Caves Messias: Grandes vinhos, grande família

A Caves Messias é um dos grandes produtores de vinho do nosso país. Com vinhas na Bairrada, onde tem a sede, no Dão e no Douro, a empresa consegue chegar a quase todos os tipos de vinhos e possui um portefólio impressionante. Na sua base continua a estar uma família que cada vez mais alia […]

A Caves Messias é um dos grandes produtores de vinho do nosso país. Com vinhas na Bairrada, onde tem a sede, no Dão e no Douro, a empresa consegue chegar a quase todos os tipos de vinhos e possui um portefólio impressionante. Na sua base continua a estar uma família que cada vez mais alia a discrição à vontade de bem fazer.

TEXTO António Falcão
NOTAS DE PROVA Vários provadores da GE
FOTOS Anabela Trindade

Os representantes da família na administração: Gonçalo Lousada, José Vigário, Margarida Valente, Messias Vigário e Henrique Guedes de Campos.

A Grandes Escolhas percorreu os caminhos da Caves Messias, conduzidos por Gonçalo Lousada, responsável da produção, e Margarida Valente, prima de Gonçalo e responsável de marketing, enoturismo e recursos humanos. Ambos são administradores, tal como mais outros três elementos, cada um deles representando uma das cinco famílias que herdaram o património que começou a ter nome em 1926. Gonçalo e Margarida representam a quarta geração à frente dos destinos da casa, que começou com Messias Baptista, o fundador da empresa (na altura ainda em nome individual). Não se sabe a história completa de Messias, mas Margarida disse-nos que o bisavô começou de baixo. Terá começado a sua fortuna a exportar vinho para vários mercados da Europa. Outra versão fala ainda da venda de aguardente aos produtores de Vinho do Porto, trazida de grandes explorações do Ribatejo. Estas e outras actividades económicas deram-lhe capacidade para começar a adquirir terras e vinhas na sua Bairrada natal. Em 1938 a 1943 constrói a actual sede da casa, na Mealhada, uma estrutura já de grande dimensão, fundamentalmente constituída por caves e armazéns. Poucos anos depois, Messias Baptista oferece um cineteatro ao município da Mealhada. Mais tarde recebe o grau de Comendador.
Ao longo dos anos foi acumulando uma fortuna considerável. Parte da fortuna foi para a compra de terras e casas. Começou na Bairrada, onde se destacou a Quinta de Valdoeiro, na Mealhada, nos anos 40 do século passado. A segunda aquisição foi no Douro, a Quinta do Cachão, em 1956. Dois anos depois, Messias Baptista iria adquirir uma quinta adjacente, a Quinta do Rei, que pertencia a Gonzalez Byass, famoso produtor de Jerez. As duas quintas fundiram-se e possuem cerca de 200 hectares, dos quais 90 estão actualmente ocupados por vinha. E foi exactamente por aqui que começámos a nossa visita.

Rumo a Ferradosa, São João da Pesqueira

A Quinta do Cachão fica no Cima Corgo, mas está praticamente encostada ao Douro Superior. “A próxima freguesia já aí pertence”, diz-nos Gonçalo. E a paisagem não mente, com as fragas e rochas a mostrarem aquele lado mais selvagem tão típico da sub-região mais a Leste. A casa de apoio aos visitantes, sejam ele família ou técnicos, fica mesmo ao lado da adega e tem todos os confortos necessários neste pedaço de mundo afastado de quase tudo. Estamos no fundo de um vale e ao lado está o final de um dos braços da barragem da Valeira, uma das cinco que represam o Douro na sua corrida para o mar (em território português). O efeito estético é muito interessante.
A adega, de aspecto industrial fica logo ao lado e, apesar de estar em colina, na altura da construção, há umas décadas, optou-se por colocar a recepção da uva na base e depois bombar as massas para os respectivos depósitos. Nos dias de hoje seria exactamente ao contrário, para evitar bombas e usar o benefício da gravidade, maximizando a qualidade. Gonçalo pretende reformular em breve a recepção da adega para a parte de cima, nem que seja apenas para as uvas que vêm em caixas, destinadas para os vinhos especiais. Este ano o desafio é ainda comprar alguns lagares e depósitos de pequena capacidade, para tintos e Vintage ainda mais ambiciosos, à semelhança do que fazem na Mealhada.
No exterior está um generoso conjunto de grandes depósitos (de 50 a 150 mil litros) onde estão os vinhos vinificados. Os vinhos por aqui ficam, muitas vezes um ano ou dois, antes de transitar para madeira ou garrafa.


A adega recebe, das vinhas da casa, apenas 180 toneladas de uva tinta e 10 toneladas de branca. Pouca quantidade para a área de vinha, mas existe uma explicação: “preferimos qualidade em detrimento da quantidade”, afiança Gonçalo. No total a adega recebe muito mais uva do que esta, através de contractos com muitos viticultores da região. No total, entram aqui em média, e por ano, 1,6 milhões de quilos. Como a adega foi projectada para o dobro, conseguem-se “fazer as coisas com calma”, garante o director de produção. Cerca de 70% vai para Vinho do Porto, o resto para vinho Douro. Tudo é engarrafado em Gaia.
Por baixo da adega, uma nova construção, com apenas alguns anos: a casa das barricas, que alberga os melhores vinhos tintos da casa. Todos os anos se compram barricas novas, mas predomina a madeira de carvalho francês. João Soares, o enólogo que vem da Mealhada, é o experimentador nato e por isso reina a diversidade de marcas. Por outro lado, a equipa de enologia descobriu que misturar barricas novas e velhas dá melhores resultados.

Um enorme património de tawnies

A enóloga Ana Urbano gere os stocks de um vasto património de Vinho do Porto. Só na Quinta do Cachão estão cerca de 500 mil litros, com datas a começar em 1982. O armazém principal fica a cerca de 2 quilómetros da adega e é constituído por um enorme edifício mesmo junto ao rio. A abertura da porta, no piso inferior, revela-nos um gigantesco pé direito, exibindo um telhado lá em cima, a mais de 10 metros de altura do chão. As retorcidas traves de madeira, de enorme tamanho e espessura, revelam que esta antiga adega está aqui há muitas, muitas décadas. As grossas paredes de pedra e as raquíticas janelas só realçam ainda mais a cinefilia do espaço, que nos leva a mente para séries de grandiosos cenários, como a Guerra dos Tronos ou o Senhor dos Anéis. Encostados à parede, diversos tonéis e balseiros de vários tamanhos e capacidades, até às dezenas de milhar de litros, por exemplo). Cada tonel tem vinhos de um ano só e aqui não há lotes. Este espaço consegue manter-se fresco todo o ano, mesmo quando estão 40 graus lá fora, garante Margarida.
A idade do edifício? Não se sabe ao certo e, pasme-se, não havia registo dele na câmara municipal. Um indício é a data inscrita num dos tonéis: 1853.
Este seria um local óptimo para fazer eventos vínicos e Margarida Valente sabe-o. O grande óbice, está bom de ver, é o afastamento dos grandes centros. A Régua está muito longe e mesmo o Pinhão dista quase uma hora de carro. A viagem por rio, contudo, é bem mais descansada, mas exige a passagem por barragens e respectivas eclusas: as mais próximas são Bagaúste, entre a Régua e o Pinhão, e Valeira, mais acima no rio. Menos mal que aqui não faltam cais de atracagem, incluindo o da Ferradosa. Este será um projecto para o futuro próximo, certamente, até porque uma casa anexa está já projectada para ser convertida em enoturismo. A exploração poderá vir a ser realizada com um parceiro especializado.
Ana Urbano traz-nos, entretanto, para o presente. “Envelhecemos aqui os vinhos, a maioria para fazer tawnies. Quando os vinhos chegam à qualidade que pretendemos, são enviados para Gaia e substituídos por vinho novo”. Ana prefere estagiar os vinhos em Gaia, que é uma zona mais fresca e húmida e os vinhos levam mais tempo a envelhecer.

