Monte Xisto: Nicolau de Almeida, tudo em família

Nicolau de Almeida

O nome Nicolau de Almeida carrega uma grande história, como sabemos. A associação com o criador do Barca Velha é óbvia, mas o nome é bem mais antigo e remonta ao séc. XIX, quando havia uma empresa de Vinho do Porto, criada em 1870 e inscrita como exportadora em 1907, com o nome de A. […]

O nome Nicolau de Almeida carrega uma grande história, como sabemos. A associação com o criador do Barca Velha é óbvia, mas o nome é bem mais antigo e remonta ao séc. XIX, quando havia uma empresa de Vinho do Porto, criada em 1870 e inscrita como exportadora em 1907, com o nome de A. Nicolau de Almeida e Co.. A empresa foi posteriormente vendida à Real Companhia Velha e oficialmente extinta em 1973.
Na sede actual da empresa familiar que João criou com os filhos – Mafalda, Mateus e João -, em Gaia, estão expostos alguns rótulos dessa empresa de Porto, imagens deliciosas de uma estética que fez época no sector e teve, nos materiais de promoção da Ramos Pinto, um excelente exemplo.

Peso da história

Mas a família não carrega só o peso da história. Também carrega o peso das jóias, só que estas não estavam em exposição nas instalações que visitámos. Expliquemo-nos.
Duas famílias de vinho cruzaram-se quando Maria José Ramos Pinto Rosas casou com Fernando Moreira Pais Nicolau de Almeida, pais de João Nicolau de Almeida. O ramo Rosas vinha de uma tradição de ourives e sobressai o nome de José Rosas (pai de Maria José, avô de João) que, após estudos em Londres, regressou a Portugal em 1903 e interessou-se pela tradição da filigrana portuguesa aplicadas em esmaltes. Foi-lhe confiada a recuperação das jóias da Coroa em 1942. Em 1919 comprou e recuperou a Casa de Ronfe, em Lousada, onde nasceu o Verde que hoje provámos. A quinta de Ronfe está no ramo Rosas, primos, mas são os Nicolau de Almeida que fazem e comercializam o vinho.

Estamos então perante uma família desprendida, pouco apegada às pedras preciosas, mais preocupada com as preciosidades que da quinta do Monte Xisto, em Foz Côa, poderiam fazer nascer. O projecto começou do zero. A quinta era “virgem”, sem vinha e sem prévia utilização. Ali se decidiu plantar vinha e o projecto começou, e bem, tacteando, com quantidades moderadas que era preciso mostrar e o crescimento só foi ditado pela aceitação da marca no mercado. Deveria ser sempre assim, mas sabemos todos que há quem tenha outra visão, chamar-lhe-íamos a “mania das grandezas”, e se abalance num voo sem rede que, por norma, acaba mal. Aqui começaram com 3000 garrafas de Monte Xisto, depois subiram para as 5000 e estabilizaram a produção, dependendo da colheita, entre as 8 e 10 000 garrafas. No plantio não se procurou fazer diferente, antes mostrar que, também aqui, algumas castas clássicas poderiam dar bons resultados, como a Touriga Nacional e a Touriga Francesa, acrescidas de Sousão. A espinha dorsal do vinho assenta, desde o início na Touriga Nacional, sempre com uma percentagem entre os 50 e 60% do lote.

Qualidade consistente

O facto de a vinha estar no Douro Superior tem vantagens. Desde logo o ambiente seco é inibidor das doenças da vinhas, como oídio e também o míldio, e o clima tende a gerar uvas de qualidade praticamente todos os anos. Cicadela sempre houve, e vão-na tratando preventivamente com infusões e, para já, estão a ter bons resultados. É, assim, em virtude das condições climáticas, que a marca não teve qualquer interrupção desde que nasceu, em 2011. A prova mostrou que há, de facto, uma constância de qualidade, o perfil tende a ser muito semelhante, ainda que se possa notar aqui dois momentos importantes. Por um lado, a primeira colheita (2011) revelou um estilo mais evoluído, com os licorados a começarem a marcar terreno. Nada que impeça uma boa prova agora, mas a dizer-nos que a guarda prolongada em cave pode ser desaconselhada. Por outro, a mudança do estágio, das barricas para os foudres, marca claramente uma pequena nuance no estilo, com a madeira a perceber-se mais bem integrada no vinho desde que os depósitos maiores começaram a ser usados, a partir da colheita de 2019. O vinho ganhou um ar mais sério e misterioso, mas com um perfeito equilíbrio na boca.

Mais recentemente plantaram cepas de branco, com a aposta na Rabigato, de há muito uma casta apadrinhada por Mateus desde os tempos em que esteve ligado ao projecto Xistos Altos. As uvas destinam-se ao futuro Órbita branco. Plantaram também mais Tinta Francisca e Tinto Cão para a marca Oriente. A Tinto Cão era muito acarinhada pelo pai João quando, ainda na Ramos Pinto, se aventurou a fazer um Douro tinto apenas com a Tinto Cão, corria o ano de 1981. Nunca foi comercializado mas, como se vê, o “bichinho” ficou lá.

Nicolau de Almeida

Grande harmonia

A grande conclusão da vertical que fizemos não deixa dúvidas: enorme consistência de estilo e qualidade, um modelo encontrado que agora urge preservar. Diria que, à parte o 2011, todos os vinhos estão a dar excelente prova, com uma grande harmonia de aromas e sabores. Um prazer que não depende da idade.
Aproveitámos o momento para provar um Verde que tem origem numa quinta do ramo Rosas da família, em Lousada, e que tem como objectivo chegar um dia às 20.000 garrafas. Tem a originalidade de ser um varietal de Trajadura, casta pouco vista a solo, mas João sempre lhe apreciou o equilíbrio e a acidez mais moderada, até porque, como nos disse, “nunca gostei daquela acidez cortante dos Vinhos Verdes”. Por isso este branco faz maloláctica, uma prática muito pouco habitual na região. O rótulo reproduz o de 1935, em exposição nas instalações de Gaia.

Para completar a prova, ainda tivemos direito a um Porto branco seco que a empresa produz, com baixa graduação. Estava bem mais interessante do que da primeira vez que o tínhamos provado.
Um projecto de família, com os pés assentes no Douro e sala de visitas em Gaia porque, como se sabe, produzir bem é preciso, mas ainda mais necessário é vender e tornar a qualidade percebida pelo consumidor. Parece simples, mas é bem complicado.

