Tintos do Alentejo até €15: Prazer no copo, a um preço justo

Tintos Alentejo

No intervalo de preço entre os 8€ e os 15€, o Alentejo entrega tintos com grande qualidade por um valor mais do que justo. E, nos melhores casos, oferece ainda inquestionável carácter. Se somarmos a tudo isto uma consistência entre vindimas acima da média, e uma colocação eficiente nos vários canais de distribuição, não é […]

No intervalo de preço entre os 8€ e os 15€, o Alentejo entrega tintos com grande qualidade por um valor mais do que justo. E, nos melhores casos, oferece ainda inquestionável carácter. Se somarmos a tudo isto uma consistência entre vindimas acima da média, e uma colocação eficiente nos vários canais de distribuição, não é difícil compreender por que os vinhos do Alentejo estão entre os principais favoritos dos consumidores.

Texto: Nuno de Oliveira Garcia

Fotos: Ricardo Palma Veiga

A nossa intuição diz-nos que uma das regiões do país com maior capacidade de produzir tintos de grande categoria com preço entre os 8€ aos 15€ é o Alentejo. Porquê? Por um lado, encontramos na região uma vasta mancha de vinha e, em medida significativa, com capacidade para produções interessantes por hectare, acima da média nacional. Por isso mesmo, é um território que viu aparecer, nas últimas décadas, diversos players dinâmicos com dimensão, ambição e, cada vez mais, preocupações de sustentabilidade, sendo disso bons exemplos casas mais antigas como Esporão, Fundação Eugénio de Almeida e J. Portugal Ramos, não tão antigas, como Casa Relvas ou Herdade dos Grous, ou mesmo recentes, como Symington Family Estates, entre muito outros. E isto sem esquecer as adegas cooperativas que funcionam muito bem e apresentam produtos de qualidade, como comprovam os resultados no nosso painel. A própria extensão geográfica, que é enorme – é a maior região do país, de Almodôvar a Nisa, e de Vila Nova de Mil Fontes a Elvas – e a diversidade de influências climatéricas e de solos (como referiremos abaixo em notas rápidas), são verdadeiros atributos. Por outro lado, a modernização de parte da vinha (com clones adequados e a introdução das denominadas ‘castas melhoradoras’) e a orografia gentil de segmentos do território (sobretudo a sul) também ajudam, bem como o progressivo melhoramento no acesso a água para rega, compensando a pouca chuva decorrente de um clima tendencialmente continental, e com a enorme vantagem da estabilidade climática, mesmo na época de vindima na qual raramente chove.

Por fim, destacamos a percepção geral muito positiva que os vinhos alentejanos conseguiram ao longo dos anos granjear junto do público, nacional e fora do país, sendo inequívoco que a marca Alentejo é das mais fortes no sector do vinho, fruto da qualidade geral nas várias gamas, mas também de rótulos badalados e afamados, sendo um dos melhores exemplos os clássicos Mouchão, Tapada do Chaves, Quinta do Carmo, Pêra-Manca/Cartuxa, bem como os topos de gama do Esporão ou de Júlio Bastos. A somar a estas marcas consolidadas, projectos modernos pululam, quase sempre resultado do trabalho de jovens produtores e enólogos que viram no Alentejo uma região com menos obstáculos do que as demais, e não perderam a oportunidade para investir, caso, por exemplo, de Catarina Vieira/Pedro Ribeiro (Rocim), Luís Louro (Adega do Monte Branco), Tiago Cabaço e António Maçanita (Fita Preta). O facto de algumas marcas de nicho também terem o seu espaço e sucesso – a Quinta do Mouro, com os seus seguidores leais, será o pináculo mais evidente –, é, por fim, o último vértice deste triângulo dourado de marcas.