Chega, entretanto, Albertino, o homem que toma conta dos vinhos. Quem pense que é só encher os tonéis e esquecer, engana-se. Um Vinho do Porto em estágio dá muito trabalho e as operações não admitem erros. Albertino passa por aqui todos os dias e, de vez em quando tem de arejar um vinho, instruído pela enóloga; ou seja, tira-se o vinho pela torneira de baixo, para um recipiente, e volta para o tonel por cima, através de mangueira. “Quando estão muito tempo fechados, os vinhos do Porto podem ficar com poucos aromas; o arejamento reanima-os”, esclarece Ana. Outra tarefa frequente é, por exemplo, arranjar um tonel que começou a verter e lá se tem que chamar um tanoeiro, coisa nada fácil nos dias que correm.
Fazer os lotes, já em Gaia, é das tarefas favoritas de Ana. Até porque os vinhos podem ser caprichosos. Diz ela que “nunca recuso um lote só porque à primeira parece não funcionar. No dia seguinte pode estar muito diferente e…. muito melhor. Os vinhos têm que casar…”. A técnica de laboratório da casa, Ana Maria, ajuda nesta tarefa.

Vinha no Cachão

Depois de adquirida, a quinta foi alvo de uma grande reestruturação. As castas típicas do Douro, claro, mas já separadas por talhões. Esta quinta terá sido mesmo a pioneira no Douro neste sistema de gestão da vinha. De esses tempos até hoje, a vinha foi sofrendo reestruturações, a cargo das gerações seguintes. Ana consegue assim fermentar casta a casta e depois fazer blends. É quase tudo tinto, excepto um bocadinho de Malvasia e Rabigato. Esta região é muito quente para brancos, afirma Ana. A maior vinha ocupa uma boa parte do monte de Santa Bárbara, encimado por uma capela, a mais de 300 metros de altura. A enorme vinha estende-se até ao rio, quase 200 metros mais abaixo. A plantação mais recente foi um pouco de Sousão, há dois anos, para se conseguir “um pouco mais de acidez”, diz Ana. No total estamos a falar de cerca de 90 hectares, uma vinha de tamanho considerável no Douro e um património invejável. O maior desafio aqui é, cada vez mais, a falta de mão-de-obra, especialmente na vindima. Este problema, diga-se de passagem, é neste momento transversal a todo o Douro.

Rumo à Mealhada

Saímos do Douro em direcção ao sul, para a Mealhada. Pelo meio, mais ou menos, fica a Quinta do Penedo, a operação Dão da Messias. Junto à Aldeia de Carvalho, Mangualde, esta quinta foi adquirida pela Messias em 1999 e pouco tempo depois estava em reestruturação, com as castas mais típicas do Dão. No portefólio da casa, o Dão ocupa pouco espaço, até porque a área de vinha é aqui a mais reduzida de todas as regiões: tem apenas 20 hectares de vinha, que dá origem a três tintos e um branco.

Os enólogos João Soares e Ana Urbano, e o técnico de viticultura Manuel António.

Chegamos finalmente à Bairrada, onde o destino é de imediato a enorme Quinta do Valdoeiro, uma das maiores áreas contíguas de vinha da região, com 70 hectares de videiras. Esta quinta tem a particularidade de ser atravessada pela linha de comboio da Beira Alta, que separa a vinha em duas partes. Um enorme edifício vê-se ao longe, mas não é a adega. Eram construções de uma antiga exploração de gado.
Para o visitante, esta vinha é de facto de uma beleza surpreendente, também pela sua extensão e morfologia, instalada num vale de colinas suaves, entrecortado aqui e ali por pinhal. Que contraste face ao tom rústico e selvagem do Douro! Em vez de xisto, o solo aqui é predominante argilo-calcário. O clima é também muito diferente, marcado substancialmente pela proximidade ao Atlântico, a uns meros 35 quilómetros: “é mais temperado que no Douro”, atira-nos Messias Vigário, administrador e responsável comercial da casa. Ou seja, menores amplitudes térmicas e muito mais humidade, dois factores que fazem muita diferença no vinho (sobretudo na acidez), mas, no caso da humidade, costuma colocar aqui grande pressão de doenças fúngicas, muito mais do que no Douro. Mas longe vão os tempos em que se faziam de 12 a 14 tratamentos; nesta altura fazem menos de metade, uma maravilha em termos económicos e ambientais.
Conseguir maturações completas é o outro grande desafio. A casta tinta rainha da Bairrada, a Baga, é das menos exigentes, porque se conseguem excelentes vinhos com graus alcoólicos abaixo dos 13,5 graus. Outras castas tintas precisam de maior grau, mas, verdade seja dita, os últimos anos têm ajudado, com épocas de vindima secas. Outro ponto a favor é a recente máquina de vindimar, que consegue fazer 5 a 6 hectares por dia. “Foi um alívio, porque em alguns anos isto era um sufoco com falta de mão-de-obra”, garante José Vigário, o administrador da casa com o pelouro financeiro. Manuel António acrescenta: “antes tínhamos 60 pessoas a vindimar e levávamos mais de 20 dias a apanhar… hoje fazemos tudo em metade do tempo”. A máquina tem outra enorme vantagem: colher as uvas mais próximas do ponto óptimo de maturação, uma etapa crucial para a qualidade dos vinhos. Sem ter medo da chuva, o eterno problema nesta região (e em outras). Manuel António e Gonçalo Lousada adoravam levar a máquina para o Douro, mas tal não é possível, claro, pela inclinação do terreno.

Quinta do Valdoeiro.

