Adega Quanta Terra recebe exposição da artista Leni van Lopik

Quanta Terra Leni Lopik

A ligação do projecto duriense Quanta Terra — fundado em 1999 por Celso Pereira e Jorge Alves — ao mundo artístico, começou com uma exposição de Joana Vasconcelos em 2022. Agora, é a vez da artista plástica holandesa Leni van Lopik expor as suas criações na adega Quanta Terra, em Favaios, uma mostra denominada “Cor […]

A ligação do projecto duriense Quanta Terra — fundado em 1999 por Celso Pereira e Jorge Alves — ao mundo artístico, começou com uma exposição de Joana Vasconcelos em 2022. Agora, é a vez da artista plástica holandesa Leni van Lopik expor as suas criações na adega Quanta Terra, em Favaios, uma mostra denominada “Cor do Douro” que já começou e que durará até 31 de Outubro. Leni van Lopik reside em Portugal há 23 anos, e já venceu o prémio Best of Wine Tourism 2023, na categoria Arte e Cultura.

Todas as peças, das 11 obras expostas, são produzidas a partir de materiais naturais ou orgânicos, como folhas de eucalipto, bugalhos e pedras, quase sempre recolhidos durante as caminhadas da artista pelos socalcos durienses.

“O processo de reabilitação e recuperação da Quanta Terra mostrou-nos um espaço demasiado valioso para ficar circunscrito a visitas e provas de vinhos. Entendemos, desde logo, que a arte teria aqui uma simbiose perfeita com o nosso negócio de produção de vinhos e que uma com o outro reflectiriam aquilo que colocamos todos os dias no nosso trabalho: fazer vinhos únicos e diferenciadores, para serem apreciados e desfrutados”, explica Celso Pereira. Jorge Alves acrescenta: “Estamos plenamente convencidos que esta exposição será uma mais-valia enorme para o turismo na região”.

Nesta exposição, Leni van Lopik apresenta, entre outras propostas, videiras na sala das barricas, de forma a mostrar a junção perfeita entre o material e o vinho, e as quatro “Donas” de cápsulas nas cubas onde era armazenada a aguardente. A estes exemplos, junta-se ainda a instalação “Rio Douro”, elaborada através de cápsulas de garrafas de vinho.

“Cor no Douro” pode ser visitada de quarta-feira a domingo, das 10h00 às 17h30. A visita inclui uma prova de vinhos. O produtor aconselha reserva prévia, para o e-mail reservas@quantaterradouro.com, ou para o número 935907557.

Está para breve: Casa Ferreirinha confirma lançamento do Reserva Especial 2014

Reserva Especial 2014

É a 18ª edição de um dos vinhos mais cobiçados da duriense Casa Ferreirinha. O tinto Reserva Especial 2014 tem lançamento confirmado para Junho de 2023, e vem saciar a sede dos consumidores que procuram vinhos mais raros e exclusivos. Luís Sottomayor, enólogo da casa do grupo Sogrape, declara: “O ano de 2014 foi de […]

É a 18ª edição de um dos vinhos mais cobiçados da duriense Casa Ferreirinha. O tinto Reserva Especial 2014 tem lançamento confirmado para Junho de 2023, e vem saciar a sede dos consumidores que procuram vinhos mais raros e exclusivos.

Luís Sottomayor, enólogo da casa do grupo Sogrape, declara: “O ano de 2014 foi de maturação equilibrada, com alguma chuva no Inverno e uma onda de calor em Junho, mas harmonioso. Estas características reflectiram-se no vinho, dotado também de uma complexidade assinalável. E a excelente capacidade de envelhecimento comprovada ao longo destes nove anos que se passaram, tornaram este vinho digno de Reserva Especial”.

Reserva Especial 2014
Reserva Especial 2009, a colheita que antecedeu o 2014.

Produzido há seis décadas, o Reserva Especial existiu nas edições de 1960, 1962, 1974, 1977, 1980, 1984, 1986, 1989, 1990, 1992, 1994, 1996, 1997 2001, 2003, 2007, 2009 e agora 2014.

Lavradores de Feitoria: Casa nova, vinhos novos

lavradores de feitoria

Fundada em 2000 por 15 viticultores durienses, a Lavradores de Feitoria é um projecto inovador a diversos níveis. Agrupando 20 propriedades, dispersas pelas três sub-regiões do Douro, num total de mais de 600 hectares de vinha, conta desde 2021 com uma nova sede e adega e, desde abril do ano passado, com um centro de […]

Fundada em 2000 por 15 viticultores durienses, a Lavradores de Feitoria é um projecto inovador a diversos níveis. Agrupando 20 propriedades, dispersas pelas três sub-regiões do Douro, num total de mais de 600 hectares de vinha, conta desde 2021 com uma nova sede e adega e, desde abril do ano passado, com um centro de enoturismo. No meio de tanta novidade cabem, claro, novos vinhos e colheitas.

