A importância dos copos

Já lá vão os dias em que qualquer enófilo se arriscava a ir a um restaurante com ambições, pedir um bom vinho e descobrir copos com bojos (ou corpo) de meio balão ou em V. Mais ainda, em casa dos enófilos passou-se um fenómeno semelhante, graças sobretudo à informação que foi passando para o público […]

Já lá vão os dias em que qualquer enófilo se arriscava a ir a um restaurante com ambições, pedir um bom vinho e descobrir copos com bojos (ou corpo) de meio balão ou em V. Mais ainda, em casa dos enófilos passou-se um fenómeno semelhante, graças sobretudo à informação que foi passando para o público e também pela facilidade com que é possível adquirir copos em qualquer grande superfície, com preços para todas as bolsas.
Mas, afinal, tanto copo porquê? Que fascínio exerce o copo nos amantes do vinho? E será que vale a pena gastar dinheiro em copos de qualidade?

Os bons copos fazem a diferença?

Esta é de facto a pergunta do milhão de euros. E, para a responder, nada melhor do quer fazermos uma prova de… copos. São já famosas estas provas, que podemos assistir em alguns eventos de vinhos. Recordo-me de ter ficado estarrecido com a primeira que fiz, já lá vão quase duas décadas. O condutor da prova, um francês que trabalhava com os copos da marca austríaca Riedel, ia-nos pedindo para passarmos os vinhos de uns copos para outros. E depois bastava cheirar e provar. As diferenças eram enormes, especialmente as que separavam os bons copos de vinhos dos modelos vulgares que existiam (e existem) em cafés e restaurantes de poucas ambições. Lembro-me de, na altura, me prometer repetir esta prova, mas desta vez usando de um maior cepticismo, para evitar possíveis sugestões do condutor da prova. E na verdade, ao longo dos anos, repetia esta prova mais três ou quatro vezes.. E a conclusão era sempre a mesma: um copo adequado é fundamental à correcta fruição do vinho.
O enófilo não emborca vinho, degusta-o. Aprecia-o. Desfruta dele.

A técnica dos copos: cheiros e sabores

Para se calcular a influência do copo nos aromas, temos que compreender que, segundo vários especialistas, diferentes aromas ocupam diferentes espaços do copo, consoante a sua densidade. Por exemplo, a parte superior do copo fica com os aromas mais ligeiros (flores e fruta); no meio ficam os aromas de pendor vegetal e mineral, como os terrosos e cogumelos; finalmente, no fundo do copo estão os aromas mais pesados, como o álcool e a madeira. Diferentes copos separam assim os aromas de formas diversas. E, a menos que agite o vinho no copo, diferentes copos fazem realçar diferentes características de determinado vinho.
Vamos agora aos sabores, percebidos pelos sensores que temos na boca.

Ora, desde logo a forma do copo condiciona a posição da nossa cabeça durante a prova. Isto tem também influência na posição de entrada do vinho na nossa boca e na sua chegada aos sensores, como a língua e o palato. Como acontece com a comida ou outras bebidas, os gostos do vinho podem ser separados em vários sabores de base: doce, ácido, amargo e salgado. Ao condicionar a forma da chegada do vinho à boca, o copo de vinho pode fazer realçar uma determinada característica do vinho. Por exemplo, um copo destinado aos brancos ligeiros e frutados de grande acidez, como um Alvarinho ou um Riesling, deve conduzir o vinho para a borda da língua, onde são acentuados os sabores doces (frutados) e diminuir o carácter ácido.

Copos de vinho

Como comprar um copo de vinho?

Primeiro, verifique se o copo tem gravações ou entalhes de qualquer espécie. Isso, e hastes coloridas, são normalmente sinal de copos antigos. A menos que goste muito, passe à frente. Depois, olhe para o copo contra a luz. Deve ser transparente, do cálice até ao pé. Se mostrar laivos esverdeados, isso significa que esse copo é feito com vidro de baixa qualidade. Passe à frente.
Outro sinal de menos qualidade é o bordo do copo arredondado, como se tivesse um micro-pneu a toda a volta. Algumas marcas dizem que é um toque de segurança, mas, na verdade, é uma forma de poupar dinheiro no fabrico. Os bons copos têm o bordo cortado quase recto, como se cortados com uma tesoura.

