Reserva, mas não tanto

Luís Lopes

Os chamados “designativos de qualidade” fazem parte da vida de qualquer apreciador de vinho. Escolha, Reserva, Colheita Selecionada, são evidenciados na rotulagem e sugerem estarmos perante um produto de patamar vincadamente superior. Mas, olhando para o que está dentro da garrafa, o que é que o designativo de qualidade nos garante? Bom, na verdade, rigorosamente […]

Os chamados “designativos de qualidade” fazem parte da vida de qualquer apreciador de vinho. Escolha, Reserva, Colheita Selecionada, são evidenciados na rotulagem e sugerem estarmos perante um produto de patamar vincadamente superior. Mas, olhando para o que está dentro da garrafa, o que é que o designativo de qualidade nos garante? Bom, na verdade, rigorosamente nada.

TEXTO Luís Lopes

A Portaria 239/2012, do Ministério da Agricultura, define as “menções tradicionais”, entre elas os designativos Colheita Selecionada, Escolha, Reserva, Reserva Especial, Grande Reserva, Superior, etc. As diferenças entre eles são subtis, mas, basicamente, exige-se que estes vinhos tenham “características organoléticas destacadas” ou “muito destacadas”, ou seja, que a sua qualidade se demarque claramente da média. Em cima desta lei geral, cada CVR (organismo que gere a certificação em cada região) estabelece normas regionais que podendo ser mais restritivas que a lei geral, não podem nunca ser mais permissivas. Além disso, as CVR definem os critérios técnicos para aferir a “qualidade destacada”. Regra geral, passa por esses vinhos obterem mais alguns pontos na câmara de provadores que faz a certificação. Em teoria, tudo certo. O problema é a prática.
Se corrermos as prateleiras das lojas de retalho encontramos inúmeros exemplos de vinhos que ostentam orgulhosamente designativos de qualidade e que são vendidos a preços ridículos. Numa rápida pesquisa online de tintos Reserva até €3, deparei-me com vinhos que vão desde €1,99 (Dão e Tejo) a €2,99 (Alentejo), passando por valores intermédios, €2,29 (Lisboa) e €2,49 (Setúbal e Douro). Convenhamos: alguém acredita que vinhos vendidos a estes preços (IVA incluído!) possuem “qualidade destacada”? Geralmente são vinhos bem feitos, adequados ao valor que se pede por eles, mas, quase sempre, a única coisa que os diferencia de outro vinho do mesmo patamar qualitativo, é o sabor à madeira que lhes foi adicionada.
Os supermercados limitam-se a vender o que lhes é proposto, aos preços que conseguem negociar, os consumidores fazem as suas escolhas e mal nenhum viria ao mundo se tudo a isto se resumisse. Cada qual compra o vinho que quer (ou pode) e o que importa é que lhe saiba bem. O enorme problema são os efeitos colaterais destes Reservas “da treta”. O mais grave, é a banalização dos designativos de qualidade: se tudo merece “qualidade destacada”, então nada há que se destaque. Depois, a desinformação do consumidor: porquê comprar aquele vinho “colheita” por €5 se se pode comprar este “reserva” por €2,49? Acrescente-se a isto a autoviciação das câmaras de provadores: se para ser Reserva basta ter madeira, então só pode ser Grande Reserva um vinho que tiver muita (mesmo muita!) madeira. Finalmente, o descrédito internacional: um comprador que conhece o Reserva espanhol de 3 anos de idade e o Gran Reserva de 5 anos, olha para os Reserva portugueses como uma vigarice. Nos anos 80 estragámos, talvez para sempre, um excelente mercado, a Dinamarca, inundado com “Garrafeiras” miseráveis. É esta a imagem que queremos continuar a dar dos nossos vinhos?
Não há uma forma fácil de resolver isto, mas acredito não podem haver designativos de qualidade sem estágio obrigatório, que pode variar de região para região. Se um Reserva, por exemplo, só puder ser comercializado com dois ou três anos de idade, isso obriga o produtor a utilizar o designativo num vinho verdadeiramente bom, que não pode nunca ser vendido muito barato. Em paralelo, as câmaras de provadores regionais deverão melhorar e afinar o seu critério.
Nenhum produtor é obrigado a utilizar designativos de qualidade. Aliás, muitos dos mais caros e prestigiados vinhos portugueses não lhes fazem menção. Mas quando se envereda por este sistema de classificação, colocando a palavra Reserva (ou outra congénere) no rótulo, era bom que isso significasse alguma coisa.

