Sogrape declara Vintage 2022 para Porto Ferreira, Sandeman e Offley

A Sogrape fez a declaração de Vintage 2022 para a Porto Ferreira, Sandeman e Offley, as suas três casas de Vinho do Porto, depois de um ano vitícola com condições climatéricas favoráveis a uma maturação longa e equilibrada das uvas, que deram origem a vinhos cuja qualidade reflete a autenticidade e estilo de cada marca, […]
A Sogrape fez a declaração de Vintage 2022 para a Porto Ferreira, Sandeman e Offley, as suas três casas de Vinho do Porto, depois de um ano vitícola com condições climatéricas favoráveis a uma maturação longa e equilibrada das uvas, que deram origem a vinhos cuja qualidade reflete a autenticidade e estilo de cada marca, anuncia a empresa.
A região do Douro viveu um Inverno chuvoso, seguido de uma primavera e Verão amenos. Com alguma chuva em Abril e Junho, e sem ondas de calor, houve, assim, uma série de factores meteorológicos favoráveis à maturação das uvas. Em Setembro, alguns episódios de precipitação impuseram uma gestão precisa na data de colheita, de forma a garantir a qualidade pretendida em cada parcela. Luís de Sottomayor, diretor de Enologia da Sogrape, responsável pelos vinhos do Douro e Porto, assina estes três Vintages de 2022, e destaca vinhos com boa acidez, muito elegantes, que respeitam o histórico de excelência de colheitas anteriores. “O Porto Ferreira Quinta do Porto Vintage 2022 e o Sandeman Quinta do Seixo Vintage 2022 refletem a tipicidade do terroir de onde provêm”, salienta, acrescentando que “o primeiro é um vinho repleto de estrutura, profundidade e intensidade, enquanto o segundo se destaca pelo seu perfil elegante, harmonioso e complexo. O Offley Vintage 2022 também reflecte as características do ano climático, sendo um vinho com volume excepcional e estrutura assinalável”.
Para Fernando da Cunha Guedes, “mais do que um marco no tempo e de um anúncio promissor, cada declaração de vintage é a celebração do melhor que a natureza nos oferece em anos excepcionais”. Sandeman Quinta do Seixo Vintage 2022, Porto Ferreira Quinta do Porto Vintage 2022 e Offley Vintage 2022 chegarão ao mercado em Setembro.
Estudo demonstra benefício para o ambiente do uso de rolhas de cortiça

Um estudo realizado pela consultora PwC, a pedido da Corticeira Amorim, demonstrou que o impacto ambiental das rolhas de cortiça, ao longo do seu ciclo de vida, é significativamente inferior ao das screw caps de alumínio e dos vedantes de plástico. O estudo “Análise do Ciclo de Vida”, realizado de acordo com as diretrizes da […]
Um estudo realizado pela consultora PwC, a pedido da Corticeira Amorim, demonstrou que o impacto ambiental das rolhas de cortiça, ao longo do seu ciclo de vida, é significativamente inferior ao das screw caps de alumínio e dos vedantes de plástico.
O estudo “Análise do Ciclo de Vida”, realizado de acordo com as diretrizes da norma ISO 14040 e submetido, depois, a uma revisão crítica por um comité de peritos externos independentes, demonstrou que o benefício ambiental associado à rolha de cortiça Naturity® é significativamente superior ao dos outros vedantes em cinco dos sete indicadores analisados: Consumo de energia não renovável, emissão de gases com efeito de estufa, produção de resíduos sólidos, contribuição para a eutrofização das águas superficiais e contribuição para a formação de oxidantes fotoquímicos.
Realizado com base numa abordagem metodológica que considera o pior cenário possível para as rolhas de cortiça natural, o estudo apresenta conclusões particularmente relevantes num momento em que, tanto a indústria do vinho, como a sociedade em geral, estão cada vez mais conscientes da importância do uso de produtos mais ecológicos.