 

Alguns enófilos aconselham ainda a ouvir o copo. Bata no copo, mais ou menos a meio do bojo, com o nó do dedo ou com uma rolha: se o som resultante, quase como um sino, durar vários segundos, é bom sinal. Quanto mais, melhor. Se a pancada apenas dar um ligeiro som metálico, estes enófilos dizem para passar à frente. Nós não somos tão exigentes….

Mas somos, isso sim, escrupulosos com o sentir do copo nas mãos. Copos muito pesados e/ou desequilibrados tornam-se rapidamente desagradáveis. Por outro lado, a base do copo deve ser estável e estar praticamente ao mesmo nível da parte mais larga do bojo. A haste deve ser o mais fina possível, mas sem comprometer a robustez do copo.
Refira-se que as principais marcas no mercado nacional possuem várias gamas de copos. Os mais caros são feitos à mão por operários especializados, enquanto as versões mais baratas são produzidas com recurso a máquinas. Os melhores vidros/cristais ficam, como é óbvio, nos copos feitos à mão.

Que podemos esperar para o futuro?

Quanto ao futuro dos copos, tanto Ralf Schmidt (gestor da Schmidt-Stosberg) como Joaquim Cândido da Silva, (director-geral da Portfolio Vinhos), acreditam que vai na direcção de unidades cada vez mais leves, mais elegantes, mas, ao mesmo tempo, mais resistentes. Esta tendência para copos de vinho cada vez mais finos vai de encontro ao gosto dos enófilos, que procuram uma elegância de manuseamento que os outros copos não conseguem. O problema está na sua fragilidade. Considerando que alguns deles custam acima dos 50 euros a unidade (como os Zalto, modelo Denk`Art), partir um copo destes é uma dor d’alma.
Ambos os executivos acreditam ainda que o preço dos melhores copos deverá baixar nos próximos anos, graças a avanços na mecanização.

Tenho falta de espaço: o que fazer?

Muitos enófilos não têm hoje espaço de armazenamento para vários copos diferentes. Se tivermos em conta que cada modelo terá que ser multiplicado pelo potencial número de comensais, mais umas folgas para as quebras, e passamos a falar de largas dezenas de copos. Nos curtos apartamentos de hoje, não há espaço. Ou seja, muitos enófilos são obrigados a escolher um copo de vinho tinto e um de branco. Os copos de tinto poderão servir também para brancos de Inverno, com fermentação/estágio em madeira; e os copos de branco poderão servir para espumantes e vinhos licorosos.

Onde comprar?

Nos dias que correm não é difícil encontrar bons copos de vinho a preços sensatos. Os melhores exemplares são normalmente encontrados nas lojas especializadas, como as garrafeiras. Tem ainda a vantagem de quase sempre obter atendimento especializado e poder ‘brincar’ com os copos antes de os comprar. O único contra é que aqui os copos são quase todos topo-de-gama e, portanto, de boa qualidade, mas infelizmente mais dispendiosos.

As marcas não são muitas: em Portugal dominam a Schott Zwiesel (líder de mercado), Riedel (ou a sua subsidiária Spiegelau) e mais algumas marcas alemãs, francesas e italianas. A germânica Stölzle, uma das maiores do mundo, está agora a entrar no mercado nacional e em várias garrafeiras. Os preços têm uma gigantesca amplitude: desde o simples euro até às dezenas, por cada unidade. Os copos de cristal feitos à mão são os mais caros.

Vale a pena investir em bons copos? A resposta é um inequívoco ‘sem dúvida’: não é um capricho de enochato, é antes, tão simplesmente, senso comum.

Duas perguntas a Joaquim Cândido da Silva

Director-geral da Portfolio Vinhos, empresa que distribui, desde há alguns amos, a marca de copos Riedel, Joaquim está no mercado de vinhos há algumas décadas e assistiu à sua evolução (e à dos copos).