 

 

Edição Nº22, Fevereiro 2019

O nome das uvas

Luís Lopes

Temos nomes diferentes para a mesma casta. Temos castas diferentes com o mesmo nome. Temos a mesma fonética para grafias e castas diferentes. Temos grafias diferentes para a mesma casta. Felizmente, só temos 250 castas nativas, se não, imagine-se a confusão que por aí andaria… TEXTO Luís Lopes Com frequência, ao longo dos últimos 15 […]

Temos nomes diferentes para a mesma casta. Temos castas diferentes com o mesmo nome. Temos a mesma fonética para grafias e castas diferentes. Temos grafias diferentes para a mesma casta. Felizmente, só temos 250 castas nativas, se não, imagine-se a confusão que por aí andaria…

TEXTO Luís Lopes

Com frequência, ao longo dos últimos 15 anos, tenho-me visto perante uma plateia de enófilos ou profissionais estrangeiros, incumbido de lhes apresentar e dar a provar um conjunto de vinhos portugueses. Confesso que é um trabalho que aprecio bastante. É entusiasmante poder transmitir a outros a minha paixão pelos vinhos de Portugal, revelando um território onde qualidade, diversidade e personalidade se conjugam de forma notável. E é com um certo “orgulho nacional” que assisto à surpresa deliciada daqueles que, pela primeira vez, se deparam com a grandeza vinícola escondida neste pequeno país.
Em todas estas sessões, há um momento que tenho como certo: quando alguém me pede, meio envergonhado pelo seu desconhecimento, que lhe explique melhor porque é que a casta X também se chama Y e por vezes (mas nem sempre) se escreve com Z. Regra geral, safo-me dizendo que os portugueses são um povo tão extraordinário e seguro de si que, se puderem fazer uma coisa de forma complicada, não vão fazer simples. Depois da risada geral, acrescento que os espanhóis ainda são mais tortuosos, dando como exemplo a ubíqua Tempranillo, que, consoante o local onde está plantada, se pode chamar Ull de Llebre, Tinta del Pais, Cencibel, Tinto Fino, Tinta de Toro, Vid de Aranda, Escobera e Chinchillana, para além de algumas variações sobre estes nomes. Ao pé disto, nós portugueses, com a Aragonez e a Tinta Roriz, somos uns meninos de coro…
Se o problema estivesse apenas nas sinonímias não seria um problema. Torna mais difícil de explicar a quem quer conhecer (seja estrangeiro ou português) mas é ultrapassável e até reforça as identidades regionais. Mas as confusões não estão apenas nas sinonímias. Na verdade, neste país de 250 castas conseguimos o assinalável feito de estabelecer quatro patamares de confusão, qual deles o mais rebuscado:
1. Temos nomes diferentes para a mesma casta. Citando apenas alguns dos mais de 50 sinónimos oficialmente admitidos: Arinto/Pedernã, Arinto dos Açores/Terrantez da Terceira, Bical/Borrado das Moscas, Fernão Pires/Maria Gomes, Malvasia Fina/Boal, Síria/Roupeiro/Códega, Alvarelhão/Brancelho, Aragonez/Tinta Roriz, Rufete/Tinta Pinheira, Trincadeira/Trincadeira Preta/Tinta Amarela.
2. Temos o mesmo nome para castas diferentes. Algo que é (ou deveria ser) ilegal, pois induz em erro o consumidor. Mas nem produtores nem organismos de controlo (CVR’s/IVV) se preocupam em repor a verdade, através do correcto cadastro do que efectivamente existe na vinha. Quando se sabe que muito do vinho vendido como Verdelho é, na realidade, Gouveio ou Verdejo, e se encolhe os ombros como se nada fosse…
3. Temos a mesma fonética para grafias diferentes e castas distintas. É o caso do Sercial (casta típica da Madeira – que também se chama Esgana-Cão no continente, já agora…), do Cercial (da Bairrada) e do Cerceal Branco (do Dão e do Douro), tudo uvas distintas que se pronunciam da mesma forma mas se escrevem de maneira diferente.
4. Temos grafias distintas para a mesma casta. Algumas reconhecidas oficialmente (Boal/Bual, Malvasia/Malvazia) outras nem tanto, como o Aragonez/Aragonês que, segundo a legislação, deveria ser sempre Aragonez mas cada qual escreve como lhe apetece.

Agora imaginem-me perante um grupo de sommeliers de Taiwan a tentar explicar tudo isto. É um pouco embaraçoso. Mas, acreditem, tremendamente divertido.

Setembro com Dirk

Luís Lopes

Para os profissionais do vinho, Setembro não é apenas mais um mês do calendário. É, acima de tudo, o início de um novo ciclo, marcado pela vindima enquanto apogeu de um ano vitícola (e bem difícil este, por sinal). A edição de Setembro da Grandes Escolhas assinala a “rentrée” com o destaque de capa para […]

Para os profissionais do vinho, Setembro não é apenas mais um mês do calendário. É, acima de tudo, o início de um novo ciclo, marcado pela vindima enquanto apogeu de um ano vitícola (e bem difícil este, por sinal). A edição de Setembro da Grandes Escolhas assinala a “rentrée” com o destaque de capa para Dirk Niepoort, figura incontornável do vinho português.