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024)

Monte d’Oiro com marcas novas

Monte d’Oiro

O projecto foi iniciado por José Bento dos Santos e, na altura, ninguém o referenciava como estando ligado à produção vinhos. De facto, a ligação era mais emocional e gastronómica, uma vez que era comprador habitual de vinhos, sobretudo franceses, e a sua longa experiência entre tachos e fornos ajudavam, depois, a que os vinhos […]

O projecto foi iniciado por José Bento dos Santos e, na altura, ninguém o referenciava como estando ligado à produção vinhos. De facto, a ligação era mais emocional e gastronómica, uma vez que era comprador habitual de vinhos, sobretudo franceses, e a sua longa experiência entre tachos e fornos ajudavam, depois, a que os vinhos ganhassem mais esplendor com a sofisticação culinária que praticava. A quinta foi adquirida em 1987 e, com pequena área de vinha e objectivos ainda incertos, estudou-se o terreno, consultou-se quem sabia, analisaram-se castas e estilos e conseguiu-se chegar ao primeiro vinho, em 1997. Fechou-se assim o primeiro ciclo da história da quinta. Na primeira vindima participou o filho, Francisco, no mesmo ano em que entrou para a faculdade, ajudando o pai na quinta, mas sem qualquer intuito de vir a ser o continuador.

De 1997 a 2007 abriu-se um novo ciclo, com a construção da adega, houve um sucesso óbvio junto da crítica e dos consumidores, continuando a fase da experimentação. A ligação ao célebre produtor do Rhône, Michel Chapoutier, e a Grégory Viennois, abre um novo ciclo a partir de 2007. Planta-se muito mais vinha, inicia-se a experimentação em bio e Francisco vê-se cada vez mais envolvido. Houve um clic? Houve sim, como nos contou.
Quando foi pai e por via da profissão da mulher ser freelancer e não ter licença de parto, Francisco teve direito a cinco meses de licença, o que o levou a ter mais empenho na quinta, também porque Sophie Mrejen (Directora de marketing) também estava de licença de parto. A passagem do testemunho de pai em filho foi natural e óbvia e Francisco ficou a tempo inteiro a partir de 2012.

Fica sempre a pergunta: a passagem a bio valeu a pena? Há diferenças significativas? Francisco não tem dúvidas sobre a valia do método, pela maior resistência das plantas às adversidades climáticas. Mas alerta que isso só é possível porque tem alguém que passa todo o dia nas vinhas, controlando tudo o que se passa. Reconhece o mérito do bio mas, também diz, “é impossível marcar uma reunião com o João Duarte (o homem da viticultura), já que ele nunca está no escritório…”.

Actualmente estão a entrar na quarta década, agora com 30 ha de vinha, o que levou também a que se alargasse o portefólio para entrar na distribuição moderna: há agora a marca Monte d’Oiro, onde pontificam castas nacionais, o que se tornou importante, sobretudo nos mercados externos, e uma nova marca, Oiro, com uma pepita no rótulo, que podem ser varietais, com uvas das vinhas mais novas. A nova coqueluche é o Cabernet Franc e, diz Francisco, “não têm conta as garrafas desta casta que provámos de todo o mundo para perceber o que era e o que deveríamos fazer, claro, com a Graça Gonçalves, a nossa enóloga. O meu pai também participou nessa fase, que foi muito entusiasmante”.

Em termos de mercados externos, a China é um dos principais destinos do Reserva tinto. “Chegam a ir 15 000 garrafas de uma vez”, mas o vinho está um pouco por todo o lado, com a Mistral (Brasil) a ser a importadora mais antiga. Mas também tem vinho nos EUA, Canadá, Suíça. Hoje ainda se estão a lamber as feridas causadas pelo COVID 19, com perdas brutais na facturação. Mas a recuperação está em marcha. O ex-libris da casa? Continua a ser o Syrah do Monte d’Oiro Reserva, “apesar de não ser uma casta portuguesa”. Ao contrário de muitas vozes reprovadoras noutras regiões, aqui continua-se também a apostar na Tinta Roriz, a tal variedade que tem tanto de enigmática e maravilhosa, como de traiçoeira. E Francisco arrependeu-se da decisão de abandonar o trabalho que tinha nas águas de Portugal? “Nem pensar, nem me vejo a fazer outra coisa. Adoro este trabalho”, responde. Isto para o pai, confesso melómano, deverá ser (dizermos nós) música celestial…

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024)

 

 

QUINTA DO QUETZAL: Deus do Ar, da Terra e da Vinha da Coroa!

Quinta do Quetzal

O Quetzal é uma das aves mais belas do continente americano, sagrada para todas as culturas mesoamericanas, porque neste animal se fundem o céu e a terra. Em várias das suas línguas, o termo pode também significar “precioso” ou “sagrado”. As penas verdes iridescentes na cauda simbolizavam igualmente o crescimento das plantas na Primavera para […]

O Quetzal é uma das aves mais belas do continente americano, sagrada para todas as culturas mesoamericanas, porque neste animal se fundem o céu e a terra. Em várias das suas línguas, o termo pode também significar “precioso” ou “sagrado”. As penas verdes iridescentes na cauda simbolizavam igualmente o crescimento das plantas na Primavera para os Aztecas e Maias, que viam o Quetzal como o “Deus do Ar” e um símbolo de bondade e luz.
A Quinta do Quetzal fica no coração da região do Alentejo, nas encostas da Vidigueira e nas imediações da mais antiga adega romana do Sudoeste da Península Ibérica. O seu microclima e as suas colinas criam as condições ideais para um terroir único, distinto da típica propriedade alentejana. Os solos xistosos, as diferentes exposições solares e altitudes, permitidas pela topografia em colina, e as áreas plantadas com vinhas velhas, formam uma combinação única no cenário da planície alentejana.
A região da Vidigueira é solarenga e quente. Mas, por estar no sopé Sul da Serra do Mendro, beneficia de ventos frescos veiculados pela serra a partir do oceano Atlântico. Estas condições, que se traduzem em elevadas amplitudes térmicas diárias, dão às plantas o calor que precisam para amadurecer as uvas e o fresco para recuperarem. A sua qualidade, aliada a um trabalho de enologia alicerçado na experiência e no conhecimento profundo de cada planta que compõe os 52 hectares de vinha, permite produzir vinhos que expressam verdadeiramente o carácter da região envolvente.

O vinho da empresa estagia no subsolo a uma temperatura naturalmente fresca, e ao som de uma instalação site-specific de Susan Philipsz.

 

A colecção da família

Como elemento fundamental da experiência Quetzal foi criado, de raiz, o edifício que inclui o restaurante, a loja e o Centro de Arte. O xisto que reveste as suas paredes destaca-se e integra-se com fluidez na paisagem envolvente, enquanto o espaço circundante foi concebido para incorporar plantas nativas naturais, de modo a maximizar a experiência do habitat natural do Alentejo.
Cees e Inge de Bruin são colecionadores e patrocinadores de arte contemporânea. Mantêm, há mais de 40 anos, juntamente com a família, uma forte ligação a Portugal. O projecto da Quinta do Quetzal expressa a sua paixão pela cultura, natureza, gastronomia e vinhos portugueses, que gostam de partilhar.

