O Oídio

Na maior parte do território, o perigo do Míldio e Podridão estão mais ou menos afastados com o tempo seco e quente. Mas o Oídio espreita sempre uma oportunidade de comer parte ou a totalidade da vindima. TEXTO João Afonso De todas as maleitas da vinha, o Oídio é a mais persistente em todo o […]

Na maior parte do território, o perigo do Míldio e Podridão estão mais ou menos afastados com o tempo seco e quente. Mas o Oídio espreita sempre uma oportunidade de comer parte ou a totalidade da vindima.

TEXTO João Afonso

De todas as maleitas da vinha, o Oídio é a mais persistente em todo o ciclo vegetativo. É um fungo de inspiração golfista, ou seja, até ao último buraco (leia-se última semana antes da vindima) tudo pode acontecer.
O míldio e a podridão necessitam de condições atmosféricas de chuva e humidade mais ou menos extremadas para se manifestarem, mas para o oídio bastam por vezes subtis orvalhadas, ou humidade persistente do ar superior a 40%, para que nos últimos dias se perca uma boa parte da qualidade da vindima.
O nome do bicho é Uncinula necator. Entrou em Inglaterra em 1845 e até 1851 invadiu fulminantemente toda a Europa. O choque foi talvez mais brutal do que o da filoxera, com quebras de produções vitícola aterradoras. Até à década de 50 do século passado o enxofre era a única defesa contra o predador. Hoje temos uma simpática panóplia de produtos sistémicos (penetrantes e circulantes) e, claro está, o velho amigo enxofre nas versões molhável (pulverizações) e pó (polvilhações). Acima de todos os anti-oídio está o arejamento e insolação das uvas. Quanto mais expostos ao ar, ao vento e ao sol estiverem os cachos, melhor se defenderão do fungo.
Orvalhadas e nevoeiros matinais, locais baixos protegidos do vento, são a “sua praia”.
O povo dá-lhe o nome de “cinza”. E é basicamente o que é necessário para o reconhecer – a sugestão de cinza nas folhas e bagos de uva. Há que estar sempre bem atento, principalmente desde a prefloração até ao fecho dos cacho (final do crescimento do bago).

 

Os tratamentos tardios contra o oídio com enxofre, a partir do fecho do cacho, são de evitar, pois este enxofre pode dar origem a sulfídrico no vinho (hidrogénio sulfito), cheiro a esgoto, a ovos podres. Quando as uvas entram na adega com oídio, dependendo do nível de ataque, vão interferir no vinho final com desequilíbrios de prova e um cheiro característico a fungo (ortho cresol). Com uvas brancas deve-se clarificar o mais depressa possível, eventualmente usar um carvão e nas uvas tintas, fazer pouca maceração e retirar o vinho o mais depressa possível das massas.

*Enólogo

Edição Nº25, Maio 2019

 

O engarrafamento

Um dos mais determinantes passos na produção de vinho. Estamos na época do ano em que há “engarrafamentos” nos engarrafamentos de vinho. Todos querem ter cubas ou depósitos vazios para receber a próxima vindima e é uma azáfama de Norte a Sul na compra de garrafas, rolhas e prestações de serviços. Texto: João Afonso O […]

Um dos mais determinantes passos na produção de vinho. Estamos na época do ano em que há “engarrafamentos” nos engarrafamentos de vinho. Todos querem ter cubas ou depósitos vazios para receber a próxima vindima e é uma azáfama de Norte a Sul na compra de garrafas, rolhas e prestações de serviços.

Texto: João Afonso

O engarrafamento tem por fim acondicionar o vinho num vasilhame que assegure a conservação das suas características organolépticas por um período de tempo mais ou menos longo.

Passos e atos

O enxaguamento é o primeiro passo importante do engarrafamento. Deverá ser rápido, eficaz e, acima de tudo, a água utilizada deverá ser de ótima qualidade ou mesmo ser esterilizada ou ozonada.

O enchimento pode ser considerado, como o momento de maior importância no processo de engarrafamento. Deve ser estéril e garantir que o vinho contacta o mínimo com o oxigénio. A enchedora deve manter um débito constante de enchimento, sem reduções ou interrupções e não pode formar espuma dentro da garrafa.

No fim a rolhagem. A rolhadora faz um ligeiro vácuo no gargalo, que evita a oxidação do vinho e pressão no interior da garrafa antes de introduzir a rolha com rapidez. O espaço em vazio deixado entre o vinho e a rolha deve cumprir as normas especificadas no modelo da garrafa.
Com os equipamentos existentes nas linhas de engarrafamento actuais podemos ao mesmo tempo que engarrafamos, ‘pasteurizar’ o vinho, retirar álcool por osmose inversa, retirar acidez volátil, estabilizar o vinho…. Só ainda não se consegue transformar um “entrada de gama” num “super premium”. Mas com tempo….

António Ventura, enólogo

A opinião de António Ventura

Para além de alguma contaminação, que em boa parte está excluída pela grande eficácia dos equipamentos modernos e também pela profissionalização deste sector e respetivos serviços, a grande preocupação num engarrafamento é o oxigénio. Devemos evitar ao máximo a sua intrusão no vinho no ato de enchimento da garrafa, ou com azoto ou com vácuo. Principalmente nos vinhos brancos. Um engarrafamento deficiente de vinho branco não só prolonga muito a chamada “doença de garrafa”, como não permite à posteriori uma recuperação total do vinho sujeito a esse deficiente engarrafamento.

 

 

Edição Nº26, Junho 2019

Maceração

Fase determinante na feitura do vinho. É o verdadeiro “trabalhar o vinho”. Da sua eficácia depende a passagem de todo o potencial qualitativo da uva para o vinho feito. TEXTO João Afonso FOTO Ricardo Palma Veiga Maceração É a diluição num líquido de compostos que estão contidos em partes sólidas do fruto ou planta. A […]

Fase determinante na feitura do vinho. É o verdadeiro “trabalhar o vinho”. Da sua eficácia depende a passagem de todo o potencial qualitativo da uva para o vinho feito.

TEXTO João Afonso

FOTO Ricardo Palma Veiga

Maceração
É a diluição num líquido de compostos que estão contidos em partes sólidas do fruto ou planta. A preparação de chá é um bom exemplo de maceração. No vinho procuramos diluir no mosto da uva os compostos contidos nas suas partes sólidas (películas, grainhas e, por vezes, engaços). É o tempo de contacto entre partes sólidas e liquidas que toma o nome de maceração. É usada fundamentalmente em vinhos tintos e generosos (Porto e Moscatel).

Maceração é Extracção
A maceração ocorre ao mesmo tempo que a fermentação alcoólica. O aumento de temperatura do mosto, a crescente presença de álcool e o trabalho físico da manta (partes sólidas que flutuam no mosto em fermentação), que é mergulhada ou regada com o próprio mosto, aumentam o nível de extracção dos compostos fenólicos (cor e taninos). Existe uma relação directa entre a qualidade da uva e o tempo de maceração.

Macerações pré e pós-fermentativas
A pré-fermentativa ou pelicular, a temperaturas baixas e sem presença de álcool, usa-se fundamentalmente em brancos (mas também em rosé e tinto). Consegue vinhos mais finos e complexos, mesmo nos casos de maturações menos conseguidas.
As macerações pós-fermentativas são utilizadas nos tintos de guarda, produzidos com uvas bem maduras e completamente sãs. Permite extrair mais taninos, assim como a polimerização e afinamento dos mesmos. É usada também no fabrico de Moscatel de Setúbal. Procura-se sempre mais e melhor extracção.

Maceração Carbónica
Existe ainda a maceração carbónica, que consiste numa técnica especial de fermentação usada nos tintos Beaujolais (França) e nalguns vinhos da Rioja (Espanha). Produz vinhos intensos de fruto com taninos macios.

A opinião de António Ventura
A maceração é uma das etapas mais importantes na vinificação. Sempre o foi, mas hoje ainda o é mais. No caso dos tintos, vai permitir definir o corpo e a estrutura do vinho que queremos ter; nos brancos, com a maceração pré-fermentativa, define a mineralidade de cada vinho. A mineralidade do vinho existe realmente, só que não está relacionada com os solos e pode ser conduzida com esta maceração, seguida de fermentação em ambiente redutor, sempre a temperatura baixa. E agora no caso dos vinhos “Orange”, que são brancos feitos como tintos, é a maceração que lhes define o estilo e o carácter.

 

Edição nº12, Abril 2018

Lagar

O mais antigo recipiente reconhecido como equipamento de vinificação. Ao longo de milénios tem sido o berço dos vinhos da humanidade. TEXTO João Afonso O que é o Lagar? É um tanque, normalmente construído em pedra, com altura variável e uma saída de fundo, onde se esmagam frutos para separar as partes sólidas da parte […]

O mais antigo recipiente reconhecido como equipamento de vinificação. Ao longo de milénios tem sido o berço dos vinhos da humanidade.

TEXTO João Afonso

O que é o Lagar?

É um tanque, normalmente construído em pedra, com altura variável e uma saída de fundo, onde se esmagam frutos para separar as partes sólidas da parte líquida. Pode ter forma quadrangular, rectangular ou, mais raramente, circular. É habitualmente feito de granito, mas pode ser feito com qualquer outra rocha (mármore, xisto…) ou mesmo em madeira ou aço inox.

Origem

A sua origem remonta à antiguidade. Egípcios e romanos utilizavam o lagar para esmagar as suas uvas. As ânforas e dolias eram mais usadas para a fermentação.

Vantagens e Desvantagens

O lagar tradicional é utilizado fundamentalmente na vinificação de vinhos tintos, permanecendo ainda activo em algumas regiões portuguesas, sobretudo no Douro (para fazer Porto Vintage em particular), mas também no Dão, Bairrada e até no Alentejo. Permite uma maior maceração da uva e por consequência uma maior extracção de cor e compostos fenólicos. Tem a desvantagem da sua higienização (normalmente difícil e demorada) e o risco de produzir maior teor de acidez volátil, caso não sejam tomadas as devidas precauções. A escassez de mão-de-obra para a pisa é também uma potencial desvantagem e um problema a avolumar-se no futuro.

Tipos de Lagar

Hoje existem vários tipos de lagar. O lagar tradicional, feito em granito (ou outra pedra) e onde a uva é esmagada a pé; o lagar feito em cimento, com paredes altas, onde não se realiza pisa a pé e a manta é mergulhada com rodos de madeira (típico da Bairrada); o lagar tradicional de pedra mas com refrigeração por placas e macacos (pisadores) mecânicos para trabalhar o mosto; e o lagar moderno feito em aço inox com refrigeração e macacos mecânicos incorporados, para esmagar a uva e trabalhar o mosto.

A Opinião de David Guimaraens*

O lagar é um recipiente de fermentação em granito. Cubas de inox abertas não são lagar. O segredo do lagar não é ser uma superfície aberta, mas sim a sua própria construção em pedra (granito), que acaba por ter uma enorme influência no vinho feito. Um lagar em inox fará um vinho completamente diferente, seja pisado a pé ou não.
No lagar existe um equilíbrio perfeito entre a relação do mosto, massa, oxigénio e temperatura. Já se tentou replicar por outros métodos as capacidades de vinificação do lagar sem, contudo, se obter um verdadeiro sucesso. Num lagar de inox, com pisadores mecânicos, o vinho é mais aromático e aveludado, enquanto num lagar de granito com pisa a pé o vinho tem mais profundidade de nariz e boca. O lagar tradicional, sem ser objectivamente melhor, consegue sempre outra dimensão. Usamos um ou outro tipo de lagar, consoante o tipo de vinho que queremos fazer.

* Enólogo