Copos de Vinho
©Anabela Trindade

Em termos de copos, o que aconteceu em Portugal nas últimas décadas?
A evolução do copo está profundamente ligada à evolução da qualidade dos vinhos: hoje os vinhos são muito mais complexos e exigem um copo onde se consigam expressar (…). Tudo isto é, desde há muitos anos, o lema da Riedel, “o conteúdo determina a forma!”.
Que aconselha para quem tenha pouco espaço?
“Para o espectro dos vinhos portugueses, a Riedel tem 2 ou 3 referências que cobrem uma larga maioria dos vinhos: o copo Riesling para a grande maioria dos brancos e o copo de Touriga Nacional (que resultou de uma escolha alargadíssima de produtores portugueses), não só para os vinhos desta casta como para vinhos de lote de várias castas tintas”.

Duas perguntas a Ralf Schmidt

É o gestor da empresa Schmidt-Stosberg, importadora da marca de copos Schott Zwiesel. Desde 2000 que a marca é parceira na feira Vinhos & Sabores (antes, Encontro com o Vinho), organizada anualmente por esta revista em Novembro. São milhares de copos envolvidos durante três dias.

Copos de vinho

Conte-nos como foi o primeiro Encontro com o Vinho…
Foi em 2000, na Gare Marítima de Alcântara. Fiz um acordo com a organização: levava os copos, vendidos juntamente com o bilhete de entrada. Estimava-se que venderíamos, no máximo, 500 copos. Mas, à cautela, levei mil. E três horas antes de fechar o primeiro dia, estava quase sem copos… Havia de facto apetência para os bons copos.

O ano passado, a Schmidt-Stosberg fez duas acções de copos com uma grande cadeia de retalho. Como correu?
As acções correram muitíssimo bem. Cada €160 de compras permitia comprar dois copos a €2,99. Se asa compras fossem de 320 euros, os dois copos eram oferecidos. Até a minha mulher comprou copos (risos). Fornecemos mais de 2 milhões de copos da Schott Zwiesel.

 

Edição Nº22, Fevereiro 2019

 

A Poda

O Inverno chegou, com ele o adormecimento vegetativo da videira. É tempo de podar e começar a preparar a próxima colheita. A quantidade, e a sempre consequente qualidade da uva (e vinho), dependem desta operação. TEXTO João Afonso A poda Consiste no corte de total ou parcial dos ramos (pâmpanos) da videira. Existem dois tipos […]

O Inverno chegou, com ele o adormecimento vegetativo da videira. É tempo de podar e começar a preparar a próxima colheita. A quantidade, e a sempre consequente qualidade da uva (e vinho), dependem desta operação.

TEXTO João Afonso

A poda
Consiste no corte de total ou parcial dos ramos (pâmpanos) da videira. Existem dois tipos de poda: a poda lenhosa, feita habitualmente nos meses de Janeiro e Fevereiro e que regulariza o crescimento vegetativo e produtivo da planta; e a poda em verde que se realiza na Primavera e se destina a retirar os ramos “ladrões”, (que tiram “força” à planta) e abrir a copa da videira permitindo o seu arejamento e melhor exposição solar das folhas e dos cachos de uva. A poda mais importante é a lenhosa.

A poda e a produção de uva
O número de gomos deixados pela poda lenhosa devem estar aferidos à capacidade vegetativa da planta e à quantidade de produção de uva. Uma carga de gomos excessiva resulta no enfraquecimento da planta e numa produção excessiva e com dificuldades futuras de maturação (e qualidade). Pelo contrário uma carga de gomos insuficiente vai favorecer o vigor vegetativo da planta em detrimento da produção de uva. Uma poda correcta e equilibrada é muito importante para o equilíbrio e qualidade da colheita.

A técnica de poda
Um bom podador identifica com facilidade os vários tipos de ramos da videira (do ano anterior ou mais velhos, ou os chamados ramos ladrões) e executa a tarefa com destreza e rapidez. O tempo de poda por planta é importante para a contabilização dos custos de produção de uva.

Requisitos de poda
Nas grandes áreas de vinha utilizam-se equipamentos que fazem a pré poda (corte mecânico das hastes da videira) para que posteriormente um rancho de podadores munidos de tesouras manuais ou eléctricas executem com maior rapidez a operação. É ainda importante desinfectar lâminas de corte da tesoura de videira para videira, de modo a evitar a transmissão de doenças.A poda lenhosa é a operação mais importante da viticultura. Além de permitir a formação da planta jovem, possibilita nas plantas formadas definir a qualidade e quantidade da produção de uva, assim como gerir a longevidade da videira.
A poda controla o vigor da planta e ajuda a equilibrar a relação entre produção de lenha (ramos e folhas) e fruta. Permite ainda definir convenientemente a exposição solar da superfície foliar da copa e dos frutos da videira. Por tudo isto, a poda é uma tarefa importantíssima e fundamental na produção de uva e vinho.

