Concurso Escolha da Imprensa: Abertas as inscrições a produtores

Concurso Escolha Imprensa

Organizado pela Grandes Escolhas, o concurso Escolha da Imprensa é um evento sui generis no qual uma publicação especializada convida colegas de outros órgãos de comunicação social — da imprensa escrita, à rádio, televisão, plataformas electrónicas e redes sociais — a provarem uma amostra significativa do melhor que se faz na produção de vinhos em […]

Organizado pela Grandes Escolhas, o concurso Escolha da Imprensa é um evento sui generis no qual uma publicação especializada convida colegas de outros órgãos de comunicação social — da imprensa escrita, à rádio, televisão, plataformas electrónicas e redes sociais — a provarem uma amostra significativa do melhor que se faz na produção de vinhos em Portugal. Não fechar a apreciação dos vinhos aos circuitos da crítica especializada e alargar o âmbito da sua divulgação a todas as plataformas disponíveis, são os objectivos deste concurso.

A Grandes Escolhas vai organizar mais uma edição do “ESCOLHA DA IMPRENSA” a 27 de Outubro de 2022 aberto a todos os produtores nacionais e com as seguintes características:

– Um júri constituído por críticos e jornalistas, em particular os que habitualmente cobrem os temas ligados aos vinhos e gastronomia, sommeliers, compradores profissionais e bloggers especializados.

– Divulgação pública dos resultados no site, na revista Grandes Escolhas e nas redes sociais com atribuição dos respectivos diplomas aos vencedores.

Toda a informação para inscrições aqui.

 

Passarella: Uma estrela à beira da serra

Casa da Passarella

Uma recente visita à Casa da Passarella permitiu-nos conhecer melhor a evolução desta casa que, embora de história mais do que centenária (já fazia vinhos em 1893), só atingiu o estrelato junto dos apreciadores na última década, com novo proprietário e outras ambições.  Há muitas novidades na Passarella, não apenas vínicas mas também turísticas, dois […]

Uma recente visita à Casa da Passarella permitiu-nos conhecer melhor a evolução desta casa que, embora de história mais do que centenária (já fazia vinhos em 1893), só atingiu o estrelato junto dos apreciadores na última década, com novo proprietário e outras ambições.  Há muitas novidades na Passarella, não apenas vínicas mas também turísticas, dois elementos que, como se sabe, estão cada vez mais ligados.

 Texto: João Paulo Martins

Fotos: O Abrigo da Passarela

A Casa da Passarella está localizada num imenso planalto que antecede as subidas várias à serra da Estrela, passando por Gouveia, subindo ao Sabugueiro para aí aproveitar a natureza ondulante, quem sabe para um passeio arejado à beira de riachos e de caminhos com muita hortelã, a enriquecer o ar, já de si, bastante puro. Os vinhos aqui produzidos têm estampado no rótulo a sub-região Serra da Estrela, o que subentende um conjunto de características que remete para diversos produtores, uns bem conhecidos, como Álvaro de Castro, outros menos. Já se sabia, desde há muito, da valia dos vinhos da Passarella, com fama de décadas na produção de néctares muitas vezes comercializados a granel para grandes casas engarrafadoras. É uma grande propriedade, com vinhas dispersas por zonas diferentes, e com idades distintas, sistemas de condução variados, castas conhecidas e desconhecidas, umas nacionais, outras nem tanto. À fama de outrora, até aos anos 70 do século passado, seguiu-se um período em que a decadência parecia inevitável. Em boa hora foi adquirida pela família Cabral em 2008 e o novo proprietário deitou mãos a obra para recuperar a casa e as vinhas. A encimar a propriedade temos a casa, já completamente restaurada (um trabalho exemplar…) e pronta para se tornar, em breve, um hotel. Dizer que é de charme é muito pouco. Aqui todo o charme vem da própria arquitectura, da variada decoração de paredes e tectos que foram deixados intactos e apenas cuidadosamente recuperados. A decoração e os interiores seguem dentro de momentos. Daqui se vislumbra um mar de vinhas, ainda que só se abranja com o olhar uma parte dos vinhedos que completam 60 hectares. Ao arranjo e decoração dos interiores segue-se todo o arranjo exterior que irá tornar o local num ponto de paragem obrigatório para quem quiser conhecer o Dão e os vinhos da Serra da Estrela.

passarella estrela da serraManter, renovar ou arrancar?

Do ponto de vista do trabalho de viticultura e enologia, aqui estamos no céu, tal o manancial à disposição de Paulo Nunes, o enólogo que lidera este projecto desde que foi abraçado pelo novo proprietário. Na visita rápida que fizemos às vinhas, percebemos que as decisões tomadas foram arriscadas mas compensaram. Paulo explica que uma das vinhas velhas estava já com um projecto Vitis aprovado e iria ser arrancada em breve; à súplica do enólogo que pediu “só mais uma vindima” para ver o que dava, o Céu e os Deuses ouviram as preces e contemplaram o enólogo com uma colheita de 2008 de qualidade excepcional que acabou por justificar a manutenção da vinha. Produzia pouco? Pouco mecanizável? Castas esquisitas? Sim, isso tudo, mas dali vem agora um vinho emblemático da casa. O desafio passou muito por aqui, por manter o que era de manter, num trabalho enorme de preservação. Neste caso, de património cultural, não haja qualquer dúvida.

Na continuação da visita fomos ver as vinhas escondidas atrás de pinheiros e castanheiros, as formas de condução já caídas em desuso (“à morcela”) ou de reprodução (por mergulhia). Isto tudo sem deixar de ver as novas “folhas de vinha”, de moderna implantação e as vinhas do vizinho (vamos chamar-lhe sr. Manuel…) que fazem a cobiça de Paulo. Quando ali passámos, lá andava o sr. Manuel a tratar da vinha e Paulo comentou que “anda aqui todos os dias, trata disto como um jardim e temos uma óptima relação; já me disse que, entanto puder, irá continuar a tratar assim e entregar as uvas na adega cooperativa”. Nem com a proposta de lhe pagar o dobro, e a pronto, o sr. Manuel se comoveu; a ligação à cooperativa é um compromisso pessoal, fidelidade é isto…

Nos vinhedos ainda se encontra muita Tinta Roriz, uma casta que é verdadeiramente o “ódio de estimação” de Paulo Nunes que insiste não conhecer nenhum varietal daquela casta que mereça crédito. Por enquanto ela ainda lá está e tem sido usada para encomendas especiais, nomeadamente vindas de fora. A par dela, nas vinhas velhas circulam muitas outras castas, algumas impossíveis de identificar por não constarem em qualquer colecção ampelográfica, como se verá na descrição mais pormenorizada dos vinhos provados.