O resultado deste estudo vem reforçar as credenciais das rolhas de cortiça enquanto opção mais sustentável, sobretudo pelo seu contributo para a mitigação das alterações climáticas. Para António Rios de Amorim, presidente e CEO da Corticeira Amorim, o estudo “consolida, por um lado, a liderança global da Corticeira Amorim na área de I&D do segmento de rolhas e, por outro, as credenciais ambientais imbatíveis da cortiça.”
Domínio do Açor e Herdade da Cardeira: Os produtores revelação do ano

A história começou em 2020, quando um grupo de amigos brasileiros, apreciadores e colecionadores de vinho, se juntaram na ambição de encontrar uma elegância borgonhesa em Portugal. Onde iriam parar? Ao Dão, claro. A tarefa de encontrar o local certo coube a Guilherme Corrêa, experiente sommelier brasileiro há alguns anos sedeado no nosso país onde […]
A história começou em 2020, quando um grupo de amigos brasileiros, apreciadores e colecionadores de vinho, se juntaram na ambição de encontrar uma elegância borgonhesa em Portugal. Onde iriam parar? Ao Dão, claro. A tarefa de encontrar o local certo coube a Guilherme Corrêa, experiente sommelier brasileiro há alguns anos sedeado no nosso país onde já lançou vários negócios. A outrora chamada Quinta Mendes Pereira, situada em Oliveira do Conde, Carregal do Sal, foi o alvo selecionado. Rodeada de floresta, com um importante património de vinhas velhas, tinha tudo o que ambicionavam. Com o apoio de consultoria do famoso especialista de solos, o chileno Pedro Parra, e do enólogo Luís Lopes, com provas dadas no Dão, lançaram-se a criar brancos e tintos assentes na elegância, mais do que na potência. Os primeiros vinhos sob a marca Domínio do Açor nasceram em 2021 e desde logo conquistaram os apreciadores com vinhos de perfil “artesanal”, muito cuidados, e que expressam um Dão leve, fresco e vibrante como poucos.
Entre Oliveira do Conde (Carregal do Sal) e Orada (Borba) há um mundo de distância em termos de terroir e perfis de vinho. Mas a busca incondicional da excelência está sempre lá.

O projecto da Herdade da Cardeira, localizada em Orada, Borba, iniciou-se dez anos antes. Mas o casal suíço Erika e Thomas Meier levou tempo a fazer desta propriedade de 100 hectares, hoje com 21ha de vinha, aquilo que hoje é. Logo após a aquisição, Erika iniciou um curso de três anos em viticultura e enologia, e tornou-se a principal força motriz da Cardeira. O casal vê a propriedade como muito mais do que um simples investimento. É o seu espaço, o seu canto de felicidade, onde participam em todos os trabalhos que o vinho implica, da vinha à adega. A produção com a marca da casa iniciou-se apenas em 2016, contando com Filipe Ladeiras como enólogo residente e Paulo Laureano como consultor. As uvas da Cardeira, sempre vindimadas à mão, são objecto de muita seleção de modo a manter a produtividade baixa, não excedendo as quatro a seis toneladas por hectare. No total, enchem apenas 50 mil garrafas por ano, vendidas para Suíça e Luxemburgo, sobretudo, só recentemente iniciando a distribuição mais alargada em Portugal. A tremenda consistência qualitativa dos seus varietais (Verdelho e Touriga Franca) e Reservas branco e tinto, para além de um espumante e um “Talha”, impressionaram fortemente os nossos provadores. L.L.