(*agrónomo, responsável de viticultura da Real Companhia Velha)

Edição Nº21, Janeiro 2019

 

A Bâtonnage

Bâtonnage é o termo francês que traduz o mexer ou agitar das borras, em depósito no fundo de um determinado recipiente. Esta agitação põe de novo em suspensão as borras, que, ricas em aminoácidos e com um relativo poder redutivo, vão melhorar o gosto e textura do vinho. TEXTO João Afonso Prática Antiga O romano […]

Bâtonnage é o termo francês que traduz o mexer ou agitar das borras, em depósito no fundo de um determinado recipiente. Esta agitação põe de novo em suspensão as borras, que, ricas em aminoácidos e com um relativo poder redutivo, vão melhorar o gosto e textura do vinho.

TEXTO João Afonso

Prática Antiga
O romano Marcus Cato (234 a 149 AC), na sua famosa obra “De agri cultura”, já aludia a importância do contacto do vinho com as próprias borras.

Borras boas e Borras más
Devem considerar-se dois tipos de borras: borras grossas, que além de leveduras contêm grainhas, pedaços de película de uva, poeiras e outros elementos sólidos; e borras finas, que contêm maioritariamente leveduras e colóides.
Enquanto as primeiras são indesejáveis à boa evolução do vinho ou mosto, as segundas desempenham um papel importante na complexidade e afinamento do produto final, em particular no caso dos vinhos brancos.

O Segredos das Borras
As leveduras têm um período de vida curto. Quando morrem depositam-se no fundo do recipiente, libertando bases nitrogenadas de aminoácidos. Este processo de degradação proteica e libertação de aminoácidos é um dos principais agentes na melhoria das características sápidas do vinho em contacto com as borras finas.

Como e quando?
A agitação ou batimento de borras é feita periodicamente, com um bastão (daí o nome), e a sua periodicidade varia consoante a enologia, região ou clima do ano. Desde aplicar a bâtonnage logo após o início da fermentação alcoólica até alguns meses após a sua conclusão, tudo é aceitável. A periodicidade depende do tipo de equilíbrio pretendido.

Onde?
Preferencialmente em barrica. Mas a bâtonnage é também utilizada em cubas de inox e outros recipientes de fermentação e estágio. Nas cubas de inox há que ter em conta o forte poder redutivo deste vasilhame, que se irá somar ao poder redutivo das leveduras.

Uso só nos brancos. Nos tintos fiz em tempos ensaios em vinhos do Douro e, apesar de ter ficado contente com os resultados, a posteriori percebi que os vinhos tendiam a decair com o tempo em garrafa. Faço bâtonnage para conseguir mais corpo e textura de boca. No Esporão faço sempre bâtonnage no Private Reserva e nas barricas do Esporão Reserva (30% barrica do lote), sobre as borras finas de fermentação. Começo por fazer duas vezes por semana, nas semanas a seguir à vindima, e depois passo para uma vez por semana até ao fim de Novembro, quando normalmente páro com a operação.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]

Edição Nº20, Dezembro 2018

 

Aparas & Outros

A evolução do gosto pelo vinho tem desenvolvido um singular apreço pelas notas aromáticas e gustativas de madeira de carvalho. Em substituição das barricas de carvalho (por vezes demasiado caras) surgiram os chamados “Alternativos”. TEXTO João Afonso Função dos Alternativos As madeiras desenvolvidas para enologia têm como fim modular o perfil organolético do vinho ao […]

A evolução do gosto pelo vinho tem desenvolvido um singular apreço pelas notas aromáticas e gustativas de madeira de carvalho. Em substituição das barricas de carvalho (por vezes demasiado caras) surgiram os chamados “Alternativos”.

TEXTO João Afonso

Função dos Alternativos
As madeiras desenvolvidas para enologia têm como fim modular o perfil organolético do vinho ao gosto “a madeira” e também corrigir alguns defeitos provenientes de deficiente maturação das uvas ou decorrentes dos processos de vinificação e estágio.

