Trufas regressam à mesa do Egoísta, a 25 de Janeiro

O chefe Herminio Costa, trufas

O Egoísta, restaurante inserido no casino da Póvoa de Varzim, recebe, no próximo dia 25 de Janeiro, um jantar dedicado às trufas, uma das iguarias mais especiais e raras do mundo. O chef Hermínio Costa desenvolveu um menu exclusivo que destaca as trufas negras, a sua intensidade e delicadeza aromática. Todos os pratos são acompanhados […]

O Egoísta, restaurante inserido no casino da Póvoa de Varzim, recebe, no próximo dia 25 de Janeiro, um jantar dedicado às trufas, uma das iguarias mais especiais e raras do mundo. O chef Hermínio Costa desenvolveu um menu exclusivo que destaca as trufas negras, a sua intensidade e delicadeza aromática. Todos os pratos são acompanhados por um vinho pensado especificamente para o efeito.
“Este evento já se tornou numa espécie de ritual para o Egoísta. No início de cada ano realizamos um jantar que celebra um dos produtos mais incríveis a que podemos ter acesso. É um desafio e um privilégio preparar um menu que destaca uma iguaria com um sabor e um aroma tão distintos e que tornam cada prato realmente especial”, refere o chef Hermínio Costa.
As reservas podem ser efectuadas para: restaurante.egoista@estoril-sol.com ou pelo telefone 252 690 888. O preço por pessoa é de 100€ (inclui as bebidas). O menu é composto por:

No Bar
Valle de Passos rosé 2016
Cornucópia de Trufa Negra
Vértice Espumante Reserva Cuvée Bruto
Linguado de Mar, Crumble de Trufa Negra e Legumes Baby
Quinta dos Carvalhais Encruzado branco 2016
Black Angus, Batata Ratte e Trufa negra
Pintas Character tinto 2014
Cacau, Avelãs e Trufa Negra
Nieeport Porto L.B.V. 2012

Quem bebeu o meu queijo?

Queijo e vinho são combinação frequente e, no entanto, não há grandes registos de na história da alimentação haver quem fizesse ambos muito bem. Isto porque cada um pressupõe grande especialização na respectiva área, raramente concebidos para viver juntos e felizes para sempre. Óptima altura para abalar um pouco os fundamentos e repensar o assunto. […]

Queijo e vinho são combinação frequente e, no entanto, não há grandes registos de na história da alimentação haver quem fizesse ambos muito bem. Isto porque cada um pressupõe grande especialização na respectiva área, raramente concebidos para viver juntos e felizes para sempre. Óptima altura para abalar um pouco os fundamentos e repensar o assunto.

 

TEXTO Fernando Melo FOTOS Ricardo Palma Veiga

CADA um tem as suas experiências e histórias diferentes de harmonizações de sucesso ou fracasso e cada um integrou os seus dogmas no sistema próprio de prova. Eu habituei-me aos queijos postos na mesa nos dias de festa, para ir debicando e lascando com um copo de espumante ou vinho branco na mão enquanto vinham chegando as pessoas. O queijo Serra da Estrela – a que se chamava simplesmente queijo da serra – vinha de novo no final, para acompanhar com um Porto Vintage. Hoje penso e faço tudo de outra forma, porque tive a sorte de nunca deixar de gostar muito de queijo. Sempre lhe dediquei tempo e provas aturadas e sempre lhe descobri novos ângulos e harmonizações possíveis.

Claro que compliquei tudo, ao entrar pelos diferentes tipos, denominações de origem e afinações de queijo, a ponto de em 2002 ter ido a Londres provar queijo Stilton, referido por todos os produtores de Vinho do Porto como a grande ponte com o Porto Vintage. Publiquei no “Expresso” então um artigo que dava conta da Londres gourmet que fui encontrar e desconhecia por completo. Sobre a bondade da harmonização em si, confesso que voltei cheio de dúvidas, tal a variabilidade que detectei. Quando falamos de Stilton de leite (de vaca) cru, coalhado com flor de cardo natural, é um produto fantástico, mas quando o leite é pasteurizado, o confronto é ruinoso. Ainda hoje me sai assim.

Acontece que o nosso Serra da Estrela é produzido a partir de leite cru de ovelha, o coalho é produzido de forma natural com flor de cardo natural e o sal é integrado na perfeição. É talvez mais copioso que o Stilton de quinta, mas a regra antiga não estava mal de todo. Ainda há bem pouco tempo provei um bom queijo Serra da Estrela com um Vintage 2007 e soube-me pela vida. Mas não é verdade que seja a melhor ligação, porque ao pé de um bom Encruzado – casta rainha branca do Dão – nada mais funciona tão bem com o Serra da Estrela. E agora? Um Porto Vintage e um branco seco do Dão lado a lado, quando pouco ou nada têm em comum? Dá pelo menos que pensar.

