Num terreno lateral, a Falua plantou uma vinha pedagógica, com todas as castas cultivadas pela casa. E são bastantes, em 68 hectares de vinha própria, mais 250 sob gestão, em colaboração com os proprietários.

Mas é no campo que está a impressão mais forte. Ali a dois ou três quilómetros, visitamos a Vinha do Convento, uma extensão de 40 hectares agora cortada pela A13 que desafia a imaginação. Estamos a uns três quilómetros do curso actual do Tejo, mas percebe-se que o rio, em tempos, teve outros planos. A vinha cresce numa colina cujo solo é formado por pedra rolada, típica dos leitos de água corrente, e foi plantada de origem – e à mão – num terreno vazio quando a Falua foi fundada. Uma loucura que deu à região do Tejo um terroir único.

FALUA
Zona Industrial, Lote 56, Almeirim
Tel: 243 594 280
Mail: falua@falua.net
Web: www.falua.net

As instalações da empresa estão abertas das 9h30 às 12h30 e entre as 14h e as 17h30. As visitas são agendadas mediante marcação prévia e custam 10 euros por pessoa (visita ao centro de vinificação e sala de barricas, mais prova de três vinhos (gamas Conde de Vimioso e/ou Falua); ou 15 euros por pessoa (inclui ainda visita à Vinha do Convento e prova de cinco vinhos das gamas já mencionadas). No menu há também um Curso de Iniciação à Prova de Vinhos (8 vinhos das gamas Conde Vimioso e Falua), que custa 25 euros por pessoa.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 2
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 1,5

AVALIAÇÃO GLOBAL: 16,5

Ali a pouco mais de duas dezenas de quilómetros, na outra margem do rio, a paisagem não podia ser mais diferente. Da modernidade para a tradição, do cascalho rolado para uma variedade de terrenos, dos horizontes abertos para uma paisagem ondulada. Uma alameda arborizada com vinha de ambos os lados conduz-nos a um complexo de edifícios de cor ocre. Um enorme cão dormita lá ao fundo, à nossa frente um portão fechado deixa entrever um terreiro com árvores delimitado por construções térreas e um bloco de maiores dimensões ao fundo.

Há uma porta aberta e por ela entramos no Douro. Perdão, na adega. Mas é tão forte a sensação de estarmos mais a Norte, perante a visão de lagares em granito (escavados à mão no local a partir de ciclópicos blocos únicos) e da organização do espaço, que é quase sem surpresa que ficamos a saber que tudo isto é obra dirigida pela mão certeira de D. Adelaide Ferreira, a Ferreirinha, que ofereceu a Quinta de Vale de Fornos à filha como prenda de casamento. Num dos cantos desta adega velha, ligando com um varandim que permite vista desafogada sobre os gigantescos balseiros (que em breve serão inspecionados, para se saber se podem ser usados), está uma porta que leva directamente à entrada principal da casa. Aqui, o vinho era parte do dia-a-dia.

Descemos as escadas e percebemos pormenores como a existência de um poço e de uma lareira, truques de antanho para climatizar o espaço. As grandes traves em madeira do tecto voltam a trazer-nos o Douro à memória. E saímos para os jardins do palacete, onde, nem de propósito, um faisão se pavoneia nos relvados. O jardim, plantado em socalcos, sobe na direcção da casa principal e estende-se, lateralmente, para a zona de eventos, um grande pavilhão e o pequeno edifício da loja encavalitando-se na encosta sobranceira ao tapete de relva.

Antes passámos por uma velha destilaria, onde varandins em madeira, alambiques antigos, caldeiras e depósitos de água convivem num equilíbrio instável. Espreitamos as vinhas que se estendem, ora em encosta, ora em vales mais férteis. E pressentimos o Tejo lá ao fundo, para lá do vale da entrada da propriedade e por onde sopram constantes as brisas mais frescas que ajudam a temperar o clima mais quente no Verão.

A casa produz quatro tintos e dois brancos – e os vinhos estão agora sob gestão da empresa Encostas de Alqueva, que aqui descobriu um enorme potencial para néctares estruturados e complexos, lotes em que se conjugam castas portuguesas e estrangeiras, mais um varietal de Syrah. Sentemo-nos, portanto, à sombra destas construções seculares, apreciando o silêncio e recordando a história e as histórias do local. De copo na mão, como convém.

QUINTA VALE DE FORNOS
Rua da Olaria, nº48, Azambuja
Tel: 263 402 105 / 919 544 548
Mail: eventos@quintavalefornos.com
Web: www.quintavalefornos.com

A quinta está aberta todos os dias (9h-12h30 e 14h-17h30 aos dias de semana; 10h-17h aos sábados e domingos), excepto nos principais feriados. Exige-se marcação prévia. O leque de opções abre com a prova de vinhos (três vinhos – 7,5 euros por pessoa) e a prova de vinhos com queijos (três vinhos – 15 euros), passando a 20 euros com visita à adega ou vinhas. Almoços e jantares por 30 euros (mínimo 20 pessoas). Almoço com prova de vinhos e visita à adega: 40 euros (mínimo 15 participantes). É possível fazer passeios a cavalo pela quinta (80 euros meio dia, 125 dia completo) e outras actividades mediante solicitação.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17,5

ESTAÇÃO DE SERVIÇO

No Verão os dias são mais longos e convém não descurar o abastecimento sólido, por mais que o calor peça líquidos – o ideal é mesmo conjugar os dois. Nesta volta pelo Tejo, e porque o panorama gastronómico da região tem evoluído de forma sensível, não haverá dificuldade em encontrar boas mesas, mas em jeito de ajudinha aqui ficam três sugestões. Em Santarém, a conjugação dos sabores tradicionais com uma apresentação moderna torna o Ho!Vargas um local altamente recomendável. Em Almeirim, será pecado não “atacar” uma sopa da pedra e o local para o fazer é o Tertúlia da Quinta. Se procura algo mais leve, em Aveiras tem o AveiraMariscos, que não se fica apenas pelos frutos do mar… Bom apetite.

Edição nº29, Setembro 2019

A face mais Verde do Douro

As regiões de fronteira valem sempre mais do que a soma das partes que ficam de cada um dos lados da linha imaginária. E esta regra torna-se ainda mais evidente quando falamos de vinhos. Nas margens do Douro, mas em terra de Verdes, paisagem, património e mesa sempre posta conjugam-se numa experiência única. TEXTO Luís […]

As regiões de fronteira valem sempre mais do que a soma das partes que ficam de cada um dos lados da linha imaginária. E esta regra torna-se ainda mais evidente quando falamos de vinhos. Nas margens do Douro, mas em terra de Verdes, paisagem, património e mesa sempre posta conjugam-se numa experiência única.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

Portugal é, todo ele, uma imensa região vitivinícola. De Norte a Sul, de Leste a Oeste, a vinha faz parte da paisagem, o vinho é objecto de paixões e os dois entrelaçam-se no tecido cultural deste rectângulo à beira-mar plantado. Mas esta “globalização” não se faz de unanimidades nem de padronizações de gostos e sabores. Pelo contrário: cresce e multiplica-se em diversidades que aguçam a curiosidade e enriquecem o retrato geral. Se esta é uma realidade incontornável para quem procura descobrir os vinhos portugueses, ainda mais se acentua quando visitamos as zonas de fronteira entre regiões. Foi o que fizemos desta vez, lançando-nos à descoberta da face mais Verde do Douro.
A região dos Vinhos Verdes é extensa e muito variada, desde os microclimas de Monção e Melgaço às especificidades de cada rio que a atravessam, das margens do Atlântico às agrestes escarpas do rio Douro, das terras altas aos vales férteis. Há vinhos de produção maciça e pérolas raras, sabores unânimes e experiências diferenciadoras, grandes casas e pequenos produtores. Que todo este mosaico se encaixe num puzzle que construiu uma das imagens mais fortes e abrangentes da indústria vitivinícola portuguesa pode parecer surpreendente, mas é mais uma homenagem à qualidade dos vinhos que por aqui se fazem. O Vinho Verde tem um nome e uma alma.
Essa capacidade para se diferenciar acaba por ficar ainda mais evidente na região de confluência entre os Verdes e o Douro. Andámos por terras de Baião e Resende para confirmar que, apesar da paisagem assumidamente duriense, há um toque de frescura e de mineralidade que autentica a assinatura Verdes. De caminho, não resistimos a uma escapadela até Penafiel, onde vive um dos gigantes da região. Justa homenagem a uma casa com história e património, mas também uma oferta enoturística que surpreende quem fizer as contas e concluir que estamos praticamente às portas da cidade do Porto, a meio caminho entre o mar e a vertigem vertical das terras de Resende.
Mas é aqui, no limite oriental da região dos Verdes, com o Douro contorcendo-se lá ao fundo, que iniciamos o nosso roteiro enoturístico, desta vez marcado também pela presença maciça (e saborosa) de árvores de fruto. A cereja (e a de Resende tem muita e justificada fama) já foi colhida, segue-se a ameixa. Para muitos pequenos produtores, a vinha passa momentaneamente para segundo plano, mas nunca fica esquecida. E isso fica bem evidente na primeira paragem. Um caminho empedrado leva-nos do asfalto até ao terreiro da propriedade. De um lado, uma fila de cerejeiras, do outro, a vinha. Chegámos à Quinta da Massôrra.

A primeira impressão é quase contraditória. Há três cães que nos recebem com os seus latidos, mas percebe-se que o silêncio está apenas a ser beliscado. As casas, cobertas de hera, e o arvoredo envolvem-nos numa calma apaziguadora, mas para além delas a paisagem é dramática, com grandes montanhas no horizonte e desníveis impressionantes até ao rio. Não demora muito até assimilarmos tudo isto numa certeza incontestável: o local é belíssimo!
Rui e Anabela Cardoso gerem uma propriedade familiar com 12 hectares, quatro dos quais cobertos de vinha. O resto é um mar de fruta: cerejas (há 23 variedades, incluindo uma que pode ser colhida logo em finais de Abril) e ameixas, principalmente, mas também toranjas, nêsperas, laranjas, peras… Há visitantes que vêm por causa do vinho e acabam a apanhar fruta; outros procuram a quinta por causa da fruta e acabam a degustar um copo de vinho. Em 2018 passaram por aqui mais de 2000 pessoas.
Depois de uma “excursão” ao pomar, para apanhar ameixas, Rui abre as portas da loja da quinta e fala-nos do seu carácter peregrino: está em funcionamento há quase 20 anos, numa altura em que nem se falava de enoturismo e, a bem da verdade, nem se produzia ainda vinho na Quinta da Massôrra. Por força nas suas funções, à altura, no Instituto do Vinho do Porto, Rui visitou outros países e ficou a conhecer o que os produtores faziam para atrair visitantes. Quando se estabeleceu na quinta, acabou por abrir uma loja onde vendia vinhos dos “vizinhos” e outros produtos locais.
Ao lado, sempre nos baixos da casa principal e abrindo para um pátio panorâmico com a horta em primeiro plano, a vinha e os pomares a seguir e depois uma imensidão de serranias em equilíbrio precário sobre as águas do Douro, está a adega. Pequena (a produção anual anda pelas 10.000/15.000 garrafas), mas funcional, com dois lagares em granito e uma prensa manual no meio, agora já sem uso, mas que acentua o carácter artesanal das instalações.
Cá fora, um tanque com água delimita o fantástico pátio panorâmico, a mesa rodeada de cadeiras, pormenores rústicos de decoração em redor. A cobertura do pátio está forrada a hera, tal como todas as casas, formando um conjunto de grande beleza e tranquilidade – com o bónus de as folhas mudarem de cor ao longo do ano, fornecendo uma experiência visual sempre diferente.
Quem vem aqui não esquece. E pode sempre reavivar a memória com os vinhos da casa. Rui garante que cerca de 60 por cento da sua produção é absorvida, directa ou indirectamente, por quem visita a Quinta da Massôrra.