Tipos de Alternativos
No mercado estão disponíveis Pós de Madeira, que se usam habitualmente durante a fermentação alcoólica; Aparas, a usar entre ou após as fermentações alcoólica e maloláctica; e Aduelas, de uso aconselhado apenas após a fermentação maloláctica.

Acção Melhoradora dos Alternativos
Os produtos de madeira não tostadas têm as vantagens de ser antioxidantes, de eliminar mercaptanas (compostos com odores sujos e pesados) e de aumentar o sabor doce e a estrutura e volume de prova, assim como a intensidade de fruto, além de melhorar e fixar a cor dos vinhos tintos. Os produtos de madeira tostada, além das vantagens mencionadas, eliminam ainda aromas herbáceos ou vegetais e melhoram a complexidade aromática e gustativa dos vinhos.

Alternativos Sim ou Não?
Claro que sim. Presentemente são uma ferramenta essencial para a enologia na produção de vinhos, sobretudo de médio e grande volume. Há inúmeros mercados que exigem vinhos baratos e com mais ou menos gosto a madeira. O contrário também acontece: alguns mercados chegam a exigir uma declaração do enólogo em como o vinho nunca esteve em contacto com madeira.
Mas os alternativos, quando bem usados, podem fazer toda a diferença. Uso “Pós” durante a vinificação. Depois da vinificação, aparas ou cubos, que são aduelas cortadas em pedaços com maior superfície de contacto do que as aduelas. Para vinhos de qualidade média/média alta, as aduelas quando têm muita qualidade (vindas de madeira bem seca e bem tostada) e são acompanhadas com a micro-oxigenação, podem fazem um trabalho notável.

Edição Nº19, Novembro 2018

Maturação da Uva

As vindimas chegaram. Colhem-se uvas maduras para a produção de diferentes tipos de vinho. Cada viticultor deve escolher o seu momento óptimo de maturação e vindima. TEXTO João Afonso A Maturação Inicia-se depois de a uva tomar cor (fim do pintor) e tem duração variável. Depende muito do clima da região, ou do ano, e […]

As vindimas chegaram. Colhem-se uvas maduras para a produção de diferentes tipos de vinho. Cada viticultor deve escolher o seu momento óptimo de maturação e vindima.

TEXTO João Afonso

A Maturação
Inicia-se depois de a uva tomar cor (fim do pintor) e tem duração variável. Depende muito do clima da região, ou do ano, e do tipo de vinho que se pretende fazer ou ainda da filosofia enológica do produtor. Durante a maturação o bago aumenta de volume, aumenta a sua concentração de açúcares e perde acidez e taninos. No caso da uva tinta, a quantidade de matéria corante também aumenta durante a maturação.

A Maturação e o Vinho
A prioridade dos vários itens de maturação varia com o clima. Em regiões frias de difícil maturação, a acumulação de açúcares é determinante para decidir a vindima. Pelo contrário, em regiões quentes, um bom nível de acidez – que decai por vezes repentinamente na parte final da maturação – pode ser determinante para decidir o dia da colheita. No caso dos vinhos tintos a maturação fenólica, ou seja, a procura de taninos maduros e macios, pode condicionar o dia de vindima.

A Sobrematuração
Nas regiões mais quentes, e principalmente com a ocorrência de noites tropicais (mais de 20ºC), pode passar-se muito rapidamente da fase de maturação para a fase de sobrematuração, com as uvas a perderem rapidamente acidez e aromas e a ganharem açúcar e grau provável. É necessário estar atento!

Quando hoje se fala de vindimar as uvas com maturação fenólica perfeita, os meus ouvidos ouvem “vindimar uvas sobremaduras”. As vinhas modernas produzem primeiro o álcool e depois a maturação “fenólica”… por isso na enologia moderna esta maturação é tão importante e o enólogo tem que esperar por ela, observando a acidez a cair a pique e o álcool a subir dramaticamente. Toda a viticultura moderna parece estar fixada em produzir muito e muito grau, o que nos nossos tempos não faz sentido nenhum.
Sempre gostei de vinhas velhas, há um certo equilíbrio entre o “tirar” e o “dar”. Nestas vinhas a maturação surge primeiro e só depois o grau. É possível fazer vinhos leves com 11% Vol. com boa maturação e boa acidez.
A acidez (boa acidez, natural, equilibrada) é a coluna vertebral de qualquer vinho. Procuro vinhas que tenham uma maturação lenta e uma acidez natural boa, e procuro vindimar na altura certa uvas maduras mas ainda com boa acidez. A prova das uvas é fundamental, é ela que decide, as análises só ajudam.
IN VINO VERITAS. Viva a frescura. The incredible lightness of being…

