Vinhos Leves: Quando o simples sabe bem

Os Vinhos Leves, na região de Lisboa, surgiram no século passado, por necessidade, devido à viticultura da época. Hoje, a categoria solidifica-se nos vinhos regionais e é representada por vinhos aromáticos, leves, descomplicados, perfeitos para usufruir nestes dias mais quentes. TEXTO Valéria Zeferino O mundo já conhece vinhos com este perfil há muito tempo, basta […]
Os Vinhos Leves, na região de Lisboa, surgiram no século passado, por necessidade, devido à viticultura da época. Hoje, a categoria solidifica-se nos vinhos regionais e é representada por vinhos aromáticos, leves, descomplicados, perfeitos para usufruir nestes dias mais quentes.
TEXTO Valéria Zeferino
O mundo já conhece vinhos com este perfil há muito tempo, basta lembrar os Rieslings da Alemanha na sua versão mais simples. A existência dos vinhos leves na região de Lisboa deveu-se, inicialmente, à dificuldade de amadurecimento das uvas, associada a vários factores como a forte influência atlântica e humidade elevada, sobretudo em certas zonas menos protegidas; e também solos férteis e castas menos nobres e altamente produtivas, incluindo alguns híbridos, criados na Estação Agronómica de Dois Portos na década de 1950.
Os mostos com um teor alcoólico baixo, que não chegavam aos 11% fixados como o limite mínimo para os vinhos “comuns”, obrigavam os produtores fazer lotes com outros vinhos de maior graduação, ou simplesmente adicionar álcool ou aguardente vínica. Para resolver esta questão, o Ministério da Agricultura através da Portaria 547/85 de 6 de Agosto, autorizou a produção de vinhos de grau mais baixo, devendo estes conter na rotulagem a menção “vinho leve” ou “baixo grau”. Esta medida, na altura, não estava relacionada com a região de produção.
Mais tarde, com a Portaria n.º 351/93 de 24 de Março, a menção tradicional “Leve” ficou associada, em exclusivo, às regiões de Lisboa (antiga Estremadura) e Tejo (antigo Ribatejo). A menção destinava-se a vinhos regionais com grau até 10% e acidez mínima de 4,5g/l. Devido à evolução das condições edafoclimáticas da região de Lisboa, em 2018 o limite máximo do título alcoométrico volúmico adquirido do vinho com direito à menção Leve foi aumentado em 0,5% até os 10,5%.
O primeiro Vinho Leve Regional Estremadura foi produzido sob a marca Sôttal pela Companhia Agrícola do Sanguinhal e, segundo o seu director comercial Diogo Reis, queria dizer “eu sou o tal” do Sanguinhal. A marca já existia antes, desde os anos 20 e 30 do século passado, sendo utilizada para diversos vinhos.
Inicialmente, os Vinhos Leves eram brancos e tintos. O tempo e as preferências do mercado vieram a corrigir o estilo. Enquanto os se tintos procuram encorpados, os rosés começaram a ganhar terreno.
De acordo com os dados da CVR Lisboa “o crescimento exponencial das vendas nos últimos 5 anos (duplicaram, chegando em 2019 a 56 milhões de garrafas), em especial dos vinhos tintos que representam 75% da produção da região, levou os produtores, a orientarem as suas produções de tintos para vinhos “não leves”.
Ao mesmo tempo “as preferências dos consumidores e a própria avaliação dos críticos de vinho que reconhecem no branco leve e rosé leve uma mais valia qualitativa, o mesmo não sucedendo com o tinto”, levaram os produtores a fazer as suas escolhas a favor de brancos e rosés.
Dos 126 engarrafadores de vinhos de Lisboa presentes actualmente no mercado, cerca de 20 produzem Vinho Leve. As vendas de Vinho Leve têm-se mantido estáveis ao longo dos anos, variando entre 2 e 3 milhões de garrafas por ano. A maior parte é comercializada nas grandes superfícies (80%), tendo também uma boa presença na restauração local e alguma exportação.
O Presidente da CVR Lisboa, Francisco Toscano Rico, nota que o volume de produção e consequentemente das vendas, está fortemente condicionado pelas condições climatéricas, sendo que o aumento das temperaturas leva a que cada vez seja mais difícil produzir mostos com um grau alcoólico tão baixo. Ou seja, o potencial produtivo desta categoria de vinho está logo à cabeça condicionada pela própria natureza, não se perspectivando que no futuro este cenário se venha a inverter.
Ao mesmo tempo, nota-se uma melhoria substancial no nível qualitativo destes vinhos, contribuindo para isso a vindima no momento certo e a escolha de castas mais nobres. O próprio branding tem melhorado muito entre alguns produtores que apostam neste segmento, com rótulos que comunicam muito bem a ideia de “vinho leve”, transmitindo a sua essência na imagem.
Como se faz um Vinho Leve?
Os vinhos leves muitas vezes são feitos de castas aromáticas, como Moscatel Graúdo ou Fernão Pires, se bem que esta última é mais difícil de colher atempadamente, com teor alcoólico mais baixo.
Miguel Móteo, enólogo da Companhia Agrícola do Sanguinhal, conta que na utilização de Moscatel esta casa foi uma das primeiras. Na região de Lisboa, a casta é bastante produtiva o que leva a nunca atingir os valores elevados de maturação em termos de açúcar, mantendo-se nos níveis de 9-10%. O facto de ser vindimado mais cedo, penaliza um pouco a parte aromática, o que é compensado pela maceração com películas. Diz que quando se fermenta o Moscatel, “a adega parece um laboratório de perfume”. O Moscatel contribui com 50% do lote e para o Vinho Leve vindimam as uvas de certas parcelas, pois do outro lado da Serra de Montejunto já é mais quente e as maturações sobem. O Arinto amadurece lentamente e mantém a frescura. Entra com 40% e na altura da vindima para Vinho Leve tem 8 g/l de acidez. Vital é uma casta com mais corpo. Matura bem e desidrata facilmente devido à pelicula fina. É melhor para os vinhos DOC, por isto só entra em 10% no lote.
Carlos Nicolau, da Casa Agrícola Nicolau confessa que a casta Moscatel não foi a primeira opção. Aconteceu mesmo uma história engraçada. Como muitas casas agrícolas na chamada “região Oeste”, a Casa Agrícola Nicolau também tem produção frutícola. Plantaram a casta Moscatel, que também é apreciada como uva de mesa, a pedido de um parceiro seu. Mas só se conseguiu vender uma vez, pois as uvas eram pouco doces. A partir daí, foram redireccionadas para produzir o vinho leve (e com sucesso) já há cerca de 20 anos.
Outras castas da região, como Arinto, Malvasia Rei, Jampal, Seara Nova, Vital, Tamarez e outras também entram nos lotes de acordo com a preferência de cada produtor.
O vinho é feito como se fosse uma base para espumantes: fermenta até ficar seco e depois acrescenta-se o mosto concentrado para o fazer ligeiramente mais doce. O nível de doçura não está indicado pela regulamentação e fica à consideração do produtor. Costuma variar entre 10 e 17 g/l, compensados e equilibrados pela acidez sempre bem elevada.
É óbvio que com o grau de álcool baixo e com açúcar residual, o vinho tem de ser bem estabilizado microbiologicamente através de processos térmicos, filtrações rigorosas e adições de conservantes como DMDC ou sorbato de potássio para evitar o crescimento de microorganismos. Cabe ao produtor adaptar a técnica mais adequada para o seu caso.
Os Vinhos Leves não são todos iguais. Para além das castas utilizadas, com ou sem maceração pelicular, varia o nível de acidez, a sensação de gaseificação (no Mundus nota-se muito menos, do que no Solar da Marquesa, por exemplo, onde as bolhas vão subindo do fundo do copo a lembrar um espumante). A maior parte dos vinhos fermenta em cubas de inox, mas o Mundus Evolução da Adega da Vermelha tem um toque de madeira para conferir alguma complexidade ao vinho.
3 razões para repensar o Vinho Leve
Um vinho que abre o caminho para o mundo dos vinhos
Este tipo de vinho faz muito mais pelo vinho do que possamos pensar. É uma alternativa a refrigerantes e até à cerveja junto dos consumidores na faixa dos 20+ anos. É uma introdução ao mundo do vinho, mais adaptada ao paladar mais jovem. Há quem não goste de cerveja por ser amarga, mas um vinho simples, aromático, com uma ligeira doçura e um bocadinho de gás até vai muito bem. Não é um vinho que obrigue a um grande exercício sensorial, mas cumpre a sua missão de ser agradável e proporcionar um momento de socialização, quando é bem-feito e servido bem fresco à volta de 8-10˚C. É um vinho também leve para carteira, não ultrapassando os €4 PVP, e também acessível na restauração.
Um vinho adequado para uma vida saudável
Tem uma gradução alcoólica mais baixa do que os vinhos “não leves”, não ultrapassa os 10,5%, situando-se maioria dos Vinhos Leves entre os 9 e 10%, o que o torna bem menos calórico do que o habitual.
Um vinho flexível que desafia preconceitos
Gostar de vinho não é só beber vinhos caros de produtores famosos ou mais bem pontuados. Um verdadeiro enófilo não marginaliza nenhum tipo de vinho e sabe beber um vinho adequado a contextos diferentes. Quando vamos à praia, levamos um fato de banho e não um vestido de noite ou smoking. Numa esplanada junto à piscina quem consegue apreciar devidamente um Porto Vintage, por exemplo? O Vinho Leve parece que foi desenhado para estes momentos descontraídos e de socialização.
O Vinho Leve à mesa
Sendo leves e equilibrados, tornam-se autosuficientes numa esplanada ao pé da praia ou piscina. Ideal para uma conversa descontraída, fazem companhia sem atrair muita atenção. Entretanto, podem acompanhar umas entradas simples, como umas tostas barradas com um paté, humus ou guacamole, sushi ou marisco. Uma pizza havaiana que inclui pedaços de ananás é outra aposta segura. Comida indiana ou chinesa, que contém especiaria ou alguma doçura no sabor funciona sempre muito bem.
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Artigo da edição nº40, Agosto 2020
Anselmo Mendes: “Vinho Verde é a grande região de brancos de Portugal”

Anselmo Mendes é um nome muitíssimo respeitado junto de apreciadores e críticos nacionais e estrangeiros e, talvez mais significativo ainda, entre os seus pares, enquanto produtor e enólogo. Conhecedor profundo do sector do vinho, tem uma visão clara e objectiva sobre as suas múltiplas vertentes, da viticultura à enologia, passando pela economia, identidade regional ou […]
Anselmo Mendes é um nome muitíssimo respeitado junto de apreciadores e críticos nacionais e estrangeiros e, talvez mais significativo ainda, entre os seus pares, enquanto produtor e enólogo. Conhecedor profundo do sector do vinho, tem uma visão clara e objectiva sobre as suas múltiplas vertentes, da viticultura à enologia, passando pela economia, identidade regional ou modelos de sustentabilidade. Falámos de tudo um pouco com o “senhor Alvarinho”, sem esquecer, é claro, o tema que mais mexe com ele: a Quinta da Torre e a região de Monção e Melgaço.
TEXTO Luís Lopes
FOTOS Hugo Pinheiro
AS ORIGENS
Nascido numa família de agricultores, a lavoura, a vinha, o vinho, eram para ti uma inevitabilidade? Alguma vez equacionaste seguir outro caminho?
Por um lado, era inevitável, pois em criança o meu sonho era ser agricultor. Contrariamente aos jovens da minha geração que queriam fugir da agricultura, e para quem trabalhar na construção civil já era ter mais estatuto. O meu fascínio pela forma como as plantas cresciam e se comportavam levou-me a decidir bem cedo rumar a Lisboa para estudar Agronomia.
Realmente, até poderia ter ido para medicina, mas ser agrónomo era o objectivo. E foi em Agronomia que o meu interesse pelos vinhos cresceu e me levou a escolher Agroindústrias e todas as disciplinas opcionais relacionadas com Enologia.
Como era a vinha e o vinho em Monção e Melgaço na segunda metade dos anos 80, quando concluíste a tua formação académica? Nessa altura pensavas em voltar para a origem?
Na segunda metade dos anos 80, a área de vinha da casta Alvarinho não chegava a um terço da actual. Havia muito mais minifúndio e um fraco conhecimento sobre as mais adequadas formas de condução da vinha. O vinho engarrafado com alguma notoriedade estava confinado à Adega Cooperativa de Monção e ao Palácio da Brejoeira que eram, na verdade, as locomotivas da casta Alvarinho.
Nessa altura tive um convite para trabalhar na sub-região e não aceitei, pois não estava preparado para tal e tinha acabado de entrar para uma empresa, a Sociedade dos Vinhos Borges, onde pensava aprofundar os conhecimentos sobre vinhos.
A tua primeira relação profissional a sério foi intensa e duradoura: dez anos na Borges, assumindo a viticultura e enologia de uma das maiores empresas do sector. Quais os principais ensinamentos que recolheste dessa experiência?
Em primeiro lugar aprendi o que é a cultura de empresa, sua missão e valores. Desenvolvi projectos de vinhas, de adega e mesmo trabalhos científicos e experimentais em colaboração com Universidades. Mas muito importante foi trabalhar em equipa com multidisciplinaridade, onde entravam para além da área técnica, as áreas comercial, marketing, gestão e financeira.
Conheci grandes profissionais, administradores vindos das mais diversas áreas e também fiz muitos amigos. Costumo dizer que a Borges foi uma grande escola, onde também se aprende aquilo que não se deve fazer.
“Uma vinha sustentável deve ter excelente relação produção/qualidade para que possa também ser sustentável economicamente.”