É neste contexto que trabalham João Soares e o técnico de viticultura Manuel António, que estão juntos na Messias há mais de 18 anos, um caso raro de longevidade nesta fileira. E conseguem produzir todos os anos um belo portfolio de vinhos, desde espumantes até tintos, com uma notável consistência de qualidade. Mesmo no Valdoeiro colheita, cuja produção chega às 60 ou 70 mil garrafas. Este que é, diz João Soares, o “grande desafio enológico: fazer 3 ou 4 mil garrafas de um vinho especial não é muito difícil aqui no Valdoeiro”.
As uvas vão para a sede da casa, na Mealhada, onde as instalações possuem tudo o que é necessário para produzir bons vinhos e espumantes. Produzir e, acrescentamos, armazenar, especialmente no caso dos espumantes, que precisam de muito tempo em garrafa antes de irem para o mercado. Não espanta assim que a Messias tenha em stock mais de um milhão de garrafas de espumante, um negócio “importantíssimo e em crescimento” para a família, nas palavras de Messias Vigário. Sem contar com o Vinho do Porto, o sector ‘espumantes’ representa 30% da facturação e tem tido muito sucesso também na exportação. Messias Vigário diz que, pela Europa fora, os enófilos começam a conhecer e gostar do espumante português.
Alguns deles aparecem na Mealhada, onde hoje têm melhores condições para serem recebidos. A casa fez obras recentes na recepção e possui uma elegante loja com espaço, num piso superior, para fazer algumas provas.

Vasto portefólio

Uma parte do que é vinificado na Messias não vai para produtos da casa. Em particular no Vinho do Porto, onde o negócio vai para a venda de vinho a grandes casas. Uma parte do vinho feito com uvas do Douro, contudo, fica nos armazéns, em Gaia. Vai para marcas da casa, brancas e tintas, e em todos os estilos. Os tawnies, contudo, têm especial destaque. É por isso que a Messias possui uma das mais vastas colecções de ‘colheitas’, com data de vindima. Uma parte está até disponível para aquisição no site da empresa, com datas que recuam até 1962. Por lá estão também quatro tintos emblemáticos. Destacamos três deles: um é o Triunvirato, lote de vinhos do Douro, do Dão e da Bairrada. Outro vinho invulgar chama-se Dados, um Douro feito na colheita de 2009 em parceria com o enólogo espanhol Javier Rodriguez. Não teve continuidade. Finalmente, o Clássico, o Baga da Bairrada que apenas é feito em anos de enorme qualidade.


De resto, o portefólio é enorme e só uma pequena parte foi aqui avaliada. O grande objectivo estabelecido para o futuro pelos seus timoneiros, José e Messias, é ir subindo paulatinamente a qualidade dos vinhos e, ao mesmo tempo, o seu valor no mercado. A equipa de gestão, incluindo os técnicos, sabe que este desafio não é fácil: implica pequenas afinações em todo o processo, melhorias constantes, e, claro, alguma sorte, em especial no clima. A exportação tem ajudado, com 65% dos vinhos a ir para o estrangeiro. A Alemanha é, de longe, o maior mercado, e com pouca ajuda do chamado ‘mercado da saudade’. Ou seja, os alemães gostam mesmo dos vinhos da casa.

A caminho do século

O percurso da Caves Messias sempre foi discreto, mas o observador mais atento percebeu que os vinhos que daqui têm saído, sejam eles Douro, Dão ou Bairrada, generoso ou espumante, mostram um trabalho cada vez mais sério e sustentado em experiência e conhecimento. A empresa continua a singrar e apresta-se para fazer um século de actividade em 2026. Pode parecer que ainda falta muito, mas não é assim. Não é cedo, por exemplo, para preparar um Vinho do Porto, um tinto muito ambicioso ou um espumante com estágio ‘sur lies’. A família sabe-o e, em conjunto com os técnicos, já estão a preparar “qualquer coisa”. João Soares não adianta mais, mas será certamente algo em grande. E faz bem, porque a casa Messias merece-o.

 

Edição nº 34, Fevereiro de 2020

Rota da Bairrada tem loja online de vinhos e outros produtos certificados

A Bairrada dispunha já de uma plataforma de promoção e comercialização integrada de produtos certificados, com venda para qualquer parte do país e do mundo. A funcionar desde 2014, a loja online da Rota da Bairrada foi desenvolvida como um canal de venda paralelo aos Espaços [físicos] Bairrada – na Curia e em Oliveira do […]

A Bairrada dispunha já de uma plataforma de promoção e comercialização integrada de produtos certificados, com venda para qualquer parte do país e do mundo. A funcionar desde 2014, a loja online da Rota da Bairrada foi desenvolvida como um canal de venda paralelo aos Espaços [físicos] Bairrada – na Curia e em Oliveira do Bairro.

Volvido quase um mês, esta foi e tem sido uma ferramenta crucial para evitar quebrar relações entre produtores (principalmente os mais pequenos e recentes) e o consumidor, durante o surto de Covid-19. Em comunicado de imprensa, a Rota da Bairrada refere que “as vendas têm vindo a crescer e o desafio da Rota passa agora por aumentar a oferta, estando de “portas abertas” para a entrada de novos associados”.

Entre espumantes, licorosos e aguardentes, são mais de 400 as referências vínicas de 38 produtores associados, representadas na loja online da Rota da Bairrada. No mesmo domínio, é ainda possível descobrir alguns produtos regionais, como vinagres, azeites, óleo de grainha de uva, compotas e chocolates. E porque o vinho é cultura, há uma secção dedicada a alguma bibliografia da região Bairrada e não só.

A compra online é segura e tem vantagens: os produtos chegam directamente a casa, os portes são gratuitos para Portugal Continental em compras iguais ou superiores a €50, quem tiver o Cartão Cliente Bairrada beneficia da duplicação dos pontos e há sempre promoções.

Com a encomenda, segue ainda um flyer da região, com sugestões de visita; um folheto de experiências nos Espaços Bairrada e um voucher oferta para um Bairrada em Prova (prova de 5 vinhos, de 5 produtores diferentes).

Esta notícia é mais uma que se insere no tema “coisas boas que acontecem no meio da adversidade”, neste caso, a pandemia da Covid-19. Tudo tomou forma a partir de um repto, lançado nas redes sociais, de Miguel Ferreira, autor da magazine digital A Lei do Vinho:

“A Unidade de Saúde da Mealhada contactou as farmácias locais no sentido de se criar uma equipa de trabalho para produzir álcool gel a partir de aguardente vínica. Para tal necessitam com urgência de espaços de destilação onde o produto possa ser produzido. A todos os produtores bairradinos que possam ajudar, agradeço que me contactem por mensagem privada ou contacto com Mafalda Melo. Com o apoio de todos podemos ultrapassar mais depressa este flagelo”.

À data desta notícia, a publicação já tinha atingido 145 partilhas, o que levou ao sucesso do apelo. Mário Sérgio Nuno, da Quinta das Bágeiras, foi o primeiro produtor a disponibilizar as suas destilarias. Seguiu-se a destilaria Levira, situada em São Lourenço do Bairro, na pessoa de Pedro Carvalho, uma das maiores de Portugal. E outros seguirão o exemplo.