A importância da proximidade geográfica
O raciocínio da proximidade geográfica que está na base do sucesso do Encruzado num produto da mesma região como é o caso do queijo Serra da Estrela é inteiramente válido. Aliás, sempre que ambos – vinho e comida – têm já um historial conhecido, mesmo separadamente, é sempre de tentar a harmonização. Um outro caso, vinho verde tinto com cabidela de lampreia, não deixa margem para dúvidas. A única condição é gostar muito de ambos, o que raramente é o caso.

A validação de uma boa harmonização tem de ser universal, o que põe ao rubro a natureza essencialmente diferente que têm o vinho e a comida. Além de que quem não gostar de comida salgada no geral nem de queijo em particular nunca irá entrar no universo que é maravilhoso para os amantes de queijo. À medida que os queijos vão envelhecendo vão perdendo água e apurando o picante e o salgado, o que é outro aspecto relevante no cenário e que leva muitos a abandonar o barco queijeiro. Se estamos a comer a medo, dificilmente vamos gostar seja de que harmonização for.

O leite, em particular a caseína, e a gordura são alvo tradicional de atenção, e a relação simples do corte, ou destruição, ocupam o pensamento de quem tem de encontrar as melhores pontes queijo e vinho. É verdade que amaciam os taninos duros que por vezes o vinho apresenta, mas também é verdade que sem humidade relativa considerável não é possível qualquer êxito na abordagem. Vistas bem as coisas, isto não devia surpreender ninguém, a história desde o leite líquido até ao queijo velho totalmente sólido é pouco mais do que a redução progressiva da humidade. Mas o corolário desse fenómeno é também que tanto a proteína como a gordura aumentam a concentração. Pede por isso vinhos mais encorpados e vigorosos.

Depois vem a questão da acidez, outro dado físico químico do vinho que tem, de certa forma, servido como ponto chave para encontrar boas pontes de harmonização. O caso do Encruzado e Serra da Estrela, contudo, orienta-nos para patamares mais complexos; a acidez como lâmina afiada para cortar a gordura levaria a que um vinho com 9g/l de acidez seria sempre o ideal para o queijo, o que está longe de ser verdade. O nosso palato é uma fábrica de novas moléculas e é a isso que chamamos gosto. Por uma estranha razão, as reacções de todos são semelhantes, e é isso que torna universal uma boa ligação. As oposições doce-salgado ou amargo-suave, só por si são insuficientes para dar boa saúde à comunicação os componentes líquido e sólido.

Uma harmonia ainda em construção
A dança da harmonia entre vinho e queijo está longe do fim. A pressão para diminuir o teor de sal nos queijos está a mudar drasticamente o cenário e a tendência para descer a força tânica e o grau alcoólico dos vinhos vai instalar-se não tarda. Tudo vai em breve saber a outra coisa e nós vamos ter de acompanhar. O momento mais vibrante da refeição poderá vir a ser o início ou um qualquer ponto intermédio, quem sabe se os queijos não vão passar a ser propostos no meio da refeição? Talvez até faça mais sentido do que ao chegar ao fim encontrarmos um desafio titânico de proteínas que pedem vinhos de monta. Enquanto o mundo não começar a girar ao contrário, vale a pena fazer um périplo por alguns dos nossos queijos e dar-lhes aconchego vínico. Temos razões para acreditar que o diálogo existe e é pacífico. Boas experiências!

Cabra
Tem teor baixo de gordura e sódio e um sabor bastante intenso, de resto como o leite de cabra que lhe está na origem. Bom conteúdo de vitaminas e minerais, pelo que é à partida um alimento equilibrado e pronto a harmonizar com bons resultados, de forma geral. Há um cuidado a ter com o que se compra, que é o sal que contém. Sabemos que é utilizado para moderar a actividade microbiológica, pode haver tendência para o excesso para garantir que o queijo está estabilizado quando vai para casa do cliente. Quando equilibrado, contudo, é uma maravilha com um Sauvignon Blanc ou um Viognier.

Terrincho
Feito com leite cru de ovelha churra da Terra Quente, em Trás-os-Montes, tanto se encontra em pasta semi-dura como dura, caso do Terrincho Velho. Mais um caso que conseguimos resolver bem na região, os Arintos que medram para lá do Marão são salinos, frescos e dão bom corte ao apessoado queijo. Para o Terrincho Velho, mude para um Tinta Amarela transmontano, delícia garantida.

Nisa
Abastece Portalegre há gerações este queijo único, produzido a partir de leite cru de ovelha Merina Branca, em bitolas pequenas, normalmente merendeira, que também se leva a assar inteiro. Muito intenso no aroma, é ligeiramente ácido na boca. Um bom Alicante Bouschet vai gostar de conversar com ele, assim como um tinto de vinhas velhas da Serra de São Mamede.

Serra da Estrela
É o porta-estandarte dos queijos portugueses e hoje há que aprender a dar com ele nas boas queijarias. Talvez um dia o cenário se componha, mas actualmente é importante ter confiança em quem o produz. Adora brincar com os brancos estremes de Encruzado e, quando mais velho, conversa bem com um bom Jaen. Ambos do Dão, como é evidente.