TEXTO Luís Lopes

 

A vindima já está aí e a equipa da Grandes Escolhas prepara-se para correr o país de norte a sul, acompanhando todo o bulício que a colheita dos tão aguardados frutos gera. Até ao lavar dos cestos, diz o ditado, muito poderá ainda acontecer, mas não restam dúvidas que este tem sido um ano de sofrimento para as videiras e para quem delas cuida. O granizo afectou diversas propriedades, os ataques de míldio foram devastadores em várias regiões, e o escaldão daquela primeira semana de Agosto marcou a ferro e fogo vinhas um pouco por todo o lado. São de esperar quantidades mais reduzidas na generalidade do território e muitos produtores de referência, sobretudo entre os mais pequenos e os que apostam tudo na viticultura orgânica (com menos opções preventivas e curativas), ficaram praticamente sem uvas para colher. Como um viticultor atingido por estes fenómenos da Natureza me dizia há poucos dias, “por mais vindimas que tenhamos no lombo, os anos nunca são iguais e este vai ficar na memória como o ano do míldio e do escaldão, ou então o ano dos mentirosos, aqueles a quem por milagre ou microclima nada acontece e as uvas e vinhos aparecem sempre…”
Mas deixemos, por enquanto, as vindimas, que mal começaram ainda, e passemos ao tema de capa que, desta vez, é uma pessoa, Dirk Niepoort, porventura a figura do vinho português mais conhecida e com mais influência junto dos líderes de opinião internacionais. Antes de prosseguir, porém, uma declaração de interesse: o Dirk é um dos meus mais antigos amigos no mundo do vinho. É por isso que, na entrevista que publicamos nestas páginas, uso a segunda pessoa do singular, o “tu”, repudiando o que tradicionalmente os jornalistas fazem nas entrevistas para esconder a sua intimidade com o entrevistado. Eu não tenho nada a esconder. Sou amigo do Dirk, e admiro-o enquanto amigo e enquanto profissional. Isso não me impede de discordar dele em muitas coisas. Aliás, ao longo da entrevista tive por diversas vezes a enorme tentação de questionar e rebater os seus conceitos e teorias, de contra-argumentar, de iniciar uma das intermináveis discussões que sempre fizeram parte das nossas conversas. Mas uma entrevista não é um debate, enquanto jornalista cabe-me expor a sua visão do vinho, não apresentar a minha. E foi isso que procurei colocar nas páginas: o vinho, segundo Dirk.
Dirk Niepoort é único e arrebatador, complexo, polémico, desafiante, criativo, mentor de vinhos grandiosos e de (alguns) vinhos falhados, um pouco incoerente também (e isso em nada o preocupa) como acontece com muitos visionários e descobridores de novos caminhos. Ao longo das últimas três décadas, revolucionou uma empresa familiar e antecipou modas e tendências. A sua casa no Porto, autêntico viveiro de talentos (uma espécie de The Factory de Andy Warhol) acolheu, incentivou e impulsionou muitos produtores e projectos de sucesso. Dirk teve (e tem) um papel determinante na transformação da região do Douro e, com o tempo, tornou-se uma bandeira do Portugal do vinho, do Portugal da diferença, do Portugal capaz de surpreender aqueles que, lá fora, pensam que sabem e conhecem tudo. Acho que já merecia uma capa, não acham?

Os brancos vão à luta

Num país supostamente dominado pelos tintos, as uvas brancas autóctones não se rendem. E são cada vez mais as batalhas que ganham neste saboroso confronto de cores. Basta ver o crescente número de brancos monocasta lançados no mercado, oriundos de todas as regiões. TEXTO Luís Lopes Os países e regiões vinícolas do sul europeu são […]

Num país supostamente dominado pelos tintos, as uvas brancas autóctones não se rendem. E são cada vez mais as batalhas que ganham neste saboroso confronto de cores. Basta ver o crescente número de brancos monocasta lançados no mercado, oriundos de todas as regiões.

TEXTO Luís Lopes

Os países e regiões vinícolas do sul europeu são tradicionalmente considerados território de tintos, com alguns pequenos “enclaves” de vinhos brancos a desafiar a regra. Zonas quentes para tintos, zonas frias para brancos, manda a lei. O Portugal do vinho tem vivido há largas décadas sob esse preconceito, evidente sobretudo nos mercados de exportação. Encontro com frequência sommeliers, jornalistas especializados e compradores estrangeiros que, apesar de saberem que se fazem vinhos brancos em Portugal, julgam que são meras curiosidades ou produtos simples e sem grande ambição. Quando colocados perante alguns dos brancos de excelência que se produzem entre nós, ficam atónitos e muitas vezes envergonhados ao admitir o seu desconhecimento.
É certo que, também em Portugal, só há relativamente pouco tempo o branco deixou de ser considerado um produto inferior. E, ainda hoje, as referências mais prestigiadas e de preço mais elevado correspondem a vinhos tintos, tal como a produção de tintos supera largamente a de brancos.
Porém, as variedades brancas autóctones estão a sair dos esconderijos e a dar luta às tintas, não raras vezes ganhando no confronto. Já repararam que, num país de tintos, são cada vez mais as castas brancas nacionais que merecem a honra de engarrafamento “a solo”?
A omnipresente Touriga Nacional, transversal a todo o território português, é de longe a uva indígena que dá origem a mais vinhos varietais, constituindo em si mesma uma categoria para o consumidor. Mas quantas mais uvas tintas poderão dizer o mesmo? Baga, enquanto uva identitária da Bairrada, e com algumas dezenas de referências no mercado, talvez. Mas muitos destes Baga correspondem a espumantes vinificados… em branco! Castelão, embora tradicional da Península de Setúbal, origina poucos vinhos estremes, tal como a Aragonez/Tinta Roriz, apesar desta ser a casta mais plantada em Portugal. Alicante Bouschet, a francesa que adoptámos, ainda conta com vários representantes, sobretudo na metade sul do país, e o mesmo se passa com Vinhão/Sousão a norte.
Mas Trincadeira, Touriga Franca, Alfrocheiro, Rufete, Jaen, Tinto Cão, enquanto varietais, são quase nada. Por junto, e se exceptuarmos a já referida “Touriga cada vez mais Nacional”, os varietais tintos não conseguem competir com a quantidade de referências disponíveis de Alvarinho, Loureiro, Avesso, Encruzado, Arinto, Antão Vaz e Verdelho (ainda que muitos supostos Verdelho sejam, na verdade, Gouveio, mas para o caso não importa). E, para além destes verdadeiros ponta-de-lança do exército branco, há uma segunda vaga em crescendo composta por Azal, Síria, Bical, Malvasia Fina, Fernão Pires/Maria Gomes, Moscatel Galego ou Viosinho.
É claro que, em Portugal, a tradição são os blends, não os varietais. Mas sabendo-se o poder que uma casta tem na comunicação identitária de uma região e de um país, as variedades brancas estão a lançar um grito de afirmação que é impossível não ouvir. E que pode ajudar a mudar a forma como o mundo olha para os vinhos portugueses.