Como revela o Sapo24, a farmacêutica da Mealhada referida no pedido de Miguel Ferreira, Mafalda Melo, declarou que “O objectivo é minimizar a dificuldade de acesso [ao gel desinfectante] por parte da população não ligada aos serviços de saúde. Já escasseiam as soluções e a Bairrada, com forte tradição na produção de derivados vinícolas, estaria disposta a ceder a matéria-prima para posterior destilação. É uma ideia transversal a enfermeiros e farmacêuticos. A proximidade aos produtores é grande e eles questionam-nos sobre essa eventual possibilidade”.

Almoço-tertúlia “Do Reino a Coimbra” volta já este fim-de-semana

Será já no próximo sábado, dia 25 de Janeiro, que se realizará a segunda edição do “Do Reino a Coimbra”, ciclo de almoços tertúlia dedicados à cozinha das várias regiões do país, em harmonização com vinhos da Bairrada (e mais alguns). A organização cabe à magazine digital “A Lei do Vinho”, de Miguel Ferreira, numa […]

Será já no próximo sábado, dia 25 de Janeiro, que se realizará a segunda edição do “Do Reino a Coimbra”, ciclo de almoços tertúlia dedicados à cozinha das várias regiões do país, em harmonização com vinhos da Bairrada (e mais alguns). A organização cabe à magazine digital “A Lei do Vinho”, de Miguel Ferreira, numa parceria com o restaurante anfitrião, Cordel Maneirista (na foto), em Santa Clara, Coimbra.

Esta segunda edição será dedicada à abordagem da gastronomia duriense pela pena de Miguel Torga, escritor que teve Coimbra como lar durante muitos anos, aí se dedicando não apenas à escrita, mas também ao exercício da Medicina.

As convidadas especiais serão a historiadora Dina Ferreira de Sousa, autora da obra “Sabores da Mesa na Obra de Miguel Torga”, um livro factual e sentido, com deliciosas abordagens e detalhes da cozinha portuguesa resultantes da sua investigação literária e gastronómica, e a professora Fátima Flores, filha de uma das grandes referências da enologia nacional da segunda metade do século XX, Martins da Costa, e sócia das mais antigas caves em actividade na região da Bairrada, as Caves São João. Dela teremos não só o testemunho histórico sobre as empresas vitivinícolas mais clássicas da região, como também o relato íntimo das tertúlias familiares à mesa com Miguel Torga, grande curioso sobre os vinhos da Bairrada.

O almoço tertúlia será dividido em cinco momentos: “A Chegada”, “O Farnel de Caça e Mata-Bicho”, “A Espera”, “A Aproximação” e “A Montaria”, num retrato da caça e dos pratos durienses igualmente associados àquela actividade.

Nos vinhos, estarão representados sete reconhecidos produtores bairradinos – Adega de Cantanhede, Casa de Saima, Caves Messias, Caves da Montanha, Caves São João, Caves Primavera e Quinta dos Abibes – com espumantes, vinhos brancos, tintos e licorosos.

O almoço terá um custo de €37,50 e as inscrições podem ser feitas através dos mails geral@aleidovinho.com ou cordelmaneirista@gmail.com

Bairrada, a excelência em tons de branco

A Bairrada é uma pequena região de grandes vinhos. E a sua dimensão qualitativa vai muito além da notoriedade dos sólidos tintos de Baga e dos frescos espumantes. Na verdade, a Bairrada é uma das melhores regiões do país para produção de belíssimos vinhos brancos, com uma longevidade invejável. TEXTO Valéria Zeferino FOTOS Ricardo Gomez […]

A Bairrada é uma pequena região de grandes vinhos. E a sua dimensão qualitativa vai muito além da notoriedade dos sólidos tintos de Baga e dos frescos espumantes. Na verdade, a Bairrada é uma das melhores regiões do país para produção de belíssimos vinhos brancos, com uma longevidade invejável.