Serpa
É divino quando é bom, e a técnica é em tudo semelhante à do Serra da Estrela, acrescida de alguns rituais herdados que fazem a diferença. O corte do coalho em quatro movimentos e o pano de filtração do leite sobrado quatro vezes são dois deles. Tintos velhos – mais de 30 anos – harmonizam bem, e os tintos de talha são companhia valente.

Castelo Branco
Malvasias e Arintos dos granitos mais a norte, seja de Pinhel ou de Figueira de Castelo Rodrigo vestem este queijo como um príncipe. O cardo costuma pronunciar-se muito na cura do queijo, e a versão picante – que existe sempre, trate-se do picante ou não – pode ser muito pungente.

Azeitão
Consta que foi alguém que colocou na região ovelhas trazidas da Serra da Estrela e que todos os anos mandava vir alguém daquelas paragens para lhe fazer o queijo, porque queria tê-lo em casa também nas latitudes mais baixas. Nasceu o Azeitão, que acrescenta em sabor e sofisticação pela forragem onde pastam as ovelhas. É imperativo dar-lhe a companhia de Moscatel de Setúbal com alguma idade, ou brancos das vinhas de areia, que as há ali.

Ilha de São Jorge
É talvez o campeão do umami, dentre todos os queijos nacionais. Complexo e intenso, fica na boca e quando ainda não está demasiado curado (4 ou 6 meses) vai muito bem com Chardonnay com mais de 10 anos ou Pinot Noir recente. Uma aventura bem-sucedida.

Alta cozinha na quinta do Celso

O restaurante Mesa de Lemos, em Silgueiros, acaba de estrear a sua nova carta, totalmente dedicada ao seu proprietário, o carismático empresário dos têxteis Celso Lemos.   TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Cortesia Quinta de Lemos AO entrarmos no edifício de espelhos, encastrado na colina de granito, deparamo-nos logo com a cozinha galáctica. As ilhas, […]

O restaurante Mesa de Lemos, em Silgueiros, acaba de estrear a sua nova carta, totalmente dedicada ao seu proprietário, o carismático empresário dos têxteis Celso Lemos.

 

TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Cortesia Quinta de Lemos

AO entrarmos no edifício de espelhos, encastrado na colina de granito, deparamo-nos logo com a cozinha galáctica. As ilhas, em inox, usam da última tecnologia e estão instaladas dentro da sala de refeições, uma área em betão maciço que se estende ao longo do vidrado — um ovni na paisagem antiga de pedra escura e hortas do Dão. A primeira mesa está já ali, sem qualquer barreira, primeira plateia para assistir ao show de Diogo Rocha, o chef residente.

Quando chegamos, pelas 18h00, ele está num frenesim, a tratar da refeição. Não há tempo a perder com boas-vindas. “Vão ter de esperar até ao jantar”, atira, voltando à bancada de preparação. Daí a duas horas seremos os primeiros a experimentar a obra mais ambiciosa e, porventura, mais brilhante da sua carreira: o novo menu de Lemos, uma dúzia de pratos “inspirados” na figura do dono da quinta, Celso Lemos.

À primeira vista, a ideia de homenagear o patrão pode parecer graxa fajuta ou adoração provinciana. Mas rapidamente percebemos que o fundador da empresa Abyss & Habidecor, sedeada em Viseu e que alguém já classificou como “o Rolls Royce dos atoalhados”, mas também produtor de vinhos exclusivos, não é um homem qualquer. A primeira prova está no restaurante. A segunda aparece uns metros à frente.

Os quartos onde ficaremos alojados são no prolongamento da sala do restaurante. Ao abrirmos a porta, cinco metros de pé direito em madeira, o espanto outra vez, um espanto ainda maior. Ao centro, uma cama vestida de colchas luxuosas, ao lado uma banheira de granito onde se pode imergir e ficar a ver o cenário verdejante dos montes a sudoeste, só um vidro imenso a separar-nos daquele postal de pôr-do-sol.

Para encontrarmos a terceira prova de que Celso Lemos não é um homem qualquer, é só olharmos para o chão. O tapete gigante de algodão do Egipto, que decora o quarto, é um exemplo da qualidade dos seus têxteis. Muito poucos, todavia, têm tido o privilégio de o pisar. Os quartos são para uso exclusivo de chefs, importadores de vinho e outros amigos da família. A nós, coube-nos a vaga da imprensa.

Jantar completo
Completada a visita guiada — e um banhito na tal banheira, vá — é tempo de comer. Às oito começa o jantar, um festim de cinco horas. A abertura é logo em grande, celebrando uma velha máxima de Celso: uma refeição boa tem de ter bons ovos e boas batatas. Tudo simples, uma patanisca de batata com ovo cozinhado a baixa temperatura e um pickle de cebola — coisa para nos ficar na cabeça durante uma vida.