QUINTA DA MASSÔRRA
S. João de Fontoura, Resende
Tel: 254 871 578 / 965 053 820
Mail: geral@quintadamassorra.com
Web: www.quintadamassorra.com
GPS: N 41º6’32’’ | W 7º 55’ 27’’
Os visitantes são recebidos pelos proprietários, que vivem na quinta, pelo que a propriedade está aberta a visitas todos os dias, sugerindo-se contacto telefónico prévio. No terreiro da casa, pendurada numa árvore, está uma sineta, para avisar da chegada. A visita custa 7,5 euros por pessoa. Possibilidade de organizar outros programas sob consulta.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 2
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17,5

Da margem esquerda do Douro para a margem direita. De um projecto enoturístico com quase duas décadas a outro acabadinho de nascer. A Quinta de Santa Teresa, concelho de Baião, é a propriedade mais recente da A&D Wines, juntando-se à Casa do Arrabalde e à Quinta dos Espinhosos. Com 66 hectares (33 de vinha) espalhando-se ao longo de um cotovelo nas encostas que conduzem ao rio Douro, é a maior de todas. E também a mais bonita, graças a um património, natural e edificado, verdadeiramente notável.
A adega fica cá em baixo, junto à estrada, mas é preciso cumprir mais algumas curvas para alcançarmos a casa principal, primeiro, e as instalações de enoturismo, lá no alto. Um pavilhão de estrutura metálica e paredes de vidro paira sobre a piscina para acolher os visitantes. Esta original palafita, de onde se vislumbra o rio e se espraia o olhar por serranias e casario, está assente sobre uma laje que transformou a piscina de saltos num enorme reservatório de água. Ao lado, as piscinas para adultos e crianças estão operacionais.
Para quem visita a quinta, é aqui que tudo começa e acaba. Mas, pelo meio, há muito para conhecer. E deslumbrar. Ao longo da estrada empedrada que percorre toda a propriedade deparamo-nos com muros ciclópicos que sustentam os terraços de vinha, encontramos jardins e hortas, algumas pequenas construções, bicharada surpreendente (a quinta funciona em regime biológico), tanques e minas de água. E até damos de caras com um colossal pé de videira pré-filoxérico, com mais de 200 anos e que cobre uma área aproximada de 20 metros quadrados. Em 2018, produziu 230kg de uva da casta Avesso – alguém se deu ao trabalho de contar todos os cachos… e eram 580!
Mais velha é a videira do que a casa da quinta, que data de 1951. Aliás, com vinhas a rondar os 100 anos, percebe-se que esta sempre foi terra de vinho. O Douro começa logo ali acima, a escassos metros das últimas vinhas da quinta, onde o terreno deixa de ser granítico e passa a ser de xisto. Bate certo.
Ao fundo, um bosque promete frescura e belos cenários naturais para passear. Mas o que os homens construíram mostra-se bem à altura da generosidade da Natureza: jardins românticos, recantos e escadarias que proporcionam privacidade e silêncio, estátuas, fontes, painéis de azulejo. Se isto não é o cenário ideal para um hotel de charme, então não percebemos nada do assunto… “Um dia!”, prometem os proprietários.
Até lá, é preciso partir quando termina a visita. Há quem se faça desentendido e vá ficando de copo na mão – de vez em quando, alguns até se atiram à piscina…

QUINTA DE SANTA TERESA
Rua de Arufe, 530; Loivos da Ribeira, Baião
Tel: 229 419 378/9
Mail: info@andwines.pt
Web: www.andwines.pt
A quinta está aberta para provas e visitas todos os dias, das 10h às 18h; ao fim-de-semana solicita-se marcação antecipada. O número máximo sugerido de participantes por grupo é de 12 pessoas. A prova com visita à quinta custa 15 euros por pessoa (20 euros com tapas) e há duas provas standard: Monólogo e Avesso, ambas com três vinhos. O visitante pode, no entanto, escolher entre os diferentes vinhos do portefólio da casa. Outros programas e actividades mediante consulta.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 1,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 18

A coerência é uma virtude, mas quando levada ao extremo pode tornar-se limitativa. E, por isso, viramos costas à zona de transição entre Verdes e Douro e internamo-nos assumidamente na primeira, rumo a Penafiel, onde, com o Porto a meia hora de distância, encontramos um dos mais notáveis jardins portugueses. E muito mais, como se há-de relatar. Estamos na Quinta da Aveleda.
Em 2018, passaram por aqui 27.000 visitantes, a que se podem juntar outros 23.000 que optaram por visitar apenas a loja. São números impressionantes, mas ainda muito longe do potencial deste local. Os jardins são espantosos – dez hectares (é um dos maiores jardins privados do país) de floresta variada (120 espécies, incluindo exemplares gigantes), recantos ajardinados (há, por exemplo, 90 espécies diferentes de camélias), lagos, espaços abertos e construções pitorescas, povoados por uma fauna riquíssima, que até inclui uma raposa.
Quatro em cada cinco visitantes não são portugueses, o que motiva a equipa de enoturismo da Aveleda a apostar mais na divulgação interna deste local mágico. É que, para além dos jardins, há todo um património edificado que justifica a visita. Uma cozinha tradicional, a cocheira (com carruagens, arreios e outros aprestos da arte equestre), o imponente terreiro da eira, a loja e sala de provas, a vetusta Adega Velha onde, ao som de música monástica, repousam as aguardentes, em centenas de pipas de madeira. Há torres com ameias, paredes cobertas de hera, espigueiros, alpendres e varandas panorâmicas, chaminés incríveis. Em redor, uma centena de hectares de vinha recorda-nos que tudo isto foi construído à volta do vinho.
O enoturismo na Aveleda começou há muito tempo, nos anos 1960/70, apenas porque os donos dos hotéis na costa entre Esposende e Espinho convenceram os proprietários – a família Guedes – a abrirem portas a visitas e provas, para criarem programas que pudessem diversificar a experiência proporcionada aos seus hóspedes. Mas este regime semi-informal só começou a mudar há cerca de quatro anos, com a crescente aposta no sector.
Hoje, a Aveleda é um mar de tranquilidade e beleza, mas também um caldeirão de ideias e projectos. Novos espaços, novas funcionalidades, criação de núcleos museológicos nas casinhas do jardim (algumas delas transportam-nos de imediato para a terra dos hobbits), mais e melhores programas. Mas, na essência, já está tudo lá: uma belíssima moldura natural e arquitectónica para uma experiência vínica de grande qualidade. A apenas meia hora da cidade do Porto, nunca é de mais repetir.

QUINTA DA AVELEDA
Rua da Aveleda, nº 2, Penafiel
Tel: 255 718 242 / 255 718 266
Mail: enoturismo@aveleda.pt; loja.aveleda@aveleda.pt
Web: www.aveleda.pt
GPS: 41.208511 | -8.308196
Visitas guiadas todos os dias às 10h, 11h30, 15h e 16h30, com marcação antecipada. O custo está incluído no das provas de vinho, que podem ir desde os 10 euros por pessoa (Standard – três vinhos) até aos 70 euros por pessoa (Exclusiva – quatro vinhos, mais aguardente). Refeições entre 40 e 80 euros por pessoa, harmonizações entre 5 e 15 euros por pessoa. Há vários programas especiais no menu, incluindo o Momentos Aveleda (64,5 euros com almoço) ou o Make Your Own Wine (40 euros). A quinta acolhe eventos e organiza workshops. A loja está aberta de segunda a sábado (9h-13h/14h-18h).

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 18,5

ESTAÇÃO DE SERVIÇO
Os ares do campo abrem o apetite e nem só de vinho vive o Homem… Por isso, aqui ficam duas sugestões para reabastecer o corpo e a alma enquanto vagueamos por terras dos Verdes com vista para o Douro. Muito mais haveria para escolher, mas desta vez destacamos um restaurante urbano e outro rural. Em Penafiel, a Casa Sapo promete surpreender quem julga que já viu de tudo à mesa e exibe uma bela colecção de camisolas de futebol autografadas. Na Gralheira, a 1100 metros de altitude, o Recanto dos Carvalhos recebe-nos numa das terras mais altas de Portugal, por entre uma paisagem verdadeiramente magnífica. Leve fome, traga belas recordações.

Edição nº28, Agosto 2019

Porto em Lisboa

As duas maiores cidades portuguesas são, cada vez mais, destinos turísticos universais. Lisboa e Porto estão no topo das preferências dos turistas que nos visitam e, entre os seus muitos argumentos de sedução, a comida e o vinho assumem protagonismo. Mas há uma grande diferença: o Vinho do Porto. Nas margens do Douro, ele é […]

As duas maiores cidades portuguesas são, cada vez mais, destinos turísticos universais. Lisboa e Porto estão no topo das preferências dos turistas que nos visitam e, entre os seus muitos argumentos de sedução, a comida e o vinho assumem protagonismo. Mas há uma grande diferença: o Vinho do Porto. Nas margens do Douro, ele é rei. E na capital? Fomos saber onde, e como, se homenageia o mais conhecido dos vinhos lusitanos por terras de Lisboa.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

O Vinho do Porto é um dos produtos portugueses mais conhecidos e apreciados no mundo. Não será, até, exagero se dissermos que é “o” produto português, aquele que mais rapidamente se associa à imagem do país lá fora. Sim, há Cristiano Ronaldo e o futebol. E quase nove séculos de história que ajudaram a moldar o mundo como o conhecemos. E o mar, mais as praias de areia e as falésias que o emolduram. Mas o Vinho do Porto apresenta Portugal em todo o planeta. Em grande estilo.
Para quem nos visita, claro, é experiência quase obrigatória conhecer melhor esses néctares que os homens arrancam a uma Natureza austera e implacável. Muitos decidem-se mesmo por explorar o vale do Douro, em busca das raízes profundas do Vinho do Porto. Para os outros, tantos outros, esta “viagem” faz-se de copo na mão, provando e aprendendo com quem sabe abrir as portas desse fascinante mundo.
E há tanto para descobrir. Branco, Ruby e Tawny são os três tipos de Porto e dentro de cada uma dessas categorias há muito por onde escolher. Brancos datados, mais doces ou mais secos, as novas tendências de cocktails, como o Porto tónico. Ruby, Reserva, LBV ou Vintage. Tawny Reserva, Colheita ou com indicação de idade. O Porto é toda uma paleta de cores e sabores à espera de espíritos curiosos que a queiram explorar.
O Grande Porto, claro, é o epicentro desta actividade. As caves de Gaia e as margens do Douro são um incontornável pólo de atracção turística da região. Centenas de milhares de pessoas visitam anualmente as instalações das grandes empresas do sector – e muitas mais serão, certamente, num futuro próximo, com a anunciada aposta, por parte da Fladgate, num grande parque temático do sector, o World of Wine, cuja abertura já foi anunciada para o Verão de 2020.
Então e Lisboa? O que pode oferecer a capital a quem a visita e quer saber mais sobre o grande vinho português? À primeira vista, as notícias pareciam não ser boas: o Solar do Vinho do Porto, que durante anos foi o grande “embaixador” do néctar do Douro, encontra-se encerrado para obras, pelo menos até 2020… Das principais empresas do sector, apenas a Sogrape, com a Sandeman, tinha investido no mercado lisboeta, mas também foi sol de pouca dura. E então surgiu a informação de que a Taylor’s ia abrir um espaço próprio na capital.
O anúncio deste investimento espicaçou-nos a curiosidade: será que o Porto está bem representado em Lisboa? À falta de espaços institucionais, poderiam os wine bars que vão surgindo um pouco por toda a cidade assumir a passagem de testemunho? Fomos à procura de respostas. E regressámos com uma certeza: quem visita a capital tem muitas, e boas, propostas para mergulhar no universo Porto. Vamos conhecer algumas.

Dos espaços que visitámos, este é o mais recente: abriu a 9 de Maio, ali perto do Campo das Cebolas, uma zona cada vez mais turística por força da proximidade com a Praça do Comércio e a colina de Alfama, junto ao novo terminal de cruzeiros. Mesmo ao lado do Chafariz D’El Rei, o edifício da Taylor’s está classificado e isso, se acrescenta ao seu charme, também entrava os planos da empresa para dar mais visibilidade exterior ao seu espaço. Mas adiante, que lá dentro é que se está bem.
No piso térreo, a loja tem um pouco de tudo. Os vinhos, naturalmente, são o prato-forte, mas também encontra¬mos chocolates ou azeite, merchandising da marca (desde t-shirts e bonés até aos puzzles ou chapéus de chuva), bolsas, postais ilustrados, canecas, copos, velas de cera, enfeites de Natal, decanters… Até há meias. E modelos de garrafas para construir em Lego.
Subindo as escadas, entramos na zona de provas. São três salas, de paredes claras e despidas, tirando os cartazes com “cartoons” humorísticos relacionados com a marca, fotos antigas da faina vinhateira, um grande espelho de moldura dourada e o ecrã onde passa um vídeo que nos fala do vale do Douro e da insana teimosia dos homens que ali esculpiram uma paisagem de ficção científica em nome do vinho.
Mesas e bancos de madeira (há 100 lugares disponíveis) espalham-se pelas divisões bem iluminadas, o Tejo entrando pelas janelas, onde há também balcões e assentos que nos fazem pensar de imediato nas célebres namoradeiras. Algumas paredes conservam à vista as pedras originais e notam-se os sinais das arcadas antigas que sustentam o edifício.
A clientela faz-se maioritariamente de turistas estrangeiros, mas, garantem, nota-se uma cada vez maior curiosidade dos portugueses pelo Vinho do Porto, atraídos também pela possibilidade de saborear a copo vinhos cujos preços, à garrafa, estão normalmente fora das possibilidades do cidadão comum, como alguns Vintage e Tawnies velhos – os primeiros são mesmo os mais populares. “São vinhos de que as pessoas ouvem falar, mas não conhecem”, assume Anne Marie Faustino, directora do Centro de Visitas Taylor’s.
Mas a Taylor’s promete não ficar por aqui. Um edifício contíguo foi adquirido pela empresa para aí montar um centro de visitas. O cenário não podia ser mais adequado para emular a atmosfera das caves de Gaia: paredes em pedra, vestígios arqueológicos, abóbadas em tijolo… As obras já começaram.
Aberto todos os dias, das 11h às 19h30.
Não é necessário fazer reserva. Há 15 vinhos disponíveis a copo
(a partir de 5 euros) e uma prova de cinco Porto, entre os quais alguns ícones da casa (40 euros).