Texto: Luís Lopes       Fotos: Lavradores de Feitoria

O associativismo no sector do vinho é fenómeno raro e, quando acontece, normalmente não dura muito. O projecto Lavradores de Feitoria merece, por isso, forte aplauso, pela longevidade (quase 23 anos!), dimensão (são hoje 53 accionistas, dos quais 16 proprietários de quintas), conceito (lógica de sustentabilidade social, económica e ambiental) e solidez, reforçada pela aquisição da quinta do Medronheiro, em Sabrosa, e a construção da nova sede e adega no local.

Lavradores de Feitoria
A nova adega é também sede e centro de enoturismo.

Na base de tudo isto está um enorme capital de confiança gerada entre todos os intervenientes e que a administração da Lavradores de Feitoria, cujo rosto mais visível é a CEO Olga Martins, procura retribuir. Um exemplo, é o valor base de remuneração das uvas aos produtores associados, sempre acima da média praticada na região, garantindo que cobre o custo de produção, numa lógica de “fairtrade”. A Lavradores de Feitoria tem um sistema de pagamentos assente em três patamares – base, superior e extra (que chega a valer mais do dobro do valor base), como forma de valorizar a qualidade das uvas e, por conseguinte, dos vinhos. O pagamento aos fornecedores 30 dias após a emissão da factura é igualmente um ponto de honra da casa.

Mas falemos de vinhas, adegas e vinhos. E aqui é incontornável o nome de Paulo Ruão, director de enologia da Lavradores de Feitoria desde a vindima de 2005. Para construir uma gama de vinhos segmentada e criteriosa, que abarca lotes, monocastas e vinhos de quinta, a partir de 20 propriedades e 600 hectares, é preciso estar familiarizado com cada um destes terroirs e suas particularidades. Paulo conhece bem as quintas dos sócios da empresa. Para além do acompanhamento periódico anual, visita cada uma das vinhas duas vezes antes da vindima, para fazer controle de maturação e escolher as parcelas que pretende, podendo estas variar de ano para ano.

Quando a empresa nasceu, em 2000, a coisa era muito mais simples: cada quinta fazia o seu vinho e a sua marca. Rapidamente se verificou, porém, a insustentabilidade enológica e comercial do modelo. Hoje, estas propriedades dispersas pelo Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior, com uvas de castas bastantes diversas, cepas de todas as idades, plantadas a múltiplas altitudes, com diferentes exposições, numa enorme heterogeneidade de solos, originam apenas duas linhas de vinhos, identificadas como “vinhos de lote”, onde estão as marcas Lavradores de Feitoria e Três Bagos, e “vinhos de vinha”, onde se inserem os clássicos Meruge, branco e tinto, Quinta da Costa das Aguaneiras e, a grande novidade de 2022, Vinha do Sobreiro.

Depois da fase “naif” inicial, a vinificação comum passou a estar concentrada numa adega montada na zona industrial de Paços, em Sabrosa. A ambição de Olga Martins e Paulo Ruão, porém, era outra. Numa empresa assente em quintas e vinhas, fazia sentido ter “uma adega no meio das videiras”. O sonho levou tempo a concretizar. Primeiro, em 2008, foi preciso adquirir, com capitais próprios, a Quinta do Medronheiro. Com 8 hectares de área total, entre os 540 e 580 metros de altitude e exposição sul, 6,5 hectares são de vinha, exclusivamente uvas brancas, Viosinho, Gouveio e Boal, em modo de produção biológica. Depois, houve que ganhar músculo financeiro para construir a adega, inaugurada somente 13 anos depois, em 2021.

Lavradores de Feitoria
O espaço de enoturismo foi inaugurado em abril de 2022.