Edição Nº18, Outubro 2018

 

A Rega da Vinha

É Verão. As plantas têm sede, a vinha é regada. Até há poucos anos a vinha era uma cultura de sequeiro. Hoje, podemos considerar que é uma cultura de regadio. Stress Hídrico A falta de água provoca na videira um stress hídrico que, em casos extremos, pode dificultar o correcto amadurecimento das uvas, provocando mostos […]

É Verão. As plantas têm sede, a vinha é regada. Até há poucos anos a vinha era uma cultura de sequeiro. Hoje, podemos considerar que é uma cultura de regadio.

Stress Hídrico
A falta de água provoca na videira um stress hídrico que, em casos extremos, pode dificultar o correcto amadurecimento das uvas, provocando mostos desequilibrados que requerem maior ou menor correcção antes de iniciarem o processo fermentativo. Para uvas de grande qualidade procura-se que a videira passe por algumas horas diárias de stress hídrico moderado durante a fase de maturação. É nas horas de maior calor que a videira estará sujeita a este stress hídrico.

Rega de Precisão
O desenvolvimento das técnicas de irrigação modernas permite aos viticultores monitorizar com grande rigor a dotação de água à cultura da vinha. Procura-se facilitar o ciclo vegetativo nas suas várias fases. Hoje, podemos quase afirmar que existem técnicas de irrigação para as várias gamas e preços de vinho. Têm em conta a superfície foliar da sebe, as castas, o tipo de solo, o débito do gotejador etc, etc.

Câmara de Pressão de Sholander
Uma das técnicas mais eficazes para avaliar o stress hídrico das videiras é medir a pressão estomática nas folhas, através da Câmara de Pressão Sholander. Esta medição é feita a horas pré-determinadas do dia. Estes resultados, interligados com os vários factores que geram stress hídrico (evapotranspiração, potencial de base etc.), permitem disponibilizar dotações de água muito próximas do que a planta precisa para gerir um stress hídrico de acordo com os objectivos de qualidade do produtor.

Os Puristas e o Terroir
Contudo, conseguimos ainda encontrar produtores de vinho que renegam a rega da vinha, uma cultura milenar que até há poucos anos nunca necessitou de qualquer dotação humana de água para produzir todos os vinhos que fizeram a história da nossa civilização.

Acidez volátil

A acidez volátil é defeito ou virtude? É esta primeira questão que se coloca quando se aborda este parâmetro que mede a concentração de ácido acético no vinho que bebemos e apreciamos. Bactérias acéticas e Acidez Volátil A acidez volátil é formada por várias estirpes de bactérias acéticas que, em contacto com o oxigénio, degradam […]

A acidez volátil é defeito ou virtude? É esta primeira questão que se coloca quando se aborda este parâmetro que mede a concentração de ácido acético no vinho que bebemos e apreciamos.

Bactérias acéticas e Acidez Volátil
A acidez volátil é formada por várias estirpes de bactérias acéticas que, em contacto com o oxigénio, degradam (oxidam) o álcool do vinho em acetaldeído e o acetaldeído em ácido acético, água e dióxido de carbono.

Ácido acético e Acetato de etilo
A formação do ácido acético, com o característico aroma balsâmico a vinagrinho, é sempre acompanhada pela formação de acetato de etilo com aromas de cola, acetona e verniz. O primeiro, em quantidades moderadas, pode ser favorável ao sabor final do vinho, contribuindo com grande frescura, enquanto que o segundo prejudica quase sempre o resultado final.

Uma doença do vinho
A degradação do vinho por bactérias acéticas é considerada pela enologia como uma doença da qual é necessário proteger o vinho feito. A protecção faz-se com assepsia ou elevado nível de higiene, ausência de contacto de oxigénio com o vinho feito e níveis confortáveis de sulfuroso livre.