Novos vinhos e segredos por revelar

Provamos dois novos vinhos brancos, o Descoberta 2021, de que se fazem 60 000 garrafas. No lote entram Encruzado, Verdelho, Malvasia Fina e Barcelo. É um dos vinhos que mais depressa esgota, sendo habitual a ruptura de stock ao fim de dois meses. Não existem, no entanto, perspectivas de aumento significativo da produção. O Abanico 2021 tem origem em vinhas velhas com castas misturadas, sendo o lote completado com Encruzado e Bical. A produção atinge as 13 300 garrafas. Fermenta com leveduras indígenas e, após a fermentação, o estágio decorre em barricas e balseiros usados. A procura elevada exige uma pré-alocação do vinho para que chegue aos clientes habituais. Do Curtimenta branco só se fizeram 1990 garrafas. Vem de uma vinha velha onde têm as uvas com mais acidez. Feito em cuba de cimento com engaço total (3 semanas) onde faz também a maloláctica. Depois vai para barrica usada de 500 litros. Este branco recria o estilo antigo, já que era esta a forma como eram feitos todos os brancos da Passarella.

O Descoberta rosé corresponde a 13 000 garrafas. Tem Touriga Nacional, Jaen e Tinta Roriz. Fazem duas passagens de vindima nestas parcelas, uma parte vai para base de espumante e outra para rosé; o lote final acaba por ser a junção das duas vindimas.

Nos tintos provámos O Enólogo Vinhas Velhas 2019, de que se fizeram 9 000 garrafas. A vinha, que esteve para ser arrancada (ver texto em cima), tem 23 castas misturadas com a Jaen e a Baga em maior percentagem. Faz-se uma co-fermentação de todas as uvas e depois o vinho estagia num tonel usado.

O Fugitivo Bastardo é um produto de nicho. De que se fazem apenas 2152 garrafas mas que se apresenta muito bem. Apesar de ser tida como casta que origina tintos para beber enquanto jovens, o enólogo assegura que o vinho aguentará muito bem a prova do tempo. Do Fugitivo Vinha Centenária resultaram 3000 garrafas. O corte é feito em lagar com pisa a pé, com 100% de engaço, a que se segue um removimento da manta das vezes por dia com a “tranca”, nome de instrumento de madeira que se assemelha (na função) àquele que no Douro ou na Bairrada se chama “macaco”, embora o aspecto não seja igual. A fermentação demora uns 4 a 5 dias a arrancar e depois termina em tonel. Aí fica dois invernos e, posteriormente, tem mais dois anos de estágio em garrafa. Foi, assim, engarrafado em 2020.

No hotel a abrir no futuro próximo serão servidos vinhos de produções micro – Tinta Amarela e Alvarelhão, por exemplo – e para os quais serão recriados rótulos antigos. Fica a ideia que as micro-produções e as experiências do técnico só poderão ser provadas pelos clientes do alojamento. Esta, só por si, já poderia ser razão bastante para a deslocação e estadia no hotel que, desta forma, adquire um charme extra.

É provável que saia também no futuro próximo um tinto de Pinot Noir, uma casta que há muito existia na quinta e era dessa vinha que se fazia um pé de cuba usado depois nas fermentações. Irá sair como Fugitivo. Feito em lagar com engaço, prensado depois, termina em tonel. Pela pré-prova que fizemos notámos que tem muito carácter borgonhês, com leve acidez volátil bem. Irá ser um caso muito sério e contribuir para a aura de qualidade e diferenciação dos vinhos da Casa da Passarella.

(Artigo publicado na edição de Julho de 2022)

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Quinta das Bágeiras Garrafeira: Um branco à frente do seu tempo

Quinta das Bágeiras

Nasceu em 2001 quando, em Portugal, ainda não se dava valor a brancos complexos e de guarda. Era, antes de existir, o branco que Mário Sérgio Nuno queria produzir, mas ainda não tinha. Hoje, 19 edições depois, é provavelmente o branco que todos queriam ter. Texto: Mariana Lopes Fotos: Anabela Trindade No início dos anos […]

Nasceu em 2001 quando, em Portugal, ainda não se dava valor a brancos complexos e de guarda. Era, antes de existir, o branco que Mário Sérgio Nuno queria produzir, mas ainda não tinha. Hoje, 19 edições depois, é provavelmente o branco que todos queriam ter.

Texto: Mariana Lopes
Fotos: Anabela Trindade

No início dos anos 2000, numa feira de vinhos em Lisboa, Mário Sérgio Nuno apresentou um branco, a medo, a David Lopes Ramos. Nesse mesmo evento, o jornalista e crítico de vinhos e gastronomia, orientou uma prova comentada de vinho com queijos e, igual a si próprio, fez algo que na altura era tudo menos convencional: deu a provar, mesmo no final da sessão e a uma sala cheia, um branco com queijo Nisa. Era o Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2001, a primeiríssima colheita. O produtor tinha estado durante toda a prova, no fundo da sala “à espera de levar porrada”, como o próprio diz, pois “não era um   vinho compreendido pelas pessoas”. Mas todos os presentes adoraram. Era uma vez um branco proscrito e oprimido, 22 anos depois considerado com um dos melhores de Portugal.

Mário Sérgio Alves Nuno criou o projecto da Quinta das Bágeiras em 1989, pegando em todo o know-how aprendido com a sua família, que até então produzia vinho a granel para as caves da região. Juntando vinhas do seu avô paterno com outras do avô materno, perfazendo 12 hectares, fundou nesse ano, segundo o bairradino, a primeira empresa vinícola da Bairrada em mais de duas décadas.

“Bágeiras” era a vinha para onde o avô de Mário Sérgio, Fausto Nuno, costumava ir todos os dias trabalhar, montado na sua bicicleta “pasteleira”, hoje em exposição na adega que fica na aldeia da Fogueira, concelho de Anadia. “Lá vai o Fausto para a sua Quinta das Bágeiras”, dizia o povo, sem saber que viria, um dia, a dar o nome a um dos mais promissores produtores de vinho portugueses, no top da região da Bairrada.