RUA CAIS DE SANTARÉM, Nº8, LISBOA
TEL: 218 863 105
MAIL: lisbon@taylor.pt

Há um ano, completo neste mês de Julho, que Lisboa se juntou às cidades do Porto e Paris no universo Portologia. Julien dos Santos, lusodescendente, é o homem por trás deste projecto e é também o dono da Hermitage – no espaço lisboeta, os Vinhos do Porto de entrada de gama são todos desta empresa, abrindo espaço nas categorias superiores para outros produtores, todos pequenos e independentes.
Situada na Baixa, a loja/sala de provas tem 30 lugares disponíveis e a clientela, assume com algum humor Gustavo Luís, o responsável pelo espaço, será “97 por cento estrangeira”. Quem entra pode fazer provas de Vinho do Porto (o cardápio é vasto, desde as provas mais básicas a outras verticais e temáticas – o folheto fala mesmo de “degustações comentadas, de 3 a 30 copos”), adquirir garrafas do generoso e de vinhos tranquilos, mas também queijos, enchidos, compotas, conservas, azeite.
Na parede, uma grande foto do vale do Douro capta de imediato o olhar, que depois se espraia pelas estantes com garrafas, pelas barricas, caixas e mesas de madeira. A de¬coração inclui ainda algumas alfaias agrícolas, decanters, rolhas. O espaço não é grande e acaba por ser dominado pelo balcão frigorífico à direita de quem entra, mas torna¬-se acolhedor e intimista. Bem à medida de um copo ao fim da tarde… “Pela hora do almoço temos algum movi¬mento, mas o período mais intenso é entre as 17h e as 20h”, confirma Gustavo Luís.
A vontade de descobrir o universo Porto é o sentimento mais comum entre os visitantes que optam por fazer provas. E, por isso, não surpreende que a mais popular seja a que junta seis tipos de Porto diferentes, uma degustação comentada que entreabre a porta para as variações deste vinho tão multifacetado. Mas também há experiências dedicadas a quem quer ir mais longe: Novos vs Velhos; Brancos Secos ou Brancos Velhos são alguns exemplos.
O conceito Portologia parece estar de pedra e cal e, se é ainda cedo para falar de localizações específicas, Gustavo Luís assume que existe a intenção de alargar o leque de espaços. Por agora, são três. Com muito vinho para provar e comprar. Um casal francês entra e prepara-se para descobrir mais sobre o Vinho do Porto; dois jovens, também estrangeiros, pesquisam nas prateleiras um vinho diferente para levar. Lá fora, já se fez noite. E os copos continuam a encher-se de magia.
Aberto todos os dias, das 11h às 24h.
Há mais de 200 vinhos disponíveis para prova e um leque
muito alargado de provas de Vinho do Porto.

RUA DE SÃO JULIÃO, Nº 36, LISBOA
TEL: 210 179 313
E-MAIL: lisboa@portologia.pt

 

Cláudia (ou Alexandra; ela usa os dois nomes) e Adriana eram jornalistas, mas sentiam-se saturadas da profissão. E ambas gostavam de vinho e gastronomia. Deste ponto de encontro nasceu a ideia de começarem a fazer provas de comida e vinhos portugueses. Ao princípio, em sítios que iam variando; depois, assentaram no seu próprio espaço. A 7 de Dezembro de 2015, nascia a Lisbon Winery. “Tem sido uma aventura”, resume Cláudia.
Fica no Bairro Alto e o Vinho do Porto sempre foi uma opção assumida das duas anfitriãs. “Havia muita gente que dizia que não gostava e quisemos provar que o Porto tinha muito para descobrir. As pessoas ficam agradavelmente surpreendidas, porque bebem coisas bem diferentes do que conheciam”, explica Adriana. A filosofia da casa é servir apenas vinhos de qualidade feitos por peque¬nos produtores. Isso e apostar continuamente em abrir horizontes. “Estamos sempre a renovar a carta”, garantem.
O espaço, com pouco mais de 30 lugares sentados, é informal e descontraído. A parede onde uma ilustração de um cacho de uvas está rodeada de nomes de castas portuguesas (120, no total) chama a atenção à entrada, mas o grande ex-libris está lá ao fundo: uma imponente cisterna do século XVI, classificada, que se estende desde o tecto até abaixo do nível do piso – um pavimento em vidro alinha pelo chão do espaço circundante, possibilitando o experiência de passear por ali desafiando as vertigens.
Quase metade das provas solicitadas – com predomínio evidente de estrangeiros – são de Porto. E não se trata de uma prova qualquer: a prova premium de Vinho do Porto inclui um branco seco, um branco datado, dois Tawnies e um Ruby; mais seis variedades de queijos artesanais, outras tantas de enchidos de porco preto, presunto Pata Negra e compotas tradicionais. Os vinhos são sempre de marcas menos conhecidas – a Messias e a Dalva serão as relativas excepções a esta regra, mas, no caso da segunda, neste momento apenas com um vinho: o extraordinário branco Golden Light, de 1963.
Sinal dos tempos, Cláudia e Adriana assumem elas próprias a condução das provas, face à dificuldade de encontrar pessoal especializado que lhes garanta esse serviço… Não ficam os clientes a perder, por certo. Afinal, e apesar de na maior parte dos casos já serem os produtores a pro¬curá-las para colocarem os seus vinhos, são elas que provam e seleccionam todas as referências que são servidas aqui. Sempre com aquele prazer secreto de descobrir um olhar de espanto em quem leva o copo à boca.
Aberto de terça a sábado, das 15h às 23h.
Há provas diárias às 15h30 e às 17h30 que requerem marcação. Mas pode-se sempre solicitar uma prova à entrada. A Prova Premium de Vinho do Porto custa 65 euros por pessoa.

RUA DA BARROCA, Nº13, LISBOA
TEL: 218 260 132 | 919 292 151 | 914 310 744
E-MAIL: alex@lisbonwinery.com | adriana@lisbonwinery.com

Edição Nº27, Julho 2019

 

Ali bem perto, também no Bairro Alto, fica o “veterano” dos espaços visitados pela nossa reportagem: o Grapes & Bites abriu portas (e garrafas) em Setembro de 2010. É um espaço de referência no panorama nacional e a sua atenção específica ao Vinho do Porto fica desde logo bem patente na decoração da casa, com pipas a servirem de mesas, garrafas por todo o lado e um armário fechado onde repousam algumas relíquias.
Aproximemo-nos. Estão aqui, ou espalhadas por outras prateleiras e no balcão, ícones como o Scion, da Taylor’s; o Ne Oublie, da Graham’s; Burmester de 1937; Kopke do mesmo ano; Real Companhia Velha 1938; Noval Nacional 2004… Os preços de algumas destas garrafas ascendem aos quatro dígitos – isso mesmo, milhares de euros. Serão algumas das excepções mencionadas pelos responsáveis da casa quando garantem que “quase todos os vinhos podem ser pedidos a copo, excepto alguns casos especiais”. Mas há duas dezenas de referências de Porto na carta, a que se junta uma escolha de vintages e colheitas mais abrangente. E, já agora, o Porto “da casa”, o Branco Grapes & Bites by Andresen.
Também aqui os estrangeiros estão em maioria, apesar de se “notar evolução no interesse dos portugueses pelo Vinho do Porto”, assume Sílvia Mendes, uma das proprietárias. A procura crescente de refeições para grupos no Grapes & Bites, que integra um hostel nos andares superiores, levou à alteração do menu e à configuração do espaço, que se assemelha mais a um restaurante. Mas o forte continua a ser o vinho, com centenas de referências à prova.
O ambiente da sala oscila entre a linha mais moderna das mesas e cadeiras e o toque arcaico das arcadas e pilares que sustentam o tecto. Pelas paredes alinham-se expositores cheios de garrafas, que também se encontram no interior das quatro pipas transformadas em mesas e por cima do balcão, ao fundo da sala. Por aqui organizam-se provas comentadas, almoços vínicos (um por mês), toca-se regularmente música ao vivo.
Há pouco mais de dois anos, surgiu a oportunidade de complementar o Grapes & Bites com mais um espaço. Nasceu assim, no Cais do Sodré (Rua de S. Paulo), The Wine Cellar, um estabelecimento mais pequeno e intimista, com clientela mais diurna e mais portuguesa. A grande superfície vidrada chama a atenção de quem passa e a oferta, sendo menos exuberante do que a da casa-mãe, também pode rapidamente beneficiar da proximidade física dos dois espaços. Em cinco minutos, qualquer garrafa “faz a viagem” a pé…
Aberto todos os dias, das 14h às 2h. Centenas de referências à prova, a maioria das quais com serviço a copo.

RUA DO NORTE, Nº81, LISBOA
TEL: 919 361 171
E-MAIL: info@grapesandbites.com

QUINTA DO GRADIL: O encanto da aristocracia num mar de verde

A menos de uma hora de Lisboa e numa paisagem dominada pela silhueta da serra de Montejunto, a Quinta do Gradil alindou-se e criou condições para se tornar um destino de referência do enoturismo. História, sofisticação, envolvente natural, oferta variada e grandes vinhos compõem um “cocktail” irresistível. TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo Gomez O processo […]

A menos de uma hora de Lisboa e numa paisagem dominada pela silhueta da serra de Montejunto, a Quinta do Gradil alindou-se e criou condições para se tornar um destino de referência do enoturismo. História, sofisticação, envolvente natural, oferta variada e grandes vinhos compõem um “cocktail” irresistível.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

O processo tem muitas semelhanças com o que vai acontecendo um pouco por todo o país vínico: começa-se por investir nas vinhas, depois vem a adega e, com a consolidação do projecto, abrem-se horizontes. Na Quinta do Gradil, as últimas duas décadas foram de enorme crescimento na produção e no volume de negócios; agora aposta-se forte no enoturismo. Mas o que distingue este produtor da zona do Cadaval, região de Lisboa, de outros com trajecto semelhante é o peso do passado. Há séculos que a quinta está aqui. E nela, a par dos ares frescos da serra de Montejunto, respira-se a atmosfera da fidalguia.
Os primeiros registos da existência neste local de uma quinta vêm do século XV: a 14 de Fevereiro de 1492 (mais de cinco anos antes de Vasco da Gama partir para a Índia!), um documento régio de D. João II registava a doação da jurisdição e rendas do Concelho do Cadaval e da Quinta do Gradil a D. Martinho de Noronha. A propriedade esteve depois nas mãos da casa de Bragança e no século XIX entrou para os domínios do Marquês de Pombal, quando o que viria a ser o sexto da linhagem, António de Carvalho Daun e Lorena, casou com Maria do Carmo Romeiro da Fonseca, proprietária e figura decisiva na história da quinta. Sampaio de Oliveira tornou-se dono do Gradil a partir de meados do século XX e em 1999 entrou em cena a família Vieira.
A era moderna iniciou-se com a reconversão total das vinhas e o investimento na adega, fundamentais para a afirmação de um projecto que, hoje, “vale” 20 milhões de garrafas/ano, sob a chancela Parras Wines, que produz vinhos em várias regiões do país. Para além dos 120 hectares do Gradil, a empresa adquiriu recentemente a Herdade da Candeeira, no Redondo, Alentejo, onde está a alargar a área de vinha; e gere os 20 hectares das Gaeiras, em Óbidos. Ao todo, já são mais de 300 hectares em produção, a que se junta um elevado número de produtores referenciados e apoiados pelos técnicos da Parras, que fornecem uvas para as diversas referências da casa: Quinta do Gradil, Castelo do Sulco e Mula Velha.
Para quem chega à quinta, a impressão visual mais forte era dada pela presença maciça dos enormes depósitos de alumínio nas traseiras da adega, já a meia-encosta. Só depois ganhava protagonismo a silhueta elegante dos edifícios fronteiros, uma linha amarela emergindo do verde das vinhas que se estendem na várzea que separa a quinta da estrada nacional 115. Mas agora, apesar de haver ainda mais (e maiores) depósitos, a paisagem ganhou um novo foco. Porque o edifício do palácio (construído em 1854) foi recuperado e isso devolveu o protagonismo à faceta mais aristocrática do complexo.