Para além do trajecto na Borges, enquanto consultor ajudaste a criar, de raiz, projectos vitivinícolas de grande notoriedade, como o da Quinta da Gaivosa, um dos pioneiros do Douro moderno. Que desafios se colocavam a quem, em 1991, queria fazer uma empresa centrada no vinho do Douro numa região quase exclusivamente orientada para o vinho do Porto?
Os meus três primeiros anos de Borges foram intensos. Estudava e experimentava tudo o que era tecnologias de vinificação e confesso que tinha bases sólidas de Química, Microbiologia, Bioquímica, Fisiologia, etc. Tive a felicidade de frequentar cursos de formação profissional em Bordéus, fiz pós-graduação em Enologia, e na Viticultura bebi durante muitos anos os ensinamentos do Professor Rogério de Castro.
O desafio na Quinta da Gaivosa era fazer ensaios no quase desconhecido, ainda por cima no Baixo Corgo, na época considerado de baixo potencial vínico. Na altura já dominava razoavelmente a utilização do frio e do calor, a extracção selectiva e a utilização de estágio em barricas e isso foi-me muito útil. Na Gaivosa, foram 22 anos a seleccionar parcelas, estudar pontos óptimos de maturação, afinar vinhos pela elegância. Aprendi muito e dei muito de mim e do meu conhecimento. Tenho imenso orgulho em ter ajudado a construir um projecto que foi, e é, marcante para o Douro.
A tua actividade de consultoria levou-te a trabalhar em quase todas as regiões vinícolas de Portugal. Quais foram aquelas que mais te surpreenderam, revelando qualidades que não esperavas?
Numa primeira fase, final dos anos 80, princípio dos anos 90, o Douro surpreendeu-me pela diversidade, em relação às vinhas velhas, às diferentes altitudes e exposição. Lembro-me bem de conversas com Jorge Dias [ex-professor na UTAD e actual director geral da Gran Cruz] em que dizíamos convictamente que teria de haver uma revolução no Douro DOC, o Douro “não Porto”. Felizmente ela aconteceu e está para durar. No ano de 1998 foi lançado o projecto Lavradores de Feitoria onde participei na execução e no primeiro ano de enologia. Dirk Niepoort mostrou interesse em alguns vinhos destas quintas e a administração ligou-me preocupada porque não sabia o que fazer. Então disse-lhes: isso é muito bom! Convidem-no para accionista. E assim aconteceu.
Na primeira metade dos anos 90, o Dão fez-me pensar. A cada ano era surpreendido, percorria a região com o saudoso Magalhães Coelho [enólogo que apoiou muitos vinhos de quinta no Dão], homem de muita sensibilidade e saber. Alguns vinhos que encontrávamos eram de tal finura e elegância que influenciei a Borges a comprar a Quinta da Aguieira. Mais tarde, em 2004, iniciei uma experiência própria no Dão, em S. João de Areias, e em 2015 apostei na Quinta de Silvares onde os vinhos mostram elevado potencial. Mas isto só não chega e no final de 2019, em conversa com o amigo Luis Abrantes, dono da Quinta da Alameda (onde cheguei a comprar vinhos para a Borges), decidimos fazer uma parceria no sentido de transformar a Alameda numa marca de referência do Dão. Acho que desta vez o Dão vai finalmente assumir uma importância relevante no meu trabalho.
“Boas vinhas com floresta precária, é um modelo que não garante equilíbrio nem ordenamento paisagístico.”
E que regiões achas que estão ainda longe de expressar todo o potencial que têm guardado?
Sem dúvida alguma, Beira Interior e Trás os Montes. São regiões com muitas vinhas velhas de alta qualidade, intervenção mínima, castas desafiantes e diferenciadoras…têm tudo para dar certo.
Escolhe uma ou duas castas para cada região onde trabalhas ou trabalhaste: Douro, Vinho Verde, Monção e Melgaço, Alentejo, Dão, Beira Interior, Bairrada, Lisboa, Açores.
Douro: Touriga Franca e Tinta Amarela; Vinho Verde: Loureiro e Avesso; Monção e Melgaço: Alvarinho e Alvarelhão; Alentejo: Alicante Bouchet e Arinto; Dão: Touriga Nacional e Encruzado; Beira Interior: Síria e Rufete; Bairrada: Baga e Cercial; Lisboa: Viosinho e Cabernet Sauvignon; Açores (Terceira): Verdelho e Verdelho Roxo.
A VITICULTURA
Os enólogos da geração anterior à tua raramente sujavam as botas na vinha. Tu tens com a viticultura uma relação muito estreita e até, diria, invulgar, em termos de conhecimento e comprometimento. Dizer que o vinho nasce na vinha é dizer o óbvio, mas, no teu caso, qual o verdadeiro significado dessa expressão?
O vinho nasce bem na vinha desde que se cumpra um conjunto de requisitos: fazer a escolha certa do terreno; escolher as castas/porta enxerto adaptadas e a densidade adequada às condições de solo e clima; criar condições para eficiente colonização subterrânea e aérea; fazer a gestão do vigor, fertilização e intervenção em verde; trabalhar o arrelvamento e melhoria da estrutura do solo; regular a produção em função do vinho pretendido; avaliar as parcelas e sua diferenciação; fazer a triagem dos cachos na vinha e não na adega. Ou seja, o vinho nasce bem na vinha se dominarmos por inteiro as operações vitícolas e juntarmos um pouco de “feeling”…
A viticultura sustentável está hoje na ordem no dia, recolhendo a atenção de produtores e consumidores, mas muitas vezes colocando no mesmo saco coisas distintas: sustentabilidade, orgânico, biodinâmico, etc. O que é, para ti, uma vinha sustentável e amiga do ambiente?
Desde logo, sustentável é uma vinha que, na sua concepção, tenha no mínimo 10% de matas com árvores de folha persistente e caduca. Uma vinha sustentável terá de seguir um modo de produção que preserve e melhore a estrutura do solo (produção integrada em regiões mais atlânticas e, se for viável, orgânico em clima continental e altitude). Deve ser adoptada rega com o objectivo de uma forte e profunda colonização subterrânea pelas raízes, de modo a poupar água no futuro, dar maior estabilidade à planta e proporcionar frutos de maior equilíbrio e qualidade.
Uma vinha sustentável deve minimizar o uso de fitofármacos, adoptando a prevenção por métodos integrados de avaliação online dos riscos de doenças. Deve ser utilizado arrelvamento para melhorar a estrutura do solo e fertilização recorrendo a consociação de gramíneas e leguminosas, minimizando o uso de adubos químicos. Os herbicidas devem ser evitados ou limitados a uma pequena faixa na linha. Finalmente, uma vinha sustentável deve atingir excelente relação produção/qualidade para que possa também ser sustentável economicamente. Só faz viticultura sustentável quem dominar o conhecimento agronómico e tenha consciência ecológica, social e económica.
“Se a sub-região de Baião fizesse parte da região do Douro, hoje seria o terroir de excelência dos brancos durienses…”
No caso concreto do Vinho Verde, como avalias as mudanças ocorridas na viticultura ao longo da última década? Quais os aspectos positivos e negativos? E que modelo defendes para a viticultura do futuro da região?
Na região dos Vinhos Verdes, a grande maioria das mudanças ocorridas nos últimos 10 anos foram sem dúvida positivas: a área média da vinha aumentou, as castas plantadas estão bem adaptadas, o melhoramento genético destas é evidente e a condução e intervenção em verde melhorou. Um ponto negativo, é o assentar dos tintos da região numa única casta: o Vinhão.
Defendo os aspectos acima referidos para a sustentabilidade futura da viticultura dos Vinhos Verdes. Mas há um ponto fundamental: a paisagem envolvente das vinhas tem de melhorar. Boas vinhas com floresta precária, é um modelo que não garante equilíbrio nem ordenamento paisagístico. A nossa floresta, a floresta da região Vinhos Verdes, é um desastre!!!
Nas várias regiões onde trabalhas deparas-te com muitas variedades de uva, castas tradicionais, castas portuguesas que vieram de outras regiões e castas internacionais. Em todo o mundo há regiões “fechadas” e regiões “abertas” nesta matéria. Como encaras esta questão? Tens uma posição genérica ou cada caso é um caso?
Em Portugal, o nosso conhecimento das regiões e dos vinhos ainda não atingiu a maturidade. Ainda continuamos à procura do perfil certo. Temos um problema que só o tempo resolverá: aumento do preço médio que permita remunerar bem a fileira do vinho. A partir daí, poderemos serenamente construir perfis de vinho com originalidade baseados na diversidade e adaptabilidade das nossas castas. De uma forma global temos de encontrar para cada região um perfil próprio que seja competitivo internacionalmente pela originalidade. Por vezes, a demasiada diversidade de castas e estilos dentro de cada região torna-nos pouco competitivos.
Desde há muito que investigas, experimentas e fazes vinho com a casta Alvarelhão. Muitos consumidores ouviram falar nela pela primeira vez através dos teus vinhos. O que é que vês no Alvarelhão?
O Alvarelhão ou Brancelho não é uma casta fácil na vinha ou na adega. Tem tendência ao desavinho e é muito sensível ao míldio e oídio. Na adega, apanha com facilidade aromas redutores. Mas tem atributos muito positivos: um grande equilíbrio ácido, taninos finos e aromas elegantes e distintos. Aceita com classe o estágio em barricas de carvalho francês e envelhece muito bem em garrafa. É uma casta de que gosto mesmo muito.
A uva Alvarinho resolveu viajar, saiu do vale do Minho e está hoje espalhada por todo o Portugal, do Douro ao Algarve. Tu próprio, a tens usado noutras paragens. Que principais diferenças encontras no comportamento da casta em regiões como Bairrada, Lisboa, Alentejo ou até noutras sub-regiões do Vinho Verde, face a Monção e Melgaço?
A casta Alvarinho dá-se muito bem perto do Atlântico da Bairrada e Lisboa. Aí, em solos argilo-calcários perde acidez e ganha salinidade. Os aromas são menos florais e ganham mais tropicalidade. Mas no Alentejo prefiro o Arinto…
Na região dos Vinhos Verdes, a Alvarinho atinge um bom equilíbrio na sub-região de Basto, mas nas sub-regiões mais atlânticas dos Verdes perde corpo e ganha algum desequilíbrio ácido. A virtude em Monção Melgaço é ter clima temperado de influência atlântica moderada e solos com boa retenção da água. Deste modo, os vinhos têm equilíbrio, corpo e mineralidade. Mas os aromas cítricos com florais só aparecem em alguns solos de excelência.
VALE DO LIMA E OUTROS VALES
Vamos deixar para mais tarde a tua região estrela, Monção e Melgaço, e falemos de uma outra onde também tens apostado bastante, o vale do Lima. É muito diferente do vale do Minho, não é verdade? O que procuras ali?
O Lima difere do Vale do Minho por ter clima temperado de influência atlântica mais evidente. Os solos de origem granítica têm textura franco-arenosa com baixa capacidade de retenção da água. A casta Loureiro está ali muitíssimo bem adaptada, originando vinhos com aromas intensos, florais e cítricos, e uma acidez firme que lhes permite muito boa longevidade. No fundo, é intensidade, elegância, frescura e longevidade o que procuro (e encontro!) nos brancos do Vale do Lima.
Há três décadas já se falava de Alvarinho com respeito, mas o Loureiro só em tempos relativamente recentes ganhou estatuto de casta e vinho de categoria superior. Achas que o Loureiro do Lima poderá vir a ter, globalmente, a qualidade, notoriedade, longevidade, preço, do Alvarinho de Monção e Melgaço?
Estou absolutamente convicto de que o Loureiro tem potencial para lá chegar. Mas o vale do Lima precisa de mais operadores focados na qualidade, precisa de investidores e precisa de tempo, que é o factor mais limitante neste negócio.
“Neste País as medidas são lentas e a agricultura não tem peso para os decisores. Na hora da verdade, abandonam-nos.”
E como vês a ascensão do Avesso?
O Avesso tem pela frente os mesmos desafios do Loureiro, mas precisará de ainda mais tempo para se afirmar como casta e vinho, em Portugal e no mundo. Mas o potencial está todo lá. Se a sub-região de Baião fizesse parte, em termos de denominação de origem, da região do Douro, hoje toda a gente olharia para ela como o terroir de excelência dos brancos durienses…
O PERFIL DOS VINHOS VERDES
Na região dos Vinhos Verdes coexistem vários estilos de vinho mas, de forma simplista, podíamos arrumá-los em dois perfis: “leve, doce, com gás, barato” e “intenso, frutado, seco, ambicioso”. Dois perfis que são, quase se pode dizer, dois modelos de negócio distintos ainda que possam ser complementares. Qual a melhor forma de gerir/organizar/comunicar uma região com estas características?
Não é nada fácil gerir tudo isto, é verdade, pois em alguns mercados Vinho Verde é sinónimo de vinho barato. Nos mercados menos maduros, já senti que a região tem um tecto de preço. E a verdade é que nos últimos 30 anos tenho dispensado muito tempo a desconstruir alguns dos preconceitos e dogmas relativos ao Vinho Verde.
De qualquer forma, a imagem dos Vinhos Verdes tem melhorado muito, e hoje já há a percepção, por parte dos conhecedores, de que é a grande região dos brancos de Portugal. Fazer chegar esta mensagem ao consumidor menos atento é uma questão de tempo e de investimentos de comunicação/marketing bem pensados, direccionados e executados.