Até hoje sempre com o apoio — na vinha, na adega e na vida — do seu pai Abel e mãe Maria do Céu, Mário Sérgio tem agora também ao seu lado o filho Frederico Nuno, de 25 anos, licenciado em Enologia pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e com estágio em empresas de diferentes tamanhos e conceitos, como Lusovini, Susana Esteban, Sogrape, Anselmo Mendes ou Barão de Vilar. Também ele aprendeu muito com o pai e os avós enquanto cresceu, lições preciosas dadas diariamente no campo e na adega. Muito chegado à sua família e à sua terra, é no meio destas — e das galinhas, gansos e faisões que cria junto à adega — que Frederico se sente bem e prospera. Há vários anos que vai, todos os dias, tomar o pequeno-almoço a casa dos avós paternos, também ali ao lado e, sempre que pode, amassa o pão que a avó coze no forno de lenha, mostrando que há, de facto, uma geração que volta a ter amor pelas coisas da aldeia e da agricultura. E já não era sem tempo.

Quinta das Bágeiras
Mário Sérgio à direita com o pai Abel Nuno.

Um branco “como o avô fazia”

 Antes de 2001, Mario Sérgio apenas fazia um vinho branco em inox, que considerava bom, mas que não lhe dava pica. Ainda não tinha um branco que lhe enchesse verdadeiramente as medidas, ao seu gosto, mais complexo e ambicioso. Entre desabafos, Rui Moura Alves, à data enólogo consultor da Quinta das Bágeiras — e figura muito importante para esta casa, sobretudo no início — chegou com a resposta: “fazemos um branco como o teu avô fazia, no tonel, e deixamo-lo mais tempo nas borras, o necessário até o vinho se mostrar pronto e estabilizar por ele próprio”.

O Garrafeira branco é um lote de Bical e Maria Gomes, de várias vinhas velhas, algumas centenárias, em solo argilo-calcário. A maioria são parcelas de castas tintas plantadas em “field blend” (misturadas na vinha), como ditou o encepamento dos anos 60 e 70 na região, com as brancas pelo meio, a forma que se arranjou na altura para conferir mais álcool e estrutura aos vinhos tintos.

Faz decantação por precipitação natural durante um dia ou um dia e meio, sensivelmente. De seguida, fermenta e estagia precisamente num tonel antigo já com centenas de usos — sempre o mesmo, o número 21, com 2500 litros de capacidade — de Setembro até Julho ou Agosto do ano seguinte, conforme a prontidão que o vinho mostra. “Com uma mangueira, tiramos o vinho do tonel para uma selha, daí para o inox e deste para as garrafas [cerca de 3 mil], onde fica um ano antes de sair para o mercado”, explica Mário Sérgio Nuno. “Fica sempre uma pequena quantidade no fundo do tonel, cerca de 50 litros, que utilizamos na produção de vinagre ou para atestos. O vinho é feito da mesma maneira desde a primeira colheita, só varia o ano”, desenvolve.

Quando as duas primeiras colheitas foram lançadas, o Garrafeira branco não tinha grande aceitação no mercado, e Mário Sérgio chegou a pensar que só ele é que gostava do vinho… ao ponto de decidir não produzir a colheita de 2003, a única que falta nesta prova vertical, por esse motivo. “A Câmara de Provadores da Bairrada tinha, inclusive, chumbado o 2002, e só à terceira é que o passou”, confessa Mário Sérgio. Mas, depois do sucesso da prova do David Lopes Ramos e ao ver a reacção positiva do público, o produtor resolveu apostar nele, sem interrupções, desde a colheita de 2004 até hoje. Agora lança a de 2020, a 19ª edição. Assim, David acabou por ser, depois do incentivo inicial de Rui Moura Alves, o grande encorajador do Quinta das Bágeiras Garrafeira branco. “Devo a existência deste vinho ao David Lopes Ramos, por me encorajar a continuar a fazê-lo”, afirma. Mário Sérgio bem disse, bastantes anos mais tarde nos Prémios Grandes Escolhas de 2018, no discurso após ter recebido o Troféu Singularidade, que “o verdadeiro segredo deste negócio é a teimosia, eu sou muito teimoso naquilo que faço”. E o Garrafeira branco foi também muito isso.

A Bairrada e os seus brancos

Há várias condições edafoclimáticas na Bairrada que fazem dela uma excelente região para produzir grandes vinhos brancos, apesar de ser bem mais conhecida, e valorizada, pelos tintos de Baga. “A minha ideia da Bairrada é que é uma região que pode produzir excelentes brancos e, além disso, é mais fácil fazer todos os anos um grande branco do que um grande tinto. A influência marítima, a acidez das uvas sempre altíssima, os solos argilo-calcários… tudo isto é ideal para os brancos na região”, explica Mário Sérgio.

O clima da Bairrada é atlântico temperado, com Invernos frios e chuvosos e Verões moderadamente quentes, pois são suavizados pelos ventos vindos do mar e pelas grandes amplitudes térmicas, sendo muito frequentes as noites frescas. É uma região sem barreiras orográficas a Oeste, o que facilita a referida influência marítima.

“Quando eu comecei no vinho, havia uma coisa que se dizia muito, que era ‘bebe-se branco quando não há tinto’. Os brancos sofreram muito, ao longo dos anos, deste preconceito. É uma questão cultural, o país, de modo geral, ainda dá mais importância aos vinhos tintos. Uma das razões por que, logo nos encepamentos iniciais, se plantaram mais castas tintas do que brancas. Eu, por exemplo, tenho vinhos brancos mais caros do que os tintos”, elucida o fundador da Quinta das Bágeiras.

“Há um nicho de consumidores para os brancos ambiciosos, sobretudo nestas quantidades mais baixas, que deve ser aproveitado”, continua. Em boa verdade, a Bairrada é uma região de minifúndio, de parcelas dispersas, com uma dimensão média de vinha que chega apenas no meio hectare. “O Garrafeira branco 2021 só venderemos em 2023, mas idealmente até seria só lançado em 2025. É nos brancos de guarda, para lançar mais tarde, ambiciosos e complexos que a Bairrada deve apostar”. E conclui: “Não temos dimensão para grande volume, e fazer brancos ‘fresquinhos e do ano’, embora perfeitamente legítimos, não é o futuro da região…”.