Saímos da estrada, passamos uma pequena ponte e estamos rodeados de vinhas. À nossa frente, uma rampa aponta ao terreiro central, rodeado pelos volumes da adega (à direita de quem chega) e do palacete, flanqueado pela capela devotada a Santa Rita de Cássia (à esquerda). Até há pouco tempo, este equilíbrio estava refém do aspecto degradado dos edifícios mais nobres. Agora, tudo faz outro sentido. A fachada de portadas verticais, encimada por pequenos blocos que fazem lembrar ameias de castelo, e o corpo central onde se distingue o escudo da casa devolveram à Quinta do Gradil o seu encanto aristocrático.
Lá dentro, um enorme e multifuncional salão para eventos, cozinha e outros espaços mais pequenos oferecem condições para a realização de eventos de grande dimensão. Mas há mais: nas traseiras, um pátio quadrangular onde podem ser montadas estruturas provisórias proporciona uma experiência mais intimista. É o Pátio Maria do Carmo, a mulher responsável por muitas das grandes infra-estruturas da quinta e que gostava de se recolher neste recanto para contemplar o seu jardim – agora, é uma vinha, que se estende ao longo do vale até às primeiras ondulações das colinas defronte.
O salão grande é o Salão dos Marqueses; o terreiro central é o Pátio das Conversas – um topónimo bem explicado pela existência de muitas “namoradeiras”, ou bancos de conversas, ao longo do muro que delimita o espaço (e há placas que explicam a origem dos nomes). No centro, um tanque com água, à volta as construções que albergam agora a loja (na antiga sala de costura da senhora da casa), o restaurante (era uma destilaria – ainda lá estão dois grandes alambiques em cobre), a adega. Aproveitar o que havia e encontrar novas funcionalidades é uma política sempre presente nas opções da equipa do Gradil.
A loja funciona há cinco anos e meio e foi aqui que começou a aposta no enoturismo. Hoje é um espaço funcional e elegante, onde, para além dos vinhos da casa, podemos encontrar produtos como o azeite, compotas, chocolates ou ervas para temperos e infusões. Pequenas provas podem ser feitas neste recanto, usando a mesa feita a partir de uma barrica. Mas já há planos para alargar o espaço. Aqui não faltam objectivos: o moinho situado na encosta das traseiras vai ser recuperado para palco de provas; o mesmo para a torre-cisterna, também na parte de trás do edifício e que fornece um belo miradouro sobre a paisagem circundante, dominada pela silhueta do maciço de Montejunto (666 metros de altitude), que se afirma logo do outro lado da estrada nacional.

Serão investimentos pequenos, se comparados com o esforço feito para recuperar o edifício do palácio e a capela. As novas instalações, apresentadas este mês, custaram 1,2 milhões de euros, a que se juntarão, num futuro próximo, outros 500 mil para transformar a cave do edifício numa sala de barricas, com recepção, sala multiusos e enoteca. Tudo isto tem de ser bem equilibrado com a gestão corrente da empresa, lembra Luís Vieira, o líder da Quinta do Gradil, ainda mais numa altura em que a empresa investiu sete milhões de euros nas novas vinhas no Alentejo e está em vias de construir uma adega na região (para três milhões de litros) por outros 3,5 milhões…
Mas regressemos ao enoturismo, que os números ficam nos gabinetes de gestão. Depois da loja, a Quinta do Gradil começou a “piscar o olho” aos visitantes comemorando todas as datas especiais com dias abertos, fornecendo o pretexto para as pessoas conhecerem a propriedade. Nasceram assim programas como o BTT nas Vinhas (para comemorar o Dia Mundial da Bicicleta), mas outros não precisaram de data especial para se tornarem sucessos instantâneos – acontece, por exemplo, com o Wine Trail Run, que no ano passado juntou 400 participantes no percurso traçado ao longo da impressionante envolvente natural da quinta.
Há três anos e meio, o restaurante, que estava concessionado, passou a ser gerido directamente pela equipa de enoturismo do Gradil, que definiu o objectivo de criar uma unidade onde a cozinha andasse de braço dado com os vinhos. Com o chef Daniel Sequeira ao leme na cozinha, o restaurante funciona todos os dias menos à terça-feira, com lotação para 30 pessoas (ou 60, aproveitando o espaço da entrada, para grupos maiores). O menu do chef custa 70 euros por pessoa e inclui cinco pratos, com vinhos a acompanhar e o “extra” da aguardente XO da casa a encerrar a função.
O que não existe no Gradil é alvo de parcerias, para que nada falte no “cardápio” enoturístico de quem visita a quinta. É nesse sentido que foram feitas parcerias com uma unidade de alojamento nas redondezas, ou com o moinho situado ali em frente, na encosta do maciço do Montejunto, onde se faz pão como antigamente, utilizando duas estirpes de trigo quase extintas e que vêm da Maçussa, onde são cultivados por Adolfo Henriques, mais conhecido pelos seus imperdíveis queijos Chèvre artesanais.

O resto está tudo aqui ou na paisagem em redor. Provas de vinhos, visitas às instalações (palácio, adega, vinhas), passeio de charrete, piqueniques, programas de vindimas (na época das colheitas – um lagar em granito é usado para a pisa a pé), circuitos temáticos (Quinta, uma caminhada de cinco a sete quilómetros pela propriedade, onde até podemos apreciar um troço de aqueduto; Montejunto, para conhecer a pé os encantos e mistérios da maior montanha do Oeste; Moinhos, para conhecer a história do pão da região e ver como se vivia a vida de moleiro; Óbidos, com todo o património histórico e visita à Casa das Gaeiras, um palacete belíssimo com vinhas velhas que já foram um dos ícones da região de Lisboa).
Finalmente, os eventos, o ponto forte da aposta enoturística do Gradil nesta fase do projecto. Actualmente, os responsáveis da casa registam uma média de 20 a 30 visitantes diários, mas esses números deverão rapidamente ser ultrapassados com a “entrada ao serviço” dos novos espaços. A parceria com a Imppacto, uma empresa de catering especializada em grandes eventos, aponta a um mercado (casamentos, eventos de empresa) que não deixará de se sentir seduzido pela atmosfera simultaneamente bucólica e aristocrática da quinta, que agora tem capacidade para acolher grupos que podem ir das 200 às 600 pessoas.
Num cenário de “lotação esgotada” – e com todos os espaços a funcionarem em pleno – mais de 1.200 pessoas podem passar um belo dia na Quinta do Gradil. Em simultâneo e quase sem darem pela presença dos outros grupos. Falta só criar um parque de estacionamento à altura destas ambições. É já a seguir.
A 20 quilómetros do mar e enquadrada pela beleza robusta da serra de Montejunto, a Quinta do Gradil é hoje um diamante amarelo que brilha num mar de verde. Os vinhos são excelentes, o atendimento profissional, mas sempre personalizado, e a atmosfera perfeita para saborear um dia no campo beneficiando das mordomias modernas. Fica a escassos minutos da A8. E a menos de uma hora de Lisboa.

QUINTA DO GRADIL
Estrada Nacional 115, Vilar, Cadaval
Tel: 262 770 000; 917 791 974 (Enoturismo e eventos); 914 909 216 (Restaurante)
Mail: info@quintadogradil.pt; enoturismo@quintadogradil.pt
Web: www.quintadogradil.wine.pt
GPS: 39º 12′ 16.30” N | 09º 06′ 55.06” W
A quinta está aberta todos os dias, com visitas às 11h30 e às 15h30 todos os dias excepto domingo (apenas às 11h30). Solicita-se marcação antecipada, mas não há restrições ao número de participantes. A visita simples (palácio, adega e vinhas) custa 5 euros por pessoa e os programas de prova começam nos 9 euros por pessoa e vão até aos 25 euros, conforme a gama e o número de vinhos a servir. A loja funciona todos os dias, entre as 10 e as 18 horas de segunda a sábado, das 10 às 16h ao domingo. O restaurante abre portas para almoços todos os dias excepto terças e para jantares à sexta e ao sábado ou para grupos a partir de 12 pessoas mediante reserva e marcação antecipada.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 18,5

Edição nº26, Junho 2019

Requinte e tradição de mãos dadas

Como é que se define um sítio onde as mordomias da tecnologia, os prazeres da mesa, o encanto das coisas simples e a Natureza em estado puro se conjugam numa experiência única? É fácil: Herdade da Malhadinha Nova. Fomos conhecer uma das unidades mais icónicas do enoturismo do Alentejo e do país, agora com uma […]

Como é que se define um sítio onde as mordomias da tecnologia, os prazeres da mesa, o encanto das coisas simples e a Natureza em estado puro se conjugam numa experiência única? É fácil: Herdade da Malhadinha Nova. Fomos conhecer uma das unidades mais icónicas do enoturismo do Alentejo e do país, agora com uma “extensão” em terras algarvias.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

Em 1998, a família Soares, proprietária da rede de garrafeiras com o mesmo nome, decidiu dar um passo a montante na fileira do vinho e tornar-se produtora. Adquiriu a Herdade da Malhadinha Nova, em Albernoa, a sul de Beja, e começou a plantar vinha. O sucesso da aposta mede-se, duas décadas depois, pelo constante crescimento das suas marcas, pela excelência das infra-estruturas e pela aposta no enoturismo. A Malhadinha é uma referência. E uma escola.
Aos 35 hectares iniciais de vinha criados a partir de 2001 juntaram-se mais 20 em 2017, e outros 20 em 2018, a que podemos ainda acrescentar a aquisição de uma vinha velha (plantada em 1949) com quatro hectares, ali bem perto. Destas vetustas cepas saíram as edições inaugurais de Vale Travessos Vinhas Velhas, da vindima de 2016 – e, passe a publicidade (desnecessária, de resto, numa casa que sabe “vender” os seus vinhos como poucas), quem quiser conhecê-las terá de ser rápido: foram feitas apenas 670 garrafas de branco e 370 de tinto. Numa parceria com a família Pereira Coutinho, a equipa da Malhadinha Nova é agora também responsável pelos 12 hectares de vinha da Quinta de Mata-Mouros, em Silves, Algarve, e dos vinhos Convento do Paraíso que de lá saem.

Mas este crescimento na área plantada e no volume de vinhos produzido está prestes a ser eclipsado por outro investimento, numa área em que a Malhadinha faz também questão de estar no topo: o enoturismo. Quando chegar o Verão, aos dez alojamentos disponíveis no núcleo central do hotel rural (aberto em 2008) vão juntar-se outros 16 em quatro blocos espalhados pela propriedade e ainda mais quatro numa casa situada no centro de Albernoa, a Casa Amarela (que conta ainda com sala comum, cozinha, pátio interior e terraço panorâmico). E, já que falamos de pernoitas, uma palavra ainda para a villa no meio das vinhas disponível na Quinta de Mata-Mouros.
Turismo e vinho de mãos dadas, produção e distribuição a todo o gás, visão e capacidade de investimento. Sim, tudo isso, mas sempre com os pés na terra. Literalmente: o respeito pelo meio ambiente marca a gestão da casa, com a transição já feita para o modo de produção biológico – e a azáfama nas vinhas mostra bem como esta opção exige esforço e dedicação. Na Malhadinha Nova, trabalham a tempo inteiro mais de 50 pessoas – e esse contingente está neste momento substancialmente reforçado pela presença das equipas de construção civil, em tarefas de acabamento dos novos núcleos de alojamento, entre outras obras que decorrem na herdade.
Como é que todos estes trabalhos podem coexistir com uma unidade hoteleira que apregoa a tranquilidade e a paz dos grandes espaços? A resposta, mais uma vez, é simples: a Herdade da Malhadinha Nova, que agora engloba outra propriedade comprada mais recentemente, tem 455 hectares. Há espaço para tudo. Se precisa de um bom exemplo, fixe este número: entre o núcleo de entrada (onde se situam o restaurante, a adega, a loja e o picadeiro) e o hotel temos de percorrer 1500 metros de estrada de terra batida. Isso mesmo: um quilómetro e meio! Passando de caminho por uma ribeira que pode galgar as margens quando chove muito. Sim, a aventura espreita.

Mas a nossa viagem começa mais a sul, na margem esquerda do rio Arade, junto a Silves. É aqui que encontramos a Quinta de Mata-Mouros, um apaziguante recanto de sossego e beleza natural, encaixado entre as encostas da serra e o plano de água que lhe corre mesmo aos pés. A propriedade tem 120 hectares e inclui, para além das vinhas, nos terrenos mais elevados, áreas de pomar, hortas e bosque. A água está por todo o lado, há cães e galinhas, mas quem manda é a passarada.
Ao longo da estrada ribeirinha, encontramos vários núcleos de construção. Antes de mais, o convento, edifício do século XVI devotado a Santa Rita e que é utilizado agora apenas para alojamento de convidados e funcionários – há planos para o abrir ao público. Depois, a zona visitável, com a loja (de planta circular – foi construída numa antiga eira – e onde é obrigatório prestar atenção ao extraordinário travejamento do tecto) e a adega (onde se destacam os lagares em pedra e as linhas agudas – quase nórdicas – do telhado em abas sucessivas). Árvores enormes compõem o espaço, o cheiro das laranjeiras em flor paira sobre as hortas e os terraços que vão dar ao rio. Por entre a folhagem, podemos perceber a silhueta do casario de Silves.
Mas, para apreciar verdadeiramente a paisagem, há que subir às vinhas. A pé, se a alma e as pernas estiverem fortes, ou de jipe. Lá em cima, Silves, na margem oposta, oferece-se à vista, as casas brancas e o rosado das muralhas do castelo fundidas num mosaico de grande beleza. No meio das vinhas, a surpresa de encontrarmos um heliporto e, depois, rodeada por algumas árvores, uma casa com piscina de horizonte infinito sobre o rio e a ondulação da serra algarvia. Está disponível para aluguer.
Ninguém imaginaria todo este espaço e tamanha variedade de paisagens no que parecia apenas um recanto entre o rio e a estrada nacional. Mas aqui há de tudo, incluindo, claro, a casa de família, mais ao fundo, mas fora do roteiro enoturístico. Que um tal oásis de sossego tenha este nome tão “bélico”, por assim dizer, é outra aparente incongruência. Mas só aparente… O topónimo Mata-Mouros não deriva da fama de algum cavaleiro cristão de espada afiada. Nada disso: era a mata dos mouros. E está tudo explicado.
A equipa da Malhadinha Nova começou a divulgar o enoturismo da quinta há apenas um ano e o movimento começa agora a ser mais regular, justificando a elaboração de programas próprios, que ainda não estavam disponíveis quando foi feito este trabalho. Tratando-se do Algarve, não surpreende que os estrangeiros sejam o contingente mais forte entre os visitantes do projecto Convento do Paraíso, mas o prazer não tem nacionalidade. E, já agora, os vinhos são uma bela surpresa.[/vc_column_text]