Não espanta, assim, que mesmo em anos tão complicados como 2020, a exportação dos vinhos alentejanos tenha apresentado resultados positivos. Como nos destaca Francisco Mateus, Presidente da CVR do Alentejo (CRVA), mesmo com as consequências terríveis do COVID no canal Horeca (consumo fora de casa, nomeadamente hotelaria e restauração) e não só, e ainda a sentirem-se as pesadas quebras registadas em mercados anteriormente determinantes para a região como Angola, o Alentejo manteve-se em linha com anos anteriores exportando 17,7 milhões de litros (+0,1%) no valor de 59,1 milhões de euros (-0,5%), de acordo com os dados estatísticos oficiais (INE). Efectivamente, é de destacar que, em 2020, a região teria atingido os melhores números na exportação desde 2014, não fossem os resultados negativos em países como Angola, China ou Rússia. Ora, todas as razões acima elencadas são fundamentais para que num segmento de preço médio a ‘premium’ se encontre qualidade e consistência. Esse segmento médio é fundamental para o Alentejo continuar a reinar nas prateleiras das grandes superfícies (apesar da concorrência forte da região da Península de Setúbal e mesmo do Douro), da mesma forma que o segmento ‘premium’ só vence no canal Horeca se os preços se mantiverem competitivos.

Tintos AlentejoProfissionalismo a todos os níveis

Fomos, então, falar com alguns enólogos que, a par do Alentejo, trabalham noutras regiões para saber se o pressuposto com que começámos este texto se encontra correcto. Diogo Lopes, que na região assessora António Lança (Herdade Grande) na Vidigueira e Couteiro Mor (Herdade do Menir) em Montemor-o-Novo, confirmou-nos que uma das vantagens da região são, precisamente, os resultados actuais da reestruturação das vinhas que começou nos anos ‘90 do século passado. O enólogo, que trabalha noutras regiões como Lisboa ou Açores (Terceira), identifica os progressos na selecção de castas e na introdução de rega (presente em quase toda a região, com a excepção de algumas vinhas velhas em Portalegre, Borba e Granja-Amareleja), mas também na orientação de linhas e nos sistemas de condução, como condição de sucesso. Sucesso esse que permite, no seu entender e experiência, produzir até 10 toneladas por hectare com grande qualidade e consistência, nível de produção esse que é sensivelmente o dobro da média nacional (que é muito baixo, em qualquer caso). Mas, note-se, não se julgue que 10 toneladas é excessivo pois, para termos uma ideia comparativa, uma casta como o Alicante Bouschet pode produzir, com relativa qualidade e em solo adequado para o efeito, até 25 toneladas por hectare, ou mais… Sobre castas, Diogo Lopes revela-nos que tem sido positivamente surpreendido pelo carácter dos vinhos das clássicas variedades Tinta Grossa e Tinta Caiada das vinhas velhas, que actualmente vindima separadamente para as conhecer melhor e, quem sabe, pensar num novo vinho para o futuro… Ainda sobre uvas, o enólogo reconhece a qualidade do Alicante Bouschet na região, e a tendência para que entre em lotes com Touriga Nacional e Syrah, uma “fórmula” de grande sucesso junto do público.

Igualmente muito interessante foi o feedback de Luis Patrão, enólogo da Tapada de Coelheiros, que conhece muito bem a região, desde o tempo em que oficiou no Esporão. O enólogo, que tem um projecto familiar na Bairrada, identifica a escala da planície alentejana, a dimensão de alguns produtores e das próprias propriedades como factores determinantes para se conseguir muito bom vinho a bom preço. Com efeito, é essa escala que permite aos produtores diluírem investimentos avultadíssimos em adegas e no profissionalismo da viticultura. Como nos confidenciou, existem adegas apetrechadas em todo o país, mas mecanização topo de gama de vindima, de rega e de poda, ou instrumentalização sofisticada (como pulverisadores geo-referenciados a partir imagens de satélites), como sucede no Alentejo, é raro encontrar nas demais regiões. A este respeito, a ideia generalizada parece mesmo ser a de que o Alentejo introduz e é pioneiro no país em tecnologia de ponta, ou seja, “começa a fazer”, e frequentemente só anos depois as outras regiões seguem a tendência.