São cada vez mais os Verdes de grande qualidade e ambição. No entanto, esse crescimento qualitativo tem sido quase sempre acompanhado pelo crescimento do teor alcoólico, para níveis (13%, 13,5%…) impensáveis há uma década. É inevitável? Ou é possível fazer um grande vinho Verde branco com 11% ou 11,5%?
Eu gosto dos Loureiro perto dos 12% de álcool e os Alvarinho entre os 12,5% a 13%. É possível, sem dúvida, fazer grandes brancos com 11% ou 11,5%, mas abaixo disso, nesta região dos Vinhos Verdes, dificilmente teremos um vinho equilibrado.
E o Verde tinto, que futuro?
Em Monção e Melgaço com viticultura de excelência e as castas Alvarelhão, Pedral e Verdelho Feijão, estou certo de que podemos fazer tintos finos, elegantes e com capacidade de envelhecimento. Na restante região dos Vinhos Verdes, não tenho experiência suficiente de vinhos tintos para poder emitir uma opinião bem fundamentada. Mas parece-me óbvio que o Verde tinto tem de encontrar um rumo e um perfil.
A ENOLOGIA
Como te defines enquanto enólogo?
Como enólogo sou um insatisfeito, ando sempre à procura da perfeição. E a perfeição, para mim, significa exprimir de forma autêntica e séria o chamado “terroir”.
Em Monção e Melgaço, fazer um Alvarinho de perfil tropical (manga, maracujá) ou de perfil citrino (laranja, tangerina) é questão de viticultura ou enologia?
É viticultura e enologia. No respeitante à viticultura, excesso de vigor imprime tropicalidade, carácter que pode ser reforçado na adega por alimentação azotada, baixas temperaturas de fermentação e leveduras próprias para este efeito. Confesso que me incomoda o excesso de tropicalidade, porque desvirtua o perfil muito nobre dos brancos Monção Melgaço.
Este perfil que associa aromas de fruta branca com caroço, cítricos e, em alguns casos, florais, requere bom controle do vigor, regime hídrico que possibilite maturação lenta, bom microclima dos cachos sem exposição solar excessiva.
O ano de colheita é determinante e, em anos frescos sem stress hídrico, os solos franco-arenosos de encosta dão vinhos muito equilibrados com acidez vibrante e uma componente cítrica forte. Os solos sedimentares, ou seja, de zonas de menos altitude com grande capacidade de retenção para a água em anos quentes, dão vinhos frescos e concentrados com grande complexidade aromática.
Na verdade, a interação viticultura/enologia é fundamental para perceber o potencial de qualidade e definir o perfil do vinho, sem contudo desvirtuar a expressão mais séria e genuína do Terroir.
Foste talvez o primeiro a fermentar Alvarinho em barrica, ainda nos anos 80. Como avalias hoje a relação dos Alvarinho de Monção e Melgaço com a barrica?
É uma relação perfeita que começa na vinha. Necessita de mostos com grande equilíbrio açúcar/ácido/taninos. Para isso, não chega ter a grande parcela, é necessário sobretudo colher os cachos de acordo com o seu posicionamento na videira, fazer mais do que uma vindima na mesma parcela. A escolha da madeira, a sua origem, dimensão, tosta e controlo do oxigénio são determinantes. Para mim, as temperaturas de fermentação jogam um papel decisivo no objetivo final, em que a madeira contribui para o equilíbrio e complexidade do vinho mas não o marca, deixando aromas discretos ou quase imperceptíveis.
“Monção e Melgaço é terroir que, de uma forma própria e distinta, exprime vinhos brancos de primeira grandeza.”
Maceração pelicular, curtimenta, “orange wines”. O que tens experimentado nesta matéria?
Comecei em 1999 a estudar a curtimenta e em 2001 lancei um vinho Alvarinho de curtimenta total. Foi um fracasso porque pouca gente o entendeu. Foram necessários 15 anos para compreender este tipo de vinho, foi também importante o estudo das parcelas e, de entre estas, os cachos mais adequados. O meu vinho TEMPO é um exemplo disto. Já o Anselmo Mendes Curtimenta Alvarinho foi o aperfeiçoar da extracção selectiva, limitando a quantidade de polifenóis de modo a ter uma curtimenta “civilizada “. Considero que, no caso da casta Alvarinho, que tem uma relação elevada de sólidos/líquido, o estudo da curtimenta ainda está no seu início.
E vinho “natural”, o que é?
Melhor do que dizer que o vinho é natural ou que se faz vinho natural é dizer como Pasteur: “o vinho é a mais sã das bebidas”. Sã é muito mais do que natural. Hoje, com boa viticultura e intervenção mínima na adega, conseguimos vinhos com teores de sulfitos muito abaixo do máximo autorizado para biológico. Portanto, o sulfuroso não é problema nem define a “naturalidade“ do vinho. O maior problema do vinho é ter uma molécula tóxica, o álcool. Mas sem álcool não há vinho. Por isso, há que beber com moderação para que o vinho continue a ser a mais sã das bebidas.
A ECONOMIA DO VINHO
Sei que uma das tuas preocupações é enquadrar a sustentabilidade económica na noção geral de sustentabilidade da vinha e do vinho. Deverão ser conceitos compatíveis, presumo…
Sem dúvida, altamente compatíveis. E mais do que isso: sem sustentabilidade económica não há sustentabilidade vitícola, ambiental ou outra.
No quadro em que vivemos, com vários canais de distribuição e consumo limitados por via do covid-19, podes elencar, de forma breve, as principais medidas que defendes para a recuperação do sector do vinho?
Disse e escrevi logo em março as medidas que defendo: regulação da oferta pela via da destilação; apoio com parte a fundo perdido e parte a crédito, com carência de 2 anos, para investimento em capacidade de armazenamento; passar de 15% para 30% a introdução de uma colheita noutra sem esta perder o direito a data. Acresce a isto um compromisso de não baixar drasticamente o preço das uvas aos viticultores, correndo o perigo de perdermos património vitícola.
Neste País as medidas são lentas e a agricultura não tem peso para os decisores. Os produtores tem sido contribuintes líquidos para a economia nacional e ilíquidos para o prestígio de Portugal. Na hora da verdade, abandonam-nos. Vamos certamente perder competitividade, pois os outros países produtores foram ajudados, não por Bruxelas mas pelos seus governos. Isto não é só falta de dinheiro: é incompetência para perceber quais são os sectores estratégicos para a economia do País.
PRODUTOR EM MONÇÃO MELGAÇO
O teu projecto enquanto produtor em Monção e Melgaço começou na vindima de 1998. Como foram esses tempos iniciais?
Tenho saudades desse tempo. Fazer vinho de uma forma completamente artesanal, literalmente metendo a mão na massa, é algo que hoje é quase irrepetível. Talvez agora no centro de experiências do Alvarinho, na Quinta da Torre, possamos reviver e repetir esses momentos.
Dez anos depois, estavas a construir a nova adega…
Estava a construir uma nova adega e tomava conta da Quinta da Torre como arrendatário, iniciando a reestruturação das vinhas. Nesse mesmo ano, comecei também a reestruturar quintas no Vale do Lima onde hoje temos 70 hectares, dos quais 20 de Alvarinho e 50 de Loureiro. Em Monção e Melgaço estamos nos 50 hectares, com a maior mancha da casta Alvarinho num terroir que, de uma forma própria e distinta, exprime vinhos brancos de excelência.
E por fim, o grande salto, com a compra da Quinta da Torre em 2016. Que importância tem esta propriedade no teu projecto e no futuro da empresa familiar?
A Quinta da Torre nos seus mais de 60 hectares já nos mostrou que pode originar vinhos diferenciados pelos seus distintos solos, ou melhor, texturas de solos. Vai-nos permitir controlar a produção e garantir autonomia para fazer os grandes vinhos. O controlo da viticultura associado a um terroir de excelência dá-nos esperança para encarar o futuro, tendo como objectivo criar vinhos de grande valor acrescentado.
Esta é uma Quinta com uma história que vem do século XIV e ligada desde sempre à produção de vinho. Possui mais de 1 quilómetro de frente de rio, com matas, levadas de água e moinhos. A casa senhorial tem três torres e capela. Toda a quinta faz parte de uma reserva ecológica onde a viticultura que praticamos está certificada de sustentável.
“Melhor do que dizer que o vinho é natural ou que se faz vinho natural é dizer como Pasteur: ‘o vinho é a mais sã das bebidas’. Sã é muito mais do que natural.”
O que achas que podes conseguir de diferenciador, em termos de vinhos, com a Quinta da Torre?
Hoje, nas provas cegas, distinguimos com relativa facilidade os vinhos da Quinta da Torre de todos os outros que fazemos com uvas Alvarinho oriundas de outras zonas de Monção e Melgaço. Isto diz-nos que a quinta tem uma forte identidade. Os nossos vinhos superiores estão associados a parcelas distintas e estamos a construir um vinho que só sairá para o mercado com um mínimo de quatro anos de estágio. Num futuro próximo, ambicionamos fazer no centro de experiências vinhos de 8 parcelas distintas, para serem apenas vendidos no enoturismo.
ENÓFILO E GASTRÓNOMO
Quais os vinhos (ou tipo de vinhos) que mexem contigo?
Brancos da Borgonha e tintos do Vale do Rhone.
Diz-me três vinhos portugueses de que gostes muito e onde não tenhas qualquer intervenção.
Quinta do Crasto Vinha Maria Teresa, um tinto do Douro. Quinta das Bágeiras Cercial, um branco da Bairrada. E Mouchão Tonel 3-4, um tinto do Alentejo.
E três vinhos do mundo?
O Chablis de François Raveneau; o Puligny-Montrachet de Domaine Leflaive; e o Côte Rotie Michel Ogier Belle Helene.
Sei que, quando podes, gostas de te agarrar aos tachos e ao fogão. O que gostas mais de cozinhar? E qual o prato preferido que não sabes fazer?
Gosto de cozinhar muitos pratos diferentes, todos eles da cozinha tradicional portuguesa. Por exemplo, nos arrozes, arroz de cabidela, arroz de lampreia (ou não fosse monçanense…) e arroz de pato. Também bacalhau à lagareiro e açorda de bacalhau, camarões al ajillo, robalo no forno. No capítulo das carnes, ensopado de borrego, favas com chouriço e costelas, cabrito assado no forno e carne de porco alentejana.
Quanto a um prato que aprecio muito e não sei fazer como gostaria, é fácil responder: pataniscas de bacalhau. Mas sei fazer o arroz de feijão…
Artigo da edição nº 39, Julho 2020
Sugestão: Loureiro, a rainha do Lima

São várias as castas de uva que proliferam no Minho. Umas são bem conhecidas de todos, aparecendo em lugar de destaque nos rótulos das garrafas. Outras, um pouco mais obscuras, são hoje apenas curiosidades ampelográficas. Das primeiras, destacamos a variedade Loureiro, para muitos a melhor casta da região dos Vinhos Verdes. TEXTO João Paulo Martins […]
São várias as castas de uva que proliferam no Minho. Umas são bem conhecidas de todos, aparecendo em lugar de destaque nos rótulos das garrafas. Outras, um pouco mais obscuras, são hoje apenas curiosidades ampelográficas. Das primeiras, destacamos a variedade Loureiro, para muitos a melhor casta da região dos Vinhos Verdes.
TEXTO João Paulo Martins
As castas de uva têm por vezes características enigmáticas. Uma delas é a diferente apetência que mostram em querer viajar. Temos em Portugal exemplos para todas as situações, desde variedades que evidenciam muitas virtudes em todos os locais para onde foram levadas, caso da Alvarinho, mas também a Verdelho, Arinto ou Roupeiro, até outras que se quedaram na zona de origem e não deram mostras de querer viajar muito. Recordamos aqui o caso paradigmático da Encruzado e da que hoje tratamos, a Loureiro. No que respeita a esta variedade emblemática dos Vinhos Verdes, foram feitas algumas tentativas de a levar para outras zonas. Recordamos aqui que ela já esteve plantada na Quinta dos Carvalhais, no Dão, onde chegou a integrar, por uma única vez, um branco feito de lote entre Bical e Loureiro, na colheita de 2000. À época enólogo nessa quinta do Dão, Manuel Vieira disse à Grandes Escolhas que a casta produzia muito, mesmo muito, mas que “originava mostos com teor ácido baixo”, o que contraria a ideia que temos dela. A ideia de arrancar a vinha foi decisão empresarial, mas, na verdade, o tal 2000 Bical/Loureiro, ainda em 2019 dava mostras de estar em grande forma. Também na zona de Setúbal se fizeram experiências com a Loureiro. Domingos Sores Franco, enólogo da casa José Maria da Fonseca, confirmou que a casta foi para ali levada, há muitas décadas, pelo seu tio António Soares Franco. Ainda hoje tem cerca de 2ha de Loureiro plantados na zona de Azeitão, destinando-se o mosto para o lote do Quinta de Camarate branco doce, um vinho que nada tem a ver com vinhos doces de colheita tardia, mas que Domingos nos confirma ser um enorme sucesso, do qual se produzem 25.000 litros por ano. “Noto-lhe aromas de grande qualidade que lembram os que se conseguem no Minho, mas aqui tem menos acidez, tem mesmo uma certa gordura e peso na boca que funcionam muito bem no branco doce, onde a juntamos com a casta Alvarinho”, disse.
Uma casta produtiva
O vale do rio Lima, o solar do Loureiro, é bem distinto em configuração dos vales do Minho ou do Douro, importantes rios que atravessam a região dos Vinhos Verdes. O vale do Lima é amplo e largo, deixando entrar a influência atlântica bem dentro de terra.