A nova revolução dos Verdes

soluções online encurtam distâncias

Desde a sua criação em 1908, a região dos Vinhos Verdes passou por diversos impulsos de rotura com o passado que possibilitaram saltos importantes no seu desenvolvimento. Actualmente, um conjunto de produtores, grandes e pequenos, está a liderar um desses momentos, criando condições para mudar a forma como olhamos o Vinho Verde. TEXTO Luís Lopes […]

Desde a sua criação em 1908, a região dos Vinhos Verdes passou por diversos impulsos de rotura com o passado que possibilitaram saltos importantes no seu desenvolvimento. Actualmente, um conjunto de produtores, grandes e pequenos, está a liderar um desses momentos, criando condições para mudar a forma como olhamos o Vinho Verde.

TEXTO Luís Lopes

Comecei a escrever sobre vinhos em 1989, no início do movimento dos chamados “Verdes de Quinta”. Foi uma verdadeira revolução na região, uma revolução romântica, se quisermos, protagonizada por proprietários de casas e solares minhotos (alguns com muitos séculos de história) que queriam evidenciar a sua singularidade e, ao mesmo tempo, dar um cunho mais pessoal a um vinho assente quase exclusivamente em grandes marcas “sem rosto”.
Solar das Bouças, Casa de Sezim, Paço d’Anha, Casa de Cabanelas, Casa de Compostela, Casa da Senra, Casa de Vila Boa, Casa de Vilaverde, Quinta de S. Cláudio, Quinta do Tamariz ou Quinta de Azevedo foram alguns dos mais de 20 produtores que decidiram romper com o paradigma tradicional do Vinho Verde – vinhos simples, baratos, com gás e doçura – e ambicionar ir mais além, com vinhos secos e mais sérios, que transportavam uma identidade e o conceito de “produtor-engarrafador”. A vaga dos vinhos de quinta, que alastrou depois ao resto do país, teve na região dos Vinhos Verdes a sua locomotiva e hoje poucos se lembram disso. Mas o mercado dos Verdes não estava ainda suficiente maduro para acolher a ousadia e vários destes pioneiros ou desapareceram ou, a dada altura, tiveram que se adaptar a um estilo mais comercial para se manterem no activo. O conceito e o propósito, porém, ficaram.
Hoje, os tempos são outros, o consumidor também e, não menos importante, a viticultura da região está muito melhor preparada para responder aos desafios qualitativos. Ou seja, ao contrário do que a revolução das quintas pensava, para fazer um Verde mais ambicioso na qualidade e no preço não basta tirar o gás e o açúcar, é preciso que esse vinho exprima o melhor das mais nobres castas regionais (Loureiro, Avesso, Arinto e, cada vez mais, Alvarinho) e do carácter da terra que o viu nascer.
Quem estiver minimamente atento terá percebido que o processo de mudança já se iniciou, com o Vinho Verde a assumir, a pouco e pouco, dois estilos bem distintos: o perfil “clássico”, com álcool baixo, gás, leve doçura, e preço a rondar os €3 (acima da média nacional, vale a pena mencionar…); e o perfil “moderno”, elegante, intenso, encorpado, vendido por valores entre os €6 e os €10 a um segmento de apreciadores mais exigente. São duas realidades absolutamente compatíveis e com o seu espaço muito próprio no mercado.
Porém, na construção deste Verde moderno e ambicioso existem caminhos que, em minha opinião, deverão ser evitados. Um deles passa pelo abuso da tecnologia: um vinho branco é tudo menos um sumo de maracujá. O outro, não menos preocupante, é o excesso de álcool (por vezes acima dos 13%), ao qual por vezes se associa a perda de acidez, desvirtuando o carácter da região. Não esqueçamos que o Vinho Verde tem a vantagem de ser, ao mesmo tempo, uma denominação de origem e uma categoria de produto. Um pouco como o Champagne, salvaguardadas as devidas distâncias. Por isso, o principal desafio dos modernos Verdes passa por mostrar que é possível fazer vinhos brancos de superior categoria com álcool moderado e elegante frescura, preservando a sua singularidade. O que é o mesmo que dizer, grandes vinhos brancos que não deixem de ser… Verdes!