Quinta das Bágeiras

No mercado:

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Notas de Prova da Vertical:

18 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2019

Apenas num ano de colheita de diferença, ganhou nuances de orvalho matinal, sílex, leve raspa de toranja e toque de pólvora. Muito envolvente, sem nunca perder o nervo inicial, está ainda super novo e pujante. O grau nem se acusa, dada a elevada frescura natural. (15,5%)

18 C

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2018

Aqui, além da cremosidade e do querosene e pólvora expectáveis, tem já especiarias, como pimenta branca e açafrão, uma componente vegetal e sugestão de casca de laranja. Na boca mantém a acidez no topo e sobretudo uma enorme secura final, característica de quase todos os Bágeiras Garrafeira branco. (14%)

 17,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2017

Floral, grafite, limão maduro, ligeiramente menos preciso e mais difuso nos aromas. Na boca, apesar de não dar o estalo de acidez que os outros dão, tem enorme frescura e cremosidade, delicadeza num conjunto muito bonito. (14,5%)

 17,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2016

Bem delicado no aroma floral q.b., infusões tipo camomila e erva-príncipe, toranja madura. Na boca volta ao registo de óptima frescura ácida e precisão, nervo e juventude. Fica na boca e termina salino. (14%)

 17,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2015

Muito expressivo e a atacar na pedra raspada e no querosene, bastante pólvora e sugestão calcária, pimenta branca. Na boca traz uma percepção de acidez um pouco mais baixa do que os outros, mas é elegante e delicado. (14%)

 17 A

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2014

Floral e com fundo vegetal no nariz contido, com levíssima sugestão de pvc que lhe dá piada. Mais directo na boca e com menos corpo do que os anteriores, e ligeiramente mais diluído no conjunto. Provavelmente resultado das adversidades do ano 2014, que foi bastante chuvoso no momento em que não devia. (13,5%)

 17,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2013

Este vai na direcção do exotismo, com bastante especiaria, casca de laranja, lima e sugestão de cardamomo. Na boca está bem vivo e harmonioso. (13,5%)

 19 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2012

Pólvora, pederneira, muita flor e fruta, como nêspera e alperce, pimenta branca e leve caril de fundo, num nariz sublime. A untuosidade é impressionante, num conjunto de pendor vegetal, precisão superlativa e persistência quase infinita. O melhor da “nova geração” do Garrafeira branco. (14%)

 18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2011

Aqui parece que o vinho chegou à maturidade, qual adulto consciente e sereno na vida. Consolidado, bastante complexo e profundo no aroma, sério, com tudo no sítio. Na boca tem grande volume, estrutura fenomenal, tudo em harmonia, super longo, com imenso carácter e presença. Prima pelo perfil de tensão, secura e untuosidade óptimas. (14%)

 18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2010

Bastante flor do campo, ervas aromáticas, limão e pedra molhada no nariz muito bonito. Na boca é impactante porque parece um dos novos, com acidez no topo, imenso nervo e estrutura, sempre com cremosidade presente mas q.b. Impressionante também pelo equilíbrio e harmonia, sabor, secura e suculência. (13,5%)

 18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2009

Enorme complexidade de nariz, envolvência e mistério. Na boca explode em corpo e estrutura, altamente sumarento na fruta cítrica e branca, tenso, consolidado, com muita classe. Espectacular. (14,5%)

18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2008

Querosene, grafite, pedra molhada, fruta de caroço madura, pimenta branca e folha de louro, no nariz complexo, para não variar. Com elevadíssima secura e elegância, e também nervo, é nele óbvia a longevidade em garrafa. (13,5%)

 19,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2007

Enormíssima complexidade no aroma expressivo de sílex, pedra molhada, pimenta branca, grafite, pederneira… Na boca é todo impressionante pela gigante frescura, equilíbrio em todos os pontos, vivacidade, firmeza, enorme amplitude, crocância e prolongamento. A suavidade é de luxo e o vinho poderoso em simultâneo, um branco que não acaba, de classe mundial. (14%)

18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2006

Muito mineral nas notas de sílex e querosene, flores brancas e sugestão de zest. Óptima cremosidade e estrutura ácida, super amplo e largo no palato, salino no final longo e nervoso. (14%)

 18,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2005

Nariz com imenso querosene, pólvora, sugestão aborrachada no fundo, também casca de tangerina. Altamente equilibrado, com acidez cítrica gigante, mostrando o perfil mais cítrico de todos. Enorme te(n)são. (14%)

 19,5 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2004

Chegamos mais uma vez ao topo dos Garrafeira branco. Este apresenta fruta cítrica cristalizada, pederneira, flores do campo, infusão de camomila, no nariz complexo e profundo. Na boca tem tensão enorme, é intenso nos sabores e tem salinidade no ponto, a deixar as glândulas salivares a pulsar de prazer. Espectacular, quase coage ao próximo copo, envolvente e muito, muito puro no conjunto. Não queremos sair dele, é monumental. (13%)

 19 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2002

Aqui as flores do campo juntam-se ao mel fumado e à madeira antiga, também amêndoa torrada. Enorme classe e mineralidade, fumo finíssimo no nariz e na boca, imenso sabor e suculência, super largo, fica para sempre na boca, acidez enorme e equilibradíssima com a untuosidade sedutora. Grande branco. (13,5%)

 20 B

Quinta das Bágeiras Garrafeira branco 2001

Acabamos em grande, parece de propósito, mas não é. Extremamente sério e complexo no nariz mineral, sensual, sem exuberâncias histriónicas, mas com um certo “quê” que adivinha grandiosidade. Na boca envolve-nos numa dança de precisão, finesse e classe, fantástica personalidade e carácter, presença imponente, ainda muito vivo e para durar. Não se podem escrever as coisas que apetece fazer com este vinho. Estrondoso e a mostrar, pela sua juventude, que o Garrafeira branco é quase eterno. (13,5%)

(Artigo publicado na edição de Julho 2022)

Maria de Lourdes Modesto: O adeus a uma grande senhora

Créditos de foto: Monocle / Rodrigo Cardoso Apesar da idade avançada, a morte de Maria de Lourdes Modesto apanhou-me de surpresa. É sempre triste quando parte alguém com quem tivemos uma relação de amizade. Como tantos outros aficionados, conheci a Maria de Lourdes Modesto pelos seus programas de TV e sobretudo pelos seus livros. Fiquei […]