O projecto, da autoria do arquitecto Belém Lima, assenta numa estrutura e paredes exteriores em betão armado pré-fabricado, com um padrão texturado onde impera a cor do xisto. Os painéis isolados e de grande eficiência térmica, associados à produção de energia através de painéis fotovoltaicos e ao tratamento de águas, avolumam a vertente de sustentabilidade da empresa. A adega possui todo o equipamento moderno expectável numa instalação destas. Porém, a pisa a pés em lagar de granito, que Paulo Ruão exige para alguns vinhos de topo, continua a ser feita nas quintas dos produtores accionistas. Para além da parte produtiva, o edifício comporta ainda os escritórios da empresa e a área dedicada ao enoturismo, inaugurado em abril de 2022. Também aqui, a Lavradores de Feitoria procura fazer diferente, privilegiando as visitas personalizadas, a cargo de Eduardo Ferreira, exímio contador da história do Douro e das estórias dos vinhos e das gentes…

(Artigo publicado na edição de Janeiro de 2023)

 

Cristiano e Francisca van Zeller mostram novos Vintage e LBV da Van Zellers & Co

Van Zellers vintage

Decorreu em Lisboa, no dia 10 de Fevereiro, a apresentação de novidades Van Zellers & Co, empresa familiar que trouxe agora os seus novos vinhos do Porto. O momento foi também aproveitado para prova de algumas colheitas anteriores. Assim, do LBV foram provados os 2014, 2015 e 2017 (este a novidade); e dos Vintage começou-se […]

Decorreu em Lisboa, no dia 10 de Fevereiro, a apresentação de novidades Van Zellers & Co, empresa familiar que trouxe agora os seus novos vinhos do Porto. O momento foi também aproveitado para prova de algumas colheitas anteriores.
Van Zellers vintage
Francisca e Cristiano van Zeller, na apresentação dos novos vinhos. ©João Paulo Martins
Assim, do LBV foram provados os 2014, 2015 e 2017 (este a novidade); e dos Vintage começou-se também com o 2014, seguindo-se as edições de 2015 e 2017, acabando no 2020. Este novo Vintage 2020 será agora sugerido ao mercado “en primeur” com um desconto de 30% sobre o preço final, que mais tarde rondará os €120. J.P.M.
Mais sobre estes vinhos numa das próximas edições da revista Grandes Escolhas

Lançamento: Os Calços da Dona Matilde

Dona Matilde

São calços e são largos. Foram criados após a filoxera e mantiveram-se até hoje. Correspondem a uma forma de implantação da vinha ainda hoje muito vulgar no Douro e que veio permitir plantar mais cepas com menor presença dos patamares e respectivos muros. Nasceu assim o tinto Vinha dos Calços Largos. Texto: João Paulo Martins  […]

São calços e são largos. Foram criados após a filoxera e mantiveram-se até hoje. Correspondem a uma forma de implantação da vinha ainda hoje muito vulgar no Douro e que veio permitir plantar mais cepas com menor presença dos patamares e respectivos muros. Nasceu assim o tinto Vinha dos Calços Largos.

Texto: João Paulo Martins      Fotos: Quinta Dona Matilde

Dona Matilde

A quinta Dona Matilde é uma propriedade histórica, já centenária e localizada no coração do Douro, entre a Régua e o Pinhão. É nas velhas quintas que encontramos as vinhas mais antigas da região, muitas delas seculares. Hoje, ao contrário da “voragem arrancativa” dos anos 80 e 90, em que substituíram muitas vinhas velhas para plantar segundo novos moldes, hoje dizia, há uma tendência para conservar estas vinhas antigas e tirar delas o melhor proveito, nomeadamente em termos de preço de venda. Hoje todos sabemos que um vinho de vinha velha só é mesmo bom se a vinha for mesmo boa, bem localizada e se foi sendo bem tratada ao longo das décadas de vida. Na quinta Dona Matilde elas também existem, a par de vinhas mais recentes, e foi daqui, desses bardos das vinhas velhas em calços que nasceu o tinto ora apresentado.

Dona Matilde
Filipe Barros

Foi com as uvas destes calços que o produtor resolveu engarrafar pela segunda vez um tinto exactamente com esse nome, Vinha dos Calços Largos. A originalidade deste tinto assenta em dois planos: por um lado estamos a falar de vinhas muito velhas e, por outro, o vinho não teve estágio em madeira, o que é raro num vinho de topo ou que pretende mostrar as qualidades das vinhas muito antigas. Para o enólogo João Pissarra é desta forma que melhor se podem perceber as pequenas nuances que, de ano para ano, os vinhos vão tendo. Pouca intervenção na vinificação (pouca extracção, leveduras indígenas) e ausência de madeira são então os trunfos. O enólogo salientou ainda que “o equilíbrio da matéria-prima é muito mais evidente nas vinhas velhas e acho, por isso, que as vinhas velhas vão vencer a guerra das alterações climáticas”. Manuel Ângelo Barros neto do fundador e durante 30 anos administrador da empresa Barros Almeida, esteve de novo presente no evento, também para apresentar o Porto Colheita, um vinho que lhe diz muito, ele que toda a vida esteve ligado à produção e prova de vinhos do Porto. Filipe Barros, seu filho, assegura a continuidade familiar do projecto. A quinta, com uma localização espectacular e vista para o rio, tem 93 ha mas uma boa parte é de mata mediterrânica. Além da vinha possui olival, horta e pomar e tem instalações de enoturismo. Para lá do tinto agora apresentado a quinta tem outro tinto de destaque, o Vinha do Pinto, a que acrescem dois tintos e dois brancos, ente colheitas e reservas.