Francisco Antunes: O enólogo do ano

Deixem-me abrir, desde já, com uma declaração de interesse: sou desde há mais de trinta anos amigo de Francisco Antunes. Talvez por isso mesmo, ele não tenha recebido mais cedo, como justamente mereceria, o reconhecimento “oficial” por parte das revistas que tive o privilégio de dirigir. A sua personalidade discreta no plano profissional (que contrasta […]
Deixem-me abrir, desde já, com uma declaração de interesse: sou desde há mais de trinta anos amigo de Francisco Antunes. Talvez por isso mesmo, ele não tenha recebido mais cedo, como justamente mereceria, o reconhecimento “oficial” por parte das revistas que tive o privilégio de dirigir. A sua personalidade discreta no plano profissional (que contrasta com a exuberância pessoal, sobretudo quando falamos/vemos futebol…) também terá contribuído alguma coisa. O “Xico”, é verdade, não se põe em bicos de pés. E também não precisa, não apenas pela sua envergadura física como pela dimensão enquanto enólogo: os seus pares têm um respeito enorme pelo Francisco Antunes e muitos “famosos” não têm problema em confessar que a ele recorrem quando se deparam com um problema técnico invulgar.
Aos 64 anos de idade, Francisco Antunes alia uma sólida base teórica (engenharia agrícola pela Universidade de Évora, Diploma Nacional de Enólogo pelo Instituto de Enologia de Bordéus, entre muitos outros “canudos”) à experiência de inúmeras vindimas em diferentes regiões. O pai, médico, era produtor de vinho em Azeitão, e ali começou a interessar-se por este mundo. A carreira profissional passou por Pegões, Extremadura espanhola e Douro, até aterrar definitivamente na Aliança (depois integrada na Bacalhôa) enquanto director de enologia, tendo aí responsabilidades em regiões tão distintas quanto Douro, Dão, Alentejo e Bairrada. Paralelamente, nunca abdicou de ensinar, tendo pelas suas turmas da Escola de Viticultura e Enologia da Bairrada passado centenas de jovens profissionais.
Porém, este não é um prémio de carreira. O que aqui destacamos é o presente, não o passado. Em 2023, fruto do trabalho, conhecimento e talento de Francisco Antunes, a Grandes Escolhas teve oportunidade de provar extraordinárias aguardentes (Aliança XO 20 e 40 anos), soberbos espumantes (Aliança Grande Reserva branco 2018 e Aliança Grande Reserva Pinot Noir branco 2018) e, talvez o mais inesperado, um notável Bairrada Bical de 2021 (Bacalhôa 1931 Vinhas Velhas) que acabámos por votar como o melhor branco do ano. Digam lá: se não fosse agora, quando seria a vez de Francisco Antunes? L.L.
Editorial Abril: Doce

Editorial da edição nrº 84 (Abril 2024) Dizem os especialistas do gosto que, dos distintos sabores primordiais, o doce é aquele que mais fácil e imediatamente cativa o ser humano. Há quem explique essa atracção (não propriamente fatal, se comedida) pelo facto de ser doce o primeiro sabor experimentado pelo recém-nascido ao beber o leite […]
Editorial da edição nrº 84 (Abril 2024)
Dizem os especialistas do gosto que, dos distintos sabores primordiais, o doce é aquele que mais fácil e imediatamente cativa o ser humano. Há quem explique essa atracção (não propriamente fatal, se comedida) pelo facto de ser doce o primeiro sabor experimentado pelo recém-nascido ao beber o leite materno. Mesmo que a relação não esteja cientificamente comprovada é, pelo menos, uma boa desculpa para os mais gulosos.