A filosofia prolonga-se nos outros pratos, sempre sofisticados, mas com poucos elementos e saborosíssimos. Pontos altos, para além do ovo inaugural: o carapau em salmoura; a raia com pinhões e molho de fígados; o atum com fricassé, feijão frade e feijão trigueiro; o tártaro de lagostim. A acompanhar só vinhos da casa, onde não faltou o mítico Dona Paullete, de Encruzado, ou o Jaen de 2008. O Mesa de Lemos abre às quintas e sextas ao jantar, sábados ao almoço e jantar, domingo ao almoço. Menus a começar nos 35 euros e a subirem por aí a fora, até mais de uma centena de euros.

Muito dinheiro, é certo, mas o restaurante faz alta-cozinha de nível Michelin e Diogo Rocha só vai ao tapete se ele for do Celso.

O Embaixador escreveu ao mundo

O chef português Nuno Mendes, de quem Gordon Ramsay disse ser “o chef dos chefs”, acaba de lançar um livro sobre a cozinha de Lisboa. Esperam-se efeitos planetários.   TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Cortesia Nuno Mendes SE um dia destes o mundo deixar de olhar para a gastronomia portuguesa como uma subespécie pobrezita da […]

O chef português Nuno Mendes, de quem Gordon Ramsay disse ser “o chef dos chefs”, acaba de lançar um livro sobre a cozinha de Lisboa. Esperam-se efeitos planetários.

 

TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Cortesia Nuno Mendes

SE um dia destes o mundo deixar de olhar para a gastronomia portuguesa como uma subespécie pobrezita da cozinha espanhola, Nuno Mendes e o seu novo livro podem muito bem ter a ver com isso. “Lisboeta” foi lançado a 18 de Outubro, em inglês, pela super-editora Bloomsbury, com o luxo das grandes produções do género; e é bem provável que, em Dezembro, esteja nas listas dos títulos de cozinha internacional que mais marcaram o ano.

A edição em língua portuguesa foi garantida pela Campo das Letras, mas não verá a luz para já. Segundo disse Nuno Mendes à Vinho Grandes Escolhas, é previsível que só esteja nas livrarias portuguesas na Primavera do próximo ano.

“Vou lançá-lo agora em inglês porque acredito que pode ser uma ferramenta muito útil para promover a cozinha portuguesa em todo o mundo”, justificou, a partir de Inglaterra, em resposta a perguntas enviadas por email. “É uma carta de amor a Lisboa e é também inspirado na comida que comia quando aí vivia, na minha juventude”.

Nas páginas do pesado bloco de 372 páginas servem-se vários pratos da Taberna do Mercado, o seu restaurante de inspiração portuguesa na capital inglesa. As receitas vão do Polvo à Lagareiro passando pela Sapateira Recheada ou pelo Prego, mas têm sempre toque de chef.

E quem é o chef? A maioria dos portugueses não o conhece. Nuno Mendes é uma espécie de guru da nova vaga, um René Redzepi (restaurante Noma) do Sul da Europa, “o chef dos chefs”, como lhe chamou Gordon Ramsay. Cresceu em Cascais, depois foi estudar biologia marítima para os EUA, depois trabalhou com gado numa quinta do pai em Portugal, depois dedicou-se à cozinha. Passou pela Trump Tower, no restaurante de Jean-Georges Vongerichten, mas foi no El Bulli, já trintão, que viu a luz da alta-cozinha moderna.

A escalada na cena londrina começou com o The Loft, um ‘supper club’ com menu de degustação. Mas foi com o Viajante que ganhou a sua primeira estrela Michelin. Este restaurante acabaria por fechar, dando lugar ao badalado The Chiltern Firehouse, financiado por um milionário. O restaurante é uma das mesas com mais famosos por cadeira, um sítio onde, na mesma noite se podem encontrar David Cameron, Kate Moss e Madonna (quando não está por Alfama).

A Taberna do Mercado, aberta em 2015, acabou por aproveitar essa euforia e é, actualmente, outro dos restaurantes mais concorridos da capital inglesa por ‘foodies’ e chefs de todo o mundo.

Não admira por isso que a voz de Nuno Mendes em Londres soe mais alto do que 30 chefs de Lisboa a gritar ao mesmo tempo. E ele tem noção disso. Há dois anos, disse ao jornal The Guardian, onde escreve semanalmente: “Quer queiramos, quer não, tornamo-nos embaixadores do nosso país”.

“Lisboeta” é o seu primeiro despacho e pode ser adquirido através da Amazon.

Ananás dos Açores

TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Ricardo Palma Veiga É comum apanharem-se maus ananases dos Açores. Durante algum tempo, fui um crítico dos ananases dos Açores. Ouvia toda a gente a dizer que eram os melhores do mundo e eu só apanhava dos ressequidos, ácidos e bafientos. Achava que a avaliação estava contaminada de patriotismo e […]

TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Ricardo Palma Veiga

É comum apanharem-se maus ananases dos Açores. Durante algum tempo, fui um crítico dos ananases dos Açores. Ouvia toda a gente a dizer que eram os melhores do mundo e eu só apanhava dos ressequidos, ácidos e bafientos. Achava que a avaliação estava contaminada de patriotismo e vistas curtas.

O problema, percebi depois, é que nem todos os ananases dos Açores são iguais; nem todos os anos são bons anos; e há épocas melhores do que outras para os comer. “Agora é quando estão mais frescos e suculentos”, garantiu-me há umas semanas, por telefone, uma funcionária do Miosótis, o supermercado biológico de Lisboa. E eu fui logo atrás deles. A prova acabaria por confirmar a expectativa. Este ano, por estes dias, parecem estar doces, equilibrados de acidez e aromáticos.

Dito isto, é sempre difícil escolhê-los. Um truque clássico é, sorrateiramente, puxar uma das folhas da coroa: se ela estiver verde mas se desprender apenas com um leve resistência é bom sinal. Outra avaliação clássica do estado de maturação decorre da cor da casca, que não deve ser demasiado verde nas intersecções dos botões (não amadurece fora da planta), nem ter a casca esbranquiçada ou seca (não rejuvenesce, também). Procure um aspecto amarelo-rosado na base e um aroma doce.

Saiba ainda que o Ananás dos Açores é citado no livro “1001 Foods You Must Try Before You Die” e que é um produto biológico. O método de produção mantém-se o mesmo dos primórdios do cultivo na ilha, no século XIX. Para ser certificado como um produto DOP, tem de crescer em estufas de vidro e madeira da ilha de S. Miguel, ao longo de dois anos. O método implica a aplicação de “fumos” e a preparação de “camas quentes” à base de matéria vegetal.

Há várias maneiras de comer ananás, mas felizmente a loucura dos anos 80 passou. Já não é fácil encontrar rodelas amarelas a estragar pizzas ou enfiadas em copos de cocktails. A loucura passou. Eu gosto de os comer ao natural, no final de refeições pesadas ou gordurosas. Melhor do que Eno.

 

Pescaria em terra com Diogo, Claiton e Fernão

O restaurante Pesca foi a abertura mais aguardada da rentrée. Ricardo Dias Felner jantou lá duas semanas depois, deu os seus bitaites e ouviu o que o chef, o pasteleiro e o barman tinham a dizer sobre o assunto.   TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Nuno Correia DIOGO NORONHA andou meses a investigar produtos e […]

O restaurante Pesca foi a abertura mais aguardada da rentrée. Ricardo Dias Felner jantou lá duas semanas depois, deu os seus bitaites e ouviu o que o chef, o pasteleiro e o barman tinham a dizer sobre o assunto.

 

TEXTO Ricardo Dias Felner FOTOS Nuno Correia

DIOGO NORONHA andou meses a investigar produtos e técnicas e, em Outubro, o chef revelou finalmente o Pesca, um restaurante pequeno e mimoso, feito em parceria com a Multifood, mas com grandes ambições. No menu, não entram carnes e só se serve peixe da costa portuguesa e selvagem, acompanhado de legumes oriundos de pequenos produtores, boa parte deles biológicos.

A entrada tem janela para a rua, onde se pode começar a beber um dos cocktails que saem das mãos de Fernão Gonçalves. Depois há uma sala pequena e nas traseiras está a zona mais agradável, um quintal que se pode fechar com uma cobertura eléctrica em madeira. Na cozinha, para além de Diogo Noronha (ex-Pedro e o Lobo e ex-Casa de Pasto) está Claiton Ferreira, o chef pasteleiro que o acompanha (muito bem) desde sempre.

O restaurante quer jogar no campeonato dos ‘estrelas Michelin’, e isso pode ser visto em vários detalhes na sala e na cozinha mas também nos preços, que andam acima dos 50 euros por cabeça. Do que experimentei, num jantar recente, saíram boas notas e algumas lições. A prova foi cega e só no final se soube quais haviam sido os pratos servidos.

Pesca sem rede. Mas pesca opípara. Ora vejamos, prato-a-prato.

COCKTAIL ZOMBIE MEXICANO COM PIMENTOS E MALAGUETA (14€)
Antes de ir à boca
O copo lembra uma escarpa com espuma do mar e plantas marinhas.
Ao que sabe
Como se bebêssemos pimentos assados. Nota-se um leve picante, mas também notas frescas e salgadas da salicórnia. O álcool está só a dar intensidade, não queima nem perturba. Grande cocktail.
Nota: 90 pontos
O que diz o barman
“Assamos os pimentos e depois fazemos um sumo na centrifugadora. Acrescentamos xarope de malagueta e canela para ligar os sabores. O álcool é tequila e mezcal, depois temos ervas da costa e espuma do mar feita com água de camarão. O copo, desenhado pela Cátia Pessoa, leva no fim um pó de sal e alface-do-mar para dar aroma.”

PÃO COM MANTEIGA
Antes de ir à boca
A côdea do pão tem um bronze uniforme, tostado sem estar queimado. O miolo é esburacado, com alvéolos médios, mas ligado e brilhante. A manteiga vem em forma redonda, com um pó escuros.
Ao que sabe
Um dos melhores pães que comi este ano. Untuoso, elástico, ácido, equilibrado, complexo, a côdea crocante e caramelizada, ligeiramente doce e salgada. A manteiga boa, mas demasiado mole, talvez pouco fria, não desmereceu o conjunto.
Nota: 95 pontos
O que diz o pasteleiro
“Usamos três farinhas biológicas: centeio, trigo e um pouco de malte para dar o sabor a caramelo. Na nossa massa-mãe entra um centeio alentejano forte. Para conseguirmos aquela côdea deixamos o pão secar durante duas horas. Fizemos várias experiências até chegarmos a este resultado.”

OSTRA PANADA (17€)
Antes de ir à boca
Há um montículo de folhas sobre terra escura, que podia muito bem simbolizar uma laje da Ilha do Pico.
Ao que sabe
Os bivalves que se escondem sob a cama de folhas picantes (mizuna) levam-nos para o mar, e depois temos a frescura e a suavidade dos fiapos de cenoura e rábano a contrastar com os sabores fortes e crocantes da areia escura. Falta talvez um cremoso a ligar os elementos todos.
Nota: 75 pontos
O que diz o chef
“Usámos lingueirão, berbigão, percebes e fizemos um escabeche. A isso acresce a mizuna e outros legumes. Pelo meio há um panado de ostra. A terra são umas migas de morcela da Guarda, a que retirámos gordura e tornámos crocantes.”

GAMBAS DA COSTA ALGARVIA (17€)
Antes de ir à boca
Parece uma escultura contemporânea de uma artista plástica gourmet. Vê-se uma bolacha tufada, que podia ser de milho e lâminas de alcaparras. O que resta está tapado (e há-de ser o melhor).
Ao que sabe
Por baixo da bolacha, estaladiça, há gambas marinadas, praticamente cruas, tenras e suculentas de mar. Na base, está um cubo de beringela, fofa, cremosa, muito boa. O conjunto tem amargos, ácidos e várias texturas, e eleva a fasquia.
Nota: 85 pontos
O que diz o chef
“A bolacha não é de milho, mas de arroz com essência de camarão. A gamba foi marinada em molho ponzu. Cozemos a beringela no vapor com uma pasta de azeitona, e depois marcámo-la na brasa. Utilizamos também os sucos dos legumes assados para fazer um molho, com sabor a pimento. A maionese é de anchovas.”

ATUM RABILHO E CECINA (19€)
Antes de ir à boca
Vêem-se folhas de capuchinhas, quais guarda-sol, sobre o que parece ser um rolo de presunto pata negra, por causa do marmoreado e da cor escura e brilhante (estava enganado, como se verá) e carne, com destroços de pão seco e vegetais.
Ao que sabe
Os pinhões ligam bem com a carne curada. A carne fresca é atum e o pão seco é adocicado e sem grande expressão. Muito bons os pickles de chalota assados. Volta a faltar um molho que una os elementos, demasiado dispersos e desgarrados.
Nota: 65 pontos
O que diz o chef
“A carne curada é cecina [o chamado presunto de vaca italiano] e não pata negra. Usamos raízes chamuscadas e uns pickles de vinagre de chalota. O bolo seco é uma madalena desidratada.”

PARGO LEGÍTIMO BRASEADO (39€)
Antes de ir à boca
Começamos a salivar só de olhar para a pele tostada e para as lascas do peixe. E sabemos que aquele puré e os bocados de laranja estão lá para ajudar a que seja tudo ainda mais emocionante.
Ao que sabe
O peixe está perfeito, húmido por dentro, caramelizado por fora, e é logo evidente que se trata de um lombinho de pargo de qualidade. O puré suavíssimo e doce, com amargo ligeiro de tupinambur, a laranja dá frescura e há um gel do fruto logo ao lado que não acrescenta grande coisa.
Nota: 85 pontos
O que diz o chef
“Falta falar no espinafre que leva um molho de sésamo e saké, com uma emulsão de alho negro.”

SALMONETE BRASEADO (39€)
Antes de ir à boca
A arrumação no prato é apertada mas cabe lá muita coisa. Pela aparência do filete vemos logo que é um salmonete e depois há vários montículos, favinhas e ervas.
Ao que sabe
O filete está magnífico, com a elasticidade típica do salmonete. A salicórnia acrescenta sal e acidez e há ainda um puré avinagrado. Escondida está também uma gema de ovo, talvez com uma cura leve, toca-se e ela espalha-se por cima das favas, misturando-se com outro molho, acastanhado e intenso. Em separado nada a apontar, mas o conjunto sofre por ter demasiados elementos e intensos.
Nota: 75 pontos
O que diz o chef
“A gema é só cozida a baixa temperatura e fazemos um puré de alcachofras. O molho acastanhado é dos fígados do salmonete — há quem diga que é a melhor parte deste peixe e eu concordo.”

CHOCOLATE DE PIURA 65% (11€)
Antes de ir à boca
Voltamos às instalações de arte contemporânea. Desta feita é outra vez um cruzamento de bolachas a dar um ar dramático ao prato. Por baixo, esconde-se uma bola de chocolate.
Ao que sabe
O chocolate tem intensidade e acidez, sem ser amargo, e percebemos que pelo meio há avelãs trituradas. Uma Nutella. Em bom.
Nota: 80 pontos
O que diz o pasteleiro
“A minha paixão é o chocolate. Este chocolate Puria é dos melhores do mundo. Tem notas a framboesa. Vem da Amazónia e é selvagem. No interior tem avelãs tostadas.”

SEIXOS DE PISTÁCHIO, FRAMBOESA E BAUNILHA
Antes de ir à boca
Quase uma palete de pintura, multicolorida. Três ovinhos, um montículo de amoras e framboesas, gelado de morango. Vai ser fresco.
Ao que sabe
Foi fresco mas também doce, cremoso, crocante. Os ovinhos tinham cada um o seu recheio, num deles uma extraordinária panacota com a baunilha (de vagem, certamente) bem marcada; noutro bombom notas a amêndoa amarga. Muito bom também o gelado de morango. Nada excessivamente doce, muito elegante.
Nota: 85 pontos
O que diz o pasteleiro
“Usamos amoras selvagens e framboesas desidratadas. Os bombons são feitos com umas natas incríveis. Um deles leva pasta de pistáchio e essa pasta às vezes leva amêndoa amarga [leva sim]. O gelado de morango só tem 45 por cento de açúcar. Foi feito na Primavera, quando os morangos estão mais doces e, depois, guardado.”

Adeus 2017, olá 2018

Últimos meses do ano foram pródigos em acontecimentos gastronómicos. E há boas novidades no horizonte lisboeta.   TEXTO Ricardo Dias Felner ABREM cada vez mais restaurantes, muitos deles movidos a turismo. Daqui resulta que há cada vez mais mesas desinteressantes, mas seria estúpido dizer-se que se come pior por causa disso. Dá para tudo. Sobretudo […]

Últimos meses do ano foram pródigos em acontecimentos gastronómicos. E há boas novidades no horizonte lisboeta.

 

TEXTO Ricardo Dias Felner

ABREM cada vez mais restaurantes, muitos deles movidos a turismo. Daqui resulta que há cada vez mais mesas desinteressantes, mas seria estúpido dizer-se que se come pior por causa disso. Dá para tudo. Sobretudo em Lisboa.

Um exemplo claro da popularidade da capital portuguesa é o interesse que desperta em investidores estrangeiros. Entre os restaurantes neste grupo, está o Chustnify, de uma indiana de Nova Deli radicada em Berlim. O conceito é o de indiano cool, música electrónica e empregados hipsters, mas a comida é bem mais autêntica (e picante) do que a que lhe servem noutras salas da capital cheias de incenso e folclore (obrigatórios o caril de borrego e o kabab). Fica entre a Praça das Flores e o Príncipe Real.

Na mesma linha, bem perto dali, inaugurou o Zazah, sociedade de três brasileiros, dois com interesses imobiliários em Lisboa e capital financeiro, o outro um chef, Moisés Franco, que passou recentemente no Bairro do Avillez. A ideia é acolher pessoas que saem do trabalho, ao m da tarde, e que passam ali para beber um cocktail e petiscar, embaladas pela música e distraídas com as obras de arte nas paredes. Na carta, há croquetes de alheira (5,50€), ceviche de atum (9,50€), puré trufado (4€) ou vazia maturada (16€).

Quem também viajou para Lisboa, embora seja português, para abrir um restaurante foi António Galapito. Conhecido pelo seu trabalho com o chef Nuno Mendes, em Londres, na Taberna do Mercado, este jovem chef (faz 27 anos este mês) estabeleceu-se há um ano junto à Sé, no aparthotel The Lisboans, a preparar a abertura do seu Prado. O restaurante deveria abrir na semana em que este texto fechou, pelo que neste momento já poderá lá ir experimentar o conceito de farm to table (da horta para a mesa) criativo, muito em voga por estes dias.

Quem não cruzou fronteira alguma, a não ser a do Ribatejo, foi Rodrigo Castelo, da Taberna Ó Balcão, em Santarém. Conhecido por estar a recuperar produtos endógenos ribatejanos, como a carne de touro bravo, e de lhe dar tratamento de chef no seu restaurante escalabitano, Rodrigo irá estrear O Mariscador, na Praça do Campo Pequeno, também em Dezembro.

Para o mesmo mês estava prevista ainda a inauguração do novo restaurante de Ljubomir Stanisic, que no entanto relembra à Vinho Grandes Escolhas uma máxima intemporal: “A obra é que manda.” O chef quer trazer para a Rua do Teixeira, ao Bairro Alto, onde o seu 100 Maneiras dará lugar a este novo projecto, animais inteiros e desmanchá-los e assá-los paleoliticamente. Para isso contratou, Manuel Maldonado, especialista na arte de brincar com o fogo.

Mas nem tudo são favas contadas e contos de encantar. Neste final de ano, houve igualmente projectos a fechar. O Bagos, de Henrique Mouro, foi um deles. No que respeita a transições, a mais badalada foi a saída, concretizada em Novembro, de Pedro Pena Bastos da Herdade do Esporão. Os destinos de ambos os chefs são duas das boas interrogações que 2018 nos trará. Venha ele.

Se não é boi, é vaca…

A carne mais sensual de raça bovina esteve no VINUM Restaurant & Wine Bar. Pela quinta vez consecutiva, o restaurante da Graham’s dedicou-se, juntamente com o grupo basco Sagardi, a promover o confronto entre o boi velho e a vaca velha, desde o dia 24 de Outubro.   TEXTO Mariana Lopes FOTOS Cortesia Vinum ENQUANTO […]

A carne mais sensual de raça bovina esteve no VINUM Restaurant & Wine Bar. Pela quinta vez consecutiva, o restaurante da Graham’s dedicou-se, juntamente com o grupo basco Sagardi, a promover o confronto entre o boi velho e a vaca velha, desde o dia 24 de Outubro.

 

TEXTO Mariana Lopes FOTOS Cortesia Vinum

ENQUANTO durou o stock do boi de Trás-os-Montes e da vaca da Galiza (raça Rubia Gallega), o Vinum teve à disposição dos clientes um menu muito especial, harmonizado com vinhos Symington Family Estates, com destaque para as carnes seleccionadas pelos espanhóis Imanol Jaca, guru dos cortes bovinos, e Iñaki Lopez de Viñaspre, embaixador da gastronomia do País Basco.

Sagardi é um projecto de restauração e catering com 20 anos que tem na sua génese o transporte do conhecimento sobre a gastronomia tradicional basca para todo o mundo. A locais como Madrid, Barcelona, Valência, Sevilha, Ibiza, Buenos Aires, Cidade do México e Londres, adiciona-se o Porto, onde o grupo gere o restaurante “symingtoniano” Vinum. A Sagardi tem já 30 restaurantes e um hotel sob a sua alçada.

No dia de apresentação das Jornadas, os dois mentores da Sagardi partilharam o seu conhecimento com os presentes, apresentando uma masterclass interactiva sob o mote “Boi ou vaca – contrastes de sabores, contrastes de ideias”.

O boi de trabalho, antigamente usado para puxar as carroças e os arados, vê hoje a sua criação ameaçada pela mecanização da agricultura e pelo aumento das grandes explorações lácteas. Felizmente, em algumas aldeias do Minho e de Trás-os-Montes, onde a cultura tradicional se mantém como bandeira, ainda se encontram estes animais, apesar de poucos serem os exemplares. A vaca Rubia Gallega, grande e pesada, já é muito difícil de encontrar.

Com cerca de 500 quilos, a vaca velha servida no Vinum é proveniente de uma pequena aldeia montanhosa no interior da Galiza, e a sua carne é muito apreciada internacionalmente. Iñaki contou que “os bois eram companheiros de trabalho e tratados como família” e explicou que “o boi era usado para puxar por ser mais musculado e hormonal do que a vaca”. Sempre castrados, estes bois velhos são, na generalidade, criados com uma qualidade de vida considerada superior, tanto no que concerne a alimentação (pasto natural) como ao nível de stress a que estão sujeitos durante a vida, que é baixíssimo. O mesmo se aplica à vaca velha.

Vinãspre frisou que “para os bascos, a qualidade de vida do animal é muito mais importante na escolha da peça do que a raça ou o género, por exemplo” e, de seguida, desafiou-nos a acariciar a carne com a mão, para que sentíssemos a gordura a fundir-se com a temperatura da nossa pele e percebêssemos que na carne de qualidade não há maus odores. Continuou, afirmando: “Não acreditamos em longas maturações”, desenvolvendo depois que prefere a expressão “amadurecimento”, referindo-se à prática de deixar a carne no frio somente até que as gorduras se integrem o suficiente nas fibras, sob o risco de que o sabor se altere ou se desenvolvam bactérias. E, sabiamente, declarou que “o bom artista é o que olha muito para o produto e o ‘estropea’ pouco”. Por esta altura, já estávamos todos com vontade de a estropear, mas no prato…

Na hora de “atirar” as costeletas para a grelha, os mandamentos da dupla espanhola foram outros. “Não se pergunta se é bem ou mal-passada, ou como se quer a carne! Há um ponto ideal.” A temperatura deve ser extremamente alta e a carne deve ser completamente selada antes do punhado de sal marinho grosso cair sobre ela, para não desidratar – Assim a carne só agarra o sal de que necessita – disseram. Eram costeletas com cerca de dois quilos, cada.

Antes do almoço, provámos as carnes, boi e vaca lado a lado a mostrar-nos que o único resultado possível é o empate, quando lidamos com produtos desta qualidade. O boi, ostentando as suas teias brancas musculares, revelou-se mais intenso no primeiro contacto com o palato, e a vaca, mais feminina, mostrou uma elegância poderosa, ambos de sabor sublime. À refeição, acompanhou-se a carne de pimentos piquillo e nada mais. Como se fosse preciso acrescentar alguma coisa…