Lobo de Vasconcellos apresenta tinto Douro de topo

Lobo Vasconcellos Douro

No dia 26 de Janeiro de 2023, Manuel Lobo de Vasconcellos, mentor do projecto Lobo de Vasconcellos Wines, apresentou à imprensa e ao mercado as novas colheitas dos seus vinhos do Alentejo e duas estreias absolutas: um licoroso desta região e o tinto Vinha do Norte, do Douro. Do Alentejo, surgem os LV Lobo de […]

No dia 26 de Janeiro de 2023, Manuel Lobo de Vasconcellos, mentor do projecto Lobo de Vasconcellos Wines, apresentou à imprensa e ao mercado as novas colheitas dos seus vinhos do Alentejo e duas estreias absolutas: um licoroso desta região e o tinto Vinha do Norte, do Douro.

Do Alentejo, surgem os LV Lobo de Vasconcellos branco 2021, tinto 2019, Reserva branco 2021, Reserva tinto 2019 e Licoroso 2020. Já da região do Douro, Manuel Lobo e Joana Silva Lopes (a sua enóloga assistente) introduziram o Vinha do Norte tinto 2019. “Este tinto tem origem na minha vinha mais a Norte, e com exposição Norte, na localidade de Nagoselo do Douro, junto a São João da Pesqueira”, revelou Manuel Lobo de Vasconcellos. O LV licoroso 2020, por sua vez “marca o início do meu projecto no Alentejo”, adiantou o produtor e enólogo, cuja família possui propriedades no Tejo (Quinta do Casal Branco) e no Alentejo (Herdade da Perescuma) desde há várias gerações.

Mais sobre estes vinhos numa das próximas edições da revista Grandes Escolhas

 

Quinta da Gaivosa: Um caminho de três décadas

quinta da gaivosa

“Pioneiro do Douro moderno”. Assim classifiquei Domingos Alves de Sousa numa das várias peças que publiquei sobre o projecto Quinta da Gaivosa ao longo das últimas décadas. E quando se comemoram 30 anos sobre a colheita do vinho com que tudo começou, a frase mantém-se mais actual do que nunca. Também por isso se justifica […]

“Pioneiro do Douro moderno”. Assim classifiquei Domingos Alves de Sousa numa das várias peças que publiquei sobre o projecto Quinta da Gaivosa ao longo das últimas décadas. E quando se comemoram 30 anos sobre a colheita do vinho com que tudo começou, a frase mantém-se mais actual do que nunca. Também por isso se justifica revisitar Gaivosa e a sua história, escrita com vinhos, no caso, nove, três por cada década.

 TEXTO: Luís Lopes     FOTOS: Domingos Alves de Sousa

Lembro-me bem do impacto que em mim teve, na época, o primeiro Quinta da Gaivosa, um tinto de 1992 que me impressionou. O vinho tinha madeira a mais, claro, como praticamente todos os tintos ambiciosos dos anos 90. Mas disso só me vim a aperceber quando o voltei a provar mais tarde, talvez sete ou oito anos depois, que nisto da apreciação de vinhos não apenas não se nasce ensinado como o nosso palato vai mudando com o tempo.

Absolutamente certo é que, quando o Quinta da Gaivosa nasceu, muito poucos vinhos do Douro ambicionavam tão longe em qualidade e notoriedade. Barca Velha e Quinta do Côtto eram clássicos reverenciados, mas o Douro moderno, no que aos vinhos não fortificados respeita, estava ainda por construir e marcas como Duas Quintas e Quinta da Gaivosa definiam o caminho para os que viriam a seguir.

quinta da gaivosa
A Quinta da Gaivosa comporta vinhedos com idades e modelos de plantação muito diversos.

Cheguei à Quinta da Gaivosa e a Domingos Alves de Sousa pela mão de Anselmo Mendes, na altura enólogo consultor na casa. Casa essa onde permaneceu até 2013, passando então, por inteiro, a pilotagem enológica a ser feita por Tiago Alves de Sousa, da nova geração da família, que já trabalhava ao lado de Anselmo há uma década, e com quem este partilhava a sua enorme experiência e conhecimento. Os vinhos da Gaivosa vão reflectindo estas mudanças e são também, tal como a vida, marcados por ciclos, não apenas os da Natureza mas também os das ideias e conceitos.