Como já escreveu João Afonso em reportagem publicada neste revista, “em termos orográficos podemos dividir a sub-região do Lima em três zonas distintas: a zona mais litoral e ventosa de Viana, com vale aberto e pouca montanha; uma zona intermédia de Ponte de Lima (de Geraz do Lima até Jolda e Gondufe) ainda de vale aberto, mais protegido da nortada e já com traços de montanha; e a zona interior de Ponte da Barca e Arcos de Valdevez com vale mais estreito, de perfil montanhoso e com alguma continentalidade a misturar-se com o clima marítimo.”
A casta Loureiro gosta de frio, mas não aprecia vento. Segundo Anselmo Mendes, “prefere zonas mais abrigadas para evitar partir as varas e é exigente na gestão da sebe para que a vinha possa respirar. Produz bem, mas não convém deixar ir muito além das 10 ton/hectare para não perder carácter.” Esta produtividade, que se pode considerar normal na região do Verdes está, no entanto, muito acima do que encontramos noutras zonas do país, nomeadamente na vizinha região do Douro. José Luis Moreira da Siva é enólogo na quinta dos Murças (Douro) e, por via da aquisição por parte do Esporão da Quinta do Ameal, ficou também responsável pela viticultura e enologia desta propriedade minhota. As diferenças não podiam ser maiores, “é que estou a lidar com produções por hectare que são cinco vezes superiores às do Douro, com terrenos muito mais férteis e também muito mais propícios às doenças e pragas da vinha e tudo isso é um grande desafio”. José Luis confirma que apesar dessa pressão das doenças, é no Minho mais fácil assegurar uma produção regular, com solos ricos e água com fartura. A Quinta do Ameal esteve durante algum tempo certificada como bio, mas, foi-nos confirmada, essa certificação foi abandonada. O enólogo foi pragmático: “estamos a seguir tratamentos e práticas bio, mas se houver um ataque a sério avançamos com tratamentos químicos; não faz sentido perder a produção por falta de tratamentos. Estou de resto convencido que enquanto no Douro é mais fácil a certificação bio, aqui nos Verdes tenho muito mais dúvidas”.
Polivalente na adega
Na adega, a Loureiro mostra-se polivalente. Na Quinta do Ameal sempre se usou uma vinificação diferenciada, ora em inox ora em barricas usadas, praticando abundantemente a bâtonnage, mesmo no inox. Essa prática pode ser fundamental sobretudo se se pretende fazer um Loureiro que dure 20 anos na garrafa. No Ameal sempre existiu a preocupação de mostrar a longevidade da casta Loureiro, a única plantada na quinta e inúmeras provas confirmam amplamente que o tempo está muito mais ao lado da casta do que em tempos se pensava. Anselmo Mendes diz-nos que, “com o tempo, os aromas transformam-se e surgem algumas notas terpénicas que, essas sim, fazem lembrar o Riesling do Mosela”. No entanto, salienta ainda, “existem vários clones de interesse desigual, alguns originam vinhos com notas de Moscatel, mas eu prefiro uns clones que fazem vinhos mais discretos, mas que evoluem bem com o tempo”.
Além da fermentação em inox e barrica (mais usada do que nova), no Ameal estão a fazer-se ensaios com ovos e túlipas de cimento. E trabalhar com teores alcoólicos na casa dos 11,5% de “chega perfeitamente, não precisamos de mais”, confirma Moreira da Silva.
Mesmo nas outras sub-regiões dos Verdes onde a Loureiro entra em lote com outras variedades, os resultados são compensadores. É boa a ligação com a casta Arinto e está em desuso o lote com a Trajadura, uma variedade que recolhe cada vez menos adeptos. Como nos diz Anselmo Mendes, “em tempos era usada para fazer baixar a acidez do Alvarinho, mas hoje já se usa menos”. E em Valença, bem perto da zona de Monção e Melgaço, mas fora da sub-região, a casta Loureiro dá resultados muito interessantes.
Tal como acontece noutras sub-regiões dos Vinho Verdes, o Vale do Lima é a pátria da casta Loureiro, é ali sem dúvida que melhor se expressa e também a casta que melhor expressa as virtudes daquele terroir. Já na sub-região do Sousa impera a Arinto, em Baião a Avesso, exemplos que nos mostram que, embora viajantes, as castas encontram por vezes razões de sobra para não saírem de onde estão.
SABIA QUE…
Loureiro, uma variedade das terras friasA casta Loureiro é, do ponto de vista económico, a variedade mais importante da região dos Vinhos Verdes. É no vale do rio Lima que ela melhor mostra as suas virtudes. Casta produtiva, gosta sobretudo de zonas onde se faça ainda sentir a influência atlântica, contribuindo com elevada acidez para os mostos. Por esta razão é aqui, na sub-região do Lima, que melhores resultados origina. As zonas mais interiores, de Basto até Baião e Amarante já não lhe convêm porque perde rapidamente a acidez, característica marcante desta casta. Gera vinhos de teor alcoólico médio, mas muito aromáticos, razão pela qual é muito procurada pelos viticultores. Também presente nas Rias Baixas tem aí, no entanto, um peso muito residual, uma vez que a região é quase monocultura de Alvarinho. Apesar de gerar boas produções, não se pode deixar produzir demais porque depois perde aromas. Prefere solos férteis e abundância de água, mostrando muitas dificuldades para enfrentar o stress hídrico. Existem vários clones certificados desta casta sendo mais cotado o que gera o cacho com bagos pequenos e coloração dourada. Segundo informação da CVR dos Vinhos Verdes, existem 189 marcas válidas de vinhos varietais de Loureiro, correspondendo a 111 engarrafadores. Até aos anos 80 do século passado não existiam no mercado vinhos varietais de Loureiro e foi então nessa década que surgiram os primeiros varietais de Loureiro, da Adega Cooperativa Ponte de Lima e de alguns produtores engarrafadores, como a Quinta de S. Cláudio, Casa dos Cunhas ou Quinta do Luou.
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Douro tinto por menos de €10: Vinhos ambiciosos, compras inteligentes

Foram 36 os “candidatos” tintos e durienses com preços em euros até ao redondo 10, e o conjunto mostrou ser campeão na relação qualidade-preço, revelando frescura e complexidade. Será este segmento a compra inteligente do Douro? TEXTO Mariana Lopes FOTOS Ricardo Gomez Já se faz vinho no vale do Douro, segundo os mais antigos vestígios, […]
Foram 36 os “candidatos” tintos e durienses com preços em euros até ao redondo 10, e o conjunto mostrou ser campeão na relação qualidade-preço, revelando frescura e complexidade. Será este segmento a compra inteligente do Douro?
TEXTO Mariana Lopes
FOTOS Ricardo Gomez
Já se faz vinho no vale do Douro, segundo os mais antigos vestígios, há mais de 2 mil anos. No entanto, se olharmos apenas para os últimos dez, a evolução dos números desta região foi absolutamente notável, principalmente no que toca à produção e à comercialização. Segundo dados estatísticos recolhidos dos sites do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto e do Instituto da Vinha e do Vinho, a área total de vinha diminuiu de 2010 (45.553ha) para 2019 (43.608ha). No entanto, a área de vinha apta a Denominação de Origem (DO) Douro e Porto aumentou, no mesmo período, de 38.364ha para 40.071ha, o que significa que aquele decréscimo de área total de vinha representa, na verdade, boas notícias. Falamos de vinhas de uma região (e já que esta Grande Prova assenta em vinhos tintos) em que as castas tintas predominantes são a Tinta Amarela, Tinta Barroca, Tinta Roriz, Touriga Francesa, Touriga Nacional e Tinto Cão, mas onde as (verdadeiras) vinhas velhas escondem dezenas de outras uvas antigas. São precisamente estas seis variedades de uva e também, de forma mais ocasional, a Sousão, que entram nos lotes de vinhos tintos do Douro com preço inferior a 10 euros, apenas variando entre elas e nas percentagens de cada uma. Note-se que a newsletter da associação ProDouro, na sua edição de Maio, deu conta de que já se pode oficialmente voltar a chamar Touriga Francesa à Touriga Franca. Nessa edição, pode ler-se: “Segundo o aviso nº 3999/2020 do Instituto da Vinha e do Vinho, publicado em Diário da República de 6 de Março «são incluídos na lista de castas anexa à referida Portaria [nº 380/2012 de 22 de Novembro] e da qual faz parte integrante as seguintes castas e sinónimos: (…) Casta Touriga-Francesa como sinónimo da casta Touriga-Franca (PRT52205), apenas na rotulagem da DO Porto, Douro e IG Duriense».”
Já no que toca à produtividade, devida aos solos pobres, clima agreste e orografia difícil, o Douro não é uma região que se caracterize por elevado rendimento, estando a produtividade permitida tabelada num máximo de 55 hectolitros (cerca de 7.500kg) por hectare. A produtividade média fica-se, inclusive, pelos 30 hectolitros (cerca de 4.100kg) por hectare, contra, por exemplo, os cerca de 7.600 kg/ha do Alentejo (dado de 2016).
Mas é quando chegamos aos números da produção de vinho que a coisa fica ainda mais séria. Em 2010, a produção total de vinho apto para poder originar DO Douro era de pouco mais de 50 milhões de litros. Em 2019, passou os 81 milhões. Em volume, as vendas de vinho tinto certificado DO Douro passaram, no mesmo período, de 17.543.521 litros para 30.024.831 litros, o que correspondeu, em valor, a um salto dos quase 80 milhões de euros para mais de 134 milhões. Tudo isto com um aumento de 43 cêntimos por litro, dos 4.04 euros para os 4.47, o que conclui que o Douro conseguiu aumentar a produção e as vendas sem baixar o preço, o que é sempre de louvar.
Os anos vitícolas 2017 e 2018
Quase todos os vinhos provados são das colheitas de 2017 (maioria) e 2018, dois anos vitícolas que se revelaram bastante díspares. A família Symington, com mais de 1000 hectares de vinha no Douro, produz óptimos relatórios de vindima que são excelentes apoios para qualquer trabalho, e o disposto a seguir foi baseado nesses mesmos relatórios, podendo ajudar a perceber os perfis dos vinhos destas colheitas. O ano de 2017 foi, em geral, bastante quente e seco, com a maioria dos seus meses a registar um nível de precipitação bem abaixo da média. Março, Abril e Maio foram, inclusive, cerca de 2.6ºC mais quentes do que a média e Abril, em concreto, foi o mais quente desde 1931. Junho também não quis ficar atrás, e foi o mais quente desde 1980, com a temperatura a atingir os 43ºC. Julho manteve-se seco e quente. Já Agosto mostrou-se mais moderado, com noites relativamente frescas. Consequentemente, e devido a esta seca, as produções em 2017 acabaram por diminuir.
A seca prolongou-se até Março de 2018, ano que acabou por divergir bastante do anterior porque em Março, Abril e Maio choveu abundantemente, a um nível que chegou a ser duas vezes acima da média destes meses. Depois, a 28 de Maio deu-se um episódio dantesco que poucos esquecerão: uma tempestade acompanhada de forte granizo, tendo a zona do Pinhão sofrido uma precipitação de 90mm em menos de duas horas. Foi desastroso e muitos produtores viram os seus solos arrastados para o rio e as vinhas destruídas, e também por isso as perdas na produção em 2018 foram muito grandes, mesmo com o resto do ano vitícola (com a excepção de um Setembro bastante mais quente do que o habitual) a revelar-se “normal”, com números próximos da média. Em 2017, a produção total de vinho DO Douro foi de 51.564.497 litros e em 2018 caiu de forma impressionante para os 38.530.429 litros.
Como são os tintos do Douro até €10?
A amostra de 36 tintos do Douro com preço até 10 euros, é já suficiente para que se possam tirar algumas conclusões interessantes, a partir dos pontos em comum que apresentaram, e até dos que divergiram por alguma razão. Em primeiro lugar, é preciso ter em conta que a faixa de preço se situou, na maior parte dos casos, nos 7, 8 e 9 euros. Uma das ilações, e a minha favorita, é o facto de este conjunto dos tintos ter apresentado uma enorme frescura transversal, e também um nível de complexidade já bem “jeitoso” para o segmento de preço. Os enólogos de alguns dos vinhos mais bem pontuados desta Grande Prova vieram ajudar a perceber isto e várias outras coisas. Francisco Baptista, autor do Andreza Reserva 2017, da Lua Cheia em Vinhas Velhas, explica que “o Douro é uma região que se tem adaptado as novas tendências, de vinhos com frescura e complexidade, e isto deve-se à riqueza de todo o vale, como as diferentes altitudes, vinhas em encosta com diferentes exposições, e três sub-regiões totalmente diferentes. Esta vindima [2017] foi complicada, pois começámos em Agosto com imenso calor e a maturação foi rápida nas zonas perto do rio, mas os mostos eram ricos em antocianas, polifenóis e ácidos. Na meia encosta, em vinhas viradas a Norte e nos planaltos, o equilíbrio era extraordinário”. Quanto à complexidade, o enólogo diz que esta “não é de admirar”, porque “a viticultura tem feito um trabalho notável na região e, se as castas estiverem nos sítios certos, a partir daí o trabalho na adega é facilitado”. Manuel Lobo, enólogo-chefe dos vinhos Quinta do Crasto, vai de encontro à ideia da pluralidade de terroirs do Douro com que se pode “jogar”, e acrescenta que “a resposta está na “nova era” de enologia, que assenta os seus pilares no respeito pela vinha e consequentemente pelo seu equilíbrio natural”. Em relação ao ano 2017, Manuel Lobo conta que “para encontrar o equilíbrio e frescura, foi fundamental não falhar o ponto óptimo de maturação, evitando assim os aromas de sobre-maturação, e privilegiar a altitude e exposições Norte e Nascente”. E é precisamente esta a exposição das vinhas que dão origem ao Flor das Tecedeiras, cuja enologia está a cargo de Rui Cunha (também do Quinta dos Avidagos Reserva 2017), que reforça que “isso contribui muito para o seu lado de frescura”. Jorge Moreira, responsável pelos vinhos da Real Companhia Velha, neste caso o Quinta dos Aciprestes 2017, e também pelos Quinta de La Rosa, lembra que “no passado havia uma grande procura por concentração e potência, mas hoje os enólogos estão muito mais virados para o equilíbrio. Assim, a frescura e a própria acidez passaram a ser uma das nossas maiores preocupações”. Paulo Coutinho, que assina os vinhos da Quinta do Portal, é ainda mais assertivo quando fala de complexidade e afirma que esta “vem claramente de um ano quente, pois a vinha, para produzir um bom vinho, precisa de sofrer. Mas, por exemplo, 2003 foi bem mais quente, produzindo ainda maior complexidade, mas faltou acidez e frescura. Já 2017 beneficiou do que 2009 já tinha beneficiado no Douro, que foi uma busca incessante por maior elegância e frescura. O enólogo da região tentou, desde aí, combater a concentração nos anos mais quentes com a acidez, seja recorrendo à altitude, ao portefólio das castas, ou ao controlo na viticultura, com práticas que nos permitem proteger a folha e fruto da agressividade do tempo quente”.