Todos os anos, em colaboração com a sua filha, Aveline de Bruin, organizam uma nova exposição na propriedade, em que o ponto de partida é a colecção privada da família (Coleção de Bruin-Heijn) e as suas ligações ao mundo da arte. Até final do passado mês de Setembro, a exposição colectiva “Echoes of Our Stories” (Ecos das Nossas Histórias) reuniu obras de Claudia Martínez Garay, Diana Policarpo, Jennifer Tee, Agnes Waruguru e Müge Yilmaz. As cinco artistas contaram histórias que nos fazem olhar para o mundo à nossa volta de maneira diferente da perspetiva ocidental dominante e nos ajudam a compreender esse mundo. Elas propuseram novas cosmovisões, alternativas espirituais, curativas e futurísticas, nas quais as rígidas dicotomias humano-natureza, acima-abaixo e centro-margem foram subvertidas.

Mas o Centro de Arte Quetzal também apresenta duas instalações site-specific de Susan Philipsz: “Tomorrow’s Sky” (O Céu de Amanhã) e “Sleep Close and Fast” (Dorme Perto e Profundamente), ambas de 2019, revestindo, a primeira, de elevado valor sentimental e motivo de especial orgulho para Inge de Bruin, assim como, hoje, para os seus filhos. Sobre esta peça, a sua autora salienta que o “pássaro Quetzal é o símbolo desta vinha e uma das características da paisagem envolvente é o seu vazio e silêncio”, acrescentando que imaginou, nesta instalação sonora em três canais, “o pássaro conjurado pelo som, abrindo as suas asas sobre a paisagem ao mesmo tempo que esta se funde com o som”.

Surpresa durante o silêncio

Em frente do Centro de Arte, e do restaurante, com a sua janela imensa, no topo da colina da Vinha da Coroa, com as três árvores, a instalação de som começa a cada dez minutos, surpreendendo quem por lá fica a desfrutar do silêncio e a contemplar a serra do Mendro, a Vidigueira, Vila de Frades, a Ermida de Nª Senhora de Guadalupe e, em dias mesmo limpos, a própria cidade de Beja. Foi neste contexto de arte, vinha e beleza natural que fomos recebidos por Reto Jörg, director geral da Quinta do Quetzal, José Portela, enólogo, e Ricardo Tavares, director comercial.

Todos os vinhos da Quinta do Quetzal são produzidos exclusivamente com uvas próprias, numa propriedade dividida em parcelas que definem o carácter da uva juntamente com as suas diferentes exposições solares e tipos de solo, desde os pobres de granito, ao abundante xisto e às terras mais férteis e planas, com alguma argila e algo arenosas.

A propriedade foi adquirida no ano de 2001 e estabelecida por Cees e Inge de Bruin em 2003. Hoje, totaliza 52 hectares de vinha, 70% dos quais com castas tintas (Trincadeira, Aragonez, Touriga Nacional, Touriga Franca, Cabernet Sauvignon, Alfrocheiro, Alicante Bouschet, Syrah e Petit Syrah) e 30% com brancas (Antão Vaz, Arinto, Verdelho e Roupeiro). Destacam-se cerca de 2,5 hectares de vinhas velhas (com mais de 40 anos), que se caracterizam por uma baixa produção, resultando numa forte concentração de aromas, e cerca de 30 hectares de vinhas com idade avançada (com cerca de 20 anos), que se caracterizam por uma produção de uva moderada e espelham, de forma fiel, o terroir da Vidigueira.

Som de embalar na cave de barricas

Na moderna adega, as uvas são introduzidas, pela pura ação natural da gravidade, num processo de vini¬ficação, que abrange cinco pisos, para reduzir o seu manuseio mecânico e a possibilidade de oxidação. O vinho que originam pode envelhecer gradualmente nas caves que se localizam no subsolo, a uma temperatura naturalmente fresca e ao som da segunda instalação site-specific de Susan Philipsz.

A ideia de “Sleep Close and Fast”, instalação de som de canal único, surgiu depois de Susan ter tido conhecimento que se tocava música para as barricas da Quinta do Quetzal, enquanto o vinho nelas estagiava. “Pensei que esta era uma ideia bonita e assim surgiu, imediatamente, o propósito de cantar uma canção de embalar para as barricas”, explica.
A enologia está a cargo de José Portela, enólogo residente desde o início, que mostra um conhecimento profundo e detalhado do Quetzal, que teve Paulo Laureano, primeiro, e Rui Reguinga, depois, como enólogos consultores. Da vindima de 2024, já finalizada aquando da nossa visita, destacou as boas produções das uvas brancas, na ordem das 6/7 ton/ha, “o bom desempenho da Alfrocheiro, Syrah e Petit Syrah e a boa concentração da Aragonez”. Apenas o Alicante Bouschet se ressentiu “do escaldão da segunda quinzena de Agosto”, e “não houve problemas de grau nem de açúcares.”

A Quinta do Quetzal oferece um portefólio diversificado. Começa nos vinhos Guadalupe, que oferecem um excelente equilíbrio entre elegância e frescura nas suas variedades branca, rosé e tinta, e constituem uma boa escolha em termos de custo-benefício, ideais para o consumo diário. Os Guadalupe Winemakers Selection, nas suas versões branca e tinta, oferecem uma complexidade subtil, tendo sido envelhecidos em barricas usadas. Acrescem duas edições especiais, o Quinta do Quetzal rosé, monovarietal de Trincadeira da Vinha da Coroa, e o Quinta do Quetzal Terroir branco, um single-vineyard de Arinto e Roupeiro, com 15 dias de maceração pelicular e envelhecimento em barricas de acácia.
O Quinta do Quetzal Brut é um espumante fresco e elegante, elaborado através do método tradicional a partir de um lote das castas Arinto, Antão Vaz e Perrum, com estágio de 24 meses sobre borras.

Os ícones da propriedade

Os vinhos Reserva representam a porta de entrada da gama Premium da Quinta. São elaborados a partir das melhores uvas selecionadas nos vinhedos da propriedade e envelhecidos em barricas novas de carvalho francês. Os vinhos Família são os ícones da propriedade, produzidos exclusivamente em anos de qualidade excepcional. Longamente amadurecidos, estes vinhos de edição limitada estão disponíveis em garrafas numeradas, reflectindo o compromisso inabalável da família com a sua visão de produzir vinhos ¬elegantes, que se juntam a arte e gastronomia de excepção.