Aposta na sustentabilidade

Pedro Pereira Gonçalves, administrador e enólogo do Monte da Ravasqueira, destaca ainda o factor tempo, no sentido em que no Alentejo consegue entregar, em 12 meses, um vinho de qualidade e pronto a beber, algo que beneficia a indústria no geral – potenciando parcerias, evitando stocks, beneficiando a tesouraria – e isto não é fácil de encontrar noutras regiões.  O dinâmico e irreverente António Maçanita (Fita Preta, Azores Wine Company, entre outros projectos) também não tem dúvidas que o Alentejo é, generalizando, a região portuguesa mais profissional na produção de vinho, igualmente destacando que para tal contribui largamente a área média das propriedades que é, por regra, superior às restantes regiões.  Mas chegados aqui, somos forçados a concluir que será então a diferenciação, e os segmentos de preço mais elevados, os principais desafios e objectivos do Alentejo, posto que na área da produção e boas práticas só existem, como vimos, notícias positivas. Nesse capítulo, António Maçanita tem sido dos mais activos a divulgar algum do património histórico da região. Com efeito, é sabido que o encepamento do Alentejo foi fortemente renovado nos últimos 35 anos, sendo hoje menos presentes castas que antigamente marcavam a paisagem vitícola regional. Casos do Castelão e da própria Trincadeira, e das mais raras Tamarez, Alfrocheiro ou Tinta Carvalha. A procura de boa cor e boa maturação, fez privilegiar castas como o Aragonez ou o Alicante Bouschet; por sua vez, a necessidade de uma consistência na qualidade fez triunfar a Syrah ou a Touriga Franca. Já Maçanita, a partir de um vinhedo muito velho – Chão dos Eremitas – procura recuperar o património perdido, comercializando uma excelente gama de monocastas que divulgam um Alentejo diferente e com grande valor acrescentado.

Por falar em divulgação, esse é outro desafio do Alentejo. Região de grande dimensão como nós referimos, e com várias sub-regiões e uma enorme diversidade de solos, não é fácil criar um único padrão e imagem em torno da marca Alentejo. Como acima também dissemos, dúvidas não existem que a marca é muito forte junto do público, todavia associada, em regra, a vinhos de planície e de clima quente o que, sendo verdade em relação a algumas das sub-regiões, deixa outras de fora e é uma imagem redutora dos múltiplos terroirs e castas alentejanos. Em todo o caso, é injusto não referir que o Alentejo foi das primeiras regiões a criar um laço de relação e comunicação fortes com os consumidores. Como nos diz Pedro Pereira Gonçalves a este respeito, a região foi inovadora na imagem e no packaging em geral, criando um modelo de vinho que o consumidor sabe que lhe vai agradar.

Outra demonstração da modernidade e inovação da região, tem sido o investimento e trabalho em projectos vanguardistas de sustentabilidade, mantendo-se, todavia, uma região “amiga dos enólogos” como ouvimos muitas vezes dizer. Nesse aspeto particular, bem como na viticultura de vinhas com extensão, o Alentejo não tem rival. Tendo como parceiro principal a Universidade de Évora, a Comissão Vitivinícola Regional do Alentejo tem vindo a desenvolver e promover melhores práticas no que respeita à sustentabilidade, mantendo a competitividade. Projecto pioneiro no país, o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo centra-se na viticultura e na adega. A par do essencial, a conservação do ambiente e a utilização mais eficiente dos recursos, trata-se de um projeto com impacto económico positivo nos produtores, uma vez que são já vários os ‘tenders’ – propostas de aquisição – vindos de países do norte da europa, sobretudo aqueles com mercado organizado em monopólio, a dar prevalência na compra de vinhos com selos de sustentabilidade…