QUINTA DE MATA-MOUROS
Quinta de Mata Mouros, Silves
Tel: 911 933 949
Mail: info@conventodoparaíso.com
Web: www.conventodoparaiso.com
Actualmente, as visitas carecem de marcação antecipada e o alojamento na casa isolada junto às vinhas tem preço sob consulta. Mas todo o projecto enoturístico está a ser desenhado de raiz e, por isso, não é ainda possível avançar tabelas de preços nem menu de programas, visitas e provas. A actualização desta informação está prometida para breve, pelo que se aconselha consulta prévia na Internet.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2
Venda directa (máx. 3): 2
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17

De Silves a Albernoa são pouco mais de 100 quilómetros, uma horinha de caminho que nos leva das serranias algarvias às suaves ondulações da planície alentejana. E um preço irrisório a pagar quando o objectivo é tão saboroso. Adjectivo adequado, porque começamos o programa da estadia com um belo jantar no restaurante da herdade, aberto ao público. Depois, rumamos ao hotel. É de noite quando chegamos, mas a falta de paisagem terrestre é amplamente compensada pela explosão silenciosa de estrelas no céu.
O dia seguinte começa novamente sob o signo da boa mesa. Os pequenos-almoços da Malhadinha são míticos e, por isso, talvez nem seja adequado vir aqui um confesso mau garfo matinal tecer grandes comentários… Uma coisa é certa: tudo o que lá está é bom e há de tudo. E o que não houver, é só pedir. Adiante, que temos muito para descobrir, dentro e fora de portas.
Os quartos, naturalmente, são excelentes, num equilíbrio perfeito entre o rústico e o sofisticado – vale a pena destacar a banheira de grandes dimensões, o tablet e as ofertas de fruta e vinho, a par do generoso espaço disponível e de pormenores de decoração de gosto inatacável. As salas comuns são acolhedoras e oferecem uma série de recantos que permitem alguma intimidade mesmo que haja muitos hóspedes. Mas é lá fora que está a essência da Malhadinha. Piscina, relvados com espreguiçadeiras e sofás, spa (jacuzzi, banho turco, salas de massagem), tanques com água, esplanadas, oliveiras vetustas e laranjeiras jovens, uma linha de ciprestes delimitando o espaço num dos flancos, vinhas a toda a volta.
Sim, porque o olhar depressa ganha profundidade de campo (nunca a expressão caiu tão bem como neste contexto). O hotel fica sobre uma plataforma elevada, reinando sobre a paisagem grandiosa. Prados, manchas de arvoredo (eucaliptos e sobreiros), colinas que escondem e mostram ao mesmo tempo. Há por aqui bicicletas e moto-4 para quem quiser percorrer esta imensidão. As surpresas aparecem por todo o lado.
Primeiro, a ribeira, que corre pela planura alentejana até que, de repente, atravessa um maciço rochoso, criando uma zona de penhascos na rocha xistosa. Estaremos no Douro? Não, talvez seja a serra algarvia, a julgar pelas giestas que povoam esta encosta aqui. A vista alarga-se: de um lado, Beja, a uns 20km; do outro, Castro Verde, a 25. Mas quando saímos do mato mediterrânico deparamos com novas vinhas, onde um grupo de mulheres vai fazendo a poda. E, logo a seguir, já confinando com uma curva da ribeira, verdes prados salpicados do castanho das vacas. Ribatejo?! Andamos pelo meio das simpáticas ruminantes e chegamos à água. Canoagem, pesca, caminhadas… há aqui um mundo de aventuras à espera dos mais activos. Isso ou sentarmo-nos à sombra de um sobreiro enquanto o tempo passa devagar.
Nestes cenários tão diversificados estão a nascer as novas suítes e villas exclusivas, em quatro núcleos separados. Todas as ruínas da propriedade estão a ser transformadas em alojamentos de luxo. Em breve, em vez de 10 alojamentos, haverá 26 disponíveis. É um crescimento assinalável, mas não é de crer que a atmosfera da Malhadinha Nova venha a sofrer alterações sensíveis. As cegonhas continuam a fazer ninhos nos pontos altos, as águas da ribeira vão galgar as margens sempre que a chuva caia com mais abundância, os cavalos e as vacas continuarão a pastar à vontade nas colinas sem fim.
Por cima, um céu incrível vai desvendar-se à noite. E, na terra, as vinhas vão florir e dar origem a belos vinhos. Brindemos com eles à beleza da vida no campo. Com todas as mordomias que a era moderna nos proporciona, já agora.

HERDADE DA MALHADINHA NOVA
Herdade da Malhadinha Nova, Albernoa
Tel: 284 965 432/429 (hotel); 284 965 210/211 (restaurante); 927 701 022 (visitas)
Mail: geral@malhadinhanova.pt; elisa.costa@malhadinhanova.pt; isa.maximo@malhadinhanova.pt
Web: www.malhadinhanova.pt
GPS: 37º49’50.60’’N | 7º59’20,91’’W
As visitas guiadas à propriedade e à adega realizam-se de segunda a sábado em três horários (11h, 12h, 15 ou 16h – de Outubro a Maio; 11h, 12h, 16 ou 17h – Junho a Setembro) e custam entre 10 e 35 euros por pessoa, conforme o leque de vinhos a provar. O acompanhamento com tábua de enchidos e queijos fica por mais 5 euros. Recomenda-se marcação prévia. A visita com prova de três vinhos é oferta para hóspedes do hotel e clientes do restaurante. Os quartos custam entre 300 (single) e 400 (suíte) euros por noite. As novas suítes e villas terão preços que vão dos 450 aos 1500 euros. O leque de experiências é vastíssimo, com passeios a pé, de canoa, cavalos, jipes, bicicletas, moto-4, charrete, mas também pesca, massagens, tiro com arco, yoga… E roteiros culturais, workshops de gastronomia, experiências enológicas, observação de aves. E muito mais.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 19

ESTAÇÃO DE SERVIÇO
Numa zona onde, espantosamente, assistimos a uma incrível concentração de unidades de enoturismo de grande nível, qualquer roteiro gastronómico não pode deixar de fora mesas como as da Malhadinha Nova, dos Grous ou do Vila Galé, mas aqui optamos por falar de restaurantes que estão fora desse circuito. Delicie-se com a comida tradicional alentejana do Campo do Caroço, em Albernoa, ou da Casa do Alentejo, em Castro Verde. E, já que demos um saltinho ao Algarve, deixe-se encantar pelos petiscos do Mato à Vista, em Cabanita, Paderne.

CAMPO DO CAROÇO – Largo da Liberdade, 7, Albernoa | 963 009 095
CASA DO ALENTEJO – Largo da Feira, Castro Verde | 286 327 132
MATO À VISTA – Cabanita, Paderne (37º11’39’’N | 08º13’20’’W) | 289 367 101 / 967 036 016

Edição nº25, Maio 2019

 

Com os pezinhos na areia

O sol de Primavera já por aí anda há uns tempos e o apelo da praia intensifica-se. Por isso, fomos dar uma volta com os pezinhos na areia – não à beira-mar, mas pelas vinhas da Península de Setúbal. Um roteiro por terras acolhedoras, com vinhos excelentes e… muita bicharada! TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo […]

O sol de Primavera já por aí anda há uns tempos e o apelo da praia intensifica-se. Por isso, fomos dar uma volta com os pezinhos na areia – não à beira-mar, mas pelas vinhas da Península de Setúbal. Um roteiro por terras acolhedoras, com vinhos excelentes e… muita bicharada!

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Gomez

Das margens do estuário do Sado às planuras de fronteira com o Alentejo, das zonas urbanas da cintura de Lisboa aos espaços abertos da costa atlântica, a Península de Setúbal é rica e multifacetada. Na geografia, na paisagem, na tradição – há quem garanta que foi por aqui, há cerca de 4000 anos, que foram plantadas as primeiras vinhas da Península Ibérica. É também aqui que encontramos a segunda região demarcada mais antiga do país, depois da do Vinho do Porto: em 1907, o Moscatel de Setúbal viu o seu estatuto único reconhecido.
Hoje, com 9500 hectares de vinha, a região vitivinícola da Península de Setúbal produz mais de meio milhão de hectolitros de vinho (em 2017/18: 525 milhões), cerca de oito por cento do total nacional. E se o Moscatel de Setúbal continua a ser a maior bandeira de excelência, é impossível fechar os olhos a uma realidade que se afirma: com boas produções e enologia cada vez mais cuidada, os vinhos da região conquistam os mercados internos e externos com a sua notável relação preço/qualidade. Grandes campeões de vendas (Bacalhôa, José Maria da Fonseca, Casa Ermelinda Freitas, Cooperativa Agrícola de Pegões) e muitos produtores de menores dimensões povoam uma região onde imperam os terrenos de areia.
Palmela é o concelho português com mais área de vinha e é quase impossível andar na estrada sem ver as tabuletas que indicam “adega”, um pouco por todo o lado. Mas, desta vez, fugimos do epicentro do sector e formos procurar experiências enoturísticas por outras paragens em redor. Começamos por Setúbal, nas margens da ribeira de Marateca; passamos por Azeitão, fomos até Canha e depois terminamos no Poceirão. Três produtores, quatro propostas para umas horas ou dias bem passados, por entre belos vinhos, boa comida, paisagens que nos fazem esquecer a proximidade dos grandes centros urbanos, gente que sabe receber e muita bicharada. Sim, promete-se interacção com criaturas peludas e penudas. Venham daí, que o sol já vai alto e a jornada promete.

A Gâmbia é um país africano, pois, mas é também uma localidade do distrito de Setúbal e uma herdade que lhe foi buscar o nome. Saímos da EN10 poucos quilómetros a leste da capital de distrito e num instante esquecemos os prédios, os semáforos e os mares de gente. Enormes sobreiros, casas térreas brancas debruadas a azul, ao longe o brilho ofuscante dos planos de água. A maré cheia transforma a foz da ribeira de Marateca num espelho imenso (algumas horas depois, é apenas um canal de água rodeado de planícies de lodo), percebem-se a estrutura rectilínea das salinas e o pontilhado das aves em constante movimento.
A Herdade de Gâmbia tem 650 hectares, 30 dos quais de vinha, de onde saem uvas para os vinhos da casa (a cargo da Sociedade Agrícola Boas Quintas e do enólogo Nuno Cancela de Abreu) e para vender a outros produtores da região. A cortiça, o pinhal e alguma pecuária completam a actividade agrícola da herdade, mas o turismo está a ganhar cada vez maior importância. O espaço Lugar dos Pernilongos (nome de uma ave aquática, já agora), que junta zona de refeições, forno a lenha, terreiro de areia e um telheiro cheio de brinquedos, salta à vista logo à entrada, mas a sua essência está alguns metros mais à frente, nos terrenos e construções contíguos ao núcleo central da herdade: a quinta pedagógica.
Num instante estamos “à conversa” com a Pamela, que se deita no chão de barriga para o ar, à espera de festas. A Pamela é uma porca vietnamita, que aqui chegou depois de anos a viver fechada num apartamento. Com ela estão a Flor de Sal (uma ovelha gorducha), o Ernesto, a Emília e a Papoila (família de cabras anãs), a burra Alfarroba e o seu marido Malaquias. E há coelhos, galinhas, patos e gansos, porcos e cavalos, uma pavoa e uma tartaruga. E um cão, já agora.
Como a miudagem tem muito com que se entreter (incluindo aprender a fazer pão, ou conhecer os segredos da lã, por exemplo), os pais podem aproveitar para se aventurar nos trilhos da herdade, para caminhadas ou sessões de observação de aves. Isto, claro, com a promessa de belos vinhos para provar no regresso. Mesa posta no jardim, com vista para a ribeira, a passarada a chilrear por ali, um sol que desmente o calendário e faz esquecer o Inverno. Uma vinha estende-se até à linha de arvoredo que separa os terrenos agrícolas da zona de influência da maré e há um cavalo que espreita para lá das sebes.
À saída, mediante marcação prévia, podemos sentar-nos no telheiro para desfrutar uma refeição no campo. E é obrigatório passar pela loja para levar os vinhos da casa connosco. Mas leva-se sempre muito mais do que isso quando voltamos à estrada.
HERDADE DE GÂMBIA
Rua da Liberdade, 2910-219 Setúbal
Tel: 265 938 050 / 964 179006 (Lugar dos Pernilongos)
Mail: herdadegambia@gmail.com / lugardospernilongos@gmail.com
Web: www.herdadegambia.com
GPS: 38.553150, -8.760399
Para além das actividades da quinta pedagógica, a herdade oferece a possibilidade de passeios pedestres (com ou sem guia) e observação de aves. O passeio pelos observatórios (há três, nas margens da ribeira da Marateca) custa apenas um euro por pessoa, sem guia – a presença deste será orçamentada em função das circunstâncias. Solicita-se marcação antecipada. Há seis programas de provas de vinhos (mínimo: 4 pessoas), variando entre os 5,5 euros por pessoa (3 vinhos, sem canapés) e os 12,2 euros (cinco vinhos, incluindo Reserva e Moscatel, com canapés). Refeições para grupos mediante consulta.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 2,6
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17,5