Por fim, a gama Quetzal Rich constitui a oferta fortificada da Quinta, feita à moda do vinho do Porto através de fortificação com aguardente vínica com 77% de álcool. Nas suas versões Rich White, é produzido a partir de uvas Antão Vaz. Na Rich Red, a partir de Alicante Bouschet, sendo ambos envelhecidos em barricas de carvalho francês durante 16 meses.
“A ciência descreve as coisas como são; a arte, como são sentidas, como se sente que são”, disse um dia Fernando Pessoa. Talvez seja isto mesmo a experiência Quetzal, a maneira como a família de Bruin sente a Vidigueira, o Alentejo, o vinho e a gastronomia, a propriedade. Nada mais nada menos que a sua representação artística. Brindemos, pois!

(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024)

Rui Reguinga: Um pioneiro na Serra de São Mamede

Rui Reguinga

Tudo começou quando Rui Reguinga contactou com as vinhas e os vinhos de Portalegre logo no início da sua carreira, na sua primeira vindima como assistente de João Portugal Ramos, o consultor da Tapada do Chaves e da Adega Cooperativa de Portalegre na altura. Decorria o ano de 1991 quando recebeu, pela primeira vez, uvas […]

Tudo começou quando Rui Reguinga contactou com as vinhas e os vinhos de Portalegre logo no início da sua carreira, na sua primeira vindima como assistente de João Portugal Ramos, o consultor da Tapada do Chaves e da Adega Cooperativa de Portalegre na altura. Decorria o ano de 1991 quando recebeu, pela primeira vez, uvas das vinhas velhas da primeira, “as únicas que lá existiam na altura” e as do Reguengo, da Adega de Portalegre, “que eram recebidas todas para a mesma cuba, num dia especial seleccionado para isso”, conta Rui Reguinga, acrescentando que foi nessa altura que fez os primeiros contactos com os produtores de uvas locais.

Concretizar um sonho

Anos mais tarde, já no início do segundo milénio, quando decidiu concretizar o sonho, comum a tantos enólogos, de produzir o seu próprio vinho, decidiu iniciar o projecto com base nas vinhas velhas da Serra de São Mamede, que já conhecia tão bem. Não havia, na altura, a informação actual sobre as vantagens de produzir em altitude para atenuar os efeitos das alterações climáticas na vitivinicultura. Mas Rui Reguinga sabia qual era o potencial das vinhas velhas para produzir vinhos de qualidade com menos álcool, mais frescos e grande potencial de envelhecimento. Por isso comprou barricas, pagou “as uvas mais caras do Alentejo na altura” e a uma adega para fazer o vinho, dando os primeiros passos “sem deixar de ter as dúvidas e incertezas de quem é pioneiro”. E foi assim que surgiu o primeiro vinho, um tinto Reserva da colheita de 2004.
Na época, a moda, no Alentejo, era produzir vinhos com muito álcool e maturação. “Por isso, a segunda vinha que adquiri, perto de Marvão, exposta a norte, que tem quatro hectares, não era reconhecida pelo seu potencial”, conta, acrescentando que havia sempre dúvidas sobre o destino a dar às suas uvas quando estava na Adega Cooperativa de Portalegre. “Mas hoje sei que tem grande capacidade para originar vinhos de enorme qualidade, porque produz uvas com acidez e uma boa maturação”, explica.
O tinto de 2004 teve boa aceitação no mercado. Tinha sido feito com base em uvas colhidas o mais maduras possível, para acompanhar a tendência do mercado na altura. “É um vinho com 14% de álcool, mas uma acidez elevada, perto de 7 e um equilíbrio que me incentivou a ficar na Serra de São Mamede até hoje”, revela o enólogo, acrescentando que a aceitação, pelo mercado, de vinhos mais frescos, com o passar dos anos, lhe tirou as dúvidas que tinha em relação à aventura que tinha iniciado uns anos antes. Mas “aquilo que me fez apostar na região foi sobretudo o potencial das vinhas velhas para originarem vinhos com concentração e frescura, aromas com menos fruta, um carácter mais vegetal, com especiarias, e isso foi bem aceite pelo mercado desde o início”, conta Rui Reguinga.

Controlo da viticultura

Depois de verificado o potencial das vinhas velhas da região para originar vinhos distintos, frescos, de altitude, com grande acidez e capacidade de envelhecimento, era preciso investir na marca, e na compra de vinhas para assegurar a manutenção da produção e evitar o efeito da chegada da concorrência à região na potencial escassez da oferta de matéria prima. Rui Reguinga sabia que precisava de fazer isso se quisesse continuar a desenvolver o seu projecto. “Tinha de ser proprietário para controlar a parte da viticultura, porque nem sempre as uvas dos fornecedores estavam em condições para serem transformadas, porque as vinhas não eram acompanhadas e bem tratadas”, explica. Assim, à medida que ia descobrindo vinhas com potencial, alugava-as, fazia o seu maneio cultural, vindimava as suas uvas e avaliava o seu potencial para gerarem vinhos de qualidade. Só depois é que avançava para a proposta de compra. “De preferência irrecusável, mas não superior ao seu valor real”, revela. E foi assim que chegou às suas oito vinhas actuais.
Não sem dificuldades, sem recusas por parte dos vendedores. Mas sempre com paciência da sua parte, sem desânimos, com muitas visitas e o estabelecimento de relações de confiança com os proprietários das vinhas. “Foi num tempo em que isso era, talvez, mais fácil do que hoje, porque há mais competição, mais empresas e pessoas a adquirir vinhas na região, o que tem levado, inclusive, a que alguns dos locais tenham hoje uma ideia errada sobre o valor das suas vinhas”, conta Rui Reguinga, salientando que nem todas têm potencial para gerarem vinhos de qualidade, ou por má localização ou por algumas delas terem também plantadas uvas de mesa. Este foi o caminho feito no campo.

O valor das vinhas velhas

Mas depois de produzido o primeiro vinho, da colheita de 2004, foi preciso abrir garrafas, fazer provas junto de clientes e consumidores, para o apresentar, e também todo o potencial da Serra de São Mamede para gerar vinhos distintos e de qualidade. “Hoje em dia há mais produtores a fazer o mesmo, o que é benéfico para mim e para a região, mas este foi um trabalho que tive de iniciar sozinho, com as vantagens e desvantagens de ser pioneiro”, salienta o enólogo.
Uma das primeiras dificuldades foi demonstrar que os vinhos de vinhas velhas, que produzem pouco, têm de ser valorizados por isso, pela sua raridade, e pela sua qualidade e características distintas. “De outra forma, o projecto não era rentável e não fazia sentido, dado que este é um negócio e não um hobby”, explica Rui Reguinga. Não foi fácil fazer isso no início, numa altura em que a Adega Cooperativa de Portalegre colocava vinhos DOC Portalegre “a preços baixos, o que gerava alguma confusão no mercado e dificuldades para vender o meu produto”. Foi preciso muita perseverança, muito do chamado “trabalho de comunicação e marketing dos pequenos produtores, que não tem dinheiro para mais”, que passa por abrir garrafas e fazer provas com os clientes, para explicar os vinhos, a sua história e estórias, para firmar o seu nome e dos vinhos da serra no mercado.
Hoje Rui Reguinga tem 15 hectares na Serra de São Mamede, cinco dos quais de vinhas muito velhas, a partir das quais produz entre 10 e 12 mil das cerca de 50 mil garrafas de vinho da região que comercializa. A maior parte são vinhos “Terrenus Clássico”, como Rui Reguinga gosta de lhe chamar, enquanto o restante são vinhos de pequenas produções. O Clos dos Muros, propriedade com 0,6 hectares, produz apenas cerca de 1300 garrafas de vinho, por exemplo.