Créditos de foto: Monocle / Rodrigo Cardoso

Apesar da idade avançada, a morte de Maria de Lourdes Modesto apanhou-me de surpresa. É sempre triste quando parte alguém com quem tivemos uma relação de amizade. Como tantos outros aficionados, conheci a Maria de Lourdes Modesto pelos seus programas de TV e sobretudo pelos seus livros. Fiquei muito contente quando, em anos recentes, tivemos oportunidade de privar bons momentos, em sua casa, à volta de um chá e do bolo que sempre preparava para acompanhar o lanche. Sempre curiosa e atenta, nunca deixou que a idade lhe retirasse o gosto pelos livros, pelas coisas boas e novas que a culinária moderna foi trazendo. Gostava com entusiasmo mas, quando entendia, criticava as modernices sem sentido a que assistia e a mistura de conceitos que grassavam nos críticos de formação apressada que com ela se foram cruzando. Sempre disponível para participar em eventos e acções de promoção da gastronomia, sempre atenta ao que faziam os novos Chefes que, diga-se, lhe reconheciam a inspiração e a amizade sempre renovada. Foi a grande senhora da gastronomia portuguesa e serão poucas todas as homenagens que lhe forem prestadas. Fica a herança, o saber e a inspiração.

Obrigado Maria de Lourdes, foi para mim uma honra ter privado consigo tão agradáveis momentos. Até sempre!

João Paulo Martins

Grande Prova: Beira Interior 2.0

Beira Interior desafiante

Brancos e tintos desafiantes A Beira Interior está em constante mudança, com o solidificar e desenvolver de projectos clássicos e bem-sucedidos e o surgir de outros que vêm trazer ainda mais dinamismo e competitividade. Nesta prova, percorremos os brancos e tintos bem diferenciadores de uma região com antigas tradições de vinha e de vinho, onde […]

Brancos e tintos desafiantes

A Beira Interior está em constante mudança, com o solidificar e desenvolver de projectos clássicos e bem-sucedidos e o surgir de outros que vêm trazer ainda mais dinamismo e competitividade. Nesta prova, percorremos os brancos e tintos bem diferenciadores de uma região com antigas tradições de vinha e de vinho, onde o carácter, a frescura e a elegância são denominador comum.

Texto: Valéria Zeferino
Fotos: Ricardo Palma Veiga

A tradição vitivinícola antiga na Beira Interior remonta à época romana, sendo oficialmente demarcada em 1999. Há alguns anos falámos no despertar da Beira Interior, quando surgiram projectos novos a inspirados pelos entusiastas, alguns com raízes na região, outros vindos de fora dela. Enólogos conhecidos, como Virgílio Loureiro, Anselmo Mendes, Rui Madeira, Rui Reguinga ou Patrícia Santos, trouxeram o seu conhecimento, elevaram a qualidade dos vinhos e deram credibilidade à região. O consumidor também despertou, (re)descobrindo uma região antiga na sua versão 2.0 com identidade própria que privilegia frescura e elegância.

Hoje, a região produz mais de 3 milhões de garrafas, apostando cada vez mais na exportação. Nos últimos dois anos a exportação duplicou chegando a 40% de produção. Os principais mercados neste momento são Brasil, Letónia, USA, Canadá, Dinamarca, Bélgica e Holanda, de acordo com os dados da CVRBI. Esta entidade certificadora também assume um papel de promotora da região, apostando fortemente no enoturismo e na internacionalização dos seus vinhos, trazendo potenciais importadores à região através das missões inversas. Nos últimos dois anos foi criada a Rota dos Vinhos da Beira Interior que pretende atrair cada vez mais pessoas ao interior. Até porque a oferta enogastronómica e cultural dentro da região é grande. E não podemos esquecer que das 12 aldeias históricas de Portugal, 11 ficam na Beira Interior.

Identidade geográfica

A altitude, a continentalidade e os solos pobres moldam as condições edafo-climáticas da Beira Interior.  A região estende-se do vale do Douro e Trás-os-Montes no norte ao rio Tejo no sul. Faz fronteira com a Espanha e é separada da Beira Litoral pelas várias formações montanhosas:  Serra da Estrela, do Açor, Gardunha e Lousã, que cortam a influência atlântica, deixando o clima mais seco, com maior amplitude térmica diária e anual.

A continentalidade manifesta-se pelos invernos rigorosos e frios, temperaturas negativas e neve frequente e pelos verões curtos, mas quentes e secos, com muitas horas de sol. A amplitude também ameniza os extremos de temperatura no pico de Verão. As noites frescas criam condições importantes para maturações mais homogéneas e retenção da acidez que mais tarde se traduz na frescura dos vinhos produzidos.

As montanhas e planaltos elevam as vinhas à altitude de 300 a 700 metros, amenizando as temperaturas médias, pois a temperatura baixa 0,6˚C por cada 100 metros.

Os solos são pobres em matéria orgânica e bem drenados, de origem maioritariamente granítica, mas também xistosa em zonas de transição para o Douro, com filões de quartzo e alguma ascendência arenosa.

Existem três sub-regiões, que antes da criação de denominação de origem em 1999, eram três regiões separadas: Pinhel, Castelo Rodrigo e Cova da Beira.

A sub-região de Pinhel com altitude média de 650 metros fica a norte da Guarda e estende-se até Mêda e à serra da Marofa.  A sub-região do Castelo Rodrigo está praticamente colada à de Pinhel, tendo como a linha de separação o rio Côa e uma estrutura montanhosa. Caracteriza-se pelos planaltos a 600 e 750 m de altitude. Ambas as sub-regiões são secas, com precipitação anual raramente a ultrapassar os 500 mm e com grandes amplitudes térmicas.

A Cova da Beira situa-se na zona sul da região, sendo limitada, a Norte, pelas serras da Estrela, Gardunha e Malcata e a sul, pela bacia hidrográfica do Tejo, onde o clima já tem alguma influência mediterrânica. É a sub-região mais extensa da Beira Interior, onde dá para distinguir duas zonas com características um pouco diferentes. Uma mais a Norte, entre as Serras da Gardunha e da Serra, à volta do Fundão e da Covilhã, com a precipitação a variar muito (de 600 a 1.800 mm por ano) em função do relevo. Outra, a Sul da Serra da Gardunha, com temperaturas mais elevadas e de precipitação a rondar os 500-700 mm. Aqui o clima apresenta semelhanças com o Alentejo.