Em suma, e como vimos, são vários os factores que contribuem para o sucesso do Alentejo nos tintos entre os €8 e os 15€. Mas não nos esquecemos é no segmento abaixo dos 5€, e mesmo dos 3€, que a grandíssima fatia do mercado se foca. Ora, também nessas gamas, o Alentejo – pelas mesmas razões acima aduzidas – tem posição de destaque, ainda que a concorrência seja cada vez maior. E o mesmo se diga nos perfis modernos e internacionais da gama ‘premium’, sempre cativantes e de enorme aprumo, e ainda num estilo clássico e revivalista a que cada vez mais assistimos, muitas vezes assente em castas antigas e/ou no uso da talha, que constitui sem dúvida uma mais-valia para a região no que toca aos consumidores mais exigente. Ou seja, o Alentejo tem tudo!

O Alentejo em poucas palavras

Tintos Alentejo
Portalegre (Quinta da Fonte Souto)

 

Solos: Território marcado por um clima continental, tendencialmente seco (pouca chuva), com excepção dos terroirs de influência atlântica, tem nos múltiplos tipos de solos um dos principais factores de diversidade. Dos granitos e xistos, às areias e argilas, passando pelos calcários e mármores, sendo comum que, num espaço de poucos quilómetros, alguns desses solos convivam em extrema proximidade, caso por exemplo da região da Vidigueira, e à volta de Estremoz, ou mesmo na Serra de São Mamede onde encontramos autênticos solos de fusão entre xisto, argila (argilo-limoso) e granito. Na sub-região de Borba o xisto é muito presente, mas ali também se encontra argila e mármore; no Redondo o xisto também é protagonista, encontrando-se ainda alguns filões de granito. Já na Granja-Amareleja, os solos são sobretudo de barro e extremamente pobres.

Clima e altitude: O clima, como acima escrevemos, é tendencialmente continental, mas mais uma vez existem variações. As sub-regiões de Borba, Redondo, Reguengos e Évora, são claramente sujeitas a um clima continental, tal como a Vidigueira apesar de esta beneficiar da influência da Serra do Mendro na retenção das brisas atlânticas para algum orvalho nocturno. No Alto Alentejo são comuns vinhas em altitude, como sucede em Portalegre, por vezes acima dos 600 metros do nível do mar, descendo para cerca de 300 metros em Estremoz. Em ambos os casos, as temperaturas no Verão, sendo elevadas, não são tão escaldantes quanto no resto da região. No Sul, as regiões de Moura e Granja-Amareleja são naturalmente cálidas e solarengas, pelo que o clima é extremo apesar das vinhas (sobretudo Moreto) a isso estarem habituadas.

Castas: Também as castas são um factor de diversidade, encontrando-se em grandes manchas o Aragonez e o Alicante Bouschet e, em menor dimensão, a Trincadeira e o Castelão. As omnipresentes Touriga Nacional e Syrah (extremamente consistente) também são baluartes para se produzir com qualidade, com a Touriga Franca também a ganhar espaço. Para as bordalesas Cabernet Sauvignon e Petit Verdot não haverá talvez melhor região no país, e as tradicionais Alfrocheiro, Tinta Caiada, Tinta Grossa e Moreto marcam igualmente presença. Quanto a esta última, que tem na sub-região Granja-Amareleza o seu porto-seguro, é cada vez mais elogiada pelo seu carácter (sobretudo se vinificada em talha).

Certificação: Não existindo qualquer hierarquia entre as duas categorias de vinho certificados, os de Denominação de Origem (ou seja, DOC Alentejo), e os de Indicação Geográfica (os Regional Alentejano), os DOC são sujeitos a regras mais rígidas, sobretudo no que respeita à utilização de castas tidas como mais tradicionais, e têm necessariamente que provir das 8 sub-regiões estabelecidas. Já os Regionais podem provir da vasta área de vinha situada fora das sub-regiões, até mesmo do litoral vicentino onde se produzem brancos muito interessantes.