Rui Reguinga

A descoberta dos brancos

No início, o enólogo focou-se na produção de vinhos tintos. Diz que até se esquecia que tinha castas brancas nas suas vinhas, e que oferecia as suas uvas ao responsável pela viticultura, que produzia vinho de talha com elas. Só fez o primeiro ensaio de produção de branco em 2008, porque achava, até aquele momento, que não tinham potencial para a produção de qualidade. “Mas estava completamente enganado”, afirma, acrescentando que uma das desvantagens de ter sido pioneiro na região foi não ter descoberto, desde logo, aquilo que estava mesmo à frente dos seus olhos: “o potencial da serra para a produção de grandes brancos”. O final do primeiro ensaio, feito com base num field blend (lote de uvas de várias castas colhidas em simultâneo no campo) de uvas brancas, mostrou isso, dando origem “a um branco extraordinário, com boa acidez, complexidade, boca e grande potencial de envelhecimento, tal como os tintos”, conta.
Ainda hoje Rui Reguinga está à procura de vinhas. Por isso, quando alguém o contacta para oferecer as suas, não deixa de as ir ver, como aconteceu este ano, em que vinificou uvas de uma vinha “rodeada de árvores, perdida na serra”. Mas sem pressa, porque hoje o seu projecto “está equilibrado financeiramente, para o número de garrafas que produz e preço médio por unidade”, diz o enólogo. Mas se as vinhas valerem a pena, vai continuar a investir nelas.

Rui Reguinga

A gestão do tempo

Tal como ontem, ainda hoje a parte mais difícil do seu trabalho é a gestão do tempo. Mesmo que tenha criado uma equipa em que delega muito trabalho. E embora a sua aprendizagem agronómica e a sua carreira tenham tido a enologia como foco principal, “a viticultura é inevitável”. Por isso, vai acompanhando a vinha o mais de perto possível, aproveitando os conhecimentos sobre a sua protecção e maneio que aprendeu na universidade e foi melhorando com o tempo, até porque as vinhas velhas têm de ser mantidas e recuperadas. Como é evidente, a vindima mantém-no focado na adega. A seguir, viaja. Vai visitar os mercados externos para fazer provas para os seus importadores e mostrar as novas colheitas. “É um trabalho constante, porque eles gostam da nossa presença e os mercados podem ser perdidos se os deixamos um pouco mais abandonados”, explica, salientando a importância da proximidade ao mercado no sector dos vinhos, que “têm de ter uma cara por detrás”. Foi, há bem pouco, que abriu o seu enoturismo, um espaço com aquele ar sedutor de uma tasca de província de outros tempos, ao lado da sua pequena adega e bem perto das ruínas de Ammaia, grande cidade romana, em São Salvador da Aramenha. É apenas mais um dos sítios onde vale a pena ir, de uma região com muito para visitar.

Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024

 

 

WineStone com os olhos no topo: Alentejo, Douro, Verdes, Lisboa…

Ligada ao grupo José de Mello, o Winestone Group integra, no seu portfolio, as marcas Ravasqueira (Alentejo), Quinta de Pancas (Lisboa), Paço de Teixeiró (Verdes), Quinta do Côtto (Douro) e Krohn (Vinho do Porto). Foi num ambiente de celebração que fomos recebidos na Quinta do Retiro Novo, onde pontificam os lendários tonéis dos vinhos do […]

Ligada ao grupo José de Mello, o Winestone Group integra, no seu portfolio, as marcas Ravasqueira (Alentejo), Quinta de Pancas (Lisboa), Paço de Teixeiró (Verdes), Quinta do Côtto (Douro) e Krohn (Vinho do Porto). Foi num ambiente de celebração que fomos recebidos na Quinta do Retiro Novo, onde pontificam os lendários tonéis dos vinhos do Porto Krohn e que “em breve fruto da modernização das instalações em curso produzirá também vinhos Douro”. Para o CEO da empresa, Pedro Pereira Gonçalves, “celebrar o primeiro ano da Winestone e podermos partilhar e dar a provar os novos vinhos, é um motivo de enorme satisfação. Queremos estar nas regiões mais importantes de Portugal, criando bases sólidas para o futuro, ambicionando figurar, a curto/médio prazo, no top três do setor dos vinhos, sendo um agente ativo também na promoção além-fronteiras. É o nosso primeiro evento neste local e de comemoração.”
Uma das grandes diretrizes do grupo é a de manter e honrar o legado, inovar e potenciar, sempre com o respeito pelas gerações, preservando o sentido de lugar de cada casa e a identidade de cada quinta, transportando assim a sua autenticidade. Para isso, conta com uma jovem equipa de enologia, local, coordenada a nível nacional pelo experiente David Baverstock.
Com os olhos postos em 2025, a empresa apostará na continuidade da “reorganização de portefólio, reestruturação do património vitivinícola e capacitação de recursos humanos”, e prepara um “investimento relevante” na Quinta do Retiro Novo (Douro) e na Quinta de Pancas (Lisboa).

O kick-off na Ravasqueira

Foi na Ravasqueira onde tudo começou, ou não tivesse sido esta a primeira propriedade adquirida pelo grupo José de Mello. Só este ano o investimento foi de seis milhões “na capacitação das infraestruturas produtivas, espaço e equipamento”, entre outros “em linhas de engarrafamento” no centro de vinificação, uma fatia de um investimento global de 30 milhões de euros em aquisições e recapacitação de ativos, salienta Pedro Pereira Gonçalves. Os vinhos estão cada vez mais afinados e num patamar de qualidade superior, em resultado do trabalho de precisão da enóloga residente, Ana Pereira. Destaque, na prova efetuada, para o sofisticado Ravasqueira Espumante de 2015, produzido exclusivamente da casta Alfrocheiro, o Ravasqueira Alvarinho, fresco e citrino, com complexidade pouco comum fora de Monção e Melgaço ou o tinto 100% Touriga Franca, com uma fruta muito pura e gulosa. Entre outros vinhos naturalmente, como por exemplo os “clássicos” Vinha das Romãs. Qualidade inegável.