TEXTO Valéria Zeferino
FOTOS Ricardo Gomez

Há até quem considere que a Bairrada é mais região de brancos do que de tintos e é fácil de perceber porquê. A casta predominante na Bairrada é a Baga, que amadurece tarde, muitas vezes ultrapassando as chuvas de equinócio e, quanto a chuva se prolonga, nem sempre consegue a melhor performance. As castas brancas, amadurecendo mais cedo, têm mais condições para uma maturação perfeita e consistente de ano para ano.
Esta prova evidenciou que os vinhos brancos da Bairrada são de altíssima qualidade e que melhoram substancialmente com o tempo em garrafa.
Em termos quantitativos, os vinhos brancos certificados (sem contar com os vinhos base para espumantes) são em minoria e correspondem a cerca de 20% da produção na Bairrada (de 400 a 450 mil garrafas). Isto deve-se a uma menor popularidade de brancos entre os consumidores e, tirando os Vinhos Verdes, a verdade é que o tinto predomina em todas as regiões do país.Condições edafo-climáticas
A Bairrada está situada no centro litoral do país, orientada no sentido Norte-Sul entre as cidades Águeda e Coimbra e os rios Vouga e Mondego. A leste fica naturalmente demarcada pelas serras do Caramulo e do Buçaco e a oeste estende-se até à orla marítima que exerce forte influência atlântica na região. O clima é temperado, com verões não demasiado quentes, invernos brandos e moderada amplitude térmica anual. As temperaturas médias anuais situam-se entre os 12,5˚C e os 15˚C (em comparação, no Alentejo varia de 15˚C a 17,5˚C). A maioria das zonas da Região da Bairrada usufrui de cerca de 2.500 horas de sol por ano. A precipitação vai de 800 a 1600 mm/ano (este último valor está ao nível da região dos Vinhos Verdes), aumentando de Oeste para Este e concentrando-se nos meses de Outono e Inverno.
Trata-se uma região bastante plana com colinas pouco acentuadas. As vinhas encontram-se plantadas entre os 40 e 120 m de altitude, o que faz sentir a influência Atlântica em toda a região. Geologicamente é muito heterogénea e os solos variam em composição de argila e calcário, com algumas zonas arenosas. Os solos mais argilosos precisam de ser bem drenados e dificultam a sua mobilização e os com mais calcário apresentam cor esbranquiçada e uma maior pedregosidade. Actualmente, conta com cerca de 6000 hectares de vinha.Marcos históricos
A cultura da vinha na região remonta à época da Reconquista cristã aos Mouros que teve início no século VIII. Demonstrou um grande crescimento nos séculos X – XII graças a ordens monásticas.
A produção de vinho estagnou após a demarcação da região do Douro em 1756, quando o Marquês de Pombal decretou o arranque das vinhas nas margens e campinas dos rios Mondego e Vouga. Para além de proteger a origem dos Vinhos do Porto, queria substituir o cultivo da vinha na região, que era abundante, pelo cultivo dos cereais, pois o pão escasseava.
No início do sêculo XIX, lentamente, a vitivinicultura bairradina começou a recuperar, mas mal o vinho voltou a ser valorizado, muitos produtores gananciosos cederam à tentação de plantar vinha em terrenos impróprios. Isto levou à primeira tentativa da demarcação na Bairrada que foi feita pelo político e cientista António Augusto Aguiar em 1867, baseada na relação entre constituição geológica dos terrenos e tipos de vinho.
O vinho de melhor qualidade chamava-se “Vinho de Embarque” e era destinado à exportação, e o vinho de qualidade mais fraca – “Vinho de Consumo” para o mercado interno. Os vinhos brancos de embarque eram produzidos na margem esquerda do rio Cértima até Óis do Bairro, São Lourenço do Bairro e Mogofores. No século passado, a partir dos anos 20, na Bairrada começaram a proliferar as Caves (Irmãos Unidos/Caves São João, Caves do Barrocão, Cave Central da Bairrada, Caves Messias, Caves Aliança, Caves Valdarcos, Caves Borlido, Caves Neto Costa, Caves do Solar de S. Domingos entre outras) que não tendo vinha própria, compravam vinho feito e estagiavam-no nas suas instalações. E não eram vinhos provenientes só da Bairrada, loteavam-se com os vinhos de outras regiões, nomeadamente Ribatejo, Beiras, Douro e Trás-os-Montes. A maior parte do vinho vendia-se a granel, algum em garrafões e muito pouco em garrafas. Os principais mercados de venda, para além do interno, eram as antigas colónias.
Os anos 50 foram marcados pela criação de adegas cooperativas – Adega de Cantanhede, de Mealhada, de Souselas, de Mogofores e Vilarinho do bairro. Até aos dias de hoje sobreviveu apenas a primeira.
Em meados da década de 70 com a independência das colónias, os produtores tinham que procurar mercados alternativos. O vinho foi canalizado para o mercado da saudade nos países europeus (França, Bélgica, Luxemburgo, Suíça e Alemanha) e nas Américas (Estados Unidos, Canadá, Brasil e Venezuela). Mas só este mercado também não era sustentável a longo prazo, à medida que os emigrantes da primeira geração regressavam à Patria e os seus filhos tinham hábitos diferentes. Os novos destinos de exportação trouxeram maiores exigências em termos de qualidade e assim a pouco e pouco começou-se a investir na modernização: higiene, novos equipamentos, cubas de inox, controlo de temperatura, clarificação dos mostos. Esta revolução tecnológica, que se deu um pouco por todo o país, contribuiu para a qualidade crescente dos vinhos – com aromas mais limpos, vinhos menos oxidativos e com óptimo equilibrio.
Em 1979 a Bairrada foi reconhecida como Denominação de Origem e procedeu-se à sua demarcação oficial que recentemente festejou os 40 anos. Nas decadas 70 e 80 surgem os primeiros produtores engarrafadores, que produzem vinho da sua vinha e com a sua marca. A demarcação, embora tenha colidido com o negócio de volume, encorajou os pequenos e médios produtores a avançarem com os seus projectos próprios.
Luís Pato, Quinta das Bágeiras, Casa de Saima, Campolargo, Sidónio de Sousa, entre outros, deram credibilidade e potenciaram a nova imagem da Bairrada a partir do início do século XXI.A polémica Maria Gomes
De acordo com os dados da Comissão Vitivinícola da Bairrada, 70% a 75% uvas produzidas na região são tintas, deixando os restantes 25 a 30% para castas brancas. A mais expressiva em termos de plantação é a Maria Gomes, conhecida noutras regiões como Fernão Pires, seguida de Bical e Arinto. Nos últimos anos registou-se um incremento de Cercial e Sauvignon Blanc. O Chardonnay é bastante valorizado para a produção de espumantes.
O trio principal para um lote bairradino consiste em Maria Gomes, Bical e Cercial, onde cada variedade tem o seu papel. A Maria Gomes, sendo a mais aromática das três, é responsável pelos aromas, sobretudo nos primeiros anos. O Bical dá corpo e untuosidade ao vinho e o Cercial contribui com a estrutura acídica.
A casta Maria Gomes, conhecida também como Fernão Pires no resto do país e que é a casta branca mais cultivada a nível nacional. A sua origem é desconhecida, mas foi mencionada em 1788 relativamente às regiões Tejo, Beiras e Douro. Alguns produtores constatam que nos encepamentos antigos esta casta na Bairrada apresenta uma morfologia ligeiramente diferente e tem bagos mais pequenos, que, provavelmente, poderão ser alguns dos clones diferentes de outras regiões.Maria Gomes amadurece cedo e tem uma curta janela de vindima, pois acumula muito açúcar e perde rapidamente a acidez. Muitas vezes é mal-amada pelos enólogos. As “culpas” são exuberância aromática e falta de acidez. João Soares, o enólogo da Messias aponta as mesmas razões “baixa acidez e normalmente com potencial de guarda reduzido, é muito terpénica, não deixa reflectir o solo”.
O produtor Nuno do Ó também confessa que não morre de amores por esta casta, mas se trabalhar com ela, prefere apanhá-la mais cedo “com carácter mais mineral e menos exuberante”.
Já Mário Sérgio da Quinta das Bágeiras defende a casta que, embora tenha menos acidez, tem aromas interessantes de geleia e floral. E a sua experiência diz-lhe que a qualidade depende da quantidade de uva na videira. A casta naturalmente é muito produtiva e este aspecto tem que ser controlado. Frequentemente colhe Maria Gomes em óptimo estado de maturação, com 14% de álcool, e perfeito equilíbrio ácido, com 7,5 g/l de acidez total e 3 pH.
O experiente Luís Pato, exemplo para muitos produtores de dentro e fora da região, planta a Maria Gomes em solo arenoso para manter acidez (no barro dá vinhos mais gordos), mas com rega, porque a casta é muito sensível ao stress hídrico, “os bagos mirram ainda antes de amadurecerem”. É uma casta muito importante para vinhos de entrada de gama, fornecendo-lhes aromas imediatos e apelativos, mas também ser a base de vinhos de topo.A elegante Bical
Bical, também apelidada como Borrado das Moscas devido às pequenas manchas castanhas que apresentam os bagos maduros. É uma casta autóctone, situada maioritariamente nas regiões das Beiras. Por não ter o porte erecto, dificulta a vida dos viticultores. É muito sensível aos ataques de oídio na floração e a sua produção varia bastante de ano para ano. Comporta-se melhor em solos medianamente férteis, com boa drenagem e não muito alcalinos.
Amadurece mais tarde do que a Maria Gomes, em meados de Setembro e é resistente à podridão graças aos seus cachos com bagos soltos.
É mais neutra em termos aromáticos, confere estrutura e corpo ao vinho. Atinge menos grau alcoólico do que a Maria Gomes e tem menos acidez do que a Cercial. Também tem que ser colhida no momento certo, porque “facilmente perde acidez numa semana”, refere Luís Pato.
O enólogo da Casa de Saima, Paulo Nunes, que também trabalha muito no Dão, confessa que nunca plantaria Bical no Dão, mas que na Bairrada com o clima Atlântico e neblinas matinais frequentes preserva muito melhor a acidez.
Já João Soares é um fã da Bical. Para ele, é a casta que melhor mostra a região, com notas de barro, iodo, maresia, se for apanhada atempadamente. Quando sobremadura desenvolve notas tropicais e de goiabas. Com idade, os vinhos de Bical evoluem para resinas e cera de abelha, fazendo lembrar o cheiro de pranchas de surf. Acha que não tem grande aptidão para ir à barrica e apresenta grande capacidade de envelhecimento em garrafa que considera o mérito da região.
Nuno do Ó também gosta de Bical pela sua austeridade e potencial de guarda. Aguenta vinificação oxidativa (o mosto fica acastanhado por uns tempos, mas depois já não oxida). Utiliza prensa aberta, onde os chachos vão com engaço. Prefere barricas usadas, porque a casta já tem aromas de especiaria e o excesso de barrica não lhe fica bem. Com 2-3 anos de guarda os vinhos cheiram a barro molhado.A nova estrela: Cercial
Deve ser uma das castas cujo nome provoca mais confusão, não só no meio de consumidores, mas também na sua classificação e caracterização histórica. Cercial da Bairrada não é a mesma casta que Cerceal Branco utilizado no Dão e Douro, e também não tem nada a ver com Sercial da Madeira (que no continente é chamado Esgana Cão). Apenas a acidez natural elevada é comum a estas três castas, de resto são bem diferentes.
Amadurece relativamente tarde e é suceptível à podridão dos cachos devido à sua película bastante fina. Tem aroma discreto e enorme capacidade de envelhecimento.
Na opinião de João Soares, a Cercial, tal como Bical, é bastante neutra aromaticamente (fruta branca delicada com um toque de bechamel) , “transparecem atlanticidade”, mas a Cercial é mais vertical, mais tensa.
Mário Sérgio não tem dúvidas que Cercial é uma casta fabulosa. É capaz de, com 14% de álcool provável apresentar 8 g/l de acidez e 2,98 de pH. O problema é que apodrece com facilidade. Porta-se melhor em talhão estreme do que misturada com outras nas vinhas velhas (matura mais sedo e apodrece) e tem maior potencial. Ao envelhecer desenvolve os aromas de favos de mel. Produz relativamente pouco, 5 a 6 mil litros por hectare.
Segundo Luís Pato, a casta tem acidez vibrante, demonstra elegância e tem óptima aptidão para estágio em madeira.
Entre as outras uvas presentes nas vinhas bairradinas, releva a Arinto, que é uma casta nobre plantada em quase todo o país, conferindo acidez aos lotes em que entra. Na Bairrada amadurece mais tarde, nos finais de Setembro, é normalmente a última a ser vindimada, explica Nuno do Ó. Mostra o seu lado “mais salino, mais calcário, com frescura nervosa, o vinho é mais vertical e austero, menos gordo do que em Bucelas”.
Há ainda outras castas com menos expressão, como o Rabo de Ovelha que produz muito e tem cachos grandes, de maturação tardia e conhecida pela acidez alta. Sercialinho, que é muito aromática e com óptima acidez. E as castas internacionais, como Chardonnay, Sauvignon Blanc, Pinot Blanc e Viognier também são permitidas na legislação regional de DOC (com excepção da categoria Bairrada Clássico), sendo muitas vezes utilizadas em lote com as variedades tradicionais, mais raramente engarrafadas a solo.
Independentemente da casta, o terroir bairradino imprime o seu carácter nos vinhos ali produzidos, e os brancos da região, amplos, vibrantes, longevos, merecem toda a atenção do apreciador exigente.