Tintos Alentejo
Vidigueira (Herdade Grande)

(Artigo publicado na edição de Maio de 2021)[/vc_column_text][vc_column_text]

Não foram encontrados produtos correspondentes à sua pesquisa.

Vinho da Casa #39 – Periquita Clássico tinto 2014

Douro tinto, a hora dos magníficos

São grandes tintos do Douro, mas são sobretudo grandes vinhos em qualquer parte do mundo. Em poucas décadas, muitos dos vinhos não fortificados da região saíram de um quase anonimato para se tornarem nomes distinguidos pelos apreciadores de todo o mundo. A viticultura de montanha e a enorme diversidade da região fazem do Douro um […]

São grandes tintos do Douro, mas são sobretudo grandes vinhos em qualquer parte do mundo. Em poucas décadas, muitos dos vinhos não fortificados da região saíram de um quase anonimato para se tornarem nomes distinguidos pelos apreciadores de todo o mundo. A viticultura de montanha e a enorme diversidade da região fazem do Douro um cadinho onde se constrói a excelência.

TEXTO João Paulo Martins
FOTOS Ricardo Palma Veiga

A região do Douro parece ter um íman, algo que atrai de forma irresistível quem se aproxima. Não são só os visitantes turistas, são também os profissionais do sector, sejam eles jornalistas, sommeliers, importadores, distribuidores e todos os apreciadores de vinho. A paisagem e as qualidades naturais da região para originar um grande vinho são razões que bastam para que a tal atracção não tenha parado de crescer nos últimos anos. É verdade que há um “visitante de raspão” que passa sem verdadeiramente entrar na região, que vê a paisagem do seu barco de turismo e que não chega a entender nada de nada, mas, e ainda bem, há cada vez mais turistas que querem ver, falar, palmilhar caminhos e descobrir os vinhos do Douro. Para um turismo de qualidade requer-se uma oferta que lhe corresponda e o Douro tem conhecido um enorme desenvolvimento neste campo. Todos beneficiam com isso. O tema da atracção poderia estender-se a uma quantidade de produtos que se dão muito bem na região, desde o azeite aos produtos hortícolas, dos citrinos aos frutos secos. Terra abençoada dizem uns, terra difícil e muitas vezes ingrata dizem os que lá vivem.

A produção de vinho DOC Douro interessa cada vez a mais produtores que tradicionalmente já eram produtores de uvas para Porto. Não se estranha assim que surjam constantemente novas marcas que procuram entrar no mercado em patamares elevados de preço, o que não é fácil. Não é fácil vender, desde logo por falta de empresas de distribuição dispostas a agarrar mais uma marca; e o consumidor precisa de reconhecer uma qualidade continuada à marca para estar disponível para pagar caro por uma garrafa. Muitos desses vinhos são editados em quantidades muito limitadas que, por outro lado, não chegam a todo o país. O tema é de difícil resolução e a oferta de vinhos DOC Douro a preços elevados é muito, muito grande. A qualidade poderá amplamente justificar o que se paga, mas esse não é o único factor a ter em conta na formação do preço de uma garrafa de vinho.

A região continua a produzir mais Vinho do Porto do que DOC Douro, com o Cima Corgo a ser a principal sub-região, logo seguida pelo Baixo Corgo e, bem mais abaixo, o Douro Superior. No total falamos, dados relativos a 2018, de cerca de 38,5 milhões de litros, sensivelmente metade do que a região produz em Vinho do Porto. Já em termos de vinho comercializado, o Douro já suplantou o Porto em virtude da lei do terço que obriga os operadores do Vinho do Porto a apenas poderem comercializar 1/3 do stock. Os vinhos IG Duriense (que conhecemos pelo nome de Vinhos Regionais) têm aqui uma expressão muito pequena, principalmente se comparados com outras regiões do país. Do ponto de vista das variedade de uva utilizadas, as principais são as tradicionais (ver caixa) e as castas vindas de fora (da região ou do país) são raramente plantadas. Temos assim uma área de vinha de cerca de 40 000 hectares aptos à produção de vinhos Douro e um pouco mais de mil agentes (1.082), que vão dos pequenos produtores-engarrafadores aos armazenistas (engarrafadores não vinificadores) e grandes empresas produtoras.