Winestone

Foi na Ravasqueira onde tudo começou, ou não tivesse sido esta a primeira propriedade adquirida pelo grupo José de Mello

 

Paço de Teixeiró e Quinta do Côtto

Pertencentes anteriormente ao grupo Champalimaud e hoje no seio da Winestone, ambos são projetos com muita tradição e identidade. Sob a batuta da enóloga Mafalda Machado, ganham novo fôlego, a recuperação de referências clássicas e a criação de novas.
A Quinta do Côtto, situada entre Mesão Frio e Peso da Régua, possui uma localização privilegiada com vinhas ancestrais, muitas delas com mais de 100 anos, plantadas entre os 120 e os 430m de altitude. Um terroir onde se produzem há mais de 50 anos alguns dos vinhos mais icónicos da região, repletos de elegância e frescura, o que se veio a comprovar na prova efetuada, onde, nos tintos, se mantém a aposta nos monovarietais Bastardo e Sousão – vinhos realmente especiais e nos lendários Grande Escolha e Vinha do Dote – tintos arrebatadores. Mas é nos brancos que reside a maior novidade, com o regresso dos Côtto Branco e Côtto Reserva branco para completar o portfolio.
O Paço de Teixeiró é a casa da casta Avesso. Situado em Baião, este terroir único está localizado em solos xistosos, ao contrário da maioria dos produtores de Vinho Verde. É o local perfeito para produzir vinhos brancos minerais e de acidez crocante, principalmente a partir das castas Avesso, Loureiro e Alvarinho. A criação da nova gama Teixeiró (blend, Avesso e Alvarinho), com uvas adquiridas a produtores locais, dá origem a “vinhos leves, frescos e acessíveis”, enquanto a gama Paço de Teixeiró acrescenta, ao já seu carismático Avesso, um outro vinho feito exclusivamente da casta Loureiro “permitindo, assim, exprimir as castas por si só, num terroir de eleição”, salienta Mafalda. Mas a grande novidade é a criação, pela primeira vez, de um vinho branco de parcela, o Paço de Teixeiró Vinha de Sousais, um branco delicioso e que dará seguramente que falar, mostrando, na plenitude, a parcela especial que lhe deu origem

Winestone

Quinta de Pancas, legado de Lisboa

Fundada em 1945, a Quinta de Pancas fica uma propriedade histórica que remonta ao século XV. Com uma área total de 75 hectares, tem mais de 60 hectares de vinhas situadas em Alenquer, a 35 quilómetros a leste do Oceano Atlântico. As vinhas estão plantadas numa paisagem protegida pela Serra de Montejunto. Com Vasco Costa à frente da enologia, o objetivo passa por resgatar o legado de “um terroir único, que produz alguns dos melhores Cabernet Sauvignon e Chardonnay de Portugal”. Para já assistimos a uma imagem mais clean e renovada da marca, onde pontificam branco, tinto e rosé, todos reserva, com enorme frescura e equilíbrio, e os monovarietais Chardonnay e Cabernet Sauvignon, num recomeço auspicioso. Ainda em projeto está a construção de uma nova adega, que nascerá de uma intervenção nos edifícios contíguos aos utilizados atualmente. “Queremos dar, à Quinta de Pancas, uma adega como ela nunca teve e transformá-la numa marca de referência da região de Lisboa.”, salienta Pedro Pereira Gonçalves.

Winestone

A magia dos Vintage da Krohn

Para fim de festa estava destinado o ponto alto do dia, com a prova dos Vintage Krohn numa viagem de mais de 60 anos, entre 1960 e 2022. Se a Krohn é sobejamente conhecida pela qualidade dos seu Porto Colheita, ficou claro que, nos Vintage, a magia também está presente. Vintages deliciosos, em que o equilíbrio doçura/acidez foi notório em toda a prova. Assim, tivemos oportunidade de apreciar o 2022, ainda em amostra de cuba, naturalmente nesta fase bastante exuberante nas notas de fruta vermelha e preta, mas com frescura e elegância, a prometer muito. O Krohn Vintage 2017, de um ano clássico, tem fruta de muita qualidade, notas de esteva e perfumes florais, taninos lineares, saboroso expressivo, com a profundidade e intensidade desta vindima (18,5 pontos). Já o Vintage de 2003 revela cor negra bem carregada, aromas concentrados de fruta madura e algum fruto seco, num registo encorpado e carnudo (17,5). Em grande forma o 1970, muito complexo, fruto seco, café, notas de farmácia e vinagrinho a engrandecer um conjunto de final extremamente longo (19). A prova terminou em beleza com o Krohn Vintage 1960. Seis décadas em garrafa num Vintage delicado e etéreo, que exibe discretas notas de especiarias sobre um fundo de aroma de caramelo e noz, e algum vinagrinho. Mais morno que o 1970, mas igualmente esplendoroso (19).
No conjunto, a Winestone pode hoje orgulhar-se de deter cinco marcas de prestígio que correspondem a outras tantas denominações de origem espalhadas pelo país vinícola. E, tendo em conta o objetivo anunciado de chegar ao top três nacional em volume e faturação, certamente não vai ficar por aqui…

Nota: O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024

Sovibor: Mamoré de primeira grandeza

Sovibor

A sede da Sovibor fica no centro de Borba, em instalações com mais de dois séculos e foi estabelecida em 1968, em resultado da fusão de dois negócios de vinhos de famílias diferentes. Produz vinhos a partir de 80 hectares de vinhas próprias, mais 120 de parceiros, uma parte significativa das quais de vinha velha. […]

A sede da Sovibor fica no centro de Borba, em instalações com mais de dois séculos e foi estabelecida em 1968, em resultado da fusão de dois negócios de vinhos de famílias diferentes. Produz vinhos a partir de 80 hectares de vinhas próprias, mais 120 de parceiros, uma parte significativa das quais de vinha velha.
Chegou a ser uma das maiores empresas da região, mas, com o tempo, foi perdendo relevância e o seu negócio entrou em decadência até ser adquirido, em 2014, pelo empresário Fernando Tavares, proprietário da distribuidora Sotavinhos, que opera a nível nacional. Depois dessa data foram feitos investimentos na melhoria das instalações, e do processo de vinificação e engarrafamento da adega, que permitiram, à empresa, seguir novos padrões de qualidade e criar novas marcas de vinho. “A Mamoré de Borba, criada em 2015, é a nossa referência premium”, conta Rita Tavares, filha de Fernando Tavares e enóloga residente da empresa. Inclui uma gama alargada de vinhos e vinhos de talha, bagaceiras e aguardentes vínicas.
A apresentação da nova colheita do topo de gama tinto, o Mamoré de Borba Grande Reserva 2020, decorreu no restaurante Magano, em Lisboa, um lugar de sabores e aromas apropriado para um evento deste tipo, como se notou na parceria de dois dos petiscos que vieram para a mesa no início com o novo Mamoré de Borba Reserva branco 2023, as saladas de bacalhau com grão e de polvo, que se equilibraram muito bem com a sua textura, volume e frescura de boca, ou os sabores e aromas do cabrito assado no forno, que fizeram grande parceria com o Mamoré de Borba Grande Reserva 2020.