 

Edição Nº15, Julho 2018

Misteriosa Bairrada

A Bairrada é uma extraordinária e complexa região, porventura a mais desafiante na sua relação com o consumidor. Enorme diversidade e forte carácter conjugam-se em vinhos que estão longe de ser imediatos ou consensuais. São vinhos misteriosos, que se revelam a pouco e pouco, até a sua grandeza nos conquistar por inteiro. Esta é uma […]

A Bairrada é uma extraordinária e complexa região, porventura a mais desafiante na sua relação com o consumidor. Enorme diversidade e forte carácter conjugam-se em vinhos que estão longe de ser imediatos ou consensuais. São vinhos misteriosos, que se revelam a pouco e pouco, até a sua grandeza nos conquistar por inteiro.

Esta é uma região de contrastes, uma região com várias faces. Desde logo, pela forma como os seus vinhos se posicionam no mercado. Se entrarmos numa grande loja de retalho alimentar, entre centenas de referências do Alentejo, Setúbal, Douro ou Dão, será muito pouco provável encontrar mais do que um vinho oriundo da Bairrada. Aparentemente, o “consumidor comum” está de costas voltadas para os vinhos da região ou, no mínimo, os responsáveis de compras dessas lojas não vêem nos brancos e tintos da Bairrada as características ideais para cativar os seus clientes. E, no entanto, vários produtores bairradinos estão, indiscutivelmente, entre os mais prestigiados de Portugal, e há cada vez mais vinhos da região a assumir lugar de destaque nas listas de conceituados restaurantes, nas prateleiras das lojas especializadas e nas preferências dos apreciadores mais esclarecidos e exigentes.
O próprio modelo fundiário da Bairrada explica esta bipolaridade: com uma dimensão média de vinha que não ultrapassa o meio hectare, parcelas dispersas e elevados custos de produção, esta não é, claramente, uma região de volumes, capaz de fazer bom e barato, mas sim uma região de nicho, vocacionada para produzir vinhos especiais a preços condizentes.
Não quer isto dizer que não se encontre excelente relação qualidade-preço, como o demonstra a grande prova de tintos Bairrada publicada nesta edição. Só que esses “best buy” estão na faixa dos 7 a 12 euros, não custam 3 ou 4… Paralelamente, temos os vinhos de topo, posicionados acima dos 25 ou 35 euros, que aliam a sua enorme categoria a um tom vibrante e fresco, denominador comum da região.
Os contrastes bairradinos não terminam aqui. Desde a reformulação legislativa de 2002, um DOC Bairrada pode ser feito com uma ou mais de 11 castas brancas e 17 tintas, entre as quais se encontram, castas exógenas como Chardonnay, Pinot Blanc, Verdelho, Sauvignon, Viognier, Cabernet, Merlot, Petit Verdot, Pinot Noir, Syrah, Tinta Barroca, Touriga Franca e Touriga Nacional, ao lado de uvas mais “tradicionais” como Maria Gomes, Bical, Cercial, Baga ou Castelão. Se cruzarmos este número de castas com os dois tipos de solos principais (areias e argila-calcário) e, sobretudo, as diferentes abordagens de adega por parte de enólogos e produtores, facilmente se imagina a gigantesca diversidade de estilos e perfis de vinho que a Bairrada coloca hoje no mercado. Se isso se revelou positivo ou negativo para a região, o balanço está ainda por fazer. Certo é que, por um lado, os vinhos tintos e espumantes elaborados com a “clássica” Baga voltam a estar, literalmente, nas bocas do mundo e assumem-se como uma categoria à parte; e, não menos certo, seja qual for o lote de uvas utilizado, o terroir da região deixa sempre a sua marca, em vinhos com qualidade, personalidade, vivacidade e longevidade. Misteriosa Bairrada…

 

 

Edição Nº14, Junho 2018

Ano 1

Parece que foi há muito, tantas foram as coisas que realizámos neste lapso temporal, mas na verdade passou apenas um ano desde o lançamento da primeira edição da Grandes Escolhas. Como o leitor já terá reparado, a edição de Maio desta revista apresenta-se com outro visual. Desde logo no logotipo da publicação, redesenhado para dar […]

Parece que foi há muito, tantas foram as coisas que realizámos neste lapso temporal, mas na verdade passou apenas um ano desde o lançamento da primeira edição da Grandes Escolhas.