A vindima entre a Cova da Beira e Pinhel pode começar com três semanas de diferença. As geadas de primavera são problemáticas na maior parte da região. Como diz Pedro Carvalho, da Quinta dos Termos, “geada há sempre, a dúvida é se será muita ou pouca”. Por isto as podas são mais tardias, às vezes são feitas em Abril para os abrolhamentos serem mais tarde, não prejudicando a produção em caso de geada.

Castas com carácter

De acordo com os dados do IVV, houve uma diminuição em termos de área plantada nos últimos anos (de 15110 ha para 13874 ha), provavelmente devido  ao abandono da vinha e a algum arranque para plantação de outras culturas. Mesmo que 75% da vinha não tenha DOP/IGP, a área de vinha para vinhos certificados como DOP e IGP aumentou bastante, o que é uma dinâmica muito positiva.

As castas mais plantadas na Beira Interior, segundo o IVV, são Rufete e Siria representando 16,2% e 15,6% da área plantada, respectivamente. O Aragonez também tem uma grande presença na região ocupando 14,5% da vinha.

As primeiras duas castas existiam antes da filoxera, variando um pouco entre as zonas, e expressam mais a região, mas na maior parte dos vinhos entram em lotes. Outras castas antigas são Fonte Cal, Malvasia, Gouveio, Rabigato e Folgasão, nas brancas e Marufo, Bastardo, Tinta Francisca, Donzelinho, entre castas tintas. Com o passar do tempo e novas tendências o encepamento mudou e hoje encontramos na região as castas nacionais de outras regiões (Touriga Nacional, Tinta Roriz, Touriga Franca, por exemplo) e estrangeiras como a Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Syrah e Merlot. Até Sangiovese e Nebbiolo foram plantadas pela Quinta dos Termos a título de experiência.

A casta Rufete, também é conhecida como Tinta Pinheira no Dão e encontra-se em pouca quantidade noutras regiões, ocupando 2% de encepamento do país. Produz imenso, diz o produtor José Afonso, das Casas Altas. Tirando isto, na sua opinião, é bem amiga do viticultor. Antigamente, quando chovia mais no Outono, verificavam-se problemas de podridão a que a casta é sensível, ultimamente nem isto. Na adega tem tendência para aromas um pouco reduzidos, pelo que convém transfegar logo quando acaba a fermentação.

Pela sua grande produtividade, o Rufete ganhou alcunha de “pai dos pobres”. Nas adegas cooperativas chegava a produzir até 20 tn/ha, perdendo completamente a sua identidade e imagem, e nos anos 80-90 acabou por ser renegada na sua terra natal. O proprietário da Quinta dos Termos, João Carvalho, contou uma vez que em algumas adegas cooperativas até nem se aceitavam novos sócios com muito Rufete, dando preferência a outras castas.

O Rufete origina vinhos de grau alcoólico contido, com pouco tanino, cor aberta e acidez média. Plantada nos sítios certos, em solos pobres, com produções controladas a não ultrapassar 6-7 tn/ha, produz vinhos sérios, mas delicados, com frescura e carácter próprio.

A enóloga e produtora Patrícia Santos (Rosa da Mata), refere que, em termos aromáticos, Rufete tem bastante fruta, mas é delicada, nada de excessos. Tem bastante acidez e evolui bem em barrica.

É sempre uma óptima alternativa a vinhos mais extraídos, carnudos e tánicos que são cada vez mais apreciados pelos enófilos, mas nem sempre a cor mais aberta do Rufete é entendida pelo consumidor geral. José Afonso explica que vende os vinhos de Rufete mais aos conhecedores e hotelaria de luxo do que ao consumidor menos informado, embora as pessoas mais antigas da região, que entendiam o vinho como parte da alimentação, aceitassem bem a cor menos intensa.

A casta Síria no nosso país responde por muitos nomes: Roupeiro no Alentejo e Códega no Douro, são os sinónimos oficiais. Para além disto é conhecida como Alvadourão ou Alvadurão no Dão, Malvasia Grossa e Dona Branca em Bucelas e Crato Branco no Algarve. Até na Beira Interior, na zona de Belmonte, e em Portalegre, usava o sinónimo de Alva. Como vemos é bastante comum em várias regiões e ocupa 3% do encepamento nacional. Mas é na Beira Interior que a casta se destaca pela maior frescura e aromas menos terpênicos, mais delicados e focados, mas que duram mais tempo no envelhecimento em garrafa. Segundo Patrícia Santos, a Síria é uma casta muito versátil e expressa de forma identificativa não só a região da Beira Interior, como também cada sub-região. Na zona de Castelo Branco demonstra mais perfume, mas consegue manter a frescura; na zona de Pinhel é mais discreta, mais selecta; na zona de Figueira é um compromisso entre as outras duas.

A Fonte Cal é uma casta originária da zona de Pinhel e praticamente só existe na Beira Interior, sobretudo nos encepamentos antigos. Representa menos de 1% do encepamento da região, mas encontra-se principalmente em vinhas velhas onde existe uma mistura de muitas castas e por isto não se encontra identificada pelo IVV como Fonte Cal. É uma casta vigorosa, mas não muito produtiva. Precisa de mais tempo para amadurecer do que a Síria, mas perde rapidamente a acidez, pelo que a janela de vindima é muito pequena. Por esta razão entrava sempre nos lotes com Síria ou Arinto com mais nervo.

Patrícia Santos refere que na adega a Fonte Cal também não é fácil. Tem tendência para oxidar e perde aromas rapidamente. Como se não bastasse, apresenta instabilidade em termos de tartaratos de cálcio e tem tendência para o pinking (um fenómeno oxidativo do vinho branco, dando origem a uma evolução da cor para um tom cinzento-rosado). A verdade é que continuam a existir muito poucos vinhos monovarietais de Fonte Cal.

Algumas castas antigas da região são pouco conhecidas hoje em dia e trazem alguma polémica quanto à sua origem. E o caso da Callum, vinificada em extreme pela Quinta dos Termos. As opiniões dividem-se e nem os especialistas chegam a um consenso: uns dizem que é uma das castas antigas na zona que era chamada Pinhal Interior, enquanto existe possibilidade de ser a mesma casta chamada Batoca na região de Vinhos Verdes. Também foi referenciada nos distritos de Aveiro, Leiria, Vila Real e Bragança, com os nomes de Sedouro ou Alvaraça. Mas independentemente da sua origem, não há dúvidas que a casta teve sempre presença naquela zona da Beira Interior. Antes da filoxera entrava nos encepamentos de Sertã, Covilhã e Belmonte. O produtor e enólogo Pedro Carvalho conta que Callum já era autorizada para produção de vinhos na antiga Cova da Beira ainda antes de criação da denominação de origem.