Da produção ao comércio

Os vinhos DOC Douro não são dos mais consumidos entre nós (estão bem atrás do Alentejo e Vinho Verde, por exemplo) mas são dos que têm mais procura em alguns segmentos do mercado, nomeadamente na gama média/alta dos apreciadores. Jaime Vaz, da Garrafeira Nacional em Lisboa, tem cerca de 500 referências de vinhos do Douro. Neste número incluem-se, naturalmente, várias colheitas da mesma marca (Pintas, Quinta do Vale Meão, por exemplo) e se pensarmos apenas em marcas diferentes, diz-nos Jaime, serão cerca de 400. O negócio de uma garrafeira é bem diferente do de uma grande superfície e aqui vêm sobretudo consumidores que são conhecedores e estrangeiros que procuram os grandes nomes da região. Não se estranha assim que cerca de metade dos vinhos que estão disponíveis nas prateleiras se situem numa gama de preço acima dos €40. A procura tem crescido, têm sido acrescentadas novas marcas mas nada que “dê vazão” à quantidade enorme de produtores que aparecem na loja com a expectativa de ali poderem vender os seus vinhos. As mais recentes entradas na lista da Garrafeira Nacional contemplam a Quinta da Vacaria, Quinta da Zaralhôa, Quinta do Côtto e Quinta do Vale da Perdiz (marca Cistus). Conseguir vender é o enorme desafio dos pequenos produtores.

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O negócio dos vinhos na região tem matizes que se têm alterado, tal como as condições climáticas. Tradicionalmente a zona do Baixo Corgo – fértil e com grande pluviosidade – era sobretudo a região onde se faziam vinhos do Porto das entradas de gama, onde se colhiam uvas com baixa graduação e pouca estrutura. A situação está a alterar-se com as mudanças climáticas e, ironicamente, para melhor. Segundo Paulo Ruão, enólogo da empresa Lavradores de Feitoria, a diminuição da chuva no Baixo Corgo veio a beneficiar os vinhos e, onde antes se encontravam vinhos com 11% de álcool hoje vendem-se com 13% e, mais importante, “os vinhos têm mais estrutura também por via de uma melhor viticultura; na zona de Mesão Frio, que está a ser cada vez mais procurada, conseguem-se comprar hoje vinhos de uma qualidade muito superior à que estávamos habituados há apenas 5 anos”. Este fenómeno liga-se directamente às alterações climáticas e, ainda segundo Paulo Ruão, “o desafio do futuro próximo é muito mais a adaptação das melhores castas do que a introdução da rega”.

É também esta a opinião de Manuel Vieira, enólogo consultor, que não se mostra muito preocupado com o futuro uma vez que “há que tirar partido do património de castas que temos e escolher as que melhor possam responder; também a localização das vinhas passará a ter uma importância fundamental e as encostas viradas a norte e as vinhas em altitude que outrora eram consideradas zonas menores, terão no futuro um papel fundamental”. Neste novo quadro é possível que se tenha de tomar mais atenção aos porta-enxertos, escolhendo sobretudo os mais resistentes à seca (que eram os que tradicionalmente e usavam na região) e é provável que algumas castas tendam a perder importância, como a Tinta Barroca, Tinta Amarela e Tinta Roriz. Ainda sobre o tema das castas, quer Manuel Vieira quer Paulo Ruão concordam com a capacidade da Touriga Nacional para responder a estes desafios mas há menos certezas em relação a castas que têm sido muito faladas como a Sousão, que precisa de clima fresco, como nos Verdes (Ruão) e a Alicante Bouschet que produz bem mas ainda é cedo para se perceber se será casta com muito futuro. E castas que antes amadureciam mal (como a Tinta Francisca) estão agora a dar muito boa resposta.