Mas, o que deve ser um vinho deste segmento de preço, tendo em conta o que o consumidor procura neles? José Manuel Sousa Soares, enólogo da Quinta de Ventozelo, da Gran Cruz, elucida de forma muito pertinente que, para si e nesta empresa, é “necessariamente um vinho da gama média em qualidade e com um preço pouco superior à entrada de gama. Pretende-se que a força, o carácter e a complexidade do lugar sejam evidentes num vinho acessível, marcado pela expressividade das castas que o compõem”. Jorge Moreira concorda e, além de falar na identidade regional, refere que “devem ser equilibrados e estar em bom momento para serem consumidos”, e que são vinhos que estão “no nosso segundo patamar qualitativo, tendo em conta que os de entrada de gama têm carácter regional, os do segundo patamar já mostram a Quinta de onde vêm, num terceiro mostram a casta e/ou a vinha, e assim sucessivamente”. Uma hierarquia e perspetiva interessante, demonstrada por este enólogo.
Rui Cunha, por sua vez, defende o contraditório de uma forma válida: “De uma forma geral, nós (e eu também sou consumidor) procuramos aqui vinhos equilibrados, coerentes, com complexidade e bom final de boca. Mas não há uma definição de como deve ser um vinho ‘nesta faixa de preço’. No projecto das Tecedeiras, o Flor das Tecedeiras está na gama de entrada mas, nos Avidagos, o Avidagos Reserva é um ‘premium’. Este é só um dos argumentos”. Já Paulo Coutinho vê esta questão um pouco como um “jogo de cintura”, explicando que “esta é uma gama de preço onde o consumidor procura chegar sempre que quer um pouco mais de sofisticação e complexidade do que o habitual. Já não é o vinho do dia-a-dia. Além disso, é quando o consumidor pensa não só nele, mas na companhia para o tomar, e normalmente escolhe esta gama dos [quase] 10 euros para iniciar o jogo antes de passar o ponto alto, ao nível acima. Assim, tem de ter a complexidade suficiente para não defraudar”. Manuel Lobo acrescenta que “devem ser vinhos que despertem também no consumidor a curiosidade para conhecer melhor a região”.
Na vinha e na adega
Há um elemento comum nas respostas dos enólogos, que é a vinha, o respeito por ela, e a importância da viticultura, e isto não só nesta prova, mas em muitas outras que a Grandes Escolhas já fez. O que nos leva a indagar sobre se, para cada tipo de vinho, haverá ou não uma viticultura especifica, e até, em concreto no Douro, castas favoritas ou “essenciais” para tintos deste segmento. José Manuel Sousa Soares começa por expor que “na viticultura temos de escolher métodos que expressem bem o carácter das castas e dos locais de produção, de forma a que a produção seja equilibrada com o potencial vitícola em causa, quer do ponto de vista qualitativo como quantitativo, e que promova a boa sanidade vegetal. Não há, portanto, soluções únicas nem sempre vencedoras, até porque os anos, do ponto de vista climático, não se repetem e originam alteração do potencial das uvas. É necessário um acompanhamento muito próximo da evolução anual que possibilite a escolha acertada das datas de vindima em cada parcela”. Este enólogo escolheu integrar Alicante Bouschet no lote do Ventozelo 2016, juntamente com Touriga Francesa e Sousão, porque aquela casta “está instalada numa meia encosta virada a Nascente-Norte e, em 2016, apresentava frescura com algum carácter vegetal muito importante para o resultado final”. Além deste pormenor, que confere alguma originalidade, José Manuel Soares acredita que, neste tipo de vinho, “a Touriga Franca [ou Francesa] é essencial na estruturação”. Jorge Moreira e Francisco Baptista também elegem a Touriga Francesa como favorita nestes lotes, este último dizendo que dá “pouco álcool, boa acidez, e fruta vermelha intensa e fresca”. E Manuel Lobo reforça que não há receitas, mas que “é fundamental estarmos presentes. O modelo deve ser de equilíbrio e de respeito pela identidade o que, na minha opinião, só se consegue com uma viticultura de precisão.”. E defende, nestes vinhos, a tríade “Touriga Nacional, para aroma e frescura, Touriga Franca, para volume e estrutura, e Tinta Roriz, que dá elegância e persistência”. Depois de confessar que lhe dá gozo voltar a usar o nome “Francesa”, Paulo Coutinho confessa que esta é a “pacificadora do lote”, mas que adora a Tinta Roriz para esta categoria, achando “incrível para o frutado que pretendo”. E Rui Cunha volta a trazer o fundamental contra-argumento: “De nada serve dizer que uma determinada casta é fundamental se o local não lhe é favorável. Felizmente, a região do Douro é rica em castas que estão muito bem-adaptadas aos variadíssimos ‘micro-terroirs’”.
Quanto à enologia destes vinhos, e quando falamos do ano quente de 2017, Manuel Lobo diz que “foi essencial controlar muito bem as extracções e as temperaturas de fermentação” para que não se perdesse frescura. Jorge Moreira e Paulo Coutinho sublinham a pouca extracção e o primeiro fala também da necessidade de vindimar cedo “quando ainda temos fruta fresca”, e do “cuidado com a madeira nova para não descaracterizar os vinhos”. Rui Cunha toca estes pontos mas acrescenta (e muito bem) o factor higiene. E depois de tudo isto, só há uma coisa a desejar, nos tempos que correm: haja higiene e saúde para beber vinhos desta qualidade!
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Artigo da edição nº38, Junho 2020
Alentejo tinto até €8: Muita qualidade a preço acessível

O vinho do Alentejo é, de longe, líder nacional de vendas, apreciado pelos consumidores em todo o país. É ainda uma região com beleza paisagística que oferece enoturismo de excelência, quer em unidades hoteleiras, quer a nível de gastronomia. E por fim, o espírito inovador está presente em vários projectos desafiantes na região. TEXTO Valéria […]
O vinho do Alentejo é, de longe, líder nacional de vendas, apreciado pelos consumidores em todo o país. É ainda uma região com beleza paisagística que oferece enoturismo de excelência, quer em unidades hoteleiras, quer a nível de gastronomia. E por fim, o espírito inovador está presente em vários projectos desafiantes na região.
TEXTO Valéria Zeferino
FOTOS Ricardo Gomez
Desde o ínicio de produção de vinho no território que agora se chama Alentejo, pelos tartessos e fenícios, passaram várias épocas de ouro e crises profundas: invasão muçulmana; guerra de independência; aposta de Marquês de Pombal no desenvolvimento da região do Douro com arranque de vinhas no resto do país; a praga da filoxera; primeira guerra mundial ou a campanha cerealífera do “Estado Novo”.
Nos últimos 30 anos, a dimensão de vinha cresceu de 11.510 para 24.709 hectares registados em 2019 (dados do IVV). Tem a segunda maior área de vinha em Portugal, a seguir ao Douro e ultrapassando a região do Minho.
Em termos de volume de produção, ocupa o terceiro lugar em Portugal com 1.092.617 hl, que corresponde a 18% de produção nacional a seguir às regiões do Douro (21%) e Lisboa (19%). O facto de ter maior área de vinha e produzir menos do que na região de Lisboa tem a ver com a produtividade média por hectare de vinha, que é inferior no Alentejo (cerca de 44 hl/ha versus 60 hl/ha em Lisboa).
Alentejo é a região mais presente no retalho em Portugal, com quota de mercado superior a 35% em valor, seguido pela região de Vinhos Verdes com mais de 18% e Península de Setúbal com 16,5%, valores registados em 2019. Em volume, a quota de mercado aumenta para 39,5% em 2019 e acima de 40% no ano anterior.
Alentejo ou Regional Alentejano?
O principal objectivo da DO (Denominação de Origem) Alentejo é preservar a identidade de uma determinada área de produção, enquanto a IG (Indicação Geográfica) Regional Alentejano alberga a possibilidade de alguma ousadia. Mesmo assim, a regulamentação a nível de DO não é estanque, tendo sido objecto na última década de várias alterações.
Em 2010 foram simplificadas as regras das 8 sub-regiões do Alentejo e introduziu-se o conceito de castas obrigatórias generalizadas a todas elas, que devem representar, isoladamente ou em conjunto, 75% do lote. Eram 9 brancas (todas tipicamente alentejanas) e 8 tintas, entre as quais para além de tradicionais (Alfrocheiro, Alicante Bouschet, Aragonez, Cabernet Sauvignon, Castelão e Trincadeira) passou a figurar a estrela portuguesa Touriga Nacional e Syrah que conquistou produtores nacionais e entrou nos lotes alentejanos como uma casta melhoradora. Em 2014, ao leque de castas obrigatórias juntaram-se mais quatro, que bem representam a região: Grand-Noir (curiosamente, a casta esteve sempre presente no encepamento de Portalegre e em casas histórias de Reguengos, como José de Sousa), Moreto, Tinta Caiada e Tinta Grossa. Para além destas, existe uma lista de 47 castas, nacionais e estrangeiras, que podem ser utilizadas na elaboração de vinhos com DO, não ultrapassando 25%.
Obviamente, a IG oferece mais flexibilidade ao produtor: permite mais rendimento por hectare e muito mais castas à escolha. Quem quiser, pode fazer 100% Chenin Blanc, Chasselas, Vinhão ou Zinfandel.
Não existe grande diferença entre DO e IG em termos de qualidade exigida para aprovação. Por exemplo, um vinho designado como Reserva tem de obter no mínimo 70 pontos e Grande Reserva 80 pontos (escala 0/100), independentemente se for para certificar como DO Alentejo ou Regional Alentejano.
Se analisar a produção só de vinhos tranquilos, sem tomar em consideração espumantes e licorosos, na última campanha de 2018/2019 há mais vinhos produzidos com DO do que com IG, sendo 591.407 hl versus 479.688 hl, respectivamente. Cerca de 75% são tintos e rosés. As sub-regiões de Reguengos e Borba representam o maior peso na produção da região.
Explorar a região de forma inovadora
Apesar de ter uma posição confortável no mercado nacional, a região não parou no tempo, promovendo várias iniciativas, quer a nível de produtores, quer a nível institucional.
Para além das sub-regiões conhecidas historicamente e com carácter diferenciador, como Vidigueira, Évora, Borba ou Reguengos, há projectos interessantes noutras zonas, como a DO Portalegre ou o litoral Alentejano, onde o clima é temperado pela altitude ou pela influência atlântica, respectivamente.
Outro projecto altamente inovador é o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo desenvolvido pela CVR Alentejana em parceria com a Universidade de Évora. Este programa pioneiro em Portugal visa a adaptação de melhores práticas na vinha e na adega para produzir uvas e vinho de qualidade e de forma economicamente viável, protegendo ao mesmo tempo o meio ambiente. Isto consegue-se através de optimização na gestão de energia e água na vinha e na adega, redução, reutilização e reciclagem de resíduos. Sendo o Alentejo uma região com disponibilidade de água limitada (que se pode agravar com as alterações climáticas), a gestão eficiente deste recurso torna-se particularmente relevante para os produtores.
Para dar um exemplo, no Alentejo, o consumo de água varia entre os 1,2 (nos casos mais eficientes) e os 14,4 litros de água por litro de vinho. As ferramentas previstas no programa permitirão a redução do consumo de água até os 0,75 e 1 litro de água por cada litro de vinho produzido. O melhoramento na eficiência energética levará à redução de consumo e custos associados; redução de emissões de gases que contribuem para o efeito de estufa; permitirá aliviar circuitos sobrecarregados (sistemas de frio ou aquecimento, sobretudo na vindima que é altura de maior consumo energético). O programa é de adesão voluntária e gratuita e actualmente conta com 396 membros.
A nível de enoturismo, recentemente foi inaugurado um novo espaço da Rota dos Vinhos de Alentejo, onde os interessados podem conhecer melhor a região, não só através de provas de vinhos, mas também de forma interactiva. É possível cheirar os aromas das castas principais da região; aprender mais sobre solos, cujas amostras estão disponíveis para observar; organizar uma viagem através de uma plataforma interactiva que disponibiliza informação sobre os produtores com aplicação de vários filtros (tem ou não restaurante ou unidade hoteleira, por exemplo).