 

“A marca Mamoré de Borba, criada em 2015, é a nossa referência premium”, diz Rita Tavares, enóloga residente da empresa

 

Sovibor

O conforto das vinhas velhas

Trata-se somente da segunda colheita desta referência, o topo de gama da Sovibor, produzido a partir das vinhas velhas de sequeiro desta casa. Segundo António Ventura, enólogo consultor da empresa, estão situadas numa zona caracterizada por uma precipitação superior à média do resto do Alentejo, a uma altitude de 420 metros, onde existem sobretudo solos xistosos e argilo-calcários. “As vinhas velhas em causa vegetam sobre xistos castanhos, que são porosos, o que contribui para que se sintam confortáveis, porque têm grande capacidade de retenção da água”. Após a vindima, as uvas destinadas a produzir o Mamoré de Borba Grande Reserva 2020 são refrigeradas em camião frigorífico, pisadas a pé em lagar de mármore duas vezes por dia, com maceração pré e durante a fermentação que decorrer durante 48 e 72 horas. O estágio em madeira durou 18 meses, em barricas de carvalho francês de Allier e de Vosges de 300 e 500 litros, de primeira e segunda utilização, antes do engarrafamento. É um tinto que se pode beber agora ou durante muito mais tempo e merece as honras de figurar como estrela de primeira grandeza, não apenas do portefólio Sovibor, mas entre os vinhos do Alentejo.

(Artigo publicado na edição de Novembro de 2024)

Herdade da Lisboa: Da Vidigueira, com ambição

Herdade da Lisboa

A Herdade da Lisboa pertence à família Cardoso desde 2011. Nesta propriedade produziam-se os vinhos Paço dos Infantes, uns dos clássicos alentejanos nas décadas 80 e 90, feitos, na altura, pela mão de João Portugal Ramos. Com o tempo a propriedade e a marca passaram por uma crise, revertida a partir do momento em que […]

A Herdade da Lisboa pertence à família Cardoso desde 2011. Nesta propriedade produziam-se os vinhos Paço dos Infantes, uns dos clássicos alentejanos nas décadas 80 e 90, feitos, na altura, pela mão de João Portugal Ramos. Com o tempo a propriedade e a marca passaram por uma crise, revertida a partir do momento em que foi adquirida por João Cardoso, empresário com importante percurso em diferentes áreas de actividade, incluindo na vertente agrícola, com destaque para a olivicultura. Fez-se um trabalho extraordinário da recuperação da vinha (mais de 100 ha, com cerca de 15 castas) e do olival e construiu-se, de raiz, uma adega moderna, que se estreou na colheita 2018, com lagares e cubas de inox com controlo de temperatura, cubas de cimento de forma redonda e oval, uma cave climatizada para permitir o estágio de vinhos e espumantes em condições ideais de temperatura e humidade.

Herdade da Lisboa

Os vinhos com a marca Herdade de Lisboa são produzidos com base em uvas das castas que se comportam melhor na vinha em cada ano.

Aliando as características do terroir com o meio de produção, foi criada uma gama premium com três vinhos em 2021 que, para além de feitos com extremo cuidado, permanecem em cave o tempo necessário para mostrar o seu potencial na altura de lançamento. Ficou também definido conceptualmente que, em cada ano, se elege uma casta com o melhor desempenho que dá origem a um vinho varietal de excelência. Assim, em cada ano cria-se uma colecção única que expressa a casta, o ano, o terroir e a casa. O branco e o tinto são vendidos em pack de dois, com o PVP do conjunto de €67,50. Em 2019 as castas escolhidas foram Viognier e Trincadeira e, em 2020, Alvarinho e Cabernet Sauvignon. O rosé surgiu um pouco por feliz acaso, não sendo planeado de início, mas a Touriga Nacional mostrou-se tão bem em 2019, que em 2020 foi repetida a experiência com a Baga. As castas protagonistas da colheita 2021, lançada agora, são Arinto, Alicante Bouschet e Syrah na versão rosé.

O Arinto estagia parcialmente em barricas novas de carvalho francês de 500 litros, onde permanece oito meses. O Alicante Bouschet passa 18 meses em barricas de 500 litros. O rosé também estagia em barrica, mas de 300 litros, novas, durante oito meses. Para todos os vinhos, até para o rosé, não é dispensado o estágio em garrafa, o que confere integridade e a sensação de harmonia na altura do lançamento.

De colheita 2021 resultaram 1100 packs de dois, mais 120 garrafas de 1,5 litro de cada. O rosé é engarrafado apenas em magnum, o que faz todo o sentido, tendo em conta que é lançado com mais de dois anos de estágio.

(Artigo publicado na edição de Novembro de 2024)

Sogrape: Quinta de Azevedo, Vinhos assentes na história

Quinta de Azevedo

Muito provavelmente, a primeira recordação de qualquer português sobre a história do nosso território, anterior à nacionalidade, está ligada à palavra da antiga professora ou professor da escola primária, hoje denominada primeiro ciclo de escolaridade. Atualmente, os manuais digitais e os quadros multimédia substituíram os livros com magras ilustrações e o quadro negro com letras […]

Muito provavelmente, a primeira recordação de qualquer português sobre a história do nosso território, anterior à nacionalidade, está ligada à palavra da antiga professora ou professor da escola primária, hoje denominada primeiro ciclo de escolaridade. Atualmente, os manuais digitais e os quadros multimédia substituíram os livros com magras ilustrações e o quadro negro com letras gordas desenhadas pela letra irrepreensível da professora. Ainda assim, dependendo do maior ou menor virtuosismo profissional e da atenção dos alunos, há algo que não mudou: a boca semiaberta ou os olhos bem despertos pela surpresa e admiração dos discentes quando ouvem falar pela primeira vez dos tempos do Conde D. Henrique, do Condado Portucalense e da sua descendência. Os edifícios deste período histórico nem sempre são de fácil acesso a todos os alunos de Portugal. Mas o Norte do país continua a apresentar inúmeros pontos de referência dos tempos que ficaram perdidos nos interstícios da história de Portugal. Um magnífico exemplo é a Casa-solar dos Azevedo, datada do século XI, localizada na freguesia de Lama, próximo de Barcelos, que foi utilizada pela primeira vez por D. Guido Viegas de Azevedo, rico-homem do tempo do conde D. Henrique.

A Casa-solar dos Azevedo foi, literalmente, o berço ancestral desta família que governou um vasto território que se estendia desde o além Cávado até Braga e Lanhoso. Desta família despontaram cavaleiros que ajudaram a construir e consolidar o reino de Portugal, depois em África e na Índia. Mais tarde, geraram altos embaixadores que firmaram alianças e tratados nas várias cortes europeias. No século XX, o brilho histórico começou a desvanecer-se e, em 1936, o Solar foi vendido em hasta pública.

De ruína, a quinta imponente

Em 1982, a Sogrape adquiriu o Solar, pela mão de Fernando Guedes. Estava praticamente em ruínas, e compreendia a torre do século XI, reedificada no primeiro quartel do século XVI, o corpo residencial do século XVIII, com a varanda colunada sobre o jardim e o edifício do século XIX.
Durante quatro anos, Fernando Guedes e a sua mulher, auxiliados pelo arquiteto Eduardo Rangel, dirigiram as obras de restauro e decoração do solar utilizando mobiliário e peças do século XVII e XVIII. O esforço e o desvelo aplicados na requalificação do imóvel pela família Guedes foram de tal ordem que este rapidamente se transformou, como referiu Fernando da Cunha Guedes, neto de Fernando Guedes e atual líder da Sogrape, “na menina dos olhos do meu avô que manteve e obrigava a manter em perfeito estado de conservação”.

Foi igualmente realizado um estudo profundo sobre a adaptação das castas aos 23 hectares dos terrenos iniciais da propriedade, tendo-se optado por um primeiro encepamento alicerçado nas castas Loureiro e Arinto que, em 2007, contabilizava 11,7 hectares. Atualmente, e depois de várias replantações, a Quinta de Azevedo tem 24 hectares de vinha, de um total de 34, alicerçada em duas castas: Loureiro e Alvarinho. A primeira ocupa a maior área de plantação, 23 hectares, e a segunda apenas 10 hectares. Existe ainda um campo experimental com cerca de um hectare que congrega, nas palavras do enólogo Diogo Sepúlveda, “um lote de seis castas mais aptas a resistir às alterações climáticas: Arinto e Sauvignon Blanc, entre outras”.

Curiosamente, a aquisição da propriedade, em 1982, e posterior requalificação da Quinta do Azevedo marcou o início de uma longa e famosa lista de compras de inúmeros projetos vínicos nacionais e internacionais. Pouco tempo depois, em 1987, a Sogrape adquiriu, num sonante e muito mediatizado negócio, a empresa A. A. Ferreira, marcando a entrada no setor do vinho do Porto e passou a integrar, no seu portefólio os vinhos, já muito reconhecidos e ambicionados pelos consumidores, da simbólica e histórica Casa Ferreirinha. Em 1995, a Sogrape integrou a Forrester, detentora da marca Offley, reforçando a sua presença no setor do Vinho do Porto e guindando-se a uma das maiores empresas exportadoras do setor. Dois anos depois completa a aquisição da Herdade do Peso, no Alentejo e da Finca Flichman, localizada na Argentina, mais propriamente na região de Mendoza. Com este último passo iniciou-se uma estratégia aquisitiva de cariz verdadeiramente internacional. O novo milénio consolidou a presença da empresa no setor do vinho do Porto e a sua estratégia internacional com a aquisição da marca Sandeman, que incluía vinhos do Porto, Jerez e Brandy. Em 2008 adquiriu a Viña Los Boldos, no Chile e, em 2012, estendeu as operações a Espanha com a aquisição das Bodegas LAN que, para além da operação principal, na região de Rioja, se estendeu às Rías Baixas, Rueda e Ribera del Duero.

Diogo Sepúlveda, líder dos departamentos de enologia de Mateus, Vinhos Verdes, Dão e Lisboa da Sogrape

 

Uma nova imagem e filosofia para os novos vinhos da Quinta de Azevedo

A apresentação dos novos vinhos da Quinta de Azevedo decorreu, como não podia deixar de ser, no piso térreo da torre original do atual solar, onde tínhamos à nossa espera Fernando da Cunha Guedes, diretor executivo da Sogrape. Este apresentou o enólogo Diogo Sepúlveda como alguém que “detém um conhecimento de mais de 15 anos do setor, com percurso profissional que inclui vasta experiência internacional, com projetos desenvolvidos em Portugal e no estrangeiro” e, por isso, assumiu a liderança dos departamentos de enologia de Mateus, Vinhos Verdes, Dão e Lisboa.

Os novos vinhos apresentados representam um reposicionamento para a marca Quinta de Azevedo, dotando-a de maior ambição, e possuem diversas características em comum. Em primeiro lugar, as uvas utilizadas em todas as referências foram produzidas em conformidade com as diretrizes de produção integrada de agricultura sustentável, definidas pela Organização Internacional de Luta Biológica contra Organismos Nocivos. A segunda característica é ostentarem a classificação Regional Minho. “Esta nomenclatura foi muito debatida internamente e acabou por ser a adotada”, referiu Diogo Sepúlveda. Por último, as referências apresentadas revelaram uma nova rotulagem mais cuidada e apelativa para o consumidor.

Começámos a prova pelo Quinta de Azevedo Loureiro Escolha, da colheita de 2022. O enólogo relembrou que “foi um ano com acumulados de precipitação inferiores à média dos últimos três anos e com uma primavera e verão muito quentes”. As uvas foram prensadas suavemente a baixas temperaturas e o vinho estagiou durante seis meses sobre as borras com batonnage frequente. Parte do lote estagiou em barricas usadas de carvalho francês.

Em seguida provou-se o Quinta do Azevedo Escolha Alvarinho, do ano 2023 que, segundo as palavras do enólogo, “foi fruto de um inverno bastante chuvoso, que depois se revelou muito seco, conduzindo a uma vindima muito precoce”. Uma pequena parte do lote estagiou em toneis e barricas usadas de carvalho francês.
Para o final estava reservada a estrela do trio. Trata-se de um vinho de lote composto por 70% de Alvarinho e 30% da casta Loureiro, do ano de 2023. Após a fermentação alcoólica, estagiou durante oito meses em toneis de 1200 litros e barricas de 500 litros de carvalho francês de primeira e segunda utilização. Uma pequena parte do lote estagiou sobre borras em depósito de inox para preservação de toda a frescura. Este verdadeiro topo de gama (€30), até agora inexistente no portefólio Quinta de Azevedo, mostra-se um vinho ainda muito jovem, seco e revela um perfil capaz de compaginar untuosidade e frescura.

Os vinhos agora chegados ao mercado espelham a ambição da Sogrape na região dos Verdes onde, com a marca Gazela, é um “player” de referência nos vinhos de maior volume e pretende claramente sê-lo também nas categorias mais exclusivas. Assim, a vetusta Casa-solar dos Azevedo, agora renovada e vestida de vinhedos, volta a inscrever o seu nome na história, desta vez na narrativa vínica do país e do mundo pela mão da maior empresa nacional do setor.

*Nota: O autor escreve de acordo com o novo acordo ortográfico.

(Artigo publicado na edição de Novembro de 2024)