Edição Nº30, Outubro 2019

Adega de Cantanhede: 65 anos de Bairrada

A Adega de Cantanhede facturou o ano passado 7,3 milhões de euros, mais 2 milhões que o anterior recorde. Neste momento, é o maior produtor da Bairrada e o que mais vende vinhos DOC. Nos últimos anos tem acumulado prémios para os seus vinhos, cujo número ultrapassa já o meio milhar. Um panorama risonho que […]

A Adega de Cantanhede facturou o ano passado 7,3 milhões de euros, mais 2 milhões que o anterior recorde. Neste momento, é o maior produtor da Bairrada e o que mais vende vinhos DOC. Nos últimos anos tem acumulado prémios para os seus vinhos, cujo número ultrapassa já o meio milhar. Um panorama risonho que nada faz suspeitar que, há menos de 10 anos, a empresa esteve à beira do precipício…

Em 2010 entrava Vitor Damião e uma nova direcção. Vitor não quis falar muito do que encontrou, mas sabemos apenas que chegou a avalizar pessoalmente empréstimos à cooperativa. A situação foi melhorando a pouco e pouco e em 2011 entra Osvaldo Amado, que acabou por fazer muito mais do que mera consultoria de enologia, desenhando toda a estratégia de produção, encaixada no resto das estratégias empresariais (comercial, financeira, etc). Foi ele o obreiro do que Vitor Damião chama de “coerência na qualidade dos vinhos”, que leva depois à fidelização do consumidor. Os vinhos de topo começam a aparecer: O Foral de Cantanhede, o Grande Reserva, o Reserva Baga. E vendem-se, apesar de alguns preços bem elevados. As uvas, que valiam 20 cêntimos o quilo, são agora pagas, no mínimo, a 35 cêntimos. E quando começa uma vindima, a adega tem as contas saldadas do ano anterior. Outro pormenor relevante: os gestores bancários, que fugiam da adega, começam a visitá-la… Muita coisa mudou, de facto, em menos de uma década.

Cantanhede tem 525 associados activos, que entregam uva. No total, contudo, são quase o triplo, porque muita gente quer manter o estatuto de associado para ter descontos na loja. No total, os associados possuem cerca de mil hectares de vinha, mas é quase tudo em minifúndio: o maior associado tem cerca de 12 hectares e é a Santa Casa da Misericórdia local.

Uma riqueza de vinha

Deixamos a gestão e vamos com a equipa até às Covas de Vale Maior, uma zona onde se avista um mar de parcelas de vinha. Estamos naquela que poderá ser considerada como uma das melhores zonas de Baga (e não só) da Bairrada. Vitor Damião fala do quadrilátero Ourentã, Cordinhã, Póvoa da Lomba e Pocariça, que terá “a maior mancha de vinha contínua da Bairrada; pelo menos de Baga”. Na verdade, são cerca de 1.300 hectares de solos argilo-calcários, onde a Baga se dá muito bem. Não é só o solo a brilhar: as condições climatéricas também aqui são diferentes, como nos diz Vitor Damião: “a proximidade ao mar [20 km] dá-nos frescura e maturações lentas, que a Baga gosta”. Uma boa parte destas vinhas são de associados da Adega de Cantanhede, e algumas têm mais de um século. Esta é uma riqueza que a direcção não ignora e por isso cativou, se assim se pode dizer, uma parte: “Temos cerca de 50 hectares de vinhas cadastradas onde fazemos uma espécie de gestão própria”, confessa Osvaldo Amado. Para o futuro virá daqui um vinho especial, mas o enólogo não quer levantar o véu…

É um dos membros da direcção, Albino Costa, que nos mostra as vinhas. “Estes terrenos são maravilhosos”, diz Albino, que admira o facto de aqui não se verem pedras à superfície, ao contrário de ali ao lado. Tem mais argila que calcário, diz Vitor Damião. Albino leva-nos a conhecer uma parcela com mais de 100 anos, com as cepas todas retorcidas pela idade. Revela que o solo argiloso conserva melhor a humidade e dá de beber à planta nos dias de grandes calores e seca. Os últimos anos têm sido benéficos, neste aspecto, para a Baga, sobretudo por causa da vindima sem chuva.