Como o leitor já terá reparado, a edição de Maio desta revista apresenta-se com outro visual. Desde logo no logotipo da publicação, redesenhado para dar todo o destaque àquela que é, verdadeiramente, a nossa marca: Grandes Escolhas. Mas o sopro de mudança estendeu-se a todo o desenho da revista, visando não apenas torná-la mais atractiva mas também proporcionar melhor leitura e, sobretudo, possibilitar a colocação, ao longo das páginas, de blocos curtos de informação que julgamos pertinente para o leitor. É que a forma é importante, mas o conteúdo é aquilo que verdadeiramente nos distingue. Orgulho-me de contar com uma equipa de extraordinários escritores de vinhos e gastronomia, que conjuga a experiência e profundo conhecimento dos mais antigos com a irreverência, talento e constante actualização dos mais jovens. A Grandes Escolhas deve ser, acima de tudo, uma revista que dê prazer ler. O crescimento permanente das nossas vendas em banca e assinaturas (papel e digital) faz-nos acreditar que estamos no bom caminho.
Mas o projecto Grande Escolhas vai muito além da revista que mensalmente chega às bancas, às caixas de correio ou ao ecrã do computador e tablet. Os eventos que produzimos, através de uma equipa altamente profissional e empenhada, são a forma ideal de colocar consumidores e produtores de vinho face a face. Nos últimos doze meses, produzimos um conjunto de eventos de enorme sucesso, onde se destacam o Festival do Vinho do Douro Superior (Vila Nova de Foz Côa), o Trafaria (Com) Prova (Almada), Bairrada Vinhos & Sabores (Anadia) e Dão Capital (Lisboa), para além de diversas provas comentadas e apresentações de vinhos um pouco por todo o país, e também em Angola e no Brasil.
Deixei para o fim desta lista, propositadamente, aquele que logo na primeira edição se tornou no maior, melhor e mais importante evento de vinhos alguma vez realizado em Portugal, o Grandes Escolhas – Vinhos e Sabores, que teve lugar na FIL – Parque das Nações e que este ano já está agendado para 26 a 29 de Outubro próximo, no mesmo local. E temos em preparação novos eventos de vinhos e gastronomia de grande impacto, três deles a realizar até ao final de 2018 e a anunciar muito brevemente.
Se as feiras e mostras de vinhos estabelecem uma ligação mais próxima entre o consumidor e o produtor, a Academia Grandes Escolhas permite a conexão entre os leitores e aqueles que escrevem esta publicação. A grande afluência aos diversos cursos de vinhos realizados na nossa sede em Lisboa nos últimos três meses, para além da vertente didáctica, ajudam-nos a conhecer melhor quem nos lê e a ir ao encontro das suas necessidades.
A Grandes Escolhas é um projecto ainda bastante jovem, que já fez muito, mas tem ainda muito mais e melhor para fazer, levando a excelência do Vinho de Portugal a um número cada vez maior de apreciadores, dentro e fora das nossas fronteiras. Agradecemos sentidamente todo o apoio e confiança que consumidores, empresas e profissionais do vinho nos têm dado ao longo deste ainda curto percurso. Tudo faremos para continuar a merecê-los.

Edição nº13, Maio 2018

O vinho tem muitas cores

Edição nº12, Abril 2018 Nunca apreciei extremismos – na política, no futebol, na vida. O vinho faz parte da vida (pelo menos da minha) e é com preocupação que assisto ao veicular de uma certa radicalização do gosto por parte de uma franja de consumidores/comunicadores supostamente exigentes. Tenho duas boas razões para não gostar de […]

Edição nº12, Abril 2018

Nunca apreciei extremismos – na política, no futebol, na vida. O vinho faz parte da vida (pelo menos da minha) e é com preocupação que assisto ao veicular de uma certa radicalização do gosto por parte de uma franja de consumidores/comunicadores supostamente exigentes.

Tenho duas boas razões para não gostar de radicalismos. A primeira, é que os radicais tendem a ver as coisas de forma simplista, a preto e branco, sem outras cores ou tonalidades. Ora, o mundo, a vida, o vinho, são muito mais complexos do que isso. A segunda, é que quem defende uma posição radical não tem, normalmente, qualquer tipo de abertura para acolher a opinião do outro. Para um extremista, existe uma verdade (que é, obviamente, a sua) e um lado certo (que é, naturalmente, o seu), e a mentira e o erro estão com todos os outros que não concordam consigo. Esta predisposição mental aplicada ao vinho é ainda mais difícil de sustentar. Como se existisse o vinho “verdadeiro”, por oposição ao “falso”…
Tendências (modas, se quisermos) sempre as houve no mercado de vinho. Mas nunca, até hoje, se assistiu à diabolização de determinados estilos de vinho ou práticas enológicas, e à censura pública dos seus produtores ou apreciadores. O discurso do vinho “politicamente correcto” é, sobretudo, veiculado por alguns bloggers e produtores e, por muito que me custe enquanto profissional da área, também comunicadores/jornalistas. Os efeitos sentem-se num mercado de nicho, muito longe do país real, mas não são por isso menos preocupantes.
Há poucas semanas, no final de mais um curso da Academia Grandes Escolhas, um dos participantes abordou-me para uns minutos de conversa. A dada altura, arranjou coragem para dizer o que lhe ia na alma: “Sabe, eu bebo vinhos de qualidade há muitos anos e gosto especialmente de tintos encorpados, vigorosos, vinhos com 14 graus e aquele toque da madeira. Mas agora na internet e nos jornais dizem que isso é mau, que os vinhos devem ter pouco álcool e nenhum sabor a madeira, e eu começo a sentir-me deslocado. Sou eu que estou errado e já não sei o que é bom?” Confesso que quase me obriguei a pedir-lhe desculpa pelo comportamento dos outros. Mas, ao invés, disse-lhe que não há vinho “certo” e vinho “errado” e que cada um deve beber o que verdadeiramente lhe dá prazer, sem prejuízo de ir experimentando propostas diferentes, porque a diversidade é uma das mais fascinantes características do mundo do vinho.