O que são vinhos “até 8 euros”
A nossa prova centrou-se em vinhos tintos do Alentejo com preço médio de mercado igual ou inferior a €8. É muito curioso verificar que ao subir um degrau de preço, de 5 para 8 euros, por exemplo, já estamos num patamar diferente em termos de qualidade. Muitos dos vinhos nesta faixa de preços não são propriamente os vinhos de entrada de gama. No caso de alguns produtores mais pequenos, até os vinhos que abrem o portefólio produzidos em maior quantidade, nada têm a ver com os vinhos básicos e simples, normalmente associados a entradas de gama. Ao mesmo tempo não são vinhos caros, representando uma óptima oferta para um consumidor mais exigente.
O enólogo Ricardo Constantino, da Herdade das Servas, está seguro da importância deste segmento de preço para o consumidor. “Nem todos podem comprar vinhos caros. A gama de entrada pode ser mais simples, mais versátil e consensual; a gama média é para um consumidor mais esclarecido.” Se dos vinhos de entrada produzem 1.000.000 garrafas vendidas a 5 euros PVP, desta gama média fazem 150.000 garrafas de tinto (e 30.000 de branco). Procuram “alguma complexidade, algum tanino sem ser muito marcado, nem madeira muito presente, apenas para dar o equilíbrio a fruta”.
Na Herdade da Calada, o vinho Caladessa representa uma gama média, da qual produzem metade dos vinhos de entrada e o dobro dos topos de gama. Vendem mais no canal horeca no mercado interno. O enólogo Eduardo Cardeal repara que “os vinhos da gama média são importantes para o sustento das casas: têm uma margem maior, comparativamente às entradas de gama, acabam por ser uma mais valia.”
Segundo o enólogo Oscar Gato, a gama de monovarietais foi criada na Adega de Borba para dar resposta ao mercado que procura perceber melhor as castas que normalmente entram em lotes. Estes vinhos não estão nas grandes superfícies e, curiosamente, vendem-se muito bem na loja online da própria adega. Mas são quantidades limitadas. Do Senses Syrah, por exemplo, só produzem cerca de 5.000 garrafas.
No caso da HMR, Pousio Selection é um entrada de gama, mas de um patamar diferente. Como não conseguem competir com as adegas cooperativas e outros produtores de grande dimensão, não apostam no vinho de combate, não vendem os seus vinhos nas grandes superfícies e procuram que o preço não seja o factor principal na decisão de compra pelos seus parceiros e pelo consumidor final. Na definição do perfil deste vinho o enólogo Nuno Elias dá primazia à fruta em detrimento de estrutura. A gama Selection fazem 120.000 garrafas de tinto, 47.000 de branco e 20.000 de rosé que em conjunto representam mais de metade da produção total de 320.000 garrafas.
O vinho Carlos Reynolds também consubstancia a entrada de gama para Reynolds Wine Growers. Fazem 50.000 garrafas que representam 25% da produção. Segundo o enólogo Nelson Martins, pretende-se um vinho menos estruturado, com mais frescura e pureza de fruta.
O objectivo do projecto Bojador de Pedro Ribeiro é mostrar a elegância e autenticidade do terroir da Vidigueira, onde trabalha vinhas velhas em viticultura biológica. Começou pequeno e cresceu nos últimos anos, chegando a quase 400.000 garrafas, onde o entrada de gama representa cerca de 50%.
Mas quais são os factores que contribuem significativamente para que o vinho de qualidade possa ser acessível em termos de preço?
Uma viticultura com contas
A orografia relativamente plana do Alentejo e extensão de vinhas oferecem possibilidade de mecanização o que reduz o custo de produção. O clima quente e seco durante a maturação e vindima minimiza a carga de doenças na vinha. Não é por acaso que o Alentejo tem a segunda maior área de vinha em agricultura biológica (a seguir a Trás-os-Montes) com 991 hectares, o que corresponde a 28% da área de vinha em produção biológica em Portugal continental (de acordo com os dados mais recentes da Direcção de Agricultura e Desenvolvimento Rural).
Alguns produtores fazem a diferenciação logo na vinha, por castas e por parcelas. E não limitam tanto a produção, como para os vinhos de gama alta, procurando um compromisso entre várias componentes que contribuem para o produto final.
Eduardo Cardeal confirma que as produções por hectare são maiores, a monda dos cachos, se for necessária, é muito reduzida. Fazem segmentação na vinha, não é tanto em função da casta, como das parcelas. Uma parcela de Touriga Nacional produz 10 tn/ha e outra 5 tn/ha.
Nelson Martins também refere que “a vinha é trabalhada de maneira diferente. Por exemplo, em vez de limitar a produção de Alicante Bouschet ou Alfrocheiro a 4-5 tn/ha, deixam produzir até 7 tn/ha. Desta forma, as uvas também conservam mais acidez, o que é bom para vinhos gastronómicos”.
Nuno Elias tem opinião semelhante, ao dizer que a mesma casta em talhões diferentes pode ter produtividade e características bem distintas. Por exemplo, o Alicante Bouschet que entra no lote do Pousio Selection não é o mesmo que serve de base ao monovarietal.
Na Herdade das Servas a selecção de castas é feita em função do perfil de vinho desenhado para esta gama. Pretende-se alguma complexidade e tem que se sentir o contributo de cada casta. “Propositadamente utilizamos Cabernet Sauvignon e Trincadeira para transmitir alguma sensação vegetal para o vinho ser mais gastronómico, não apenas frutado. Alicante Bouschet para dar complexidade e Touriga Nacional para transmitir uma fruta mais fresca e boa acidez. A Touriga nunca entra na gama mais baixa”, repara Ricardo Constantino.
No caso da HMR a abordagem é diferente. “As castas seleccionadas para esta gama são menos taninosas e com boa fruta, como Alicante Bouschet, Syrah e Touriga Nacional. Por exemplo o Cabernet Sauvignon ou Petit Verdot não entram nesta gama”, explica Nuno Elias.
Cuidados na adega
Há várias formas de fazer vinho para atingir um equilíbrio entre custos de produção, qualidade do produto e preço moderado para consumidor. Os produtores com quem falámos, de um modo geral, têm cuidado com extracção, preferem uma maceração pré-fermentativa a frio, evitando a pós-fermentativa num ambiente mais extractivo por causa do álcool. Nuno Elias até prefere prensar logo quando acaba a fermentação para não extrair tanino em demasia.
As temperaturas de fermentação são geralmente mais baixas (22-25˚C) para não elevar a extracção de compostos fenólicos e realçar o componente frutado no aroma.
Na Reynolds, Nelson Martins presta especial atenção às leveduras e para os vinhos mais jovens, prefere as leveduras que aportam mais fruta. No início não usam Saccharomyces, adicionando-as para finalizar a fermentação e não deixar açúcar residual.
Pedro Ribeiro, pelo contrário, fermenta com leveduras indígenas e é apologista de enologia de intervenção mínima em termos de utilização de produtos enológicos. Porque o projecto nasceu pequeno, apenas 100.000 garrafas e a filosofia era esta. Hoje, quando o volume aumentou significativamente, é um risco assumido, sabendo que não pode continuar a crescer em volume para manter a filosofia.
Eduardo Cardeal, na Herdade da Calada, recorre à maceração carbónica das castas “com aromas primários clássicos – Touriga Nacional, Syrah, Touriga Franca, Alfrocheiro. Mas não faz o mesmo com a Tinta Caiada, por ter precursores de pirazina.”
Nuno Elias não faz maceração carbónica, mas coloca algumas camadas de bagos inteiros (depende de colheita e da maturação), o que impede contacto inicial com grainhas e películas e promove alguma fermentação intracelular para libertar os precursores aromáticos sem extrair tanino.
Obviamente, nesta faixa de preço há muitos vinhos que não estagiam em madeira. Também se utilizam madeiras alternativas, como aduelas, por exemplo, que são mais aproximadas às barricas pela sua grossura, comparativamente aos chips/aparas. O estágio em barricas, quando é praticado, ocorre em barricas usadas, onde às vezes estagia apenas uma parte do lote.
Segundo Eduardo Cardeal “a amortização de preço já foi feita nos vinhos de topos de gama.” Por isso o Caladessa estagia 12 meses em barricas usadas.
Na Adega de Borba existe um parque de 1.200 barricas; as novas destinam-se aos vinhos premium, as usadas servem para gama média, como é o caso do Senses Syrah que estagia 9 meses em barrica de carvalho. Existem regras internas para a reutilização das barricas, normalmente durante 7 anos.
Na Reynolds Wine Growers, para o estágio de vinhos mais jovens utilizam balseiros de carvalho de 10.000 litros que também não representam custo, nem marcam o vinho.
Na HMR, nos vinhos de entrada 80% do lote não vê barrica, mas no final engloba cerca de 20% de vinhos que estagiaram em barrica para reserva.
Pedro Ribeiro fermenta em cubas de cimento e balseiros de madeira, depois estagia 6 meses em barricas usadas de 500 litros para dar uma boa textura e não marcar muito o vinho.
Na Herdade das Servas para os vinhos de gama média prevêem um estágio bastante prolongado: um ano em barrica, mais um ano ou ano e meio em cuba para manter frescura e mais 6-8 meses em garrafa antes de lançar para o mercado.
Óscar Gato toca mais num aspecto importante que tem certo peso no PVP – os atributos do produto final que não têm a ver com a qualidade do mesmo, como é o caso das garrafas e dos rótulos. “Podíamos fazer uma garrafa ‘xpto’ com um rótulo pujante, mas nós escolhemos garrafas mais leves, ligeiramente troncocónicas e um rótulo adequado.”
É entusiasmante ver esta diversidade de abordagens e estilos, bom senso a par com alguns desafios pelo meio. O resultado está à vista: eleva-se a fasquia do “bom e barato” para “muito bom e acessível”.
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Artigo da edição nº37, Maio 2020
Brancos de Lisboa: Diversidade de castas e estilos

Se tivesse de escolher apenas uma palavra para descrever a região, esta seria – diversidade. Solos, castas, denominações de origem, tipos e estilos de vinhos produzidos – tudo é diverso e heterogéneo na região de Lisboa. TEXTO: VALÉRIA ZEFERINO FOTOS: RICARDO GOMEZ Já lá vão os tempos em que a região se chamava Estremadura, conotada […]
Se tivesse de escolher apenas uma palavra para descrever a região, esta seria – diversidade. Solos, castas, denominações de origem, tipos e estilos de vinhos produzidos – tudo é diverso e heterogéneo na região de Lisboa.
TEXTO: VALÉRIA ZEFERINO
FOTOS: RICARDO GOMEZ
Já lá vão os tempos em que a região se chamava Estremadura, conotada sobretudo com fornecimento de grande volume de vinho à capital. Em 2009 adoptou o nome de Lisboa que lhe conferiu uma nova identidade e a colocou no mapa de Portugal de forma inequívoca e contemporânea. A região estende-se entre Lisboa e Leiria, com cerca de 140 km em comprimento e entre 20 e 40 km em largura, sendo delimitada pelo oceano a Oeste. A influência Atlântica é um denominador comum – ameniza as temperaturas de verão através das brisas marítimas e frequentes neblinas matinais que, dado ao relevo não muito elevado, excepto a Sul, proliferam facilmente para o interior. O clima temperado, sem grandes amplitudes térmicas e com uma precipitação anual a nível de 600-700 mm permite uma maturação mais lenta e homogénea sem risco de escaldões ou paragens de actividade fotossintética das videiras. Os solos variam de calcários a argilosos, tendo zonas com arenitos finos e terras mais férteis de aluvião.
São permitidas mais de 50 castas brancas, entre as quais nacionais e internacionais, algumas bem populares, como Chardonnay, Sauvignon Blanc ou Riesling e outras menos conhecidas como Roussanne, Marsanne ou Grüner-Veltliner.
De acordo com os dados do IVV de 2019, a área de vinha plantada na região de Lisboa corresponde a 19 287 ha, mas segundo a CVR Lisboa, apenas cerca de 10 000 hectares são com classificação para Vinho IGP Lisboa e DOP. Destes, as castas brancas ocupam apenas 2 300 hectares. Apesar da região de Lisboa ter excelentes condições para a produção de vinhos brancos, cá, como no resto do país (com excepção da Região de Minho/Vinho Verde), a produção de vinhos brancos está em minoria, representando apenas 20% dos vinhos produzidos na região (75% são tintos e mais 5% rosados).
Em algumas denominações de origem, certas castas são intrinsecamente ligadas à sua identidade, como é o caso de Malvasia em Colares ou Arinto em Bucelas. Em Óbidos, pelo contrário, as regras são mais liberais, permitindo castas pouco conotadas com a região de Lisboa, como Encruzado ou Loureiro, por exemplo, e castas internacionais como Viognier, Riesling ou Chardonnay.
Há também meio-termo. Em Alenquer, Arruda e Torres Vedras são autorizadas várias castas, mas para certificar um vinho branco como DO, as castas tradicionais (Arinto, Fernão Pires, Rabo-de-Ovelha, Seara Nova e Vital) devem representar, no conjunto ou separadamente, no mínimo de 65% a 70% do encepamento. A situação é muito parecida nas Encostas D’Aire.
A maioria dos produtores optam por trabalhar na categoria do Vinho Regional (IG), que oferece muito mais flexibilidade e, por outro lado, a marca Lisboa é mais facilmente reconhecida a nível internacional, do que, por exemplo DO Torres Vedras ou Arruda.
Assim, dos vinhos certificados, 93% são Regional Lisboa e só 7% são DO.