Num instante mudamos de mundo. A atmosfera bucólica da Herdade de Gâmbia cede o passo ao ritmo aristocrático de Azeitão e, passando ao largo da casa do treinador José Mourinho, eis-nos perante as primeiras vinhas da Quinta de Catralvos, sede da Malo Wines. São 22 hectares exclusivamente de castas brancas (ou quase, porque há uma parcela de Moscatel Roxo), em terrenos planos ou levemente ondulados em redor da adega.
Entramos na loja e vemos muitos vinhos tintos. Como é que… Bom, a explicação é simples: as vinhas tintas ficam noutro espaço da empresa, que é propriedade do médico Paulo Malo. Lá iremos, ao Monte da Charca, em Canha. Mas, por agora, vamos conhecer as instalações deste produtor que faz à volta de 500 mil garrafas por ano, mas cuja adega presta serviços a mais de uma dezena de clientes externos, responsáveis por outro meio milhão de garrafas.
A adega, naturalmente, é ampla, com uma capacidade instalada de 1,2 milhões de litros, termicamente isolada por um prado que cresce na cobertura e com os seus espaços mais “nobres” ocupados por barricas onde estagiam tintos e envelhecem moscatéis. No edifício contíguo, junto à loja, o enorme salão para eventos, com capacidade para até 500 pessoas, e o espaço do restaurante (tem chef residente, mas não está aberto ao público, recebendo apenas eventos e refeições de grupos mediante marcação).
Nas traseiras, o módulo dos quartos, cinco ao todo, com uma sala comum. O regime aponta para uma lógica de self-service, com o pequeno-almoço a ser deixado à porta. Aqui predominam os visitantes estrangeiros, na sua maior parte verdadeiros enoturistas, que visitam a região com o foco nos seus vinhos. É diferente a algumas dezenas de quilómetros dali, numa zona onde três regiões – Península de Setúbal, Tejo e Alentejo – se encontram. Dirigimo-nos a Canha, rumo ao Monte da Charca, um local mais procurado por famílias.
O contraste com Catralvos é ainda mais evidente na atmosfera campestre (chega-se lá por estrada de terra batida, com a surpresa de passarmos por um enorme parque de painéis solares) e na composição das vinhas, que só contemplam castas tintas. Não há adega, porque as uvas são colhidas à noite e seguem para Azeitão. O Monte da Charca é uma verdadeira unidade de alojamento rural, com os quartos rodeados de vinha e bicharada, silêncio total e um céu que explode em estrelas. Quando a Grandes Escolhas lá esteve, estavam em fase adiantada obras de remodelação, que prometiam transformar o local num destino de eleição.
Então vejamos: piscina coberta e spa, piscina exterior e barragem com uma ilha, planos para criar um alojamento num barco e outro numa camioneta vintage, restaurante, muito espaço e um verdadeiro zoo nos cercados ali à volta. Uma família de gamos, outra de avestruzes, javalis, um lama, cavalos, burros, um rebanho com mais de 300 ovelhas… a lista poderia continuar, mas não podemos esquecer os cães. Vários, grandes e pequenos, à solta pelos relvados, sempre prontos para saudar quem chega.
Com 55 hectares de vinha ali à volta, boas estradas de terra batida e caminhos bem desenhados, passear a pé ou de bicicleta é quase obrigatório. Passamos pelos cercados e percebemos que muitos dos animais apreciam o contacto com os humanos – um gamo que encosta a cabeça à grade para ser coçado, as avestruzes que se aproximam curiosas e… gulosas, burros que gostam de festas. Já os javalis procuram esconder-se e o lama, bom, esse mira-nos com ar desconfiado. Uma ponte de madeira permite-nos chegar à ilha, só para descobrirmos que uma parte das ovelhas se adiantou e já ocupa as melhores sombras…
Resta dizer que a gama de tintos feitos com as uvas do Monte da Charca é extraordinária e que, quanto mais não fosse, vale a pena a visita só para ficar sentado a ouvir o silêncio com um copo na mão.

QUINTA DE CATRALVOS
EN379, 2925-708 Azeitão
Tel: 212 197 610
Mail: geral@quintadecatralvos.com
Web: www.quintadecatralvos.pt
As provas de vinhos (que podem incluir visitas à adega e às vinhas) custam entre seis euros por pessoa (grupos com mais de 50 pessoas, três vinhos) e 12,5 euros (entre duas e nove pessoas, três vinhos com queijo ou torta de Azeitão). A experiência vínica, em que os visitantes vestem o papel de enólogo, fica a 28,5 euros por pessoa (grupos entre 10 e 50 pessoas). O preço dos quartos varia entre os 68 e os 98 euros por noite.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17,5

MONTE DA CHARCA
Olho De Bode De Cima, 2985-708 Canha
Tel: 212 197 610
Mail: geral@quintadecatralvos.com
Web: www.quintadecatralvos.pt
O preço dos quartos oscila entre os 75 e os 150 euros por noite. Os programas enoturísticos são centralizados na Quinta de Catralvos, mas é sempre possível realizá-los no Monte da Charca, mediante marcação.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): *
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 18*
(*nota ponderada; a filosofia do local não contempla a existência de loja)

As mulheres, por estas bandas, têm muito que se lhe diga. Estamos na Quinta da Invejosa, sede do produtor Filipe Palhoça, e em frente, do outro lado da estrada, está a Quinta da Teimosa… O comentário é feito, em tom de brincadeira, enquanto contemplamos a paisagem que rodeia as instalações da Filipe Palhoça Vinhos, no Poceirão. E se a vista é bonita daqui, da enorme varanda no primeiro andar, também é muito interessante lá de baixo, contemplando o edifício.
Cinzento e amarelo, com uma fachada central mais escura, feita com painéis de cortiça. A descrição até pode soar estranha, mas há toda uma elegância que ressalta deste visual que nos remete para as antigas civilizações mediterrânicas, sensação reforçada pela colunata lateral. As obras ainda decorriam quando a Grandes Escolhas visitou a quinta, mas já se podia ter uma noção bem segura do resultado final. É o investimento mais recente de uma casa que começou a apostar no enoturismo há menos de dois anos.
A Quinta da Invejosa tem 18 hectares de vinha (ao todo, a empresa possui 95 hectares de vinhedos), em solos planos de areia, uma adega com capacidade para 1,2 milhões de litros, loja moderna e decorada num misto de tradição e modernidade, salão para eventos e provas. Em breve, terá também uma esplanada exterior com vista para a vinha pedagógica (onde estão plantadas as duas dezenas de castas trabalhadas pela empresa) e um quintal interior onde se planeia promover a interacção com animais domésticos.
As obras de remodelação cortaram o ímpeto inicial da procura enoturística, mas agora não há desculpa para falhar a visita a este local. O cuidado nos detalhes é evidente (o balcão tem uma zona rebaixada, para facilitar o acesso a quem se desloque em cadeira de rodas – e isto é só um exemplo), há peças muito interessantes para apreciar – como o alambique e caldeira que se alinham numa parede interior da loja – e o leque de experiências pode incluir uma refeição ou prova de vinhos na nave de barricas.
Na cave, para além das barricas, há também um pequeno espaço onde estão expostas algumas garrafas que contam a história da casa. O primeiro vinho engarrafado (S. Filipe, um tinto de Castelão) data de 1995 e desde aí a gama alargou-se para três marcas: S. Filipe, Quinta da Invejosa e Filipe Palhoça. Há também Moscatel, claro, e aguardente. Escolha-se um destes néctares e passe-se o olhar em redor, pelas planuras onde as vinhas começam a despontar, pelas linhas de arvoredo ao longe, o casario disperso. A haver aqui espaço para a inveja, será certamente de quem passa na estrada e não pode parar para saborear a vida…

QUINTA DA INVEJOSA
EN5, km 24,8, 2965-213 Poceirão
Tel: 265 995 886
Mail: geral@filipepalhoca.pt
Web: www.filipepalhoca.pt
GPS: N 38º37’18’’ | O 8º43’30’’
Há duas visitas guiadas por dia – 10h e 15h30 no Verão (Abril a Outubro); 10h30 e 15h no Inverno (Novembro a Março). Aos domingos, solicita-se marcação antecipada e um mínimo de oito participantes. Os preços variam conforme a prova de vinhos escolhida e vão desde os quatro euros por pessoa (três vinhos) até aos 14 euros (cinco vinhos e produtos regionais, mínimo quatro participantes). Há também uma prova de espumantes com harmonizações (10 euros, mínimo quatro pessoas). Refeições para grupos mediante consulta. A loja está aberta de segunda a sábado, entre as 9 e as 13h e das 14h às 18h.

Originalidade (máx. 2): 1,5
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 2
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17

ESTAÇÃO DE SERVIÇO
Nem sempre é fácil navegar no dédalo de estradas que cruzam na enorme planície de aluvião que caracteriza esta zona da península de Setúbal e a maioria dos restaurantes alinham pela filosofia de estabelecimento de estrada. Mas há alternativas muito interessantes para “reabastecimento” dos visitantes. Aqui ficam três sugestões, desde os grelhados da Casa das Tortas de Azeitão aos petiscos da Pérola da Mourisca, passando pelo estilo wine bar e sala de chá do Mar Até Cá.

CASA DAS TORTAS DE AZEITÃO – São Lourenço (Vila Nogueira de Azeitão), Praça da República, 37A | 969 146 996

MAR ATÉ CÁ – Rua 5 de Outubro, Cajados | 962 465 120

PÉROLA DA MOURISCA – Rua Baía do Sado, 9, Setúbal | 265 793 689

Edição nº24, Abril 2019

 

Abrem-se horizontes em Monforte

Alto Alentejo, zona de transição para a serra de S. Mamede, vinhos que combinam a frescura da altitude com a força de uma terra quente. Património, gastronomia, gentes que abrem a porta. Passado, presente e futuro. E uma paisagem a perder de vista. TEXTO Luís Francisco FOTOS Ricardo Palma Veiga Terras férteis, ribeiras que drenam […]

Alto Alentejo, zona de transição para a serra de S. Mamede, vinhos que combinam a frescura da altitude com a força de uma terra quente. Património, gastronomia, gentes que abrem a porta. Passado, presente e futuro. E uma paisagem a perder de vista.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Palma Veiga

Terras férteis, ribeiras que drenam a face sul da serra de S. Mamede, ali ao fundo na linha do horizonte, e uma localização geográfica estratégica – a meio caminho entre Mérida, a capital da província ibérica, e Lisboa. Os romanos encontraram em Monforte território acolhedor e rico, instalando-se por ali há mais de dois mil anos. Hoje, as ruínas de Torre de Palma levantam o véu sobre o que seria a vida nesta luxuosa villa, que dominava o extenso planalto agrícola. A família Basilii, nome que chegou até nós numa inscrição encontrada no local, marca o início da história registada de uma região com muito passado e que tenta não perder o comboio do futuro.
Monforte fica junto a um eixo rodoviário principal, o IP2, a meio caminho entre Estremoz e Portalegre, e não será a dificuldade dos acessos a explicar o seu despovoamento. Falamos de uma das regiões do país com menos gente e neste concelho vivem agora pouco mais de 3000 pessoas – eram para cima de 8000 na década de 1950. Com 7,9 pessoas por quilómetro quadrado, não espanta que a Natureza e os grandes espaços sejam a marca de água deste município. A agricultura e a pecuária são pujantes, há pedreiras de granito. E faz-se vinho. Do bom.
É surpreendente consultar o sistema de navegação do carro e perceber que estamos a cerca de 350 metros de altitude, rondando os 400 em alguns locais. Não é o planalto das Beiras, mas aqui já estamos na meseta ibérica, esse bloco primordial da península que transforma Espanha num dos países europeus com altitude média mais elevada. Para os vinhos, isto é extraordinário: as amplitudes térmicas são muito significativas, as brisas sopram com mais frequência e a exposição solar é quase uniforme, dada a suavidade da orografia. Alie-se a isto a tal terra fértil e abundância de água que tanto seduziu os romanos (e outros antes deles, que os vestígios de povoamento remontam ao Neolítico) e temos uma receita garantida para uvas de grande qualidade. Ainda com um extra: a surpreendente mineralidade proporcionada pela influência do granito no subsolo.
Por tudo isto, e muito mais, Monforte é terra que merece uma visita. Para quem vem até aqui, as opções são muitas e – coisa surpreendente no Alentejo… – não ficam longe. Olhando apenas para um raio de uns 30km em redor da vila, podemos encontrar as fortalezas de Elvas, os encantos de Vila Viçosa, a monumentalidade de Estremoz, os cavalos de Alter, as águas da barragem do Caia, os encantos “alpinos” e históricos de Portalegre, Castelo de Vide e Marvão. É muito para absorver. Mas não vale a pena ter pressa. Saboreie devagar este Portugal preservado no tempo. E com um copo na mão, já agora. Nós ensinamos o caminho.