Ainda assim, logo a seguir ao pintor, a adega instalou mais de 80 postos de controlo de maturação, com duas pessoas em permanência. É com base nestes resultados que a equipa técnica determina a data de vindima e avisa o respectivo associado com alguns dias de antecedência. Com vindimas manuais, o grande inimigo é aqui a chuva, que ataca a Baga e a faz apodrecer rapidamente. Por isso há sempre folga nas marcações e nunca se sabe se é preciso acelerar. A adega recebe entre 5 e 7 mil toneladas de uva por ano, mas já chegou aos 9 mil, em outros tempos: “muita gente aproveitou os subsídios da CEE ao arranque de vinha”, diz-nos Vitor Damião.

Baga e Arinto são as estrelas da casa

A Baga representa cerca de 40% da uva que entra em Cantanhede. É usada para tintos, claro, mas também para espumantes e rosés. O espumante é uma das estrelas da casa, produzido em muita quantidade (cerca de 40% da produção total!) e a Baga cai aqui que ‘nem ginjas’: “a sua acidez natural é cada vez mais procurada”, diz Osvaldo. Cantanhede produz espumantes desde 5 até 27 euros a garrafa e já tem desistido de negócios porque o comprador queria pagar menos.

Durante a vindima, as uvas são analisadas à chegada e o preço pago passa por mais do que o quilo e o grau alcoólico potencial. Um aparelho chamado WineScan dá mais parâmetros e eles são contabilizados no preço final. Ou seja, uvas com pouca qualidade não levam benefício de preço. E depois, existem castas que podem ter majorações, como a Baga e o Arinto.

Osvaldo é talvez o maior fã de Arinto em Portugal: “não tenho dúvidas de que é a melhor casta branca portuguesa; é amiga do agricultor e do enólogo. Consigo Arintos de muito boa qualidade com 8, 10 ou mesmo 12 toneladas por hectare”. Das castas brancas, Cantanhede tem cerca de 30% em Arinto, mas Osvaldo ficaria feliz se tivesse o dobro. Outra casta branca típica da região é o Bical, e é defendida pelo presidente: de facto, Vitor Damião nunca esqueceu que vinhos com esta casta ganhavam primeiros prémios em concursos locais. Mas, verdade seja dita, Osvaldo só em 2018 achou que o Bical tinha qualidade para se estrear a solo. Este vinho tem 12 meses de estágio, mas o Arinto tem 18 meses! Osvaldo acha que só ganham com isso e, sejamos francos, estamos a falar de tiragens relativamente pequenas, se comparadas com os vinhos mais vendidos.

Uma adega sempre modernizada

Na adega faz-se muita experimentação e Osvaldo delega muita coisa em Ivo Almeida, o enólogo residente. Nenhum procedimento é executado (uma colagem, uma filtração, lotes…) sem antes ter sido testado e avaliado economicamente. Por isso, o bem equipado laboratório tem trabalho todos os dias, a todas as horas. Os lotes são feitos ao gosto do consumidor, mas cada vinho tem o seu padrão e estilo, previamente definido.
Ao longo dos anos a adega tem investido bastante em equipamentos para melhorar a qualidade. O sistema de frio é novo e, por exemplo, foi adquirida uma enorme prensa pneumática de vácuo, ideal para prensar as uvas para os espumantes de Baga. Não falta sequer um belo parque de barricas, muitas delas novas.

Nos próximos tempos Cantanhede vai comprar uma segunda linha de engarrafamento e fazer uma nova estação de tratamento de águas.
As caves onde repousa o espumante, adaptadas em grande parte de antigos depósitos, está muito bem arranjada, não só a nível de condições de temperatura como de estética. Existe um outro espaço de armazenamento, mas como é térreo, tem que ter ar condicionado. Em qualquer momento, Cantanhede tem, pelo menos, 200.000 garrafas em estágio.

Como as perspectivas apontam para o crescimento, Cantanhede quer também expandir a área da adega. A oportunidade surgiu logo ao lado, num terreno com vários enormes balões de cimento. Para o visitante fará tudo parte de Cantanhede, mas não é assim. Este espaço pertence ao Instituto da Vinha e do Vinho e está sem utilização. Mas fazia muito jeito à cooperativa para armazéns. A adega tem estado a negociar com o instituto público que gere esta venda, mas o preço pedido é, segundo Vitor Damião, “muito alto”.

De Cantanhede para o mundo

Se a área comercial e da distribuição foram ‘revitalizadas’ desde 2010, provavelmente a que levou maiores mudanças foi a de exportação. Em 2010 estava nuns magros 10%, hoje representa 35% da produção, mas é para aumentar. Brasil, Rússia e Canadá são os maiores mercados e, em média, os preços para exportação são mais caros que para o mercado nacional. Maria Miguel é a principal responsável por esta área.
A bem arranjada loja da casa dá também uma boa ajuda. Traz à memória as velhas mercearias finas ou mesmo farmácias, com os seus bonitos armários e estantes de madeira. Já cá está há muitos anos e de facto é uma mais-valia para a casa: Vitor Damião diz-nos que saem daqui cerca de 400.000 euros de vinho (e não só) por ano. Muito bom, considerando que os preços ao público não são mais baixos que os que se conseguem encontrar nas grandes cadeias de retalho. Mas o público adere: “temos uma grande preocupação em ter os vinhos com a melhor relação preço/qualidade”, diz Osvaldo.

Agora que tudo começa a entrar nos eixos, a direcção aponta também para os arranjos exteriores da adega. Alguma coisa foi feita, mas muito mais acontecerá nos próximos anos. Outra área onde Cantanhede tem apostado é nas certificações de qualidade. A mais recente, ainda a decorrer, é a certificação IFS Food, muito exigente e rigorosa, mas que ajuda a abrir portas em mercados internacionais. Obras, equipamentos, procedimentos, muita coisa teve que ser alterada, garantiu-nos Vitor Damião.

O que mudou em Cantanhede em menos de uma década é de facto impressionante. E uma lição do que é possível fazer com trabalho, dedicação e profissionalismo. Hoje, a cooperativa tem um invejável portefólio de vinhos e goza de uma notoriedade como nunca: “A imagem da adega é muito boa, tanto na região, como no país e mesmo a nível internacional”, assegura Vitor Damião.