VARIEDADE DE CASTAS
As principais castas brancas são Fernão Pires, representando cerca de 50%, seguindo-se o Arinto com 25%. Fernão Pires é uma casta bastante flexível em termos de clima, adapta-se bem a diferentes tipos de solo, desde que haja humidade suficiente, o que se verifica na maior parte das vinhas da região de Lisboa. É bastante vigorosa e produtiva. Amadurece cedo, tendo como inconveniente a rápida degradação de ácidos, se não for vindimada a tempo. O clima da região, neste caso, permite uma maturação mais lenta. Grande presença aromática faz dela uma escolha acertada para os vinhos fáceis e apelativos da gama de entrada.
Arinto é uma das grandes uvas nacionais com o seu potencial máximo em Bucelas, onde existe a maior variabilidade genética, indicando que esta zona tenha sido a origem da casta. Espalhada pelo país, faz parte de muitos lotes de entrada até aos topos de gama e é capaz de produzir excelentes vinhos em extreme. É naturalmente rica em ácidos, conserva-os mesmo em territórios mais quentes, o que lhe confere a frescura e assegura a longevidade em cave. Tem cachos grandes, mas poucos por cepa o que não faz dela uma casta muito produtiva. Amadurece tarde. A enóloga da Quinta da Chocapalha, Sandra Tavares, refere que é apanhada no final de Setembro, já depois de algumas castas tintas. Para Sandra “Arinto é uma casta muito pura em termos aromáticos, fica bem com alguma maceração pelicular, barricas muito usadas e estágios longos de 8-10 meses.”
O enólogo da Adega Mãe, Diogo Lopes, refere que, no caso deles, o Arinto é plantado nos solos mais calcários das encostas, vinhas não regadas para controlar o vigor. Considera que Arinto é bem talhada para fermentação e estágio em barrica, mesmo a madeira nova não se sobrepõe. Escolhem barricas por tanoaria e por floresta. Preferem tosta ligeira, mas até aguenta um pouco mais.
Das castas nacionais é interessante também cada vez mais a popularidade do Viosinho. Diogo e Sandra concordam que a casta precisa ou altitude, como em certas zonas no Douro, ou a frescura por meio da influência marítima, se não a acidez quebra rapidamente, tornando o vinho pesado.
Das castas internacionais, Chardonnay e Sauvignon Blanc têm uma aposta forte na região.
Diogo e Sandra são unânimes, afirmando que Chardonnay porta-se muito bem na região de Lisboa, fica com acidez forte, aguenta bem barrica, incluindo nova. Tem muita consistência e textura, e mais volume de boca do que Arinto.
Sauvignon Blanc com influência marítima adapta-se bem aos vinhos de entrada de gama (um pouco como Fernão Pires). Diogo Lopes procura no Sauvignon Blanc o seu lado mais cítrico, não tão exuberante e herbáceo como os da Nova Zelândia.
Viognier, com os seus aromas exóticos e que em condições mais frescas não desacidifica bruscamente, parece também começar a ter um certo protagonismo na região.
Segundo Sandra Tavares, as castas internacionais, como Chardonnay, foram uma ferramenta útil no início do projecto, mas hoje, aumentou a procura pela diversidade, e Chardonnay pouco ou nada vende nos mercados estrangeiros. É mais fácil comunicar castas nacionais, como o Arinto, por exemplo. No mercado nacional é o inverso.
Diogo Lopes aponta para a mesma tendência: no Japão ou Estados Unidos, vendem bem as castas nacionais. No mercado nacional, onde em Lisboa e Algarve há muitos turistas que preferem jogar pelo seguro, vendem-se melhor as castas internacionais conhecidas.
NOVE DENOMINAÇÕES DE ORIGEM
A região de Lisboa tem 9 denominações de origem, algumas delas bastante específicas: Lourinhã – só para aguardentes, Carcavelos – só para vinho generoso e Bucelas — apenas para o vinho branco.
DO Lourinhã fica entre Óbidos e Peniche, onde devido à proximidade do mar e castas de grande produção plantadas em solos férteis, os vinhos ficam, naturalmente, com baixo grau alcoólico e acidez alta, tendo mais vocação para servir de base para destilados de qualidade. Carcavelos, com apenas 10 hectares de vinha, segundo o site da CVR Lisboa, é uma das três denominações históricas, juntamente com Bucelas e Colares, todas com características distintas. Foram as primeiras da região a serem demarcadas em 1908 por terem fama e importância económica na altura. Hoje compõem o triângulo dourado de Lisboa e contribuem para diversidade.
Colares, situada entre o mar e a serra de Sintra, com fortíssima influência Atlântica, em termos de brancos, dá primazia a Malvasia de Colares, que deve compor pelo menos 80% de lote. Outras castas autorizadas (Arinto, Galego-Dourado e Jampal) ficam em minoria e nunca aparecem no rótulo. Bucelas é a maior das três denominações históricas, tendo 142 hectares de vinha (dados CVR Lisboa) e é a única no país onde se produz apenas vinhos brancos, com forte predominância de Arinto. O vinho deve ser feito, no mínimo, de 75% desta casta, podendo completar o lote com Esgana-Cão e Rabo de Ovelha.
O relevo relativamente acentuado oferece alguma protecção da influência marítima. As vinhas instaladas em solos predominantemente derivados de margas e calcários duros, distribuídas pelas encostas suaves do vale do Rio Trancão, chegando até as várzeas com solos mais férteis e maturações mais tardias. As brisas do lado do Tejo também têm um efeito temperador, fazendo com que os Verões não sejam muito quentes, mantendo humidade bastante elevada, e desta forma, oferecem à casta as melhores condições para amadurecer lentamente e revelar o seu potencial.
Na parte central da região ficam as quatro denominações com maior contribuição em termos de área de vinha e produção – Alenquer, Torres Vedras, Arruda e Óbidos. DO Alenquer, onde a produção de vinho remonta, pelo menos, ao século XIII, fica a sul da Serra de Montejunto, ganhando protecção dos ventos frescos e húmidos do Atlântico. As vinhas ficam inseridas numa sequência das colinas e vales. Em Arruda dos Vinhos. a Sul de Alenquer, mais afastada dos maciços montanhosos, sente-se mais a afluência atlântica que confere temperaturas amenas, alguma nebulosidade e protege de geadas tardias. Delimitada pelo Atlântico a Oeste, com altitude baixa e fora da barreira montanhosa de Montejunto, o território de Torres Vedras está sob forte influência marítima e também fluvial, sendo atravessada por dois rios – Alcabrichel e Sizandro. A vinha cobre colinas e outeiros, descendo às várzeas ao redor dos rios.
A Noroeste da Serra de Montejunto está a denominação de origem Óbidos, integrando os concelhos Bombarral, Cadaval, Caldas da Rainha e Óbidos, propriamente dito. É uma zona com bastante precipitação devido às chuvas orográficas, influenciadas pela Serra. É nesta área que se situam algumas das casas mais clássicas da região como a Casa das Gaeiras, a Quinta das Cerejeiras, Quinta de S. Francisco, Quinta do Sanguinhal e a bem antiga, embora relativamente recente na produção de vinho de marca, Quinta do Gradil.
Na parte setentrional da região, fica a denominação Encostas D’Aire, assente no maciço cal- cário a Noroeste das Serras de Aire e Serra do Candeeiro. Tem muita influência marítima que marca o clima de transição entre o Atlântico e o Mediterrânico. Está dividida em duas sub-regiões – Alcobaça e Ourém. Nesta última é produzido um vinho histórico sob designação Medieval de Ourém, com apenas duas castas – Fernão Pires e Trincadeira em proporção 80%/20% no mosto, respectivamente.
Ao falar da diversidade, não se pode esquecer da categoria de Vinho Leve, produzido na região de Lisboa. É literalmente, um vinho com corpo leve e baixa graduação alcoólica (de 7,5% a 10,5%), podendo ser ligeiramente gaseificado (até 1 bar).
VISÃO HISTÓRICA
Durante quatro séculos do domínio muçulmano na região Oeste a actividade vitivinícola não tinha expressão. Após a fundação da nacionalidade, a viticultura desenvolveu-se graças às ordens religiosas, os Beneditinos, Clunicenses e ordem de Cister em Alcobaça. Mais tarde, a invasão francesa, depois doenças e pragas da vinha no século XIX penalizaram a produção de vinhos. No final da primeira metade do século passado apareceram casas como Casa das Gaeiras, Quinta do Sanguinhal ou Quinta das Cere- jeiras. As décadas 50 e 60 foram assinaladas pela proliferação de Adegas Cooperativas. Forte incremento do co- mércio para as ex-colónias levou à utilização de castas de grande produtividade, como Alicante Branco, Alvadurão (Síria), Malvasia Rei (conhecida na região como Seminário) e híbridos da Estação Agronómica Nacional. Das 23 adegas até aos nossos dias sobreviveram apenas 13 (referi- das no site da CVR Lisboa). Muitas delas conseguiram fazer uma reestruturação de castas e modernizar-se em termos de equipamento, portefólio e imagem.
Na viragem do século surgiram novos projectos de qualidade e que contribuem para o prestígio da região – Quinta do Monte D’Oiro, Quinta da Chocapalha, Quinta do Gradil, Adega Mãe, por exemplo.
A região está fortemente orientada para os mercados externos, sendo que 80% de vinho produzido é exportado, sobretudo através de dois grandes players como a Casa Santos Lima e a DFJ Vinhos. No panorama do mercado nacional e em termos de vinhos certificados, a região de Lisboa fica no sétimo lugar com 4,7% de vinhos brancos e 4,4% de vinhos tintos em volume.
Ainda há muito vinho vendido à granel, mas o vinho certificado tem vindo a crescer enormemente. A certificação Lisboa é hoje uma garantia de qualidade em vários mercados do mundo e os brancos da região que agora provamos contribuem certamente para isso. Frescos, vibrantes e diversos, são o espelho de uma Lisboa vinícola multifacetada e com espaço para crescer nas mesas de todo o mundo
Sabia que…
O vinho de Bucelas sob o nome “charneco” foi mencionado na peça de W. Shakespeare “Henrique VI”. Teve a ver com um lugar chamado Charneca em Bucelas. O branco famoso também era conhecido na Inglaterra como “hock portuguese” ou “Lisbon hock”, aproveitando a palavra popular “hock” referente aos vinhos brancos secos da Alemanha, particularmente, Riesling.
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Artigo da edição nº36, Abril 2020
Sociedade Agrícola de Pias: A César o que é de César

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TEXTO Mariana Lopes
NOTAS DE PROVA João Paulo Martins e Mariana Lopes
FOTOS Soc. Agr. Pias
José Veiga Margaça fundou a Sociedade Agrícola de Pias em 1973. Natural de Torres Vedras e com formação na Estação Vitivinícola de Dois Portos, viu-se depois a trabalhar num armazém em Ferreira do Alentejo, altura em que começou a sonhar com um projecto do género do que viria a fundar. Assim, em 73 e com mais dois sócios, instalou empresa e produção em Pias, adquirindo 800 hectares de terreno (sobretudo vinhas e olivais) entre Serpa e Moura. Também viria a restruturar as vinhas e a renovar a adega, dando emprego a muita gente daquela terra. A produção de vinho a granel era actividade principal, com venda em garrafão, mas com o tempo José Margaça introduziria a garrafa, criando outros canais de venda e distribuição.
Gerindo quase tudo sozinho até 1976, pois os outros dois sócios eram praticamente só investidores, nesse ano toda a propriedade foi ocupada por locais de Pias, consequência do PREC e da Reforma Agrária. Felizmente, os camponeses que a ocuparam mantiveram viva a produção de vinho naquele sítio, mas aqui a moeda teve duas faces. Por um lado, esta ocupação foi assumida como uma conquista e uma bandeira da revolução para um país que se erguia após a ditadura, o que inclusive originou romarias de todos os cantos de Portugal, para se testemunhar o sucesso dos agricultores/vitivinicultores em Pias e levar um pedaço dessa conquista para casa, em forma de garrafa. Por outro, enquanto a fama de Pias se enraizava cada vez mais na cabeça dos portugueses, havia toda uma indústria que começava a apropriar-se do nome da localidade, o que gerou, até hoje, um cardápio impressionante de algumas centenas de marcas com a palavra Pias, que nada têm que ver com esta origem, ou até com o país.[/vc_column_text][vc_gallery type=”nectarslider_style” images=”47890,47892,47893,47891,47898,47899,47900,47894,47895″ bullet_navigation=”true” bullet_navigation_style=”see_through” onclick=”link_no”][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Em paralelo a tudo isto, a partir do início da década de 80 e até 89, José Veiga Margaça recebeu de volta, faseadamente, as suas propriedades, bem como a adega e o escritório, acabando por adquirir a quota-parte dos outros dois sócios, ficando assim a empresa totalmente familiar. A nível de gestão pouco mudou: José Margaça era a cara do negócio, o que condizia com a sua faceta dinâmica, irrequieta e de “workaholic”. E por isso mesmo, sentindo que era esse o modo de estar que simbolizava a sua família e o seu negócio, desde o início do projecto que o garrafão de vinho ostentava o nome “Margaça”, acompanhado de um símbolo em elipse, que o mercado passou a identificar imediatamente. Em 1988, surgiu o primeiro vinho engarrafado, o tinto Encostas do Enxoé, que gerou burburinho no mercado e é ainda hoje um produto de carácter nostálgico, que muitos consumidores identificam.
Em 1993 dá-se um infeliz ponto de viragem, ano em que José Veiga Margaça adoece e fica impossibilitado de continuar a sua actividade, passando a gestão da empresa para os seus filhos Fernanda e Francisco, que reforçaram ainda mais o carácter familiar do projecto, tendo como uma das primeiras resoluções o lançamento do Encostas do Enxoé branco, em 1998. Por essa altura, o tinto da mesma marca já tinha uma produção de 12 500 garrafas. Curiosamente, o background de Fernanda Margaça era a investigação nuclear, actividade que também manteve em simultâneo com a gestão da Sociedade Agrícola de Pias. No início fê-lo com alguma relutância, mas cedo se reuniu de pessoas de confiança para que a empresa funcionasse de forma oleada enquanto não poderia estar presente. Em 2003 e até 2008, deu-se o processo de reconversão e plantação de novas vinhas, com foco nas castas brancas, que até essa altura tinham pouca quantidade. Assim, as vinhas mais antigas passaram a ser as de 2000 e além das castas tintas – predominantemente Aragonez, Trincadeira, Alfrocheiro, Castelão, Alicante Bouschet e Syrah – passaram a existir as brancas Arinto, Antão Vaz e Gouveio. Foi também em 2004 que a marca do vinho Pias foi alterada para As Pias.
Ventos de mudança
Em 2008 entra em cena Luís Margaça, filho de Fernanda, aquele que viria a ser o actual administrador da empresa. No entanto, o neto de José Veiga Margaça não entrou directamente para este cargo. Licenciado em gestão, começou nesse ano apenas a “ajudar” na empresa, iniciando pelo campo e pela adega, passando por todas as áreas até aprender um pouco de tudo (e não é assim que deve ser?). Foi também em 2008 que entrou uma pessoa que Luís Margaça revelou ter sido muito importante para a empresa: Aida Pires, comercial que estabeleceu relações fortes com os clientes. Dois anos depois, Luís vai para o escritório tratar da parte da exportação, componente que mesmo hoje representa uma menor percentagem do negócio, cerca de 8%. “Tirei o ‘curso de exportação’ a ligar todos os dias para as alfândegas”, disse, em tom de brincadeira. Em 2011, quando da saída de um dos elementos da equipa da mãe, Luís assumiu as tarefas deste e entrou com afinco na administração. Esta data foi também importante porque, além do lançamento da marca Pulo do Lobo, marcou uma explosão de vinhos com a palavra “Pias” no mercado nacional. Em 2015, plantaram-se as vinhas que hoje são as mais jovens.
Uma nova era
Mais tarde, em 2016, entra o actual enólogo e viticólogo, Renato Neves, que ficou com a parte do campo em sua jurisdição. “Tínhamos, até esta fase, um óptimo produto que era, sobretudo, escoado para granel”, confessou Luís, acrescentado que toda a equipa sentia que havia potencial para mais do que isso. A chegada do novo enólogo coincidiu de forma feliz com o empreendimento da barragem do Alqueva, que lhes tirou 100 hectares mas lhes deu um fornecimento de água fundamental. Assim, o panorama passou para 700 hectares na totalidade, 138 dos quais de vinha, 160 de olival (intensivo e super-intensivo) e 70 de amendoal. Na verdade, foram estas duas últimas áreas agrícolas que geraram financiamento para a vitivinicultura, tendo o azeite Encostas do Enxoé começado a ser distribuído em 2000. “Quando cheguei a Pias, a situação era diferente da que eu estava habituado, pois vinha de projectos vínicos que funcionavam de forma mais harmoniosa. Senti a necessidade de alterar o panorama, tendo visto problemas na organização da empresa a nível estrutural, de recursos humanos, equipamentos… estava tudo muito dedicado ao mercado do bag-in-box e a empresa fechada sobre ela própria”, contou Renato. Uma das primeiras coisas que fez foi desenvolver o sistema de rega, que disse ter sido crucial: “A rega é a ferramenta essencial para ter os custos de produção adequados à qualidade do produto, principalmente se a ajustarmos talhão a talhão”, explicou. Uma das grandes contribuições de Renato, juntamente com os viticultor João Torres, foi precisamente o facto de se ter começado a olhar para a vinha como parcelas e talhões diferentes uns dos outros. Em solos de origem argilo-calcária e arenosa, as vinhas da família Margaça vivem num microclima caracterizado por Verões quentes e secos, e Invernos húmidos e frios. Para as optimizar, investiu-se nesta altura em maquinaria, algo que já não acontecia há muitos anos. “Alguns tractores já nem cabiam nas vinhas”, lembrou Luís Margaça. Com Renato Neves, surgiram também novas tecnologias que aumentaram as quantidades processadas na adega, melhoraram os controlos de maturação e que permitiram a produção própria de leveduras, a título de exemplo. “Neste momento, estamos super-modernizados em todas as áreas”, afirmou o administrador. Em 2018, já com tudo organizado, Renato dedicou-se à vindima e à adega, uma instalação com 2 mil metros quadrados que já existia antes do “Avô Margaça”, com capacidade de armazenamento para dois milhões de litros. Até hoje, esta adega continua a sofrer alterações e investimentos.
Honrar a terra
Com a casa arrumada, chegou o tempo de olhar de forma séria para a estética dos vinhos e a sua comercialização. Foi por isso que em 2019 se iniciou o processo de “rebranding” da marca As Pias, rebranding esse assinado pelo atelier de Rita Rivotti. “Queríamos honrar esta nossa marca, que sabíamos genuína”, disse Luís Margaça. Desde a primeira garrafa com “Pias” no rótulo, saída em 1995, já tinham saído muitas mas, na verdade, foi a família Margaça que sempre investiu na freguesia, com uma política social que nunca deixou de passar por apostar nas pessoas de lá. Dos 36 funcionários efectivos, apenas cinco não são de Pias, incluindo Renato e Luís. E foi aqui que o gestor decidiu que, em vez de ingressar numa luta sem fim pela palavra já tantas vezes repetida em registos por este país fora, “seria mais identitário ainda comunicar os Margaça de Pias. Somos Pias porque estamos em Pias”. Surgiu, assim, em 2020, a nova gama Família Margaça, que Renato descreveu como “uma marca superior para nos reposicionar no mercado, com um vinho de qualidade e perfil reproduzíveis colheita a colheita”. Com distribuidores exclusivos para esta marca, o objectivo é levá-la para canais diferentes dos habituais. Para o primeiro ano, o parceiro é a Garrafeira Soares, onde são vendidos os vinhos, que também estão disponíveis em loja online própria. “Este salto é feito com muita segurança e é também um mote para eventuais novas gamas especiais, no futuro”, desvendou Luís.
Com o intuito de fechar um ciclo, a família Margaça tem em marcha um projecto de enoturismo, que tem já infra-estrutura pronta mas que, devido à entrada na fase de recolhimento (imposta pela pandemia) ainda não foi utilizada. Também já existe um wine bar próprio, aberto para a rua, e uma zona-museu com um espólio de equipamentos antigos dos próprios e de uma outra adega já desactivada. De marcas próprias, já se produzem 200 mil garrafas por ano. “Felizmente, a venda a granel tem-nos permitido resistir melhor a esta fase crítica”, desabafou Luís Margaça. Mas olha para o futuro de forma positiva com a intenção, por exemplo, de plantar novas castas – como Alvarinho, Encruzado e Viosinho – de alargar a rede de distribuição e “se a economia resistir a esta fase”, aumentar a produção da nova gama Família Margaça. E é com um sorriso contagiante que conclui: “O meu avô iria ficar muito contente com o que está a acontecer na empresa agora. Ele prezava muito as relações entre as pessoas, a conversa, a palavra e o aperto de mão. Por isso, se pudesse, estaria aqui, de qualquer maneira que fosse”.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][image_with_animation image_url=”47907″ alignment=”” animation=”Fade In” border_radius=”none” box_shadow=”none” max_width=”100%”][vc_column_text]
Veja as notas de prova dos vinhos da gama Família Margaça aqui.
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Edição nº 36, Abril de 2020
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Gaivosa multiplex

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[vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Setembro 2020
Marca clássica do Douro, nascida na colheita de 1992, a Quinta da Gaivosa desdobra-se hoje num vasto conjunto de referências, entre brancos e tintos, oriundos de vinhas mais jovens e mais antigas, com parcelas muito distintas umas das outras. Mas independentemente da origem e das opções de adega, a verdade é que o carácter Gaivosa está sempre presente, como se comprova nas novas colheitas agora colocadas no mercado.
TEXTO Luís Lopes
Multiplex, definição: conjunto muito variado de elementos que se cruzam numa relação complexa.
A encosta da Gaivosa é conhecida desde os primórdios da nacionalidade, sendo o monte referido na “Carta de doação e couto da ermida de Santa Comba” assinada por D. Afonso Henriques em 1139. Será de supor que então existisse vinha naquele local, que hoje se situa junto à antiga Estrada Nacional 2, na freguesia da Cumieira, a 4 km de Santa Marta de Penaguião. Garantidamente, a vinha já era ali a cultura dominante à época da demarcação da região do Douro, com as célebres Memórias Paroquiais de 1758 (questionário que o Marquês de Pombal mandou fazer em todas as paróquias do reino) a referirem expressamente o “sítio da Gaivoza, bem conhecido pelos exquesitos vinhos”.
A propriedade situa-se na margem direita do rio Corgo e as vinhas estão plantadas entre os 240 e os 450 metros de altitude em solos de xisto bastante pedregosos. Neste extremo noroeste do Baixo Corgo o clima é mais ameno do que na maior parte da região do Douro, para o que contribui também a proximidade do Marão e a floresta da quinta.
A família Alves de Sousa produz ali uvas e vinhos desde há muitos, muitos anos. Domingos Alves de Sousa representa a quarta geração de viticultores e foi ele que protagonizou a grande mudança na vocação familiar, passando de fornecedor de vinho do Porto a granel às principais casas de Gaia, para produtor de vinho do Douro engarrafado.
A estreia, na vindima de 1992, do Quinta da Gaivosa tinto, faz parte da história do Douro moderno e foi o primeiro passo para a consagração da marca. O Quinta da Gaivosa, resultado da fermentação conjunta das uvas das melhores parcelas da propriedade, com a consultoria enológica de Anselmo Mendes, apareceria apenas nos melhores anos, surgindo depois em 1994, 1995, 1997, 1999 e 2000. Na vindima de 2003 optou-se por uma outra abordagem, com a vinificação separada por parcela, fazendo-se o lote no final. Os Gaivosa que se seguiram (2005, 2008, 2009, 2011, 2013, 2015 e 2017) mantiveram o conceito.
A separação das parcelas possibilitou igualmente o nascer de novas referências, como o Vinha de Lordelo e o Abandonado. Entretanto, a enologia da casa foi assumida por Tiago Alves de Sousa, com a quinta geração a dar continuidade à saga familiar.
Vinhas diferenciadoras
A propriedade onde nascem as várias declinações do Quinta da Gaivosa tem 25 hectares de vinha, com diversas orientações solares (predominando poente nas castas tintas e nascente na brancas), declives (entre os 30 e 45%), sistemas de plantação e condução, e idades. As castas tintas representam 75% e as brancas 25%. Quase metade dos vinhedos é constituído por videiras muito velhas, algumas centenárias, com as castas tradicionais misturadas.
É nestas vinhas mais antigas que têm origem o Quinta da Gaivosa, o Vinha de Lordelo e o Abandonado. Estão ali representadas mais de 50 variedades de uva, 30 tintas e 20 brancas, incluindo nomes que raramente aparecem nos contra-rótulos durienses: Donzelinho Tinto, Tinta Bairrada, Malvasia Preta, Tinta da Barca, Touriga Brasileira, Alicante Bouschet, Ratinho, Chasselas, Avesso, Tamarez, Cerceal, Moscatel de Alexandria…
Mas a quinta tem igualmente uma área de vinha ao alto, uma outra de patamares e ainda, desde 2014, uma parte constituída por “vinhas tradicionais novas”. Esta última é a “menina dos olhos” de Tiago Alves de Sousa. “Temos hoje a possibilidade de comparar os vários modelos adoptados ao longo da história do Douro – vinhas tradicionais, patamares, vinha ao alto”, refere. “Quais as mais bem adaptadas às condições naturais, mais preparadas para os desafios climáticos, mais amigas do ambiente, mais longevas, as que dão vinhos de maior qualidade e maior identidade?”, é a pergunta que deixa, adivinhando-se a resposta.
O futuro, assegura, está nas “novas vinhas velhas”. No fundo, trata-se de recriar a vinha tradicional do Douro, aproveitando as suas melhores características e combinando-as com uma viticultura moderna e de precisão. O que significa a preservação da topografia natural da encosta, mantendo os antigos muros de xisto, com as videiras plantadas segundo as curvas de nível; a opção pelo sistema clássico de condução em Guyot duplo; a alta densidade de plantação (8.000 videiras/hectare); a mistura de castas, mas não de forma aleatória, antes organizadas em linhas ou micro-blocos; e a preservação nestas vinhas do património genético das castas oriundas das vinhas mais velhas da Gaivosa.
A partir de 2014, todas as novas vinhas da Gaivosa foram feitas desta forma e o tinto Gaivosa Primeiros Anos de 2017 que aqui provámos foi o primeiro fruto do actual modelo de plantação.
É, pois, desta amálgama de tradição e modernidade que são feitos os vinhos hoje produzidos na Gaivosa. “Estamos a preparar o futuro, preservando as vinhas do passado, por um lado e, por outro, plantando as vinhas do amanhã para as novas gerações”, diz Tiago. “E essas vinhas assentam na sustentabilidade e na identidade”, conclui.
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