Se há um sítio onde o passado, o presente e o futuro desta região se encontram, ele é o Torre de Palma Wine Hotel, uma unidade hoteleira de cinco estrelas com 19 quartos, restaurante onde o chefe Filipe Ramalho é assumido candidato à estrela Michelin e um conjunto de mordomias de excelência. Ali ao lado, as ruínas da villa da família Basilii (o nome adoptado pelo restaurante do hotel), são um legado, mas também uma inspiração.
A ideia é replicar o que os romanos faziam por aqui: um hotel emula a hospedaria dos primeiros séculos desta era, o spa recorda as termas, os cavalos continuam a tradição dos puro-sangue Lusitano (cuja origem pode bem estar nestas terras), o restaurante. E os vinhos, claro, assinados originalmente pelo enólogo Luís Duarte e agora nas mãos de Duarte de Deus. As vinhas estão mesmo ali ao lado, a adega limita num dos cantos o enorme quadrilátero de construções dominado, ao meio, pela torre medieval (data de 1338).
Tudo aqui é limpo, bonito, arranjado, elegante. Mas sem que jamais se perca a matriz rústica de um hotel rural. Ao traço arquitectónico de João Mendes Ribeiro junta-se a decoração de Rosarinho Gabriel e o seu trabalho conjunto funde-se com uma paisagem grandiosa, de longínquos horizontes em tonalidades de verde. Ao longe, as silhuetas da serra de S. Mamede (1025m), de um lado, e da serra de Ossa (653m), do outro. O pôr-do-sol visto do alto da torre, onde se pode saborear a “welcome drink” oferecida aos hóspedes, é qualquer coisa de mágico. Mas vale sempre a pena o esforço de subir umas boas dezenas de degraus. A qualquer hora.
Já que estamos por aqui, olhemos com atenção para o que nos rodeia. A piscina, a horta biológica, a vinha, o pomar, o bosque de pinheiros, as pastagens sem fim pontilhadas de vacas, o picadeiro e as boxes dos cavalos, as cegonhas de se saúdam matraqueando os bicos, os dois grandes terreiros cercados de construções térreas. As que têm telhas são recuperadas, as cobertas com placas de cimento foram acrescentadas ao complexo (casos do restaurante e da loja/adega). O hotel abriu em Maio de 2014 e neste momento já inverteu a tendência inicial e acolhe mais portugueses (60%) do que estrangeiros.
Mas é nos detalhes que está o maior encanto. A piscina interior, os quartos luxuosos, a incrível decoração da loja (que parece transportar-nos para o imaginário do Faroeste…), o notável Cristo esculpido em cortiça que encontramos na capela, as obras de arte e peças de artesanato espalhadas pelos salões do edifício principal, o enorme forno comunitário, a adega moderna cujo visual faz lembrar uma catedral. Há por aqui muita coisa para fazer e desfrutar, mas, por agora, fiquemo-nos por aqui, em silêncio, de copo na mão enquanto sol doura a paisagem.

TORRE DE PALMA WINE HOTEL
Herdade da Torre de Palma, Monforte
Tel: 245 038 890
Mail: reservas@torredepalma.com
Web: www.torredepalma.com
GPS: 39º 4’ 6’’N | 7º 29’ 20’’W
Os preços começam (época baixa, dias de semana) nos 145 euros do quarto duplo, 185 euros para o duplo superior, 185 euros para o quarto familiar e 345 euros para a master suíte. Restaurante, spa (com tratamentos e massagens), visitas à adega, provas de vinhos ou workshops de cozinha são algumas actividades disponíveis no interior do hotel. No exterior, temos passeios de balão, bicicletas, observação de estrelas, passeios a cavalo, aulas de equitação. E recomenda-se a visita às ruínas romanas.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 3
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 19,5

Ali a poucos quilómetros, na estrada para Arronches, o roteiro enoturístico continua com a visita a um produtor que já faz mais de 500 mil garrafas anuais, a que se juntam outras 100.000 oriundas da região de Arraiolos (do Monte do Pintor, na posse do mesmo grupo de investidores chineses sediados em Macau). Estamos na Herdade do Perdigão, 40 hectares de vinha rodeando o edifício da adega e o complexo habitacional, a casa principal decorada com a réplica de uma torre medieval.
As ondulações suaves do terreno dão um encanto especial à vinha, por agora ainda sem verde, mas emolduradas por linhas de arvoredo. Da estrada, somos convidados a entrar por um pórtico de paredes brancas e barras amarelas, um sobreiro de cada lado, uma estrada que se estende até à linha do horizonte. Imagens icónicas de um Alentejo que se reinventa sem perder o contacto com as raízes.
Chegamos à adega, passamos pela sala de provas maior, onde pontifica uma mesa comprida e as paredes estão “decoradas” com alvéolos de cimento onde se arrumaram as garrafas que fazem o arquivo vivo da casa. O rendilhado das etiquetas e cápsulas foram um efeito visual muito interessante. Uma curiosidade: apesar de a propriedade se chamar Herdade do Perdigão, os vinhos perderam a contracção da preposição e do artigo, chamando-se apenas Herdade Perdigão. Uma disparidade que poderá, quiçá, dar uma boa história para ouvir de copo na mão.
Porque aqui é do contacto directo com o visitante que se faz, também, a magia da visita. Depois de descermos à zona de trabalho, onde pontificam os depósitos em inox, e de passearmos pela bonita nave das barricas, voltamos a subir, para uma outra sala de provas, onde as garrafas já estão sobre a mesa. Cá fora, um generoso sol de Inverno vai afastando o frio (mais uma vez, as grandes amplitudes térmicas marcando o carácter da região), os cães ladram lá ao longe abanando as caudas, os sons do campo ecoam pelas colinas e pelo complexo de construções, que inclui, num plano mais próximo, uma pequena capela. Lá dentro, o vinho começa a passar pelos copos.
Fala-se da história recente da herdade, de como foi adquirida por Carlos Gonçalves, empresário ligado às tecnologias bancárias, que um dia decidiu voltar ao seu ramo, abrindo espaço ao mais significativo investimento chinês no sector vitivinícola em Portugal. Mudou isso, mas manteve-se o padrão de fazer vinhos de qualidade a partir das vinhas velhas que se alinham pelos campos em redor à espera que a Primavera as faça voltar à vida, num círculo mágico que desafia o tempo.

HERDADE DO PERDIGÃO
Herdade do Perdigão, Monforte
Tel: 967 304 941
Mail: schaves@herdadeperdigao.pt
Web: www.herdadeperdigao.pt
O enoturismo funciona aos dias de semana, entre as 8h30 e as 17h30, e é possível optar por três provas distintas, variando a gama dos vinhos apresentados: “As nossas tradições” – 11 euros por pessoa, com quatro vinhos; “O Terroir dentro do Terroir” – 14 euros por pessoa, com quatro vinhos; “A Melhor expressão do nosso Terroir” – 19 euros por pessoa, três vinhos. Em qualquer dos casos, com o mínimo de dois participantes.

Originalidade (máx. 2): 1,5
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 2
Ligação à cultura (máx. 3): 2
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 16,5

Curiosamente, umas das primeiras imagens que retemos do nosso destino seguinte é também uma torre, vigiando do alto de uma colina as bandas de vinha que se estendem num sobe e desce que tão depressa esconde como revela a paisagem circundante. É uma construção moderna, com fins tão prosaicos como servir de depósito para as alfaias agrícolas, mas fornece um miradouro fantástico sobre a propriedade. Estamos na Quinta de S. Sebastião, outrora domínio do Marquês da Praia e Monforte, agora sede da empresa Lima Mayer.
Se a torre é recente, o que não falta por aqui são testemunhos do passado, com destaque para a igreja visigótica do século XI, uma de várias construções que nos falam da matriz religiosa do complexo, que acolheu em tempos uma comunidade de frades. A profusão de nascentes deu origem a um dédalo de fontes, canais, barragens, aquedutos e tanques – e esta generosidade da Natureza ajuda a explicar a longa história de ocupação humana destas terras: há por aqui vestígios pré-históricos.
O monte propriamente dito é constituído por um terreiro central rodeado de alvas edificações térreas bordejadas a amarelo, a que se acede por um pórtico vigiado por um enorme e caloroso cão de gado transmontano. No recinto murado, já houve veados, mas descobriram forma de saltar e agora vagueiam pelas terras em redor, enriquecendo um santuário natural onde, entre muitas outras espécies, nidificam grifos e águias-reais.
Descendo uma escadaria exterior com vista para a piscina acedemos à sala de provas, decorada de forma rústica, mas acolhedora e encavalitada sobre os muros que dominam a horta em socalcos. Lá ao fundo, do outro lado deste pequeno vale pontilhado por planos de água, está a adega. Num terreno contíguo, pasta um cavalo puro-sangue Lusitano. À volta, 20 hectares de vinhas plantadas em 2000 sobre areias graníticas, que conferem aos vinhos da casa, feitos pelo enólogo Rui Reguinga, um carácter muito especial.
A produção anda à roda das 150 mil garrafas e o proprietário, Thomaz de Lima Mayer, não esconde a filosofia de exclusividade que impõe aos seus vinhos. “Produzimos pouco, muito bom e caro!” E essa matriz elitista também se aplica ao enoturismo: todas as visitas têm o próprio produtor como anfitrião e carecem de marcação antecipada. “Mais do que apenas dar provas de vinho, gosto de receber.” O calor humano, a paisagem surpreendente e a qualidade do que temos no copo fazem da visita à Quinta de S. Sebastião uma experiência muito especial. E, à saída, pode sempre contar com “um preço mais simpático” nos vinhos da casa.

LIMA MAYER
Quinta de São Sebastião, Monforte
Tel: 245 573 450 / 964 053 243
Mail: info@limamayer.com
Web: www.limamayer.com
GPS: 39° 0.120′ | -7° 28.130′
Todas as visitas carecem de marcação prévia, com preço sob consulta. O proprietário recebe pessoalmente, apresenta a propriedade, explica na vinha as técnicas de viticultura e na adega os processos de vinificação. A prova de vinhos inclui amostras de barrica. O programa inclui refeição no final.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 3
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17,5ESTAÇÃO DE SERVIÇO
Encontrar bons sítios para “reabastecer” à mesa não é tarefa complicada no Alentejo, mas às vezes precisamos de uma pequena ajudinha para acabar com as dúvidas. Por isso, aqui ficam três sugestões, noutros tantos registos diferentes: desde o estilo directo da Churrascaria Tapadão ao ambiente típico do Solar do Forcado, passando pelo intimismo da Taberna Tintos e Petiscos. Saciedade garantida.
CHURRASCARIA TAPADÃO – Rua do Assomar, nº2, Monforte | 963 391 952
SOLAR DO FORCADO – Rua Cândido dos Reis 14, Portalegre | 245 330 866
TINTOS E PETISCOS – Rua Dr. António Sardinha, nº2, Vaiamonte | 960 248 138

Edição nº23, Março 2019

 

Rio abaixo, de copo na mão

Os vinhos do Tejo estão, de forma segura e consistente, a vencer o preconceito. E se o que nos chega ao copo é bom, então vamos descobrir o que está por trás, as histórias, os terroirs e as pessoas que dão corpo e alma a uma região que se reafirma. “Descemos” o Tejo, parando pelo […]

Os vinhos do Tejo estão, de forma segura e consistente, a vencer o preconceito. E se o que nos chega ao copo é bom, então vamos descobrir o que está por trás, as histórias, os terroirs e as pessoas que dão corpo e alma a uma região que se reafirma. “Descemos” o Tejo, parando pelo caminho para retemperar o corpo e o espírito.