Porém, no que aos vinhos doces respeita (o que em Portugal significa quase sempre licorosos), os ventos parecem não ir de feição. Em grande parte do mundo assiste-se a um certo afastamento dos consumidores relativamente aos vinhos doces, atingindo mesmo os não fortificados, Sauternes incluído. Até o vinho do Porto, que parecia imune à erosão de mercado sentida por muitos dos outros célebres congéneres (caso do Jerez, por exemplo), entrou numa lenta, mas inexorável, decadência de consumo, perdendo 20% em volume nas últimas duas décadas. Em 2023, de novo, caiu em quantidade e valor face ao ano anterior. No vinho Madeira essa tendência é menos evidente, mas existe: de 2022 para 2023, decresceu em quantidade, ainda que ganhando muito ligeiramente em valor. Paradoxalmente, é o mais doce (e, porventura, o mais subvalorizado) de todos os fortificados nacionais, o Moscatel de Setúbal, tema de capa desta edição da GE, que melhor se tem “aguentado”. Partindo embora de uma base muito mais pequena, nas últimas duas décadas quase duplicou o volume certificado. E as vendas mostram uma certa estabilidade, com crescimentos moderados. O que não deixa de espantar, se pensarmos que mais de 90% do negócio é feito em Portugal. E, mais interessante ainda, ao invés do que acontece com Porto e Madeira, o consumo em território nacional é feito sobretudo por portugueses, não por turistas estrangeiros. Já agora, comportamento muito semelhante tem o Moscatel do Douro, este com uma fatia um pouco maior de exportação. Significa isto que os portugueses são particularmente gulosos?
Dizia a minha avó (e aposto que muitas avós) que o que é doce nunca amargou. Eu nunca fui por aí. Prefiro os amargos, ácidos e salgados, um pastel de nata de quando em vez já é extravagância. Mas se o aforismo estiver certo, a verdade é que os grandes licorosos do mundo, de uma forma geral, não estão a ganhar muito com isso, antes pelo contrário. Resumindo, o que parece doce e é doce, está na mó de baixo. Mas, estranhamente, o que não parece doce e é doce, continua em alta e sem indícios de perder a boa onda. A esmagadora maioria dos vinhos tintos (portugueses, espanhóis, italianos, franceses, chilenos, argentinos, etc.) de preço moderado e médio, vendidos na Europa, Ásia e Américas, tem uma quantidade apreciável de MCR (mosto concentrado rectificado) adicionada. Ou seja, são, enfim, a modos que…docinhos.
Nada contra, é absolutamente legal e, quase diria, necessário, vai ao encontro do que o mundo pede, ou melhor, exige. E atenção, não são só os consumidores “de supermercado”, supostamente menos “conhecedores”, que os adoram. Muitíssimos destes vinhos são crónicos vencedores de concursos internacionais, onde são provados por sommeliers, enólogos, jornalistas, e ali batem concorrentes bem mais ambiciosos. Assim sendo, talvez o problema dos doces e licorosos não esteja, afinal, na doçura. A minha avó tinha outra na manga para estas ocasiões: “todo o burro come palha, é preciso saber dar-lha”.
Editorial Março: Os Melhores

Editorial da edição nrº 83 (Março 2024) Quando se fala de vinhos, poucas coisas haverá mais discutíveis do que reduzir aromas e sabores a um número. Mais difícil ainda será partir de uma lista com idênticas classificações e escolher um vinho em detrimento de outro. Para sermos, tanto quanto possível nestas circunstâncias, justos, na Grandes […]
Editorial da edição nrº 83 (Março 2024)
Quando se fala de vinhos, poucas coisas haverá mais discutíveis do que reduzir aromas e sabores a um número. Mais difícil ainda será partir de uma lista com idênticas classificações e escolher um vinho em detrimento de outro. Para sermos, tanto quanto possível nestas circunstâncias, justos, na Grandes Escolhas procuramos que esta responsabilidade seja partilhada entre todos os provadores, através de uma eleição. Mas mesmo assim não é fácil. E no final, é mais do que certo, ninguém sai satisfeito. Nem os produtores que não viram os seus vinhos destacados como “os melhores” (seja lá o que isso for…); nem os provadores que não obtiveram “votos” suficientes nos vinhos que propuseram e defenderam.