Na base de tudo, esteve e continua a estar Domingos Alves de Sousa, pedra basilar do projecto. Foi ele que, logo em 1992, determinou que o tinto Quinta da Gaivosa só sairia à rua nos anos de qualidade superior. Assim, depois da colheita estreante, vieram 1994 e 1995, esta última a que colocou a Gaivosa, definitivamente, “no mapa”. A seguir 1997 e 2000, todos eles elaborados a partir da vinificação conjunta das melhores parcelas desta propriedade situada na margem direita do rio Corgo, a poucos quilómetros de Santa Marta de Penaguião. Hoje com 25 hectares de vinha, já na altura havia muito por onde escolher, desde vinhedos bem antigos a mais recentes, abarcando todo o tipo de altitudes e exposição solar.

Com o 2000 encerrou-se um ciclo, para se abrir outro com o Quinta da Gaivosa 2003. Nesse ano, um esforço adicional possibilitou finalmente a vinificação isolada das pequenas parcelas, identificando as características de cada uma e selecionando com maior rigor os vinhos que viriam a fazer parte do lote final. Deste trabalho vieram também a surgir outros tintos de renome, como Vinha de Lordelo ou Abandonado, mas isso é outra história, para outro momento. Para o que agora nos interessa, bastará saber que todos os Gaivosa que se seguiram obedeceram já a um trabalho de lote a partir das barricas onde os vinhos de cada parcela descansavam sem misturas. Nasceram assim os Quinta da Gaivosa que faltam: para além do já citado 2003, também 2005, 2008, 2009, 2011, 2013, 2015, 2017 e, agora, 2019.

São 14 vinhos lançados no mercado ao longo de três décadas, não se pode dizer que tenham abusado. Entretanto, importa referir que a concorrência apertou, sobretudo a partir de 1999, quando excelentes vinhos que se tornaram referência no Douro se impuseram num mercado de topo, onde deixaram de estar apenas meia dúzia de marcas. O Gaivosa, porém, não se amedrontou nem mudou o rumo nem o estilo, assente mais na elegância do que na concentração. A família Alves de Sousa preocupou-se, isso, sim, em garantir o futuro desta e das outras marcas, sobretudo ao nível vitícola. Assim, para além da preservação das vinhas antigas, verdadeiros cofres onde o património genético das videiras é guardado e acarinhado, foram plantadas vinhas novas a partir de conceitos diversos. Grande parte da propriedade (45%) assenta em vinhas tradicionais, com as castas misturadas e idades que vão dos 45 aos 120 anos; mas existem também vinhas ao alto, patamares e aquilo a que Tiago Alves de Sousa tem devotado muito do seu tempo e paixão e a que chama “vinhas tradicionais novas”. Este modelo, que se tornou regra na Gaivosa a partir de 2014, replica as vinhas antigas procurando preservar a topografia natural da encosta, mantendo os antigos muros de xisto, com as videiras plantadas segundo as curvas de nível, em alta densidade (8.000 pés/ha), condução em Guyot duplo e mistura “organizada” das castas, com diferentes variedades co-plantadas por parcela e organizadas por linhas. Mais de 50 castas tintas e 20 brancas fazem hoje parte deste património.

Mas deixem-me, para finalizar, voltar ao Quinta da Gaivosa tinto, de onde me desviei por instantes, até porque ainda vão passar uns bons anos até as vinhas novas terem idade e estatuto para entrar na sua garrafa. Houve um terceiro ciclo na já longa história da marca, que ocorreu a partir da vindima de 2016 com a construção da nova adega. Mais e melhores condições ao nível da vinificação e estágio significam poder dar mais atenção aos vinhos que estão a fermentar nas cubas ou a estagiar nas barricas. E, sobretudo, significa não os apressar. Lançar agora o Quinta da Gaivosa tinto de 2019, quando várias prestigiadas marcas do Douro já foram “obrigadas” pela pressão do mercado a apresentar os 2020, é também uma forma de Domingos Alves de Sousa mostrar ao mundo que não tem pressa. E, na verdade, para quem faz Gaivosa há 30 anos, o tempo tem outro significado.

(PROVA VERTICAL DE REFERÊNCIAS QUE JÁ NÃO ESTÃO NO MERCADO)

18 A

Quinta da Gaivosa tinto 1992

Ano de maturação tardia, que gerou vinhos mais delicados, com menos álcool (12,5%). Estagiou em barricas de carvalho português. A evolução é notória, mas está surpreendentemente bem, notas de musgo, tabaco, balsâmicos, erva seca. Muito polido, com notável frescura de boca, cheio de equilíbrio, dá muito prazer a beber. Talvez a melhor garrafa desta colheita que bebi nos últimos anos.

19 B

Quinta da Gaivosa tinto 1995

Vindima de boas maturações, colheita precoce, um vinho que impressionou vivamente quando foi lançado. Estagiado em carvalho francês em vez do nacional, mais de duas décadas depois mantém o nível de excelência que apresentou na época, ainda com fruta no aroma, musgo, taninos presentes a dar estrutura. Muito fino, muito impactante, com belíssima frescura, um vinho histórico que, ainda hoje, continua a fazer história.

17,5 A

Quinta da Gaivosa tinto 1997

Vindima quente e concentrada, mas equilibrada. Ao contrário do que aconteceu com o 1992, esperava mais deste, sobretudo no aroma, muito balsâmico e apimentado, com bela evolução mas fruta mais apagada. Melhora muito na boca, fresco, equilibrado e apetecível.

18,5 B

Quinta da Gaivosa tinto 2000

Nevou na Gaivosa em janeiro, num ano heterogéneo, em que a natureza foi compensando frio com calor, seca com chuva. Estava tudo no ponto na vindima e o vinho revela essa fruta de excelente qualidade, ainda bem presente, bagas e morangos, notas fumadas. O equilíbrio ácido é perfeito, magnífica presença de conjunto.

18,5 B

Quinta da Gaivosa tinto 2003

O ano de estreia de Tiago Alves de Sousa na equipa de enologia foi muito quente e seco, mas a vinificação por parcela e alguma chuva em setembro permitiram esbater as agruras do clima. O vinho está belíssimo, com leves tostados, fruta muito boa, complexos balsâmicos, tabaco, alguma idade a dar complexidade tabaco. Taninos de seda, e a frescura típica da Gaivosa a equilibrar tudo.

18 A

Quinta da Gaivosa tinto 2009

Ano com dois grandes picos de calor, em agosto e setembro. Pela primeira vez, barricas usadas juntaram-se às novas. Mostra muito boa fruta madura, ainda com traços de juventude. Muita sedosidade de taninos, num registo polido, texturado, com corpo cheio, alguns amargos de esteva, amplo e envolvente.

19 B

Quinta da Gaivosa tinto 2011

Muito míldio reduziu a produção e, quando foi preciso, o verão foi ameno, com maturações lentas e preservando a acidez. A ausência de chuva fez o resto, uma vindima portentosa.  Bastante jovem, concentrado como é típico do ano, menta e esteva, um tom sisudo e austero que lhe fica bem. Um portento na boca, extremamente sólido, texturado, com taninos que nunca mais acabam, ainda a precisar de tempo para se mostrar. Seco, sério, tremendo.

18 B

Quinta da Gaivosa tinto 2015

Ano generoso na quantidade e qualidade, com vindima precoce. A barrica está evidente, mas sem excessos, um tom mais maduro na fruta, bagas e mirtilos. Bastante encorpado, concentrado e intenso, sedoso, com taninos muito redondos. Sente-se um ano quente mas o vinho tem frescura, com final amplo, pontuado por notas de fruta ácida.

Favaios: Onde reina o Moscatel

Favaios Moscatel Douro

Partimos de Vila Real e chegámos a terras de Alijó, mais propriamente a Favaios. Aqui a casta Moscatel Galego é rainha e domina a paisagem. Apesar de estarmos em plena zona demarcada do Douro, o generoso feito com Moscatel não pode ser considerado vinho do Porto. Mas não importa, o sucesso e qualidade dos moscatéis […]

Partimos de Vila Real e chegámos a terras de Alijó, mais propriamente a Favaios. Aqui a casta Moscatel Galego é rainha e domina a paisagem. Apesar de estarmos em plena zona demarcada do Douro, o generoso feito com Moscatel não pode ser considerado vinho do Porto. Mas não importa, o sucesso e qualidade dos moscatéis de Favaios fala por si.

 Texto: João Paulo Martins    Fotos: Adega Coop. de Favaios

 Este é um Douro diferente, um Douro de planaltos, um Douro pouco ou nada escarpado, uma zona que permite estender o olhar por grandes distâncias. E, o que mais se vê, são vinhas. Um verdadeiro mar de vinhas. Estas são terras altas, as tais que hoje são muito procuradas, nomeadamente para plantar cepas de uvas brancas. Entre os problemas colocados pelas alterações climáticas e a apetência cada vez mais evidente do mercado por vinhos brancos, as terras de Favaios têm tudo para ser uma zona de referência. A paisagem não engana: as vinhas são a perder de vista, todas bem perto do centro da terra. Esta proximidade é excelente para os associados da cooperativa que entregam uvas na adega; e são muitos, 500 a entregar uvas e, como nos disseram, muitos outros em lista de espera. Também o enólogo fica com o trabalho muito facilitado, uma vez que, entre a apanha dos cachos e a chegada à adega podem mediar apenas alguns minutos. Estes cooperantes dispõem de 1100ha de vinhas onde a Moscatel ocupa 620 hectares, ou seja, 2,5% de toda a área da região, mas representa 5% da produção total. Assim, além daquela variedade, existem uvas para a produção de vinhos brancos, tintos e espumantes. E ainda algum Vinho do Porto.

Favaios Moscatel DouroPode, naturalmente, perguntar-se: porquê Moscatel, e porquê aqui? Estas e outras perguntas fomos fazê-las à adega cooperativa, o grande polo vinificador da região de Favaios. Miguel Ferreira, enólogo dos vinhos generosos, ajuda na explicação, salientando a altitude que, aqui, gera condições para maturações lentas porque os estios são amenos. Amenos sim, mas com a temperatura média a aumentar; este ano foi 22ºC, quando a média anterior andava pelos 19ºC. Estamos também numa zona de boa pluviosidade, em média 1000 milímetros/ano mas este ano vitícola não passou dos 390. Curiosamente quando visitámos a adega, já em fim de vindima, chovia “a potes”, como que a dizer-nos que o futuro não era negro. “Temos então condições óptimas para brancos mas menos favoráveis para fazer vinhos tintos”, confessou Miguel.

Esta é uma zona alta, planáltica, de terrenos férteis, favorável para brancos e entre elas ganhou destaque a casta Moscatel Galego que tem várias características que se adaptam bem a este ambiente: produz bem, gera mostos com muito boa acidez, é uma variedade muito terpénica (é mesmo das poucas castas em que o sabor do bago é idêntico ao do vinho) o que torna a identificação muito fácil, mesmo em prova cega. Além destas, tem mais duas características interessantes: é resistente à seca, como ficou bem demonstrado este ano em que, apesar da falta de água, se conseguiu mais 10% de produção no Moscatel do que na edição anterior, e tem uma produção regular. A produtividade da casta tem variado entre os 5200 litros/ha em 2020 e os 6200 litros em 2022.

Para a boa produção regular muito contribuiu o trabalho de pesquisa e melhoramento da casta feito por Nuno Magalhães, um profundo conhecedor/técnico/autor, especialista em viticultura; assim, desde há 40 anos têm vindo a mudar os clones que são plantados, “não sem alguma perda da variabilidade genética” mas a produção tem-se mantido em bom nível. Hoje sabe-se que o “afunilamento clonal” é altamente negativo e é sobretudo a partir da selecção massal que agora se escolhem os garfos a plantar, assegurando assim tanta diversidade quanto possível.

Uma batalha de ontem e de hoje

A adega foi criada em 1952 e o primeiro Moscatel surgiu em 1956. Estamos, portanto, a comemorar os 70 anos da fundação. Essa foi a época da criação das adegas cooperativas, processo muito incentivado pelo Governo que, por proposta da Casa do Douro, apontava para a criação de 30 adegas cooperativas em 19 concelhos da região, em que se associassem produtores que tivessem pelo menos 10 pipas de produção. A época mais intensa de criação das cooperativas decorreu até 1964, por vezes até mais tarde, como aconteceu com a Adega Coop. de Tabuaço que só foi criada em 1993.

Os azares do generoso Moscatel remontam aos anos 30 do século passado quando, face às dificuldades que se viviam nas vendas de Vinho do Porto (que a Grande Depressão e a crise de 1929 também ajudam a explicar), se cortou o benefício nas terras mais altas (acima dos 500 metros). Favaios deixou de poder produzir Porto e, apesar da tal proibição ter sido levantada ainda nos anos 50, a verdade é que, até hoje não se faz Porto Moscatel. Porquê? Porque, ao que nos contaram, “da Câmara de Provadores do IVDP vem sempre a mesma resposta: o vinho não cheira a Porto, cheira a moscatel”. Por esta razão para os vinhos desta casta criou-se a designação Moscatel do Douro, que é demasiado vaga, como aqui nos afirmaram, uma vez que qualquer zona do Douro pode, face à lei, fazer moscatel do Douro. Essa é a batalha actual desta zona: criar a sub-região de Favaios, uma vez que as uvas daqui têm especificidades e muitas diferenças em relação às de qualquer outra zona duriense. A região tem tudo para se transformar em sub-região mas falta, ao que soubemos, mais energia na condução desse processo. Não existe uma delimitação precisa da zona de Favaios e isso seria o primeiro passo para a criação da sub-região. Também já deu entrada no Interprofissional o pedido para a produção de Moscatel Roxo, variedade que corresponde a uma mutação da Moscatel Galego, mas por enquanto ainda não é possível. Essa será também uma conquista futura.

Favaios Moscatel DouroDe tudo um pouco

A cooperativa de Favaios é muito conhecida pelo Moscatel, nomeadamente o seu Favaíto, um aperitivo de moscatel que se vende no canal HORECA, em mini-garrafas de 55 ml. O sucesso deste licoroso é tal que da linha de engarrafamento saem 25000 garrafas/hora. Para além deste vinho emblemático, a cooperativa aposta em novos produtos, como seja o espumante, aqui em duas versões. A mais ambiciosa é o Grande Reserva com estágio prolongado em cave, de que só se fazem 3000 garrafas e que é produzido com Gouveio, Arinto e Viosinho. A primeira colheita foi a de 2005. Celso Pereira, enólogo com larga experiência nas Caves Transmontanas, é o consultor para espumantes e vinhos brancos DOC; a par deste espumante, a cooperativa faz pelo método Charmat, na Bairrada, em prestação de serviços, cerca de 40000 garrafas de espumante de Moscatel.

Aqui vinificam-se 6 milhões de litros/ano dos quais 3 milhões de Moscatel, não todo para generoso uma vez que da casta se faz espumante e entra também no lote dos vinhos brancos. Fazem 1 milhão de litros de branco, outro tanto de tinto e de Porto (esta zona corresponde a letras C e D); muito do Porto produzido é vendido a granel, mas também engarrafam aqui com marca própria. O Moscatel que se faz em vinho DOC não é vendido para terceiros, é todo usado para os vinhos brancos da casa. Aos lavradores a uva é paga a 95 cêntimos/quilo, bem acima da média que outras empresas pagam na região.

De tudo o que produz, a adega exporta 20% mas mantém um elevado stock que lhe permite fazer os moscatéis com idade. Em finais de 2021 a Adega tinha 9,5 milhões de litros em stock. Foi esses vinhos que tivemos oportunidade de provar.

Assim, do Moscatel Favaios sem indicação de ano de colheita fazem-se 3 milhões de litros/ano. É elaborado todo de uma vez (usa 3 a 4 colheitas no lote). O vinho mais jovem tem pelo menos 2 anos. A ideia de 3 a 4 colheitas é para tentar fazer um lote igual todos os anos. É estabilizado pelo frio e colado e filtrado para evitar a turbidez. Têm para este vinho 10 milhões de litros em stock. Não há lei do terço (como no Vinho do Porto) no licoroso Moscatel e por isso não há limite ao que se pode engarrafar. O Moscatel Reserva 2015 vai deixar de ter indicação de ano, tal como acontece no Vinho do Porto Reserva. As uvas ficam 3 dias em maceração, um antes da fermentação e dois depois. A aguardentação é feita na cuba ainda com as massas; estagia em madeira, inicialmente balseiro velho e depois barricas onde fica um ano. Deste fazem 10 000 garrafas/ano. O Moscatel 10 anos envelhece sempre em tonel, fazem quase uma solera conseguindo-se assim uma regularidade de perfil. É um lote que está sempre a ser alimentado com o que existe e tem uma média de 15 anos de idade.

Favaios Moscatel DouroNa edição comemorativa dos 70 anos foi escolhida a melhor colheita de cada uma das décadas; o mais jovem é de 2020, depois 2011, 07, 99, 80, 75 e 64 (deste foi usado vinho engarrafado). Desta edição especial foram cheias 2000 garrafas mas metade destina-se a ser oferecida aos viticultores associados. Já do Colheita 1980 existem 8000 litros em stock de barricas e enchem-se 500 garrafas por ano.

Com tudo isto, a Adega de Favaios é uma referência absoluta nos licorosos Moscatel do Douro, sendo igualmente líder no vinho licoroso Moscatel a nível nacional. Não espanta por isso que, para muitos consumidores, a menção Favaios seja sinónimo de Moscatel.

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2022)