Há aqui um enorme desafio que se coloca às empresa e produtores: pesquisar, estudar e compreender muitas das castas antigas que estiveram “em arquivo” e apenas presentes nas vinhas velhas e que poderão responder bem às mudanças do clima. A região tem, no entanto, uma enorme vantagem, como salienta Paulo Ruão: o solo xistoso que permite a passagem das raízes entre os fragmentos da rocha e a capacidade do xisto de conservar alguma frescura mesmo em ambiente de pouca pluviosidade, são grandes vantagens, é algo de muito original no Douro”.

O negócio dos vinhos na região tem matizes que se têm alterado, tal como as condições climáticas. Tradicionalmente a zona do Baixo Corgo – fértil e com grande pluviosidade – era sobretudo a região onde se faziam vinhos do Porto das entradas de gama, onde se colhiam uvas com baixa graduação e pouca estrutura. A situação está a alterar-se com as mudanças climáticas e, ironicamente, para melhor. Segundo Paulo Ruão, enólogo da empresa Lavradores de Feitoria, a diminuição da chuva no Baixo Corgo veio a beneficiar os vinhos e, onde antes se encontravam vinhos com 11% de álcool hoje vendem-se com 13% e, mais importante, “os vinhos têm mais estrutura também por via de uma melhor viticultura; na zona de Mesão Frio, que está a ser cada vez mais procurada, conseguem-se comprar hoje vinhos de uma qualidade muito superior à que estávamos habituados há apenas 5 anos”. Este fenómeno liga-se directamente às alterações climáticas e, ainda segundo Paulo Ruão, “o desafio do futuro próximo é muito mais a adaptação das melhores castas do que a introdução da rega”.

É também esta a opinião de Manuel Vieira, enólogo consultor, que não se mostra muito preocupado com o futuro uma vez que “há que tirar partido do património de castas que temos e escolher as que melhor possam responder; também a localização das vinhas passará a ter uma importância fundamental e as encostas viradas a norte e as vinhas em altitude que outrora eram consideradas zonas menores, terão no futuro um papel fundamental”. Neste novo quadro é possível que se tenha de tomar mais atenção aos porta-enxertos, escolhendo sobretudo os mais resistentes à seca (que eram os que tradicionalmente e usavam na região) e é provável que algumas castas tendam a perder importância, como a Tinta Barroca, Tinta Amarela e Tinta Roriz. Ainda sobre o tema das castas, quer Manuel Vieira quer Paulo Ruão concordam com a capacidade da Touriga Nacional para responder a estes desafios mas há menos certezas em relação a castas que têm sido muito faladas como a Sousão, que precisa de clima fresco, como nos Verdes (Ruão) e a Alicante Bouschet que produz bem mas ainda é cedo para se perceber se será casta com muito futuro. E castas que antes amadureciam mal (como a Tinta Francisca) estão agora a dar muito boa resposta.

Há aqui um enorme desafio que se coloca às empresa e produtores: pesquisar, estudar e compreender muitas das castas antigas que estiveram “em arquivo” e apenas presentes nas vinhas velhas e que poderão responder bem às mudanças do clima. A região tem, no entanto, uma enorme vantagem, como salienta Paulo Ruão: o solo xistoso que permite a passagem das raízes entre os fragmentos da rocha e a capacidade do xisto de conservar alguma frescura mesmo em ambiente de pouca pluviosidade, são grandes vantagens, é algo de muito original no Douro”.