Apenas duas coisas acalmam, de alguma forma, os naturais desapontamentos (pelo menos, os nossos). Primeiro, a noção de que fizemos tudo para sermos rigorosos, independentes, justos; segundo, a absoluta certeza de que, quer os 30 vinhos eleitos como “os melhores do ano”, quer os cinco apontados como vencedores em cada categoria, são indiscutivelmente grandíssimos vinhos. Adjectivo que se ajusta por inteiro aos nomes vencedores: o espumante Murganheira Assemblage Grande Reserva 2006, o branco Bacalhôa 1931 Vinhas Velhas Bical 2021, o rosé Quanta Terra Phenomena 2022, o tinto Quinta do Crasto Vinha Maria Teresa 2019 e o fortificado Dalva Tawny 50 anos.
Se destacar vinhos grandes entre os grandes tem sempre uma elevada subjectividade, esse grau multiplica-se quando se trata de avaliar pessoas, empresas, instituições.
A reunião anual da redacção para escolher “Os Melhores”, espaço onde cada um apresenta as suas propostas, depois submetidas a debate e votação, é sempre o momento mais tormentoso do ano. As discussões são épicas e duram horas. A coisa fica tão feia que, normalmente, organizamos o jantar de Natal da empresa nessa mesma noite, na esperança de que o espírito natalício e umas belas garrafas de vinho promovam as reconciliações. Normalmente, resulta.
O mais importante é que, quando na noite dos Melhores do Ano subimos ao palco para anunciar os nomes vencedores, cada um de nós assume essa escolha colectiva como sua e defende-a intransigentemente.
Mais uma vez, e como acontece com os vinhos, como seria possível de outra forma, face à qualidade dos premiados? Senão vejamos. No que à gastronomia respeita, este ano pontificam os restaurantes Pedro Lemos, Três Pipos e Soão, todos eles referência no seu estilo de cozinha, a loja gourmet Comida Independente, que com poucos anos de vida já deixou marca, e a historiadora e investigadora Isabel Drumond Braga, com importante obra feita na área. No retalho e serviço de vinhos, três nomes incontornáveis: o wine bar Mind The Glass, a garrafeira Imperial e o talentoso sommelier Filipe Wang. Wine in Moderation e Algarve Wine Tourism são outros conceitos/projectos em evidência. Quanto a produtores, destacamos as boas surpresas do Domínio do Açor e da Herdade da Cardeira, a singularidade de Baías e Enseadas, a consistência da Adega Cooperativa de Ponte de Lima, a ambição da Menin Wine Company, o pioneirismo da Barbeito e a excelência clássica da Fundação Eugénio de Almeida. Na vinha e na adega, há que “tirar o chapéu” a Álvaro Martinho Lopes, Manuel Henrique Silva e Francisco Antunes. E, por fim, grande aplauso para um autêntico Senhor do Vinho, António Soares Franco.
Foram as escolhas certas? Cada qual que decida. Foram as nossas escolhas e estamos muito satisfeitos com elas.
Editorial Fevereiro: 35 Vindimas

Editorial da edição nrº 82 (Fevereiro 2024) Nascido e criado no meio urbano, a primeira vez que assisti a uma vindima já era jornalista encartado, quase cinco anos a coordenar revistas de computadores e automóveis todo-o-terreno, entre outras. Tinha 28 anos feitos quando, por dever de ofício (íamos lançar uma publicação de vinhos) vi entrar […]
Editorial da edição nrº 82 (Fevereiro 2024)
Nascido e criado no meio urbano, a primeira vez que assisti a uma vindima já era jornalista encartado, quase cinco anos a coordenar revistas de computadores e automóveis todo-o-terreno, entre outras. Tinha 28 anos feitos quando, por dever de ofício (íamos lançar uma publicação de vinhos) vi entrar uvas numa adega.
Parece que foi ontem, mas já passou muito tempo. Cumpri no ano que passou a minha 35ª vindima. Não foram vindimas a fazer vinho, nem nada que se pareça. Não possuo a formação necessária e, ao contrário de alguns, acredito que para fazer vinho com qualidade e consistência é preciso ter conhecimentos técnicos e científicos. Também, confesso, não tenho especial interesse em “meter as mãos na massa”. Se algum dia podei cepas, colhi uvas, pisei lagares, lavei prensas, trasfeguei depósitos e vasilhas, foi unicamente para perceber como se fazia, não porque tivesse grande vontade de o fazer.
