Casa Américo: O “sonho americano” na Serra da Estrela

Américo Seabra nasceu em 1927 e emigrou para os Estados Unidos, em 1967. Consigo levou a mulher e os seus seis filhos, ainda crianças. A razão foi a mesma que levou tantos outros portugueses a deixar o país, em vagas sucessivas, ao longo da década de 60: buscar uma vida melhor para si e para […]
Américo Seabra nasceu em 1927 e emigrou para os Estados Unidos, em 1967. Consigo levou a mulher e os seus seis filhos, ainda crianças. A razão foi a mesma que levou tantos outros portugueses a deixar o país, em vagas sucessivas, ao longo da década de 60: buscar uma vida melhor para si e para os seus.
Anos e anos de trabalho duro permitiram à família criar um autêntico império comercial e de serviços, em diversas áreas, entre elas a restauração, a logística, os supermercados, com a cadeia Seabra Supermarket, e a distribuição de vinhos e bebidas, com a Aidil Wines, que muito tem feito pela implantação local dos vinhos portugueses.
Porém, o coração serrano de Américo Seabra ficou sempre em Vila Nova de Tazem, onde manteve uma pequena vinha cujas uvas vendia para a cooperativa local. Quando ele e a mulher regressaram às origens, em 2000, deixando os filhos à frente dos negócios americanos, resolveu produzir o seu próprio vinho. O que veio a acontecer na vindima de 2005, com o apoio dos filhos que construíram uma pequena adega em Tazem. O tinto resultante, segundo consta na família, não era nada de especial. “Mas deu uma alegria enorme ao meu pai”, revela Albano Seabra, que com seus irmãos António, Américo e José, resolveu, em 2009, ajudar o progenitor a dar outra dimensão ao seu sonho. Surgiu assim a Seacampo, empresa familiar sedeada em Vila Nova de Tazem e dedicada à produção e comercialização de vinhos do Dão.
Casa Américo tornou-se marca e assinatura da empresa que o pai Américo Seabra, falecido em 2011, ainda viu nascer e produzir os primeiros vinhos.
Ano após ano a Casa Américo foi crescendo e aumentando o seu património. O que começou com uma vinha de 5 hectares transformou-se em seis quintas mais algumas parcelas, num total de 150 hectares de vinha, onde se inclui já a Quinta da Garrida e a Quinta das Casticeiras, adquiridas em 2022 à Aliança/Bacalhôa. É uma área impressionante para a região e mais ainda se pensarmos que toda ela se insere na sub-região da Serra da Estrela, talvez a mais vincadamente diferenciadora de entre as sete sub-regiões do Dão. Já em 2017 tinha sido adquirida a Adega Cooperativa de São Paio. Com essa aquisição, foi possível preservar um pedaço da história vinícola da região, implicando embora um forte investimento na sua renovação e actualização. A adega pode vinificar milhão e meio de litros e armazenar dois milhões, algo que ultrapassa em muito a produção da Casa Américo, que está ainda assim em crescendo, passando dos 525 mil litros em 2021 para os 650 mil em 2022. Muitos antigos viticultores associados da adega de São Paio continuam a ali entregar as suas uvas. O património completa-se com um solar/palacete adquirido em 1999, situado no centro de Vila Nova de Tazem e rodeado por 1 hectare de vinha. Foi ali que a família desenhou de raiz o projecto Casa Américo.
Um empreendimento desta magnitude, ainda para mais com os seus proprietários a viver nos Estados Unidos da América, necessita de uma gestão profissional no seu dia a dia. “A dada altura percebemos que isto não podia ser somente uma paixão, era importante profissionalizar, criar dimensão, economias de escala. Só assim poderíamos corresponder ao propósito de trazer valor para Vila Nova de Tazem e honrar o nome do nosso pai”, refere Albano Seabra, dos quatro irmãos sócios aquele que está mais tempo em Portugal. Assim, uma equipa liderada pelo director geral David Lopes e composta pelo enólogo consultor Pedro Pereira (técnico com vasta experiência no Dão e, em particular, na sub-região da Serra da Estrela), pelo enólogo residente João Cantão e pelas irmãs Dora Caseiro (marketing) e Beatriz Caseiro (comercial) assegura o bom desempenho do projecto que tem como principais mercados de consumo Portugal, EUA, Brasil, Europa e Suíça, por esta ordem.
No coração da Serra
As vinhas da Casa Américo Wines estão distribuídas por 6 quintas e mais algumas propriedades dispersas entre Vila Nova de Tazem e S. Paio, Gouveia. A Quinta Nova é a maior, constituída por 68,5ha de vinha em produção. São distintas parcelas com diferentes idades e castas, rodeadas por pinhal, oliveiras e afloramentos graníticos. Para além das castas, brancas e tintas, mais comuns e tradicionais do Dão, existe também aqui uma parcela recentemente plantada com castas antigas e, algumas delas, quase desaparecidas da região, existentes apenas nas vinhas velhas. Variedades brancas como Alvadurão, Gouveio, Barcelo, Uva Cão, Terrantez e tintas como Baga, Alvarelhão, Camarate, Sousão, Bastardo e Rufete têm aqui uma nova oportunidade. “É também uma forma de preservar a nosso património vitivinícola para as gerações futuras”, diz a propósito David Lopes. Também em Tazem encontramos a segunda maior propriedade, a Quinta da Garrida. São 18ha de vinhas, algumas com mais de 50 anos, onde estão presentes diversas castas antigas. Aqui só existem variedades tintas, com destaque para a Tinta Roriz e Touriga Nacional. A Quinta do Aral situa-se perto de Gouveia, sendo a vinha de maior altitude (todas as vinhas da casa estão entre os 400 e 650 metros), de onde saem os brancos e tintos Casa Américo 625. No Aral encontramos 15ha de vinha (com parcelas, brancas e tintas, muito velhas, remontando aos anos 30 e também uma parcela plantada em 2017 com varas das vinhas velhas) e 4ha de pomar Bravo de Esmolfe. A Quinta do Paço, localizada igualmente nos arredores de Gouveia, tem um total de 27ha, dos quais 15ha de vinha, em bonitos patamares, de onde vem a marca Vinha de Púcaros. Um olival em modo de produção biológica, uma casa antiga recuperada e uma capela são outros destaques da propriedade.
Já a Quinta das Casticeiras, adquirida no ano passado, está situada em Moimenta da Serra, bem próxima da encosta da Estrela. Rodeada por muro de granito, tem 12ha de vinhedos, a 580 metros de altitude. Segundo o enólogo Pedro Pereira, é daqui que vem a melhor Touriga Nacional da empresa. Finalmente, a Quinta da Cerca. Tem apenas 1,5ha de vinha, cercada por um muito de granito, mas a sua importância é bem maior do que a dimensão. É que esta é a vinha mais antiga da Casa Américo, com mais de um século de idade, feita de cepas retorcidas com uma grande variedade de castas brancas e tintas. Aqui nasce o ex-libris da casa, o Vinhas Centenárias.
Mais de 75% das vinhas da empresa têm uma idade entre os 10 e os 50 anos e as castas tintas predominam largamente nos encepamentos, com 85%. A aquisição de propriedades vai ficar por aqui, a ideia agora será, sobretudo, aumentar a área de uvas brancas, provavelmente à custa da Tinta Roriz, casta que Pedro Pereira não aprecia particularmente. O que aprecia, isso sim, é a disponibilidade de diversas vinhas “maduras” e em altitude, com dias quentes que contrastam com as noites frescas e orvalho nas madrugadas, conduzindo a vinhos de forte personalidade e muita frescura. “O perfil de vinhos que ambicionamos são os que expressam a identidade da Serra da Estrela, terra natal do Sr. Américo Seabra”, diz o enólogo. “Daí todo o investimento na preservação do património vitivinícola da região e das castas autóctones.”
O portefólio começa a ser vasto (são seis linhas distintas de produto, cada qual com várias referências, sendo que Casa Américo é a marca mais sonante) mas isso não assusta David Lopes. “Temos opções para diferentes momentos de consumo, para diferentes tipos de consumidores e diferentes canais”, justifica. “Queremos ser uma referência entre os vinhos portugueses, como embaixadores da sub-região da Serra da Estrela, Dão.”
(Artigo publicado na edição de Agosto de 2023)
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Casa Américo Vinhas Centenárias
Tinto - 2018 -
Casa Américo 625
Tinto - 2019 -
Casa Américo
Tinto - 2016 -
Casa Américo
Tinto - 2018 -
Casa Américo
Tinto - 2016 -
Casa Américo
Tinto - 2018 -
Casa Américo
Rosé - 2021 -
Vinha de Púcaros
Branco - 2020 -
Casa Américo Branco Pelicular
Branco - 2021 -
Casa Américo 625
Branco - 2020 -
Casa Américo
Branco - 2021 -
Casa Américo
Branco - 2020
IVDP distinguiu empresas e pessoas no Port Wine Day 2023

No âmbito das celebrações do Port Wine Day 2023, assinalado a 10 de Setembro, o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP) voltou a distinguir empresas e pessoas cujos projectos se revelaram casos de sucesso nas áreas do enoturismo e da vitivinicultura. Este ano, os prémios foram atribuídos sob a égide “Douro + […]
No âmbito das celebrações do Port Wine Day 2023, assinalado a 10 de Setembro, o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP) voltou a distinguir empresas e pessoas cujos projectos se revelaram casos de sucesso nas áreas do enoturismo e da vitivinicultura.
Este ano, os prémios foram atribuídos sob a égide “Douro + Sustentável”, nas categorias Enologia, Viticultura, Enoturismo e Revelação: Jorge Lourenço, enólogo da empresa Vinilourenço, venceu na categoria Enologia; o projecto i-GRAPE, da Sogrape, foi distinguido em Viticultura; à Quinta de S. Luiz, da Sogevinus, foi entregue o prémio de Enoturismo; e na categoria Revelação, venceu a enóloga Rita Marques, produtora dos vinhos Conceito.

“A sustentabilidade é a chave para garantir que este tesouro perdure. As mudanças climáticas, a pressão sobre os recursos naturais e os desafios sócio-económicos são realidades que não podemos ignorar. Através destas distinções, queremos inspirar toda a comunidade do Douro a abraçar a sustentabilidade como um valor central em todas as nossas actividades. Queremos incentivar a inovação, o respeito pela natureza e o compromisso com as gerações futuras. O Douro merece continuar a ser um lugar mágico, onde a tradição se une à vanguarda, e onde os vinhos são verdadeiras obras de arte que reflectem o terroir único da nossa região. É esse trabalho, empenho e dedicação que hoje estamos aqui a homenagear”, referiu Gilberto Igrejas, presidente do IVDP, entidade impulsionadora do Port Wine Day.
Sogrape e chef Vasco Coelho Santos juntos em pop-up na estação do Pinhão

A Sogrape abriu o pop-up gastronómico Douro Bites na estação ferroviária do Pinhão, reforçando a parceria com o chef Vasco Coelho Santos. Situado no piso superior da estação, o Douro Bites “leva um pouco da gastronomia do restaurante Seixo para este local emblemático duriense, num conceito diferente, mais leve e descontraído”, explica a Sogrape, que […]
A Sogrape abriu o pop-up gastronómico Douro Bites na estação ferroviária do Pinhão, reforçando a parceria com o chef Vasco Coelho Santos.
Situado no piso superior da estação, o Douro Bites “leva um pouco da gastronomia do restaurante Seixo para este local emblemático duriense, num conceito diferente, mais leve e descontraído”, explica a Sogrape, que já tinha e mantém, neste edifício, uma loja de vinhos e provas harmonizadas com produtos da região.
A carta do Douro Bites começa por propor gaspacho de tomate coração de boi, e segue com sugestões de bolinhos de bacalhau, cabeça de xara ou sardinha de escabeche. As sanduíches hokaido, um tipo de pão da família do brioche, e as saladas de polvo e tomate também marcam presença.
Para sobremesa, em enquadramento com o Douro e a época de vindimas, há torta de chocolate e uvas. Na carta de vinhos, encontra-se uma selecção de vinhos do Douro e do Porto do grupo, com destaque para Casa Ferreirinha e Porto Ferreira, duas referências históricas no portefólio da Sogrape.
“O Douro Bites vem reforçar a presença da Sogrape no Douro com um conceito muito complementar à oferta que existe actualmente na região”, refere Joana Pais, responsável de Relações Públicas e Hospitalidade da Sogrape, acrescentando que este é “um espaço muito confortável, com uma carta leve e diversificada, num local fascinante pela sua história e beleza”.
O pop-up Douro Bites — localizado no Largo da Estação, 5085-037 Pinhão — está aberto todos os dias, das 10H30 às 18H30, até ao final de Outubro.
Quinta do Monte Travesso: Navegar com maré alta

À Quinta do Monte Travesso chega-se sem dificuldade. É provável que, quer no caminho, quer ao chegarmos à quinta, nos cruzemos com viajantes em autocaravanas. A razão é que Bernardo Nápoles facilita o estacionamento destes visitantes na propriedade, favorece o uso de instalações sanitárias e não esconde as vantagens que daí advêm quando nos lembra […]
À Quinta do Monte Travesso chega-se sem dificuldade. É provável que, quer no caminho, quer ao chegarmos à quinta, nos cruzemos com viajantes em autocaravanas. A razão é que Bernardo Nápoles facilita o estacionamento destes visitantes na propriedade, favorece o uso de instalações sanitárias e não esconde as vantagens que daí advêm quando nos lembra que “é gente diferente, muito interessada em vinho, em fazer provas e, o que nos interessa particularmente, em comprar vinho. Quando vão embora levam caixas na carrinha”. Chegam através de sites como o Park4night e o resultado tem sido muito animador, “é gente diferente das caravanas de praia”, recorda. À quinta acorrem turistas para provas, eventualmente para refeições ou para usarem as duas casas que estão disponíveis para receber visitantes. Tal como acontece cada vez com mais frequência no Douro, o enoturismo está a ter um peso muito importante na facturação, cerca de 40%, diz-nos Bernardo. É claro que uma das primeiras medidas práticas para poder receber visitas foi ter copos de qualidade e frigoríficos para manter os vinhos à temperatura certa. Das provas passou-se às refeições, abriu-se uma mini loja e às duas casas já em uso poderão juntar-se mais duas, por ora em plano.
De há muito tempo ligado à Symington Family Estates, como profissional de campo, Bernardo recorda que esteve vários anos como responsável da quinta do Vesúvio, depois Senhora da Ribeira. Como todos temos assistido, a Symington continua a adquirir propriedades de diferentes dimensões e isso “é um sufoco de trabalho”, disperso por muitas zonas distintas da região. E, como nos diz, rindo “há sempre mais um telefonema do Paul Symington que tem um pequeno problema na sua quinta e lá vou a correr”. O desejo de voltar ao mar está assim cada vez mais distante e mais ainda o sonho (louco, dizemos nós que não somos dados a navios…) de dar a volta ao mundo!
Pezinhos na terra
Sonhos à parte, é a quinta que herdou da família que lhe toma o pouco tempo disponível. Com referências que remontam a 1896, a quinta está na posse da família desde 1931. A casa solarenga foi considerada de interesse municipal e ostenta as armas da família, destacando-se, nesta história, a figura matriarcal de Judith de Barros Caupers de Sousa Nápoles, agora homenageada em marca de vinho.
O “novo” projecto arrancou em 1996 e tem sido construído aos poucos, sempre com fundos próprios, passo a passo. Como é tradição da região, o direito de benefício e as correspondentes uvas são vendidos, uma vez que aqui não se produz Porto “Temos 35 pipas de benefício que desde sempre entregávamos à Ferreira mas agora, com a adega da Granvinhos aqui ao lado, é para lá que vão as uvas”, diz Bernardo. O desejo de vir a fazer um vinho do Porto de marca própria existe mas a concretização é que não está para breve, já que continua a existir a obrigação da lei do terço e isso implica um grande empate de capital e muito vinho em stock. É um sonho para já adormecido. As boas uvas são usadas para fazer os DOC Douro da marca da quinta mas a rentabilidade é muito complicada porque, diz-nos, o Douro está a ter um problema de quebra significativa de produção por hectare e “mesmo com rega as produções tendem a baixar, não sabemos bem porquê, mas poderá ter a ver com a qualidade das plantas, dos enxertos prontos” E dos 60 hectares de vinhas que existiam no tempo do avô, Bernardo herdou os 12 que agora compõem a quinta, situada perto dos 500 m de altitude. Daqui saem anualmente de 35 a 50.000 garrafas, muito para exportação, sobretudo para o Brasil, o principal mercado. No mercado interno, com a excepção das lojas El Corte Inglès, o vinho encontra-se nas garrafeiras e restauração. A venda à porta é um negócio interessante e é para continuar.
Na vinha disponível vamos encontrar de tudo: uma parcela velha com 90 anos (1,5 ha) onde já se identificaram 14 castas brancas e 7 tintas, já objecto de uma tese de mestrado na UTAD; vinha em patamares, vinha ao alto e pilheiros (são vides colocadas nos buracos dos muros para aproveitar todo o espaço disponível). Para já nada é para alterar, a vinha velha é para continuar e as reestruturações estão feitas. Agora é preciso, isso sim, rentabilizar. Mesmo os modelos de vinho estão encontrados e o portefólio apenas virá a conhecer um novo rosé da cor aberta que agora se tornou o padrão e que poderá ser feito de Touriga Nacional. O rosé que já existe tem muita cor mas “os visitantes das caravanas assumem esse vinho com um tinto de Verão e tem funcionado bem”.
O grande salto em termos de profissionalismo das tarefas da quinta foi dado com a entrada de um jovem enólogo, Daniel Souto, um verdadeiro “apaga fogos” que está presente em todas a tarefas, da vinha à adega. A equipa fica completa com Pedro Francisco que é enólogo consultor e proprietário da vizinha Quinta da Padrela. Com a limitação da área da vinha, o crescimento apenas é possível com as entregas de pequenos lavradores da zona que há muitos anos fornecem uvas. Antigamente porque a quinta tinha produção insuficiente e hoje porque é uma alavanca para aumentar a produção da marca de entrada, Travesso.
Por aqui pratica-se a protecção integrada na viticultura e na adega são sempre usadas leveduras para inocular os mostos; depois são usadas barricas de várias tanoarias, sobretudo de 225 litros de capacidade. As novas tendências de enologia “no fio da navalha” não encontram aqui muita receptividade. Joga-se na segurança, algo que, estamos certos, vem também quer do trabalho na Symington quer nas quintas da Prats & Symington, recentemente acrescentadas de 10ha e que serão, diz-nos, objecto de reconversão total. A boa surpresa tem sido o comportamento da Touriga Nacional que “a esta altitude e, quem sabe, fruto das alterações climáticas, está a dar resultados excelentes”. As duas castas brancas de eleição (Gouveio e Viosinho) estão encontradas, não há que inventar.
A vindima ainda é uma festa, com um grupo que se tem mantido ano após ano e que não dispensa a festa final da “entrega do ramo”, momento de boa disposição sempre animado pelas quadras que a D. Salete (na quinta há 30 anos) faz para o evento. E se a vindima e o negócio correrem de feição, “há uma prenda especial no Natal”, diz Bernardo.

Um portefólio fechado
Das provas que fizemos na quinta percebemos que existe uma hierarquia muito segura dos vários tipos de vinhos e das gamas de preços. A altitude ajuda a uma acidez sempre muito evidente nos diferentes vinhos. O branco de 2022 é apenas feito em inox e sem maloláctica para preservar a acidez. Os brancos são vinificados por casta e por parcela e só no final se faz o lote, o que permite ter um melhor retrato das parcelas da quinta e do comportamento das castas. O Vinhas Velhas branco é fermentado em barricas usadas e vai agora na 5ª edição.
Nos tintos destaca-se o Reserva, um vinho sempre com edição anual e do qual se produzem cerca de 3000 garrafas e também Magnum, muito fruto do pedido de alguns restaurantes. Os topos de gama da casa são o Capela e Judith. No caso do Capela juntam-se a Touriga Francesa da vinha velha junto à capela e a Touriga Nacional mais antiga que existe na quinta, agora com 30 anos. Teve a primeira edição em 2021 e fizeram-se 1300 garrafas. O tinto Judith é um varietal de Touriga Nacional, criado pela primeira vez na vindima de 2015.
Crescer, mas com passos seguros, é o lema. Com o pai a ajudar e a aprovar as iniciativas de Bernardo, e a D. Salete a criar pratos gulosos para servir aos visitantes, algo que, com prazer, pudemos constatar, a Quinta do Monte Travesso está aí para continuar a revelar o que nesta zona do Douro é possível fazer de bom. Não é um navegar à vista, é um jogo de orientação entre o saber e a força, por vezes telúrica, dos elementos. Neste caso algo parecido com o que se passa em alto-mar.
(Artigo publicado na Edição de Agosto de 2023)
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Quinta do Monte Travesso Vinhas Velhas
Branco - 2021 -
Quinta do Monte Travesso Judith
Tinto - 2020 -
Quinta do Monte Travesso Capela
Tinto - 2021 -
Quinta do Monte Travesso
Tinto - 2020 -
Quinta do Monte Travesso
Tinto - 2021 -
Travesso
Tinto - 2022 -
Quinta do Monte Travesso
Branco - 2022 -
Quinta do Monte Travesso
Branco - 2021 -
Quinta do Monte Travesso
Branco - 2022
Editorial: A outra Bairrada

Editorial da edição nrº 77 (Setembro 2023) Manuel F. Silva (Casa de Saima) 1981, Luis Pato Vinhas Velhas 1990, Quinta das Bágeiras Garrafeira 2001, Kompassus Reserva 2013. O que têm em comum estes quatro vinhos que, em conjunto, atravessam quatro décadas? Diversas coisas: são brancos, nasceram na Bairrada e mostram, à data de hoje, qualidade, […]
Editorial da edição nrº 77 (Setembro 2023)
Manuel F. Silva (Casa de Saima) 1981, Luis Pato Vinhas Velhas 1990, Quinta das Bágeiras Garrafeira 2001, Kompassus Reserva 2013. O que têm em comum estes quatro vinhos que, em conjunto, atravessam quatro décadas? Diversas coisas: são brancos, nasceram na Bairrada e mostram, à data de hoje, qualidade, complexidade, carácter e longevidade notáveis. Não menos significativo, pelo menos para mim, existem cá em casa algumas garrafas de cada um deles, abertas com parcimónia quando a ocasião e a companhia o justificam.
Aquele que pode, muito justamente, ser considerado o pai da Bairrada moderna, Luís Pato, sabe-a toda. Desde há muito que tem a opinião formada a este respeito e emite-a com frequência, originando reacções de surpresa ou escândalo, consoante as almas mais ou menos sensíveis: “A Bairrada é, acima de tudo, região de vinhos brancos. Tintos e espumantes apenas complementam a oferta”.
A prova de vinhos brancos da Bairrada publicada nesta edição da Grandes Escolhas parece dar-lhe razão. São 25 vinhos (e poderiam estar aqui mais alguns) oriundos de distintos produtores e terroirs da região, nenhum classificado abaixo de 17 e sete deles alcançando 18 ou mais pontos. Tenho muitas dúvidas que igual número de espumantes ou tintos Bairrada atingisse esta impressionante consistência qualitativa.
Razões para isso, existem várias. O clima, desde logo. Escrevo estas linhas em Sangalhos, às 10:30 de um dia de Agosto. O sol ainda não apareceu e estão 22ºC. Ontem estive no Baixo Alentejo. À mesma hora, debaixo de um sol radioso, estavam 39ºC. O Atlântico dita aqui a sua lei. Depois, os solos. Tradicionalmente, os melhores (e mais raros) terrenos da Bairrada, de argila com maior ou menor presença de calcário, eram reservados para casta Baga, pois só ali seria expectável alcançar grandes tintos. Com algumas excepções, as castas brancas eram assim “empurradas” para os solos arenosos, e destinadas, sobretudo, ao espumante. Na última década, porém, muita coisa mudou. Por um lado, a crescente valorização dos brancos tranquilos, levou vários produtores a plantar castas brancas em solos de maior potencial. Por outro, a ascensão do “blanc de noirs” Baga-Bairrada desviou a Baga menos boa do tinto para o espumante, libertando mais e melhores uvas para vinhos brancos.
A tudo isto, acrescentemos as castas brancas da Bairrada. Em que outro local de Portugal é possível encontrar mostos de Maria Gomes (Fernão Pires) com 13,5% de álcool e 8 gramas/litro de acidez total? Da primeira vez que me anunciaram estes resultados não acreditei e pedi para ver o boletim de análise. Agora, já estou acostumado. Se a Maria Gomes dá estrutura e intensidade, a Bical confere elegância e finura, a Cercial (não confundir com Cerceal-Branco do Dão nem com Sercial/Esgana Cão da Madeira/Bucelas) oferece frescura e tensão. E ainda há a ubíqua Arinto, que sempre considerei (na Bairrada, atenção!), inferior às outras três, mas que, progressivamente, me tem vindo a convencer.
A consistência demonstrada pelos 25 produtores cujos vinhos entraram nesta prova não deve ser confundida com uniformidade. E esse é o ás de trunfo da Bairrada: à diversidade de castas, solos e microclimas, junta-se uma profusão de conceitos e práticas de vinificação que fazem com que os vinhos sejam muito distintos entre si, sem nunca perderem os traços que os remetem para a sua origem – complexidade, carácter, frescura, longevidade – e os destacam entre os melhores brancos de Portugal.
Grande Prova: Um mundo cor de rosa

O rosé está claramente na moda. Comunica pela imagem, incluíndo a garrafa e a cor, mais do que qualquer outro tipo de vinho. A França, sobretudo a região de Provence, está na vanguarda e serve de inspiração aos outros. Basta ir ao stand da Provence na Prowein para ver as mais lindas garrafas com vinhos […]
O rosé está claramente na moda. Comunica pela imagem, incluíndo a garrafa e a cor, mais do que qualquer outro tipo de vinho. A França, sobretudo a região de Provence, está na vanguarda e serve de inspiração aos outros. Basta ir ao stand da Provence na Prowein para ver as mais lindas garrafas com vinhos de cores apelativamente suaves. É claramente um produto de design para ser atraente na prateleira, na mão e no copo. E sim, rosé é o vinho mais instagramável que existe.
Mas o design não é tudo. Há cada vez maior procura pelos vinhos mais leves, mais frescos e menos alcoólicos, onde o rosé se enquadra perfeitamente. É mais do que uma moda, é uma mudança estrutural de consumo. Não é por acaso que o concurso de vinhos Concours Mondial de Bruxelles desde 2021 realiza uma edição de rosés em separado para dar mais ênfase a este tipo de vinho.
Tendências globais ou rosé mania
A França lidera o movimento rosa no mundo, sendo número 1 em produção, consumo e exportação em valor (em volume a Espanha exporta mais). Em conjunto, a França, Espanha e Estados Unidos são responsáveis pelo 66% da produção mundial de rosé.
Em França, a produção de rosés cresceu substancialmente graças a várias regiões que apostaram neste tipo de vinho ao longo da última década. Fora de França, surgiram “novos” países produtores de vinho rosé com um crescimento de mais de 50% no espaço de 10 anos, com, no mínimo, 50.000 hectolitros produzido anualmente. São os casos do Chile, Nova Zelândia, Hungria, Romênia e Bulgária.
Aproximadamente 1 em cada 10 garrafas de vinho consumidas no mundo é de rosé. E em França, este número é de 1 em 3 garrafas, pois neste país consome-se 33% da produção total do rosé. Seguem-se a Alemanha com 12% e os Estados Unidos com 11%.
Em Portugal a categoria também está a crescer, embora nem sempre seja fácil encontrar informação estatística, por ser o rosado quase sempre enquadrado nos dados do vinho tinto. Entretanto, no último Anuário do IVV foi registada a variação da produção do vinho rosado desde 2011 até 2021, assentando o rosado com uma quota de 6% da produção nacional. Na campanha de 2020/2021 o rosé correspondeu a 6,6% de produção total dos vinhos nacionais em termos de cor (sendo 59,6% de tinto e 33,8% de branco).
Mas quase não é preciso olhar para as estatísticas, basta ver as prateleiras para perceber que o rosé está claramente na mente do consumidor actual. Há 20 ou até 10 anos não havia tanta variedade de rosés como hoje. O mesmo se pode dizer também da qualidade.
Há cada vez maior procura pelos vinhos mais leves, mais frescos e menos alcoólicos, onde o rosé se enquadra perfeitamente
Como é feito um rosé
A cor e os aromas estão nas películas, onde se encontram as antocianas responsáveis pela cor e os precursores aromáticos. Como a maioria das castas tintas não tem antocianas na polpa (com excepção das variedades tintureiras), o sumo sai quase transparente. A duração do contacto com as películas tem influência directa na intensidade da cor e do aroma do vinho.
O OIV (organização que rege a produção mundial de vinho, com 45 países filiados) distingue três principais métodos de fazer um rosé.
Prensagem directa ou uma maceração curta (normalmente na própria prensa) inferior a 2 horas – com o mínimo possível contacto com as películas. As uvas podem ser desengaçadas ou não, isto depende das castas. O desengace promove melhor passagem das antocianas para o sumo, enquanto a prensagem de cachos inteiros facilita a drenagem. A prensagem tem de ser delicada para dar tempo e obter o nível pretendido de antocianas sem extrair taninos e aromas verdes. Produtor e enólogo da Quanta Terra (em parceria com Celso Pereira), Jorge Alves, refere que de 4 tn só conseguem 1.200 litros. Na última prensagem obtém-se mais 300-400 litros com mais cor. Esta fracção mantém-se à parte, para lotear com o resto e obter a cor que se pretende – clarinha e bonita. Basicamente, é a vinificação das castas tintas como se fossem brancas, onde a fermentação ocorre sem películas. Desta forma obtêm-se os rosés mais pálidos e delicados aromaticamente, com uma maior acidez.
Maceração pelicular superior a 2 horas e depois o sumo é separado, em lágrima (escorrendo naturalmente da prensa) ou prensagem. O tempo de maceração varia com cada casta. Se for uma casta com pouca intensidade corante como a Pinot Noir ou Tinto Cão, pode justificar-se uma maceração mais longa.
Sangria é uma separação parcial do sumo das uvas em maceração. Este método era mais utilizado antigamente, nem tanto para fazer um rosé, mais para concentrar um tinto. No depósito de fermentação, depois de se retirar 5-15% de sumo, ficavam mais películas para menor volume de líquido. Um rosé obtido por este método tem mais cor, mais tanino, aromas de fruta madura e menor acidez (devido à liberação de potássio da película para o mosto durante a maceração que se liga ao ácido tartárico e aumenta o pH). Estas uvas são também colhidas mais maduras, a pensar em vinho tinto. Este método é menos adoptado para os rosés mais ambiciosos e não é utilizado em Provence, por exemplo.
Existe ainda outro método de fazer rosés, praticado em alguns países, sobretudo de Novo Mundo, quando se mistura o vinho branco com vinho tinto, prática genericamente proibida na União Europeia (mas autorizada para os rosés de Champagne). A fermentação maloláctica é quase sempre evitada para preservar a frescura e evitar os aromas lácticos que esta pode conferir ao vinho.
Quando passámos de um rosé corrente para um rosé premium, constatamos que não é raro ocorrer fermentação e estágio, total ou parcial, em barricas, normalmente usadas (casos das marcas Phenomena, Giz, Redoma, Quinta do Monte d’Oiro, Olho de Mocho Single Vineyard, Ravasqueira, Herdade das Servas e muitos outros), mas também novas, como é o caso da Casa da Passarella o Fugitivo Rosado.
Enologia ou terroir?
Embora um rosé possa ser visto mais como um produto de enologia do que uma expressão de uma região, eu não faria uma distinção tão peremptória. Por um lado, é verdade que as uvas vindimadas mais cedo conseguem fugir um pouco às adversidades do ano e da zona onde ficam, e muitas vezes ainda não têm desenvolvido todos os precursores aromáticos varietais. Por outro lado, a abordagem correcta na adega não será possível sem um bom conhecimento de castas utilizadas e o local onde estão plantadas. Precisamente por isto, os rosés não são todos iguais.
Um bom exemplo é o novo rosé da Casa da Passarella, o Fugitivo Rosado. Paulo Nunes, o talentoso enólogo desta casa, já há algum tempo andava a pensar num rosé de topo, tendo como inspiração um rótulo antigo de 1937 do “vinho rosado”. Nesta altura, o vinho era elaborado com a ajuda de um enólogo francês Eugène Hellis (que também esteve, segundo me contam, envolvido nos primeiros anos do Mateus Rosé). Não se sabe como eram aqueles rosés, não sobrou nenhuma garrafa, mas de certeza que o rosé de hoje é bem diferente. Provém de uma parcela com várias castas, que foi plantada naquela época. É a mais sombria de todas, onde a partir das 15-16 horas não há sol, por causa da floresta circundante. A vindima é tardia, só no início de Outubro. Prensagem de cacho inteiro com engaço e fermentação espontânea em barricas novas de 500 litros, longa, que dura quase até Dezembro, sem bâtonnage. Combina-se neste caso um profundo conhecimento das parcelas existentes e pleno domínio técnico na adega para conseguir um resultado extraordinário.
Com excepção das castas tintureiras, aquelas com a polpa corada, todas as castas podem ser adaptadas para produção do rosé.
As melhores castas
Com excepção das castas tintureiras, aquelas com a polpa corada, todas as castas podem ser adaptadas para produção do rosé. É preciso saber trabalhá-las de acordo com as características varietais e estilo pretendido.
Na região de Provence, para produção de rosés são tipicamente utilizadas Cinsault, Grenache, Mourvèdre, Syrah, em algumas denominações também Cabernet Sauvignon e Carignan e ainda algumas castas brancas, incluindo Clairette, Sémillon, Ugni Blanc e Rolle (Vermentino) que acrescentam frescura e aromas.
No Sul do Ródano, na DO Tavel, exclusiva para rosés, também para além das castas tintas (Cinsault, Grenache, Mourvèdre, Piquepoul Noir, Syrah) podem ser utilizadas variedades brancas (Bourboulenc, Clairette, Grenache Blanc Clairette Rose e Piquepoul Blanc) ou chamadas “cinzentas”, aquelas com uma ligeira coloração da película (Grenache Gris e Piquepoul Gris). Em Espanha é muito utilizada a casta Tempranillo e Garnacha e na Itália Sangiovese, para além de outras castas.
A Pinot Noir, de película fina e pouca intensidade corante, é uma boa opção para os rosés. Não é de estranhar uma aposta séria nesta casta para os rosés de ambição. Três belíssimos exemplos – Phenomena da Quanta Terra no Douro, Vicentino na costa alentejana e AdegaMãe na região de Lisboa. No Quinta do Poço do Lobo, da Caves São João, a Pinot Noir entra em partes iguais com Baga. Jorge Alves refere que Pinot Noir é uma boa exploradora do terroir. Fenolicamente e aromaticamente amadurece bem, traz profundidade aromática e transparência da altitude. Consegue transferir o terroir e a barrica.
A Tinta Roriz também é uma boa opção para rosés. Usam-na na Taboadella no Dão. Jorge Alves explica que é uma casta redutora, tem algum tanino e não oxida facilmente. É muito sensível no momento de vindima com a janela de oportunidade muito curta. Desidrata, absorve potássio e perde acidez, o pH sobe. Tem de se vindimar com pH 3,3 no máximo, pois com 3,7 já não vai dar. Uma parte estagia em barrica para compensar a parte que estagia num ambiente mais redutor de cimento. A Tinta Roriz é também utilizada no caso da M.O.B. no Dão ou Carlos Reynolds no Alentejo.
Em Portugal não temos nenhuma DO destinada somente à produção de rosés, que são feitos ao longo do país, desde o Minho até ao Algarve, e as castas adotadas são muitas vezes as típicas de cada região. Por exemplo, na região dos Vinhos Verdes são utilizadas castas com pouca cor Espadeiro e Padeiro, e no Algarve Negra Mole e na Madeira Tinta Negra (das duas últimas temos nesta prova os exemplos interessantes). A Baga na Bairrada é uma grande protagonista nos rosés. Com a maturação lenta e tardia, aguenta mais tempo sem criar grandes alterações a nível organolêptico e permite acertar no momento da vindima. Luís Gomes, do projecto Giz, considera que as vinhas velhas da Baga oferecem robustez e segurança na produção de rosés. Vindima normalmente de 8 a 15 de Setembro.
A Quinta do Vallado e a Sogevinus (São Luiz Winemakers Collection) fazem um belíssimo rosé da casta Tinto Cão que preserva bem a acidez e naturalmente não passa muita cor.
A versátil Touriga Nacional veste-se bem em tons de rosé com notas citrinas e florais. Temos óptimos exemplos da Ravasqueira (Heritage) e Chocapalha. A Touriga Franca é raro ver num rosé a solo, mas nesta prova temos o Qualt da Quinta Alta no Douro. Mais uma casta com pouca cor – Alvarelhão – pode ser provada na versão rosé Quase Tinto da Quinta dos Avidagos. Outro exemplo varietal – Tinta Caiada no Monte do Álamo, Alentejo.
O resultado muito interessante demonstra a casta levemente corada Moscatel Roxo, utilizada pelas grandes empresas da Península de Setúbal – José Maria da Fonseca e Bacalhôa – e também pela Aveleda no projecto Vila Alvor no Algarve, produzindo rosés extremamente aromáticos e com uma cor naturalmente muito leve.
A Syrah brilha no Monte D’Oiro de uma parcela da vinha mais antiga (antes de 1998) e na Herdade do Sobroso. A casta Sangiovese mostra o seu carácter no Monte das Bagas e na Herdade das Servas – em dois perfis bem diferentes – um mais guloso e outro marcadamente acídulo e crocante.
Também temos alguns exemplos bem sucedidos de uso das castas brancas na produção de rosés. A Quinta das Cerejeiras, na região de Lisboa, ao Castelão (que amadurece relativamente cedo) acrescentou 15% de Moscatel Graúdo (com maturação tardia), que acabam por ser vindimadas na mesma altura, na segunda semana de Setembro e fermentam em conjunto. As castas completam-se, a Castelão conribui com textura e aromas de fruta vermelha, enquanto Moscatel oferece acidez, frescura e aromas exóticos. Outro exemplo de parceria feliz entre a casta tinta e branca é o QM rosé feito de Vinhão e Alvarinho.
Nenhum vinho comunica tanto pela cor como o rosé: a cor mais ligeira indica delicadeza e elegância; e a cor mais intensa promete intensidade e estrutura.
A cor importa?
Nenhum outro vinho comunica tanto pela cor como um rosé: a cor mais ligeira indica um vinho mais delicado e a cor mais intensa promete um vinho com maior intensidade de sabor e mais estrutura.
Os franceses até se debruçaram para definir a paleta de cores de rosés que podem variar de pêssego, melão, lichia, manga, pomelo, framboesa, damasco, tangerina e groselha.
Jorge Alves confirmou que a cor é extremamente importante para um rosé e que eles tomam muitos cuidados a este respeito para garantir que um produto final fique apelativo na prateleira. E é preciso ter em atenção que durante todos os processos de vinificação e estágio a cor vai-se perdendo. Já Luís Gomes não liga nada à cor que pode num ano ser mais intensa do que noutro – é mesmo assim!
Um rosé pode ser caro?
Pode, como outro vinho qualquer. Pode custar tanto, quanto o consumidor estiver disposto a pagar por ele em função da espectativa, qualidade e raridade do mesmo.
Antigamente achava-se que o rosé é um vinho barato. Lembram-se quando o rosé fazia parte da triologia de entrada de gama – um branco, um tinto e um rosé, deixando os gamas médias e de topo para tintos e brancos? Agora há muitos rosés portugueses de topo, que rondam os 25-30 euros e uns poucos ultrapassam os 50 euros.
Em França, durante alguns anos o rosé mais admirado e caro foi Garrus do Château d’Esclans, Provence, cujo preço hoje ultrapassa os 100 euros – é um blend de Grenache com Rolle das vinhas centenárias. Em 2020, Languedoc disputou a primazia da Provence quando Gérard Bertrand lançou o “Clos du Temple” feito de Grenache, Cinsault, Syrah, Mourvèdre e algum Viognier com o PVP de 190 euros.
Qual é a melhor altura para apreciar um rosé?
Quando apetecer. No verão talvez apeteça mais vezes, mas não vejo porque o rosé não possa ser consumido noutras alturas do ano, num momento apropriado. Quem come burrata, céviche de salmão, sushi e saladas apenas no verão? São harmonizações perfeitas para um rosé. Pode ser consumido tanto à mesa, como num bar, a solo, ao pé de uma piscina. Um encontro de amigos depois de trabalho numa sexta-feira à noite ou um jantar romântico também são momentos certos. Alguns rosés têm presença e intensidade suficientes para aguentar um prato com alguma estrutura: um bife de atum na grelha acompanhado de legumes parece uma óptima opção. Carnes brancas, até com molhos para compensar a acidez do vinho, ou caril de frango ou de camarão são outras sugestões a considerar.
Resumindo, um rosé de sucesso é um produto completo de vinha, de enologia competente, de imagem aliciante e de marketing inteligente.
(Artigo publicado na edição de Agosto de 2023)
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Paço dos Infantes
Rosé - 2022 -
Terras do Grifo
Rosé - 2022 -
Opta
Rosé - 2022 -
Adega de Borba Premium
Rosé - 2022 -
Santa Vitória Seleção
Rosé - 2022 -
Quinta da Giesta
Rosé - 2022 -
Herdade de São Miguel
Rosé - 2022 -
Herdade das Servas
Rosé - 2022 -
Conde Vimioso Sommelier Edition
Rosé - 2022 -
Villa Lisa
Rosé - 2022 -
Villa Alvor Singular
Rosé - 2022 -
Vicentino Naked
Rosé - 2022 -
Taboadella Caementa
Rosé - 2022 -
Rosé dos Villões
Rosé - 2022 -
Ribafreixo Cashmere
Rosé - 2022 -
Quinta do Paral
Rosé - 2022 -
Monte das Bagas de Ouro
Rosé - 2022 -
M.O.B. Lote 3
Rosé - 2022 -
Herdade Barranco do Vale
Rosé - 2022 -
Covela
Rosé - 2022 -
Convento do Paraíso
Rosé - 2022 -
Carlos Reynolds
Rosé - 2022 -
AdegaMãe
Rosé - 2022 -
Vinha da Rosa
Rosé - 2022 -
Valle Pradinhos
Rosé - 2022 -
Síbio
Rosé - 2022 -
Rosé Vulcânico
Rosé - 2022 -
Quinta do Poço do Lobo
Rosé - 2022 -
Quinta das Cerejeiras
Rosé - 2022 -
Quase Tinto
Rosé - 2022 -
Qalt
Rosé - 2022 -
QM
Rosé - 2022 -
Pousio Selection
Rosé - 2022 -
Monte do Álamo
Rosé - 2022 -
Monte da Peceguina
Rosé - 2022 -
Maçanita Touriga Nacional em Rosé
Rosé - 2022 -
Herdade da Rocha Private Collection
Rosé - 2022 -
Encostas do Sobral
Rosé - 2022 -
DSF
Rosé - 2022 -
Chocapalha
Rosé - 2022 -
Bacalhôa Vinha dos Frades
Rosé - 2022
Symington com boas perspectivas para a vindima

Após uma sucessão de anos desafiantes no Douro, com vagas de calor prolongadas e baixas produções, a Symington Family Estates encontra-se bem posicionada para uma das vindimas com maior qualidade dos últimos tempos de acordo com o comunicado feito hoje à imprensa. De acordo com a Symington Enquanto uma grande parte do sul da Europa […]
Após uma sucessão de anos desafiantes no Douro, com vagas de calor prolongadas e baixas produções, a Symington Family Estates encontra-se bem posicionada para uma das vindimas com maior qualidade dos últimos tempos de acordo com o comunicado feito hoje à imprensa.
De acordo com a Symington Enquanto uma grande parte do sul da Europa sofreu neste verão ondas de calor intensas, Portugal foi, de um modo geral, poupado. As temperaturas registadas em Julho estiveram próximas do normal e, aliás, no Douro até um pouco abaixo da média. A região, bem como uma grande parte do país, beneficiou do anticiclone dos Açores que gerou ventos fortes do quadrante norte (a ‘Nortada’) ao longo do litoral, trazendo massas de ar mais frescas e condições de maior humidade. As temperaturas moderadas, aliadas a índices razoáveis de humidade nos solos – assegurados pelas chuvas do final da primavera –, proporcionaram bons níveis de acidez, maturações equilibradas e boa evolução fenólica.
A Symington iniciou a vindima no Douro com uvas brancas (Viosinho) no dia 21 de Agosto nas vinhas em cotas mais elevadas no Cima Corgo. No final do mês, começaram a vindimar
gradualmente uvas tintas (Sousão, Tinta Roriz e alguma Touriga Nacional) em parcelas selecionadas em algumas propriedades no Douro Superior (vale da Vilariça).
A época das vindimas já arrancou nas principais quintas da família Symington, que destaca a maturação final dos bagos possibilitada pelas chuvas de 2 e 3 de Setembro e as temperaturas máximas abaixo dos 30 graus, que se deverão manter ao longo das próximas semanas de Setembro.
Herdade da Cardeira: Um blend de sucesso

Parece que já ouvimos esta história um milhão de vezes. Em Portugal, gostamos disso. Talvez até demais. Chega alguém de fora, um estrangeiro, apaixona-se por Portugal, a nossa terra, os nossos costumes, o nosso chão, os nossos produtos, o nosso vinho. Apaixona-se por nós. E nós, velhos tugas, agradecemos a atenção, recebemos como só nós […]
Parece que já ouvimos esta história um milhão de vezes. Em Portugal, gostamos disso. Talvez até demais. Chega alguém de fora, um estrangeiro, apaixona-se por Portugal, a nossa terra, os nossos costumes, o nosso chão, os nossos produtos, o nosso vinho. Apaixona-se por nós. E nós, velhos tugas, agradecemos a atenção, recebemos como só nós sabemos, abraçamos os estrangeiros e de repente já não são estrangeiros. E eles sabem, apreciam a nossa hospitalidade e tornam-se verdadeiramente um de nós. Todos ganhamos, todos somos mais felizes de sermos um país assim definido. Definido pela confiança, hospitalidade, versatilidade, pelo quente abraço. Portugal é um abraço.
Foi esse abraço que Erika e Thomas Meier sentiram em 2010, quando um telefonema os trouxe da Suíça. Nunca tinham estado em Portugal, nunca tinham feito vinho, nada disso, ou seja, tudo boas razões para comprar uma adega. Visitaram a Herdade da Cardeira, ao pé de Orada, Borba, apaixonaram-se, e a sua vida mudou. Thomas trabalhava na Ásia, por isso Erika teve de liderar o projecto, mas ambos tinham ideias claras sobre o que queriam fazer: a junção de duas culturas, a Suíça, sob o mote “unidade sim, uniformidade não” e a portuguesa, baseada no orgulho dos seus valores tradicionais e no terroir da Orada. Na Herdade da Cardeira, Erika encontrou Filipe Ladeiras, enólogo. Ambos são músicos, ele fadista, ela pianista, e isso ajudou a encontrarem logo uma harmonia. Mas nunca fizeram música juntos, fiz logo o desafio, vamos ver se acontece. Fado e piano, um clássico sempre elegante.
A herdade tem 100 hectares no total, dos quais 21 são de vinha. As vinhas mais velhas são de 2003-4, e os Meier plantaram mais em 2015. A adega data de 2010, era nova quando compraram a propriedade, vieram estreá-la. Produzem ainda gado em modo biológico, em parceria com uns vizinhos e amigos. Em 2010 todas as uvas iam para a cooperativa, e ainda hoje têm algum excesso de uvas, o que lhes permite manter os padrões de qualidade que desejam nos vinhos da casa. Na produção agrícola, a sustentabilidade é cada vez mais uma preocupação, por exemplo, há mais de 8 anos que não usam herbicidas.
Os encepamentos são tradicionais alentejanos, temperados com algumas castas “novas”. De brancas têm Antão Vaz, Arinto e Verdelho, as tintas são Touriga Nacional, Touriga Franca, Aragonez, Tinta Caiada, Petit Verdot e Cabernet Sauvignon. Todos os anos fazem uma severa monda de cachos, o que torna as uvas bastante caras, exigindo um posicionamento cuidado dos vinhos. O conceituado enólogo Paulo Laureano, o bigodão mais famoso do vinho português, juntou-se à equipa Cardeira a partir de 2018, porque “acreditou no projecto, nos seus objectivos bem definidos, e na paixão dos proprietários.” A produção anual varia entre 60 e 70 mil garrafas, entre brancos (20%) e tintos (80%), sendo que 85% é exportada para a Suíça. Por uma questão de diversificação e também para aumentar o reconhecimento da marca, a aposta será agora em aumentar as vendas no mercado nacional. A quantidade total vai, no entanto, manter-se, por isso vai ser preciso aumentar o valor dos vinhos.
A marca segmenta-se em Cardeira e Cardeira Reserva, com dois tintos e dois brancos logo desde o princípio. Para além destes, e por curiosidade e vontade de experimentação da equipa de enologia, há outros vinhos, como os monocastas, o vinho de talha ou o espumante. Para além do monocasta de Verdelho, os varietais tintos seguem o seguinte princípio: como as castas são vindimadas, fermentadas e estagiadas separadamente, todos os anos são separadas as três melhores barricas da melhor casta e engarrafam-se pouco mais de 700 garrafas. Em 2018 foi o Touriga Nacional, em 2019 Alicante Bouschet, em 2020 Touriga Franca, e em 2021, como foi impossível decidir fizeram-se dois: Alicante Bouschet e Touriga Franca. Em 2022 será Touriga Nacional. Há ainda o Renée’s Rosé, assim chamado porque foi uma ideia da filha Renée do casal, é o único vinho proveniente de um lote que vem já da vinha: Aragonez, Touriga Nacional e Tinta Caiada. Há uma importante aposta em engarrafamentos em magnuns, que tem funcionado cada vez melhor. Com várias colheitas disponíveis, os clientes procuram já colheitas específicas.
Baixa produção, elevada qualidade
As uvas são recebidas e refrigeradas numa câmara, e depois há muita atenção nas macerações para que cada vinho chegue ao estilo desejado. A ênfase é nas castas e nos talhões de onde elas provêm. Apesar de não haver uma pré-definição, o Alicante Bouschet e a Touriga Nacional começam a emergir como as grandes origens dos melhores vinhos, e assim vão para os balseiros de carvalho de 3500 litros. As remontagens são feitas à mão, e a pisa é feita com macacos, ao estilo da Borgonha.
Para os vinhos de talha são usadas talhas antigas, da zona de Portalegre. São apenas 1500 garrafas de tinto, e 300 de branco. Nas talhas apenas entram castas portugueses: Touriga Nacional, Tinta Caiada, Alicante Bouschet, Aragonez, Touriga Franca. No branco um lote de Arinto e Antão Vaz que vêm da vinha.
Nos outros vinhos, excepto o rosé, as castas são colhidas e fermentadas separadamente. Os tintos estagiam ano e meio em garrafa, o reserva dois anos e meio. Só o tinto da talha não vai à barrica, os outros todos vão, são barricas de 300 litros de carvalho francês, com um máximo de 7 anos de uso. O percurso dos vinhos é peculiar: sempre separados, fazem a maloláctica, e com a percepção do que cada vinho oferece vão para a barrica, seis meses para os DOC, 12 meses para o reserva. Feito o blend, voltam para a barrica para terminar o estágio.
Usualmente, a produção por hectare é de 4 a 5 toneladas para os tintos, e 6 para os brancos. Para isso é preciso fazer a monda de cachos, porque apenas controlando a produção na altura da poda, o rendimento seria de 8 a 9 toneladas. Os solos são variados, com argilas vermelhas e calcários, havendo zonas com bastante xisto. Este ano, o granizo de Junho destruiu 30% da produção na Cardeira. Para salvar as vinhas e ajudar à cicatrização das feridas, foi preciso intervir logo no dia seguinte com aplicação de cálcio, aminoácidos e alguns azotos.
A zona da Orada sempre foi considerada especial na região de Borba (recordemos que Borba chegou a ser uma DOC, antes da reestruturação das denominações do Alentejo). Orada fica na parte Norte de Borba, entre a Serra de Ossa e a Serra de Portalegre e tem um microclima específico, com nevoeiros, e noites mais frescas. A zona da Cardeira é especialmente ventosa. Há assim uma grande amplitude térmica diária, fundamental para uma maturação equilibrada, que preserva os ácidos das uvas.
Ao contrário de Estremoz, igualmente incluída na denominação Alentejo-Borba, o prestígio de Orada é ainda só local, com qualidade reconhecida junto dos viticultores e produtores da região. Mas talvez possa agora seguir pelo mesmo caminho de Estremoz, gerando massa crítica para ganhar notoriedade como polo de excelência vínica. Filipe Ladeiras explicou que Orada contribui com 2300ha de vinhas só para a adega cooperativa. Segundo Filipe, durante muito tempo, no concelho de Borba, por questões de ordenamento do território, não se podiam construir edifícios acima de certa dimensão. Algumas adegas foram assim “empurradas” para concelhos vizinhos, como Estremoz.
A estratégia de Erika e Thomas para os vinhos Cardeira é de seguir as suas próprias preferências e gostos pessoais, não perseguir modas ou tendências. Os vinhos são distribuídos por empresas regionais, não vão para a chamada “distribuição moderna”, ou seja, super e hiper mercados. Apesar de não viverem em Portugal a tempo inteiro, estão com muita frequência na Cardeira e envolvem-se na vida local. Erika tem um projecto de abrigo para animais em fim de vida, chegarão em breve dois cavalos e um burro. A adega está também rodeada por algumas pequenas casas muito bonitas, para alojar convidados, e talvez um dia hóspedes. As filhas de Erika e Thomas nadam, por isso foi construída uma pequena piscina, que tem o formato da silhueta que associamos a Portugal.
Paixão, identidade, autenticidade, Portugal. Rigor, dedicação, definição, exigência, Suíça. Pode muito bem ser fórmula de sucesso.
(Artigo publicado na edição de Agosto de 2023)