Há gente armada em polícia de costumes, a exercer “wine bullying” sobre produtores e consumidores

Ao que isto chegou! Na ânsia de se mostrar muito conhecedora, muito “fora da caixa” e “alternativa”, há gente armada em polícia de costumes e dedicada a exercer “wine bullying” sobre os produtores e consumidores que ainda não “viram a luz”. Esquecendo-se que, se atingirem os seus propósitos e todos começarem a pensar e a beber o mesmo, um dia os vinhos verdadeiramente alternativos serão os que têm 17% de álcool e 36 meses de barrica nova!
Equilíbrio. Numa única palavra, esta é para mim a qualidade mais importante de um vinho. Equilíbrio entre exuberância e contenção, entre corpo e leveza, entre garra e elegância, entre pureza e carácter. E o equilíbrio encontra-se (e encontro-o) em vinhos muito distintos entre si, distintos na origem, no conceito, no estilo. O vinho é uma paleta multicolorida. Não o queiramos reduzir a uma cor só. E, sobretudo, não aceitemos que nos digam que só o amarelo tem nobreza e virtude. O que seria do vermelho, do verde, do azul…

Tejo, os vinhos que faltavam

Editorial Março 2018 O Tejo é rio e é região de vinhos. Uma região diversa, mas com características muito próprias. Uma região que, nos últimos anos, fez nascer um bom número de vinhos de topo, fundamentais para alicerçar uma imagem global de qualidade. Com esses vinhos como bandeira, pode agora apostar na recuperação, comunicação e […]

Editorial Março 2018

O Tejo é rio e é região de vinhos. Uma região diversa, mas com características muito próprias. Uma região que, nos últimos anos, fez nascer um bom número de vinhos de topo, fundamentais para alicerçar uma imagem global de qualidade. Com esses vinhos como bandeira, pode agora apostar na recuperação, comunicação e promoção de uma identidade regional.

Algumas das mais famosas regiões de vinho do mundo têm o seu nome associado ao rio que as atravessa. Ribeira del Duero, em Espanha; Côtes du Rhone, em França; Mosel, Rheingau, Rheinhessen e Nahe, na Alemanha; Napa Valley, nos Estados Unidos da América; ou Mendoza, na Argentina, são apenas algumas das mais importantes. Em Portugal, avultam naturalmente o Douro, o Dão e o Tejo.
Foi nessa tradicional ligação entre rio e vinho que a antiga região do Ribatejo pensou quando, em 2009, resolveu mudar de nome para Tejo, libertando-se de eventuais conotações negativas do “Ribatejo vínico” no mercado nacional. Curiosamente, apesar da mudança, os produtores do Tejo mantêm com o rio uma relação tímida, ao contrário de outras regiões da Europa (incluindo o Douro) que ostentam os seus rios como factor identitário…
Esse distanciamento é tema que me levaria longe e que este espaço editorial não permite desenvolver. Fica para outra ocasião. O importante é focar o gigantesco salto qualitativo dos vinhos do Tejo ao longo da última década. As bases para isso sempre estiveram lá, na verdade. Quem assistiu à descoberta do bom vinho por parte dos consumidores lisboetas, no início da década de 90, lembra-se certamente do furor que nos restaurantes da capital fizeram certos brancos e tintos de marcas ribatejanas, algumas entretanto desaparecidas (D. Hermano, Quinta Grande), outras que hoje regressam ao seu melhor (Falcoaria, Casa Cadaval). Nesse primeiro assomo da qualidade dos vinhos do Tejo, é de inteira justiça recordar a “mão” de João Portugal Ramos, que orientava várias dessas casas. E, também a título de curiosidade, relembrar que uma boa parte desse sucesso inicial assentava em vinhos brancos de Fernão Pires, uma casta de enorme potencial, com forte identidade regional, e que, a meu ver, ainda não recebeu do Tejo toda a atenção que merece… Mais um tema que fica para segundas núpcias.

Em dois ou três anos, os vinhos que faltavam chegaram finalmente

Dos anos 90 até aos nossos dias, o Tejo revolucionou-se na vinha, na adega, na cultura vínica, com a qualidade média a subir em flecha. Porém, fazer bons vinhos a bom preço não chega para potenciar a imagem de uma região. Os vinhos bandeira são essenciais nesse processo e estes, apesar de existirem, eram até há bem pouco tempo em número insuficiente para fazer a diferença. Porém, em dois ou três anos, os vinhos que faltavam chegaram finalmente. Entre marcas mais clássicas e outras mais recentes, o Tejo tem hoje uma dúzia de nomes e vinhos que podem e devem constituir-se como cartão de visita e locomotiva da região. Permitam-me que destaque aqui apenas uma casa, a Companhia das Lezírias, não apenas pela notável transformação ali operada e que conduziu a alguns grandes vinhos, como também pelo facto invulgar de ser uma empresa estatal, ou seja, “de todos nós”, cujo sucesso deveria servir de exemplo para as suas congéneres.
Com qualidade média em alta e um razoável número de vinhos de topo, o que falta agora ao Tejo para obter o pleno reconhecimento do mercado? Arrisco uma sugestão: encontrar denominadores comuns (o rio, a Fernão Pires, lembram-se?), realçar factores pontuais diferenciadores (as vinhas velhas que poucos sabem que existem…), assumir a história (que nada tem que envergonhe, pelo contrário). Em suma, construir, reforçar e comunicar uma identidade. Eu iria por aí.

Quatro tendências para 2018

O novo ano será o da confirmação de diversas tendências na vinha e no vinho. Umas serão conjunturais, transitórias. Mas outras poderão representar caminhos estruturantes para o vinho português.   OS apreciadores querem diferença e, por isso mesmo, as vinificações especiais estão na moda. O carácter de um terroir ou de uma casta já não […]

O novo ano será o da confirmação de diversas tendências na vinha e no vinho. Umas serão conjunturais, transitórias. Mas outras poderão representar caminhos estruturantes para o vinho português.

 

OS apreciadores querem diferença e, por isso mesmo, as vinificações especiais estão na moda. O carácter de um terroir ou de uma casta já não é suficientemente singular, e assim a adega assume-se como factor diferenciador. Brancos de curtimenta, vinificações com cachos inteiros, fermentações ou estágios em talhas de barro ou ovos de cimento, garrafas armazenadas debaixo de água ou embarcadas em “torna viagem”, tintos com 17% ou com 11% de álcool, as possibilidades são infinitas. E não é só o consumidor de nicho ou com muito dinheiro que aprecia a diferença. Quando se fazem 80 mil garrafas de um branco de Aragonez e se vendem em poucos meses, a diferença democratiza-se, deixa de ser um luxo.

As “castas região” começam a mexer. Num país que promove como mais-valia a disponibilidade de 250 castas autóctones e a arte do lote, não deixa de ser interessante assistir ao avolumar de monovarietais de castas identitárias de regiões. Falo de castas cujo nome/imagem está associado ao nome/imagem de uma região, e que fora dessa região ou são pouco utilizadas ou não têm estatuto de nobreza. É o caso de Antão Vaz/Alentejo (aqui ajudando a promover uma sub-região, Vidigueira), Baga/Bairrada, Encruzado/Dão, Jaen/Dão, Castelão/Setúbal, Rufete/Beira Interior, Síria/Beira Interior, Fernão Pires/Tejo, Avesso/Verdes ou até Ramisco/Colares, entre outras. É mais fácil “vender” uma casta ou uma região? Fica a pergunta.

A viticultura sustentável não é uma moda, antes uma necessidade

Paralelamente, e talvez paradoxalmente, crescem as castas viajantes portuguesas, ou seja, aquelas que se espalham a partir da sua região tradicional porque são adaptáveis a diferentes climas/solos e consideradas mais valia para qualquer região. Nem vale a pena falar da ubíqua Touriga Nacional. Mencione-se antes as cada vez mais transregionais Alvarinho, Viosinho, Touriga Franca (aqui com alguns erros de casting, pois não é assim tão adaptável), Verdelho, Gouveio, Loureiro ou a “nossa” Alicante Bouschet. Se às portuguesas mais viajadas juntarmos as “globetrotter” internacionais, na maior parte das regiões é um exercício quase impossível adivinhar o que está dentro da garrafa.

A viticultura sustentável não é uma moda ou uma tendência, antes uma necessidade. E uma necessidade de que muitos produtores estão conscientes, sobretudo aqueles que querem deixar algo para as gerações vindouras (as suas e as dos outros). A protecção integrada, a produção integrada, a produção orgânica e, até, a biodinâmica, são distintas formas de procurar solucionar um problema. Os meios podem ser mais ou menos radicais, mais ou menos cumpridos ou assumidos, mais ou menos comunicados, mas o objectivo é apenas um: criar um modelo de produção sustentável, o mais possível amigo do ambiente, que promova a biodiversidade e a preservação dos solos. Que garanta o futuro, no fundo. Proteger a natureza custa dinheiro e o consumidor (ainda) não está disposto a pagar mais por isso, é verdade. Mas este é um dos raros casos em que a produção está à frente do mercado e há cada vez mais produtores a cuidar do ambiente porque acham que é o correcto, não porque daí advenham vantagens comerciais imediatas. Só posso aplaudir.