Uma coisa faço, porém, com enorme prazer pessoal e empenho profissional. Em cada uma dessas 35 vindimas percorro dezenas de adegas, procurando acompanhar de perto aqueles que sabem do seu mister, totalmente focado em ver, ouvir, perguntar, aprender. E, dois ou três meses mais tarde, faço questão de provar os vinhos nas cubas e barricas.
Ter boa memória ajuda. Lembro-me dos primeiros brancos fermentados com temperaturas controladas, revelando um mundo novo de aromas e sabores a enólogos e consumidores, maravilhados com tanta fruta. Lembro-me da chegada da barrica nova ao estágio de tintos e fermentação de brancos, e daquelas baunilhas, tostas e fumos que nós, inocentemente, associávamos a vinhos luxuosos. Lembro-me de dezenas de produtores, apostados em fazer vinhos de maior qualidade, a abandonar auto-vinificadores, cubas de cimento, tonéis de madeira, talhas de barro, lagares, prensas verticais (e hoje a recuperar tudo isso…). Lembro-me de passar dias no Dão a provar vinhos brancos sem ouvir mencionar a casta Encruzado. Lembro-me de estar uma semana no Douro, a visitar quintas, e ninguém me apontar uma vinha velha como sendo algo de especial. Lembro-me de como se fazia a selecção dos vinhos base para espumante, com as amostras dos lavradores alinhadas, a passarem no crivo do chefe de cave, “este serve, aquele não serve”. Lembro-me dos ciclos de amor e ódio à Trincadeira, no Alentejo, e de como estes alternavam entre os anos quentes e secos e frescos e húmidos. Lembro-me de ter aterrado na Bairrada em pleno levantamento das “forças vivas” contra a Baga e dos muitos que queriam substituí-la, definitivamente, por Cabernet Sauvignon. Lembro-me de um orgulhoso produtor do Tejo me mostrar um Fernão Pires com 17 graus acabadinho de fermentar. Lembro-me de estar à beira de um tegão de recepção, ainda Lisboa era “Estremadura, conhecida por Oeste”, e durante uma vindima de chuva inclemente o reboque largar as uvas numa nuvem de pó cinzento que cobriu tudo. E o enólogo ter de fazer (e fez mesmo) um vinho decente com aquilo.
Enfim, lembro-me de muitos, muitos mais momentos e conversas na azáfama da colheita que não cabem ou não é próprio mencionar aqui. Lembranças de 35 vindimas significam, é claro, que não vou para mais novo. Essa é a parte má. A parte boa é o prazer de cruzar o histórico acumulado com a prova dos vinhos, sabendo de onde vieram, como nasceram e cresceram, que decisões foram tomadas, relacionando assim inúmeras variáveis. Acreditem, é um exercício entusiasmante que suscita intensa reflexão e de onde surgem, por vezes, conclusões interessantíssimas. De tal modo que, ainda os cestos estão a lavar, e já anseio pela 36ª vindima. Tenho coisas para aprender e dúvidas para esclarecer.
Editorial Janeiro: Fama

Editorial da edição nrº 81 (Janeiro 2024) A chegada de amadores (no sentido daquele “que ama”) ao sector do vinho é relativamente recente, o fenómeno teve o seu “boom” já no século XXI. Gente financeiramente bem-sucedida noutras áreas de actividade, mas completamente desconhecida do grande público, viram nesta bebida uma forma de satisfazer um hobby […]
Editorial da edição nrº 81 (Janeiro 2024)
A chegada de amadores (no sentido daquele “que ama”) ao sector do vinho é relativamente recente, o fenómeno teve o seu “boom” já no século XXI. Gente financeiramente bem-sucedida noutras áreas de actividade, mas completamente desconhecida do grande público, viram nesta bebida uma forma de satisfazer um hobby e, ao mesmo tempo, alimentar o ego de forma saudável. Quem pode ser criticado por gostar de ver o seu nome (ou da sua empresa) no rótulo de uma garrafa? E, com sorte e trabalho, alcançar os ambicionados “15 minutos de fama”?