Tudo começou quando a Quinta dos Termos adquiriu em 2015 outra propriedade – Herdade de Lousial, onde plantou nos cerca de 2 hectares 92 clones de Callum, provenientes de zonas distintas do pais, incluindo o Minho. Fizeram-se cerca de 1200 garrafas de um vinho único desta casta em 2020 e a experiência foi repetida em 2021, com mais de 3 mil garrafas.

A casta Fernão Pires não é muito associada à Beira Interior, ocupando cerca de 1% de vinha, mas tem na zona de Pinhel uma expressão bem interessante. Patrícia Santos ficou fascinada pela performance da casta que em Pinhel mostra uma quase salinidade inexplicável. Compara com vinhos de Sancerre, que, feitos de uma casta aromática, naquela região revelam uma personalidade diferente. No final de fermentação o vinho passa para as pipas de 500 litros, onde permanece pelo menos um ano. A produtora gosta de vinhos com madeira para dar outra dimensão ao vinho, desde que não seja exagerada. Deste vinho produz  apenas 1500 litros, mas faz um vinho de que gosta e que reflecte o terroir.

Na zona de transição para a região do Douro, os solos são xistosos e nota-se grande presença das castas durienses. As vinhas da Casas do Côro, na aldeia histórica de Marialva a poucos quilometros de Mêda, são velhas com quase 100 anos, com produções baixíssimas de 1500 kg/ha e ficam numa altitude de 600 metros. Entre as castas tintas predominam Mourisco e Touriga Franca e nas brancas Rabigato e Códega, aos quais se juntam uvas de Rabigato, Verdelho da Madeira e Donzelinho, provenientes da primeira vinha plantada em 2009.

Projectos novos e antigos

Na Beira Interior nota-se um movimento em direcção à qualidade e valorização da região. Já há produtores de renome, marcas associadas aos vinhos de autor, com personalidade vincada, que começam a ficar emblemáticas para a região, como a Casas de Côro, Biaia, Quinta dos Termos (também é uma das mais antigas) e Rui Madeira, entre outros.

E quase todos os anos aparecem projectos novos de grande dedicação e com propósito. Podem não ter ainda dimensão, mas contribuem para o nível qualitativo da região. Um dos mais interessantes é o de Miss Vitis Wines com marca Bal da Madre. Gil Taveira conta que o projecto começou no Douro pelo seu avó e com ele teve continuação. Há poucos anos resolveu apostar na Beira Interior para fazer vinhos de agricultura biológica, já que a região reúne as condições para isso. Em conjunto com produtores de azeite e mel, entre outros produtos, exportam para o Reino Unido, transportando a mercadoria em veleiros (para reduzir a pegada ecológica). O nome Bal da Madre significa “Vale da Mãe” em língua mirandesa e presta homenagem à mulher e à videira, onde tudo começa. A primeira colheita foi de 2017. O perfil dos vinhos é muito limpo, delicado, com uma simplicidade cativante.

A notoriedade constrói-se com resiliência e dedicação e pequenos projectos por vezes seguem conceitos bem sucedidos, são rapidamente captados pelos radares dos enófilos e propagados, valorizando a imagem global da região.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2022)

 

Trafaria (com) Prova com mais de 7000 visitantes

trafaria com prova

Depois de dois anos de ausência devido à pandemia, a Trafaria voltou a viver momentos intensos com o festival Trafaria (com) Prova que decorreu entre 8 e 10 de Julho numa organização do Município de Almada e produção da Grandes Escolhas. Com a presença de 20 expositores de vinhos, representado várias regiões vinícolas do país […]

Depois de dois anos de ausência devido à pandemia, a Trafaria voltou a viver momentos intensos com o festival Trafaria (com) Prova que decorreu entre 8 e 10 de Julho numa organização do Município de Almada e produção da Grandes Escolhas.

Com a presença de 20 expositores de vinhos, representado várias regiões vinícolas do país e uma presença internacional dos vinhos da Moldávia, a que se juntaram os deliciosos petiscos locais de oito restaurantes participantes e de quatro pastelarias, o evento atraiu muitos visitantes que puderam disfrutar de bons momentos à beira Tejo.

O imenso calor que se fez sentir no fim de semana não desencorajou os participantes e foram muitos os que aproveitaram as condições únicas do Passeio Ribeirinho da Trafaria para passar momentos descontraídos. Para os consumidores mais exigentes as provas de vinho comentadas pelo critico Luís Antunes foram um momento alto e muito participado. Actividades para crianças, actuação de bandas e tunas musicais, teatro de rua e DJs, completaram a oferta de uma festa que foi concebida para agradar a toda a família.

 

Séries RCV- A engarrafar o futuro

Séries RCV

Tudo começou com um Rufete de 2010, e hoje são já 13 varietais. O projecto Séries, da Real Companhia Velha, tem sido um autêntico esboço do presente e do futuro dos vinhos não fortificados da empresa. Um estudo aprofundado do potencial vitícola e enológico de cada casta antiga do Douro. Texto: Mariana Lopes Fotos: Real […]

Tudo começou com um Rufete de 2010, e hoje são já 13 varietais. O projecto Séries, da Real Companhia Velha, tem sido um autêntico esboço do presente e do futuro dos vinhos não fortificados da empresa. Um estudo aprofundado do potencial vitícola e enológico de cada casta antiga do Douro.