Desafios de futuro

Nos anos mais recentes a região conheceu um novo problema que em 2018 assumiu contornos de tragédia: a escassez de mão de obra na vindima. Os relatos que nos chegaram de produtores que queriam vindimar, tinham gente contratada e que no dia acordado tinham 5 pessoas quando tinham contratado 20 (este número é um mero exemplo) mostra bem o drama que se está a viver. O recurso a mão de obra estrangeira contratada apenas para a vindima não só é, dizem-nos, complicada do ponto de vista legal como tudo se agudiza por serem trabalhadores que vêm de países não produtores que de vinha nada percebem e de vinho não consomem. A solução, ainda com Paulo Ruão, tem duas direcções: pagar melhor a mão de obra e “já em 2019 notámos que por termos aumentado a jorna, tivemos menos dificuldade nos vindimadores e, nas zonas onde for possível, introduzir a máquina de vindimar”. As primeiras experiências no sentido da mecanização da vindima foram feitas pelo grupo Symington e os resultados são animadores. A Lavradores de Feitoria já usou este ano a vindima mecânica na zona vitícola do palácio de Mateus e os resultados, segundo Ruão, foram excelentes: “poder vindimar no dia e na hora que se quer, inclusivamente de noite, é um avanço tremendo; já estamos a rentabilizar a máquina alugando a produtores da zona.”

Charles e Rupert Symington estão a utilizar máquinas de vindimar em zonas difíceis com resultados animadores, sobretudo em patamares de um bardo. Não vai decorrer muito tempo para que se veja a replicação destas experiências.

Uma prova de excelência

Os vinhos que provámos são do melhor que se faz na região e em Portugal. Seria impossível estarem todos na nossa mesa de provas, mas percebe-se muito facilmente porque a região do Douro interessa a cada vez mais wine writers, winemakers, sommeliers e investidores estrangeiros. A originalidade do terroir do Douro é transmitida ao vinho e o que aqui tivemos é uma espécie de “passeio da fama” onde desfilam vinhos de enorme qualidade e carácter, vinhos que nos entusiasmam vivamente. O preço elevado a que muitos são vendidos é a certidão do reconhecimento nacional e internacional e reflecte a relação entre a oferta e a procura. São vinhos de excelência de uma região que, apesar dos desafios que enfrenta, atingiu já um elevadíssimo patamar. Sabendo que, com as condições de solo, clima, património varietal e sobretudo, dinamismo e talento dos seus viticólogos, enólogos e produtores, muito tem ainda para descobrir, crescer e oferecer aos apreciadores.

As tourigas e as outras

Tal como acontece com outras regiões, o Douro tem um universo muito extenso de variedades que podem entrar na composição dos lotes, quer de brancos quer de tintos. Nas vinhas velhas encontramos uma proliferação enorme de castas, algumas delas “esquecidas”, mas actualmente a conhecerem mais notoriedade, como a Alicante Bouschet, a Tinta Francisca, Tinta da Barca ou Tinta Carvalha, por exemplo. No entanto, apesar da escolha ser enorme, a verdade é que a história e a tradição foram impondo como mais importantes um conjunto relativamente restrito de castas. São estas que constituem a espinha dorsal dos tintos da região. Em primeiro lugar a Touriga Franca, desde sempre a casta mais plantada, a que mais adaptada está a um clima de intenso calor estival e de produtividade baixa; depois, a Touriga Nacional, com notável “boom” nos anos 90 e que veio a impor-se como casta diferenciadora, cada vez mais casada com a Touriga Franca. Muitos dos vinhos que avaliámos nesta prova resultam de lotes destas duas castas. A Tinta Roriz surge em seguida, já foi mais apreciada, mas continua a ser uma referência, fazendo parte do “núcleo duro” das castas durienses. Menos usada nos vinhos de topo, mas muito presente na região, a Tinta Amarela (Trincadeira). As castas “de tempero” estão a adquirir cada vez mais importância, como Sousão e Tinto Cão, agora acrescentadas das novas variedades renascidas, como a Donzelinho tinto, Bastardo, Casculho ou Malvasia Preta. A Tinta Barroca está tendencialmente a desaparecer dos vinhