O projecto foi iniciado por José Bento dos Santos e, na altura, ninguém o referenciava como estando ligado à produção vinhos. De facto, a ligação era mais emocional e gastronómica, uma vez que era comprador habitual de vinhos, sobretudo franceses, e a sua longa experiência entre tachos e fornos ajudavam, depois, a que os vinhos ganhassem mais esplendor com a sofisticação culinária que praticava. A quinta foi adquirida em 1987 e, com pequena área de vinha e objectivos ainda incertos, estudou-se o terreno, consultou-se quem sabia, analisaram-se castas e estilos e conseguiu-se chegar ao primeiro vinho, em 1997. Fechou-se assim o primeiro ciclo da história da quinta. Na primeira vindima participou o filho, Francisco, no mesmo ano em que entrou para a faculdade, ajudando o pai na quinta, mas sem qualquer intuito de vir a ser o continuador.
De 1997 a 2007 abriu-se um novo ciclo, com a construção da adega, houve um sucesso óbvio junto da crítica e dos consumidores, continuando a fase da experimentação. A ligação ao célebre produtor do Rhône, Michel Chapoutier, e a Grégory Viennois, abre um novo ciclo a partir de 2007. Planta-se muito mais vinha, inicia-se a experimentação em bio e Francisco vê-se cada vez mais envolvido. Houve um clic? Houve sim, como nos contou.
Quando foi pai e por via da profissão da mulher ser freelancer e não ter licença de parto, Francisco teve direito a cinco meses de licença, o que o levou a ter mais empenho na quinta, também porque Sophie Mrejen (Directora de marketing) também estava de licença de parto. A passagem do testemunho de pai em filho foi natural e óbvia e Francisco ficou a tempo inteiro a partir de 2012.
Fica sempre a pergunta: a passagem a bio valeu a pena? Há diferenças significativas? Francisco não tem dúvidas sobre a valia do método, pela maior resistência das plantas às adversidades climáticas. Mas alerta que isso só é possível porque tem alguém que passa todo o dia nas vinhas, controlando tudo o que se passa. Reconhece o mérito do bio mas, também diz, “é impossível marcar uma reunião com o João Duarte (o homem da viticultura), já que ele nunca está no escritório…”.
Actualmente estão a entrar na quarta década, agora com 30 ha de vinha, o que levou também a que se alargasse o portefólio para entrar na distribuição moderna: há agora a marca Monte d’Oiro, onde pontificam castas nacionais, o que se tornou importante, sobretudo nos mercados externos, e uma nova marca, Oiro, com uma pepita no rótulo, que podem ser varietais, com uvas das vinhas mais novas. A nova coqueluche é o Cabernet Franc e, diz Francisco, “não têm conta as garrafas desta casta que provámos de todo o mundo para perceber o que era e o que deveríamos fazer, claro, com a Graça Gonçalves, a nossa enóloga. O meu pai também participou nessa fase, que foi muito entusiasmante”.
Em termos de mercados externos, a China é um dos principais destinos do Reserva tinto. “Chegam a ir 15 000 garrafas de uma vez”, mas o vinho está um pouco por todo o lado, com a Mistral (Brasil) a ser a importadora mais antiga. Mas também tem vinho nos EUA, Canadá, Suíça. Hoje ainda se estão a lamber as feridas causadas pelo COVID 19, com perdas brutais na facturação. Mas a recuperação está em marcha. O ex-libris da casa? Continua a ser o Syrah do Monte d’Oiro Reserva, “apesar de não ser uma casta portuguesa”. Ao contrário de muitas vozes reprovadoras noutras regiões, aqui continua-se também a apostar na Tinta Roriz, a tal variedade que tem tanto de enigmática e maravilhosa, como de traiçoeira. E Francisco arrependeu-se da decisão de abandonar o trabalho que tinha nas águas de Portugal? “Nem pensar, nem me vejo a fazer outra coisa. Adoro este trabalho”, responde. Isto para o pai, confesso melómano, deverá ser (dizermos nós) música celestial…
(Artigo publicado na edição de Dezembro de 2024)