Limites máximos de Acidez Volátil
A União Europeia permite um máximo de 1,2 gramas de ácido acético por litro de vinho. No caso dos vinhos generosos este máximo sobe para 1,5 g/l e com derrogação (que decorre da justificação do produtor) pode subir aos 1,8 g/l.

A Acidez Volátil e o Vinho
Normalmente, a quantidade de acidez volátil num vinho seco bem feito e devidamente protegido situa-se entre os 0,4 e os 0,6 gr/l; contudo, podemos encontrar vinhos com valores bastantes superiores sem que a qualidade do conjunto seja colocada em causa.

Marcas famosas e acidez volátil
Os tintos mais famosos de Espanha e da Austrália, respectivamente o Vega Sicilia e o Penfolds Grange, vangloriam-se da elevada acidez volátil dos seus vinhos, sendo que são dois dos tintos mais caros do planeta.Nos brancos não quero ter acidez volátil excessiva. Também não vejo qualquer vantagem em ter uma volátil elevada nos tintos de gama baixa. Nestes casos, não há qualquer mais-valia. Mas no caso dos tintos topo de gama, com vários meses ou anos de barrica antes do engarrafamento, a acidez volátil um pouco elevada, em torno dos 0,8 ou 0,9 gramas por litro, pode ser muito vantajosa porque oferece complexidade e frescura balsâmica ao vinho em causa.

*Enólogo

Leveduras

Um dos temas favoritos do jornalismo enológico. Leveduras naturais ou selecionadas? – esta é a pergunta recorrente. FOTOGRAFIA: Sogrape Vinhos As Leveduras As leveduras são fungos. Conhecem-se algumas centenas espécies de leveduras, distribuídas por algumas dezenas de géneros. Encontram-se não apenas no bago das uvas mas também no solo, ar, patas dos insectos… etc. Há […]

Um dos temas favoritos do jornalismo enológico. Leveduras naturais ou selecionadas? – esta é a pergunta recorrente.

FOTOGRAFIA: Sogrape Vinhos

As Leveduras
As leveduras são fungos. Conhecem-se algumas centenas espécies de leveduras, distribuídas por algumas dezenas de géneros. Encontram-se não apenas no bago das uvas mas também no solo, ar, patas dos insectos… etc. Há leveduras favoráveis e outras indesejáveis ao fabrico do vinho. Estas últimas podem ser causa de desvios graves. A espécie Saccharomyces cerevisiae é o principal agente da fermentação alcoólica (cerveja, pão…).

Leveduras e Vinho
Estas leveduras só produzem álcool (fermentação alcoólica) na ausência de oxigénio. O seu desempenho não se limita à produção de álcool, mas também ao desenvolvimento das componentes aromáticas do vinho. Esta capacidade levou a biotecnologia moderna a selecionar, desenvolver e produzir leveduras secas activas (LSA) para uso enológico.

Leveduras Selecionadas
As LSA podem ser selecionadas e cultivadas a partir da flora indígena de uma determinada região, promovendo desta forma as castas e a tipicidade dessa mesma região. A diversidade de oferta de leveduras selecionadas no mercado é grande e adapta-se a qualquer tipo ou perfil de vinho: permitem “desenhar” o vinho, com mais aroma, com um determinado tipo de aroma (tiol, terpénico…), mais fresco, mais leve, ou mais estruturado e macio, vinhos das várias gamas etc., etc.

Leveduras e “Terroir”
Coexistem na enologia moderna duas filosofias de vinificação distintas que se ligam aos dois grupos principais de leveduras. Os que defendem a utilização de “leveduras nativas” (naturais, indígenas), que à partida expressam o “terroir” (vinha/clima do ano/solo/castas), e os defensores das “leveduras seleccionadas”, que procuram fruto e expressão máxima da(s) casta(s) e preferem não ariscar a colheita…

Em lotes de vinho acima de 10.000 litros e em uvas compradas das quais desconheço o tipo de tratamento fitossanitário, ou calculo que houve tratamentos fitossanitários mais intensos, uso de preferência as leveduras selecionadas de estirpes nacionais. Mas para lotes pequenos ou especiais de vinho utilizo as leveduras nativas. Procura-se hoje cada vez mais vinhos personalizados e com carácter e as leveduras naturais expressam-no melhor do que as leveduras selecionadas.

* Produtor e enólogo

Edição Nº14, Junho 2018