TEXTO Luís Francisco
FOTOS Ricardo Palma Veiga

A região vitivinícola do Tejo é muito recente, mas tem uma história secular. Paradoxo? Nem por isso. A tradição de fazer vinho no vale da metade oeste do maior rio da península Ibérica tem a sua origem nos tartessos, um povo oriundo da região do Guadalquivir (sul de Espanha), que terão introduzido a vinha no que viria a ser o território português por volta de 2000 anos antes de Cristo. Um milénio depois, os fenícios trouxeram novas castas para as regiões onde estabeleciam comércio, nomeadamente a embocadura dos grandes rios, como o Guadiana, o Sado, o Tejo e o Mondego. Em 1170, no foral de Santarém, já D. Afonso Henriques menciona o vinho. E o resto é história.
Mas quando se fala de vinhos do Tejo estamos a olhar para pouco mais de uma década: a região vitivinícola do Tejo só ganhou este nome em 2008, enterrando – no papel, ainda que não de imediato nas mentalidades – a antiga região Ribatejo. Esta reorganização lá terá tido a sua argumentária burocrática, mas o propósito subjacente desde sempre ficou claro: era preciso mostrar aos consumidores que se vivia uma nova era. O vinho do Tejo já não era o “carrascão” produzido em grandes quantidades e despachado para as carvoarias e tascas de Lisboa. Nascia o futuro.
Hoje, o Tejo engloba cerca de 17 mil hectares de vinha e é responsável por cerca de dez por cento da produção nacional (média de 650 mil hectolitros/ano). Espraia-se ao longo do rio desde praticamente o centro geográfico do país (Mação, Ferreira do Zêzere) até às portas da cintura urbana de Lisboa (Azambuja, Benavente). O rio define os três terroirs da região: junto à água, as férteis planícies do Campo; na margem esquerda, os solos arenosos da Charneca; na margem direita, os terrenos argilo-calcários do Bairro.
Mas isto é saber de biblioteca (ou internet, nos tempos que correm). É preciso pôr os pés ao caminho para descobrir tudo o que o Tejo tem para dar, no seu cruzamento de rituais e culturas (das Beiras, do Alentejo, das influências litorais que chegavam nos barcos e, naturalmente, desse imenso Ribatejo que alberga esta região). Começámos no Tramagal, junto a Abrantes, e descemos o grande rio até ao Cartaxo, com paragem em Almeirim. De copo na mão e espírito aberto. Já temos saudades.

Há muito tempo que se produz vinho por aqui, mas a “era moderna” da Quinta do Casal da Coelheira começou em 1986, quando foi adquirida pelos actuais donos. Nessa altura, vendia-se toda a produção em garrafão e foi preciso criar marcas, investir na adega, reconverter as vinhas. Em pouco tempo, a qualidade desse trabalho teve expressão nos vinhos. Mas ainda havia um problema, explica Nuno Rodrigues, enólogo e proprietário: “A imagem dos vinhos, o que as pessoas sentiam no copo, não correspondia ao que encontravam aqui.” E há seis anos o espaço foi remodelado.
As linhas tradicionais da unidade agrícola ribatejana continuam lá, com os edifícios compridos a delimitarem um pátio interior (enriquecido com incríveis painéis de azulejo que mantêm toda a frescura ao cabo de quase 40 anos), um antigo poço no centro do espaço. A diferença é que numa das alas, em vez de celeiro e estábulos, temos agora uma loja, um espaço multiusos e uma sala de provas. Visual moderno e simplista, com madeiras claras e superfícies vidradas coabitando em harmonia sob um altíssimo tecto forrado a madeira mais escura.
Entramos pela loja, onde os vinhos da casa se mostram em expositores e armários de madeira, enquanto num ecrã passa em vídeo a história deste projecto. Duas grandes portas levam-nos ao salão, capaz de albergar eventos para até uma centena de pessoas e onde encontramos alguma maquinaria antiga e pedestais com as garrafas mais emblemáticas da casa. Por cima de quem entra, um cubo de madeira projecta-se sobre o espaço – é um escritório. Ao canto, um balcão; parte do chão fez-se aproveitando antigos esteios da vinha, em pedra.
Uma porta ao fundo leva-nos até à “sala das vaidades”, assim chamada por ter as paredes forradas a diplomas conquistados pelos néctares da Coelheira ao longo de décadas. É aqui que se fazem provas de vinhos, em mesas e cadeiras de madeira. Numa das paredes, duas imagens pintadas a vinho, por um artista local; ao canto um velho alambique. Abaixo deste nível fica a sala de barricas, do outro lado do complexo a adega, as vinhas (cerca de 55 hectares) a um quilómetro de distância.
Abrantes (apesar da sinuosidade da estrada; que, por outro lado, oferece magníficas vistas sobre o Tejo) fica a poucos minutos e há a promessa de uma nova ponte para aceder directamente do Tramagal à A23. O Casal da Coelheira recebe à volta de 1500/2000 visitas por ano, sem grandes grupos, que não são fáceis de gerir naquele espaço. Famílias, casais e grupos de amigos encontram aqui um espaço moderno e funcional integrado num complexo com toda a sedução dos velhos tempos. Quanto aos vinhos, ano após ano marcam presença segura entre os melhores da região.

CASAL DA COELHEIRA
Estrada Nacional 118, nº1331, Tramagal
Tel: 241 897 219 / 241 897 802
Mail: geral@casaldacoelheira.pt
Web: www.casaldacoelheira.pt
GPS: 39,26º 58,38N | 8,15º 04,20W
As visitas podem ser efectuadas entre as 9h e as 12 e entre as 14h e as 18h aos dias de semana. Sábados, das 9h às 12h. Mínimo duas pessoas, máximo 15. A visita com prova de três vinhos (branco, rosé, tinto) custa 10 euros por pessoa ou 20 euros por pessoa com prova de três vinhos topo de gama da casa à escolha dos visitantes. A loja funciona no mesmo horário, encerrando ao domingo.

Originalidade (máx. 2): 1,5
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 3
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 1,5

AVALIAÇÃO GLOBAL: 17

Se as instalações do Casal da Coelheira não renegam a sua ligação à terra (chamava-se mesmo Centro Agrícola do Tramagal), mais abaixo no rio entramos numa zona fortemente marcada pela presença aristocrática das grandes famílias que frequentavam a corte – a zona de Almeirim era Coutada Real desde 1424 (D. João I). Os exemplos de grandes propriedades que aliam latifúndio e belos palacetes são vários e extraordinários – Lagoalva de Cima, em Alpiarça; Casal Branco e Alorna, em Almeirim, por exemplo. Escolhemos, desta vez, a Alorna, tutelada historicamente pela figura notável da Marquesa de Alorna, poetisa e mulher de causas que viveu na transição do século XVIII para o século XIX, numa altura em que ao universo feminino estavam reservados tradicionalmente papéis de bem menor protagonismo.
De um lado da EN118, as instalações de trabalho; do outro os jardins e o palácio, com a (agora) anacrónica fachada principal virada de costas para a estrada – mas de frente para a Vala Real, via por onde chegavam, vindas do Tejo, as embarcações que transportavam a fidalguia lisboeta até à lezíria. Com o tempo, nos terrenos contíguos, para lá do arvoredo, cresceram a adega e edifícios de apoio, mas a silhueta esbelta do palacete continua a dominar a paisagem.
A loja fica junto à estrada, na outra “margem”, e no terreiro delimitado pelos edifícios agrícolas cresce uma espantosa planta, um arbusto que só as regras da botânica obrigam a que se chame assim, tal a sua dimensão. Chamam-lhe “bela-sombra”, nome científico phytolacca dioica, também conhecida pelos nomes comuns ombú ou umbú e originária das pampas da América do Sul. Uma bela imagem para nos enquadrarmos na dimensão da quinta: 2.500 hectares, 220 de vinha, produção projectada para 2019 de 2,4 milhões de garrafas.
Visitamos a adega, espreitamos a imponente sala de barricas, passeamos pela alameda ajardinada e admiramos o palacete que reina sobre a imensa lezíria (o interior do edifício está fora do roteiro turístico), as arribas de Santarém ao fundo, a silhueta da ponte Salgueiro Maia mais à esquerda. Junto aos jardins, uma vinha que junta as 27 castas existentes na propriedade, justamente apelidada Jardim das Castas.
Fechamos a visita na loja, para apreciarmos a elegância e funcionalidade das instalações e nos demorarmos no espaço que fica atrás, copos e garrafas sobre mesas que são pipas, conversa fluindo ao ritmo do vinho. Em 2018, não contando naturalmente com o enorme movimento exclusivo da loja, passaram pela quinta cerca de 2.000 enoturistas. Esperam-se mais em 2019. E não espanta: os vinhos são extraordinários, as histórias que vêm com eles também.

QUINTA DA ALORNA
Estrada Nacional 114, Almeirim
Tel: 243 570 706
Mail: geral@alorna.pt; carolina.gomes@alorna.pt
Web: www.alorna.pt
As visitas (centro equestre, adega, exterior do palácio, mas sem prova de vinhos) custam 5 euros por pessoa, 8 euros (prova de dois vinhos), 11 euros (três vinhos) ou 35 euros (seis vinhos, incluindo os Marquesa de Alorna). Ao domingo, segunda e terça o enoturismo funciona das 10h às 12h30 e das 14h às 18h. Quartas, quintas, sextas e sábados, o horário prolonga-se mais meia hora da parte da tarde. A loja está aberta todos os dias, no horário normal.

Originalidade (máx. 2): 2
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 2
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 2

AVALIAÇÃO GLOBAL: 18

Depois de uma empresa familiar e de uma propriedade com história e “pedigree”, o retrato do actual Tejo fica bem composto com a nossa próxima paragem: a Adega Cooperativa do Cartaxo. Antes de mais, um louvor a quem pegou nos destinos desta instituição com quase sete décadas de actividade (foi fundada em 1954) e apostou na sua modernização. Não há-de ser fácil encontrar um nome mais susceptível ao estigma do que este: não lhe basta ser adega cooperativa e ser do Ribatejo, como ainda é do Cartaxo! E, no entanto…
Quando, há alguns anos, a crítica e o público acordaram para o bom trabalho que estava a ser feito por aqui, já a “má fama” dos vinhos ribatejanos levara fortes estocadas de produtores da região que apostavam na qualidade e ambicionavam a excelência. A este lote juntou-se, por direito próprio, a Adega Cooperativa do Cartaxo, que gere cerca de 600 hectares de vinhas, vinifica à volta de 11 milhões de quilos de uva por ano e faz entre cinco e seis milhões de garrafas, mais “bag-in-box”. E se houver dúvidas sobre o gigantismo da operação, basta espreitar as traseiras da adega e pasmar com a dimensão impressionante dos três depósitos em inox que ali se alinham: dois deles têm capacidade para 500 mil litros, o maior chega ao milhão!
Estes, e outros instalados numa ala exterior do edifício de quatro andares (dois abaixo do solo) que alberga a adega, armazéns, laboratório, sala de barricas e, enfim, toda a unidade produtiva, são a resposta para um bom problema: a Adega Cooperativa estava a operar no seu limite e em 2018 nem sequer pôde aceitar novos sócios. A aposta na qualidade e na consistência do trabalho (há 25 anos que Pedro Gil é responsável pela enologia) trouxe frutos e o futuro comercial anuncia-se de crescimento sustentado.
Perante o que atrás foi descrito, facilmente se percebe que a aposta no enoturismo não foi, durante muito tempo, prioritária. Mas as coisas estão a mudar. A inauguração da nova loja, de visual moderno e com sala de provas, logo à entrada das instalações, justificou-se pela elevada procura, mas abarcou igualmente o universo do turismo. Até porque, na última vindima, criaram-se pela primeira vez programas para visitantes e a adesão foi de tal modo entusiástica que ficaram bem claras todas as potencialidades desta actividade. Vai ser melhorado o percurso pela adega e dinamizada a oferta enoturística. Para já, quem for ao Cartaxo não dará o seu tempo por mal empregue. E, ainda melhor, poderá descobrir um lote de vinhos de enorme qualidade a preços bem interessantes.

ADEGA COOPERATIVA DO CARTAXO
EN 365-2, Cartaxo
Tel: 243 770 987
Mail: geral@adegacartaxo.pt
Web: www.adegacartaxo.pt
GPS: 39º 09’ 20.33’’N | 8º 48’ 33.18’’W
As visitas (adega, zona de vinificação, sala de barricas, cave) custam cinco euros por pessoa, convertidos em vale de desconto para a aquisição de produtos na loja. Solicita-se marcação antecipada com 72 horas de antecedência. Na altura das vindimas, estão disponíveis dois programas, um com visita à adega e prova de vinhos comentada (5 euros por pessoa), o outro (30 euros) juntando visita às vinhas com explicação das castas e almoço. Os preços indicados são os de 2018.

Originalidade (máx. 2): 1,5
Atendimento (máx. 2): 2
Disponibilidade (máx. 2): 1,5
Prova de vinhos (máx. 3): 2,5
Venda directa (máx. 3): 2,5
Arquitectura (máx. 3): 2,5
Ligação à cultura (máx. 3): 2,5
Ambiente/Paisagem (máx. 2): 1,5

AVALIAÇÃO GLOBAL: 16,5

ESTAÇÃO DE SERVIÇO
Numa região tão extensa e variada, é quase impróprio recomendar apenas três mesas onde o viajante poderá “reabastecer”. Mas, sem prejuízo para tantos outros locais onde a gastronomia – local, ou outras – está muito bem representada, aqui ficam três sugestões. E não deixe de pedir um vinho da região para acompanhar.
Restaurante Santa Isabel – Rua Santa Isabel, 12, Abrantes; 916 777 068, 967 893 970 (encerra aos domingos e feriados)
Taberna Ó Balcão – Rua Pedro de Santarém 73, Santarém; 243 055 883; www.tabernaobalcao.pt
Taberna do Gaio – Estrada N3 – Cruz do Campo, Cartaxo; 243 759 883; tabernadogaio@hotmail.com; GPS – 39º 07’46.38’’N / 8º 48’50.96’’W

Edição nº22, Fevereiro 2019