Edição Nº28, Agosto 2019

Espumante Quinta de São Lourenço 2008 vence concurso na Bairrada

No âmbito do evento Aqui na Bairrada – Beber e Saborear, realizou-se a edição de 2019 do Concurso de Espumantes e Vinhos Bairrada. O painel de 15 provadores elegeu, com Grande Medalha de Ouro, o Quinta de São Lourenço Espumante branco 2008, das Caves do Solar de São Domingos. A concurso estiveram quase 70 referências, […]

No âmbito do evento Aqui na Bairrada – Beber e Saborear, realizou-se a edição de 2019 do Concurso de Espumantes e Vinhos Bairrada. O painel de 15 provadores elegeu, com Grande Medalha de Ouro, o Quinta de São Lourenço Espumante branco 2008, das Caves do Solar de São Domingos.
A concurso estiveram quase 70 referências, entre espumantes, vinhos tranquilos brancos e vinhos tintos. Com uma qualidade geral bastante elevada, não houve medalhas de prata, tendo todos os vinhos premiados – correspondentes a 30% da amostra – alcançado medalhas de ouro: dois espumantes com estágio até 24 meses; nove espumantes com estágio igual ou superior a 24 meses; três brancos e sete tintos.

Os premiados:

Grande Medalha de Ouro
Quinta de São Lourenço Espumante branco 2008 – Caves do Solar de São Domingos, S.A.

ESPUMANTES ESTÁGIO MENOS DE 24 MESES

Ouro
Aplauso Espumante branco 2017 – Ampulheta Mágica, Lda.
Marquês de Marialva Espumante rosé – Adega Cooperativa de Cantanhede, C.R.L

ESPUMANTES IGUAL OU SUPERIOR A 24 MESES

Ouro
Aliança Grande Reserva Espumante branco 2012 – Aliança – Vinhos de Portugal, S.A.
Casa do Canto Baga Bairrada Espumante branco 2015 – Caves São João – Sociedade dos Vinhos Irmãos Unidos, Lda.
Elpídio Espumante branco 2013 – Caves do Solar de São Domingos, S.A.
Marquês de Marialva Espumante branco 2014 – Adega Cooperativa de Cantanhede, C.R.L
Messias Espumante branco 2013 – Soc. Agrícola e Comercial dos Vinhos Messias, S.A.
Milheiro Selas Espumante branco 2014 – António Assunção Coelho Selas
Montanha Baga & Chardonnay Grande Cuvée Espumante branco 2010 – Anadiagro, Lda.
Quinta de São Lourenço Espumante branco 2008 – Caves do Solar de São Domingos, S.A.
Quinta do Poço do Lobo Baga Bairrada Espumante branco 2016 – Caves São João – Sociedade dos Vinhos Irmãos Unidos, Lda.
Samião Espumante branco 2015 – Quinta Vale do Cruz, Lda.

VINHOS BRANCOS

Ouro
Marquês de Marialva branco 2015 – Adega Cooperativa de Cantanhede, C.R.L
Quinta dos Abibes branco 2015 – Quinta dos Abibes Vitivinicultura Unipessoal, Lda.
Samião branco 2017 – Quinta Vale do Cruz, Lda.

VINHOS TINTOS

Ouro
A. Henriques tinto 2016 – Caves Montanha – A. Henriques, Lda.
Marquês de Marialva tinto 2014 – Adega Cooperativa de Cantanhede, C.R.L
Nelson Neves tinto 2013 – Célia Moreira Briosa Neves – Herdeiros
Quinta do Poço do Lobo tinto 2015 – Caves São João – Sociedade dos Vinhos Irmãos Unidos, Lda.
Quinta dos Abibes tinto 2015 – Quinta dos Abibes Vitivinicultura Unipessoal, Lda.
São Domingos tinto 2015 – Caves do Solar de São Domingos, S.A.
Samião tinto 2017 – Quinta Vale do Cruz, Lda.

Bairrada cria marca identitária

A Bairrada acaba de apresentar a sua primeira marca identitária e territorial, que visa funcionar como símbolo agregador de toda a região. O anúncio foi feito durante o evento vínico e gastronómico “Aqui na Bairrada”, realizado em Anadia. No ano em que celebra o 40º aniversário da demarcação enquanto região vitivinícola, a Bairrada resolveu comemorar […]

A Bairrada acaba de apresentar a sua primeira marca identitária e territorial, que visa funcionar como símbolo agregador de toda a região. O anúncio foi feito durante o evento vínico e gastronómico “Aqui na Bairrada”, realizado em Anadia.

No ano em que celebra o 40º aniversário da demarcação enquanto região vitivinícola, a Bairrada resolveu comemorar com a apresentação de uma marca identitária. O conceito, desenvolvido pela Ivity Brand Corp, procura resumir as principais valências e mais valias dos oito concelhos que integram a região (Anadia, Águeda, Aveiro, Cantanhede, Coimbra, Mealhada, Oliveira do Bairro e Vagos) e vai muito para além do vinho: água, leitão, desporto (com ciclismo em destaque), cerâmica, ciência, indústria, paisagem florestal, agrícola e marítima são alguns dos pontos em destaque.

A ideia é apresentar a Bairrada com um centro de bem viver (a assinatura da marca, aliás, é “Terras de Bem-Viver”), conceito que se desdobra por outros “bem”: a simbologia integra a garrafa em “Terras de bem-beber”, o leitão em “Terras de bem-comer”, o copo em “Terras de bem-receber”, a bicicleta em “Terras de bem-pedalar” e a fonte termal em “Terras de bem-estar”. Eventualmente mais importante do que a nova marca, terá sido o que a ela esteve subjacente: a colaboração e compromisso entre os oito municípios, a Rota da Bairrada e a Comissão Vitivinícola da região. Esperemos que esses pressupostos se mantenham e conduzam a uma região mais unida e solidária no seu desenvolvimento.

 

No centro desta apresentação esteve o evento “Aqui na Bairrada – Beber e Saborear”, promovido pela CV Bairrada, Rota da Bairrada e Município de Anadia, que teve lugar nos dias 14 e 15 de Setembro no pavilhão desportivo desta cidade e contou com a participação empenhada dos agentes económicos da região, bem como a afluência de muitos visitantes que assim puderam apreciar os vinhos e gastronomia regionais e confraternizar com os seus produtores. No âmbito deste evento foi igualmente realizado o “Concurso de Espumantes e Vinhos Bairrada”, com cerca de 70 referências em prova, que apurou 22 medalhas de ouro e elegeu como grande vencedor absoluto o espumante Quinta de São Lourenço branco 2008, da Caves Solar de São Domingos. Paralelamente, e aproveitando a estadia de diversos jornalistas na Bairrada, foi inaugurada a remodelada adega Regateiro, em Aguada de Cima, e oficialmente apresentados os vinhos Caves São João 99 anos de História (desta vez, um rosé de 2018) e Lopo de Freitas branco 2017, da São Domingos. Duas masterclasses bastante concorridas, realizadas no Museu do Vinho, em Anadia, lembraram os 40 anos da demarcação da Bairrada e os (quase) 130 anos da produção de espumante na região, iniciada em 1890. Luís Lopes