Mais difíceis de entender serão as razões que levam alguém que já tem dinheiro e espaço nos media a enveredar pelo mundo do vinho. Apesar de glamouroso, o vinho nunca poderá competir com a notoriedade que se alcança enquanto profissional do cinema, da música ou do desporto, por exemplo. Nunca ninguém rico e famoso vai ficar mais famoso por investir no vinho. E vai, quase de certeza, ficar menos rico.
Apesar disso, pessoas a quem pediríamos autógrafos na rua continuam a entrar neste universo vínico, bem mais pequeno e limitado do que aquele de onde vieram. Os exemplos são incontáveis e surgem, sobretudo, dos Estados Unidos da América (mas não só) com gente do cinema à cabeça. Francis Ford Coppola foi pioneiro com a sua marca, em 1979, (em Napa Valley, depois Sonoma, mais tarde Oregon) e o que mais longe chegou no ultrapassar dos naturais preconceitos dos “conhecedores”, tornando-se um produtor de vinho bastante respeitado enquanto tal. Muitos outros e outras o seguiram: George Lucas (Skywalker Vineyards – só podia… – em 1991) Drew Barrymore, Emilio Estevez, Sam Neil, Cameron Diaz, Brad Pitt, Angelina Jolie, Kurt Russell, Goldie Hawn, Antonio Banderas e, até o hoje tão discutido – pelas piores razões – Gérard Depardieu, são apenas alguns dos nomes da sétima arte que possuíram ou possuem adegas e vinhas, nos EUA, Espanha, França, Itália ou Nova Zelândia. Do mundo da música, Cliff Richards (que teve a Adega do Cantor no Algarve), será o exemplo mais próximo. Mas também Dave Matthews, Mary Blige, Brandi Carlile, Mick Fletwood, Kylie Minogue, Sting, Pink e Snoop Dogg fazem parte da lista. Lista essa que se estende ao desporto, com o basquetebolista Yao Ming, o piloto Mario Andretti, os golfistas Nick Faldo e Greg Norman e os futebolistas David Ginola, Ronaldo “Fenómeno” e Andrés Iniesta, entre vários.
Como já perceberam pela capa desta revista, abordo o tema por causa de Francisco Costa, o Costinha do futebol. Quando nos cruzámos pela primeira vez, há quase duas décadas, já Costinha era um apreciador de vinhos, gosto que ganhou no Mónaco, para onde foi jogar com 20 e poucos anos. Hoje, é um profundo conhecedor do que de melhor se faz em Portugal e no mundo. E também um pequeno produtor que participa activamente em todo o processo, na vinha e adega, e engarrafa um vinho de excelência.
Chegados a este ponto, talvez percebamos melhor o que é que o vinho tem, capaz de atrair ricos e famosos a este mundo tão particular. Não é certamente a razão que os move, antes o coração. A paixão, o prazer da descoberta, a exaltação dos sentidos, não coisas que se expliquem. O vinho tem tudo isso e Costinha sabe-o bem.
PS: A peça sobre o novo desafio de Costinha foi a última escrita nesta revista pela jornalista Mariana Lopes. Também ela troca de profissão, mas, felizmente, mantém-se ligada ao mundo vínico. O seu talento vai agora estar do “outro lado”, onde o vinho nasce. No seu lugar, a partir da edição de Fevereiro, coordenando a redacção da Grandes Escolhas, estará o experiente jornalista José Miguel Dentinho, com muitos anos de escrita nesta área. A ambos desejo muita sorte e sucesso.