Texto: Mariana Lopes

Fotos: Real Companhia Velha

No Douro, estão reconhecidas cerca de 150 castas autóctones autorizadas para produção de vinho. Só nas vinhas velhas, encontram-se várias dezenas de variedades diferentes, umas mais populares e amplamente utilizadas nos vinhos de hoje, e outras já consideradas raras, existentes em pouca quantidade, algumas com excelentes aptidões na adega. Isto é mais do que razão para se tirar partido prático desta riqueza varietal, e é mesmo isso que a Real Companhia Velha está a fazer com o projecto Séries. “A grande vantagem das vinhas velhas do Douro não é apenas a idade, é, precisamente, a diversidade de castas que lá encontramos, como as familiares Touriga Franca, Tinta Roriz, Tinta Amarela, naturalmente a Touriga Nacional, mas também outras muito interessantes como Tinta da Barca, Cornifesto, Malvasia Preta, Donzelinho Branco, Donzelinho Tinto… castas estas que produzem, e que se mostram adaptáveis às condições austeras do Douro”, sublinhou Pedro O. Silva Reis, Fine Wine Manager da empresa com sede em Vila Nova de Gaia, na apresentação dos novos Séries. Na verdade, foi esta diversidade que inspirou o nascimento desta gama de ensaios, onde se exploram diferentes técnicas na adega, castas e abordagens: em 2002, depois de várias visitas a campos ampelográficos do Douro, a equipa técnica da Real Companhia Velha inspirou-se e iniciou a aposta na recuperação de mais de 30 variedades autóctones. Séries RCV

Na Quinta do Casal da Granja, em Alijó, estão as brancas Alvarelhão Branco, Alvaraça, Branco Gouvães (ou Touriga Branca), Esgana Cão, Donzelinho Branco, Moscatel Ottonel, e Samarrinho. Já as tintas Bastardo, Donzelinho Tinto, Malvasia Preta, Preto Martinho, Cornifesto, Rufete, Tinta da Barca, Tinta Francisca e Tinto Cão, são da Quinta das Carvalhas, junto ao Pinhão. Quase todas foram plantadas pela empresa em parcelas estremes com área mínima de um hectare, para serem estudadas quanto ao comportamento agronómico e avaliado o seu potencial em vinhos varietais. Como explicou Jorge Moreira, responsável de enologia da Real Companhia Velha, foram “também às vinhas velhas à procura das castas mais antigas, para as vinificar separadamente”.

Famosa pelos seus vinhos do Porto, a Real Companhia Velha arrancou com o seu projecto de vinhos não fortificados — chamado Fine Wine Division — em 1996, ano em que resolveu “apostar na produção de grandes vinhos do Douro”, referiu o enólogo. “Começámos a melhorar a forma como tratávamos da vinha para termos uvas de qualidade, e a apostar em novas técnicas de vinificação, mais cuidadas e precisas. Sentimos necessidade de perceber, entre a enorme panóplia de castas que tínhamos, o que é que cada uma representava”, desenvolveu. Assim, ainda no final dos anos 90 e já com o “bichinho” dos estudos varietais, a empresa começou a engarrafar vinhos monocasta com as marcas Porca de Murça e Quinta de Cidrô, como Tinta Roriz, Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Barroca, Chardonnay, ou Cabernet Sauvignon. “Poucos se mantiveram, mas foram importantíssimos para percebermos as nuances de cada uma das castas na vinha e na adega, e permitiu-nos das um grande salto qualitativo”, explicou Jorge Moreira.

Séries RCVCom primeiro lançamento em 2012, de um Rufete 2010, as Séries contam já com 13 referências, algumas com mais de uma edição, o que totaliza mais de 30 vinhos, incluindo brancos, tintos e espumante. No recentemente inaugurado The Editory Riverside Hotel, em Santa Apolónia, foram lançadas as mais recentes colheitas dos Donzelinho Branco, Bastardo, Rufete, Malvasia Preta e Cornifesto; e também a novidade absoluta, um Tinta Amarela, cujas uvas têm origem na Quinta dos Aciprestes. Como “teaser” do que sairá em breve, provou-se um Samarrinho de 2019 e um Branco Gouvães de 2018.

“Isto é algo que teve um grande impacto na Real Companhia Velha. Os Séries marcaram muito a nossa forma de produzir vinho, criaram-se técnicas na adega muito a pensar nas uvas que estamos a vinificar, como uso ou não de engaço, maior ou menor extracção, remontagens… no fundo, aprendemos muito com este projecto”, afirmou Pedro Silva Reis, e Jorge Moreira rematou: “O que se passa aqui são as bases do futuro da Real Companhia Velha. Estamos entusiasmados, nunca fizemos vinhos tão bons, e falo de nós e do Douro em geral. Os Séries são, hoje, as sementes para fazer mais tarde vinhos ainda melhores. São lições que aprendemos, de conhecimento e de prazer”. Para “adoçar a boca”, a dupla revelou ainda que, na calha, está um Tinta da Barca e um Moreto…

(Artigo publicado na edição de Maio 2022)

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Dora Simões é a nova presidente da direcção da CVR dos Vinhos Verdes

Dora Simões Presidente

Duas mulheres eleitas para a liderança no mandato 2022-2025 Dora Simões acaba de ser eleita para o cargo de Presidente da Direcção da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV) para o triénio 2022-2025, contando com Óscar Meireles e Rui Pinto como Vogais, em representação do Comércio e da Produção, respectivamente. Natural do […]

Duas mulheres eleitas para a liderança no mandato 2022-2025

Dora Simões acaba de ser eleita para o cargo de Presidente da Direcção da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV) para o triénio 2022-2025, contando com Óscar Meireles e Rui Pinto como Vogais, em representação do Comércio e da Produção, respectivamente.

Natural do Porto e licenciada em English for International Business pela University of Central Lancashire, no Reino Unido, Dora Simões conta com um percurso profissional de mais de 25 anos em que se destacam funções de relevo no sector dos vinhos, desde gestão de Marketing na Europa Central da Ernest & Julio Gallo Winery, à Direcção-Geral da ViniPortugal ou a Presidência da Direcção da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), onde lançou e desenvolveu o Plano de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA) que constitui uma referência a nível nacional e internacional. Dora Simões foi eleita por unanimidade para suceder a Manuel Pinheiro, Presidente da Direcção da CVRVV durante cerca de duas décadas, na qual assumiu 7 mandatos.

Pela primeira vez, a CVRVV conta com duas mulheres na liderança da Região, com Celeste do Patrocínio a assumir a Presidência do Conselho Geral, numa instituição em que historicamente a Direcção dos Departamentos é maioritariamente assumida no feminino.

“É um enorme orgulho e uma grande responsabilidade assumir a liderança de uma Região que se posiciona com diferenciação pela qualidade e que tem sido um exemplo a nível nacional e na promoção da marca Vinho Verde em mais de uma centena de mercados externos. Esta Direcção tem como missão manter esse crescimento nas exportações e no mercado nacional, reforçando o papel pioneiro que a CVRVV tem tido no desenvolvimento de ferramentas de apoio aos viticultores, na promoção do trabalho de produtores e engarrafadores e no aumento da base de consumidores dos vinhos desta Região única no Mundo”, destaca Dora Simões, Presidente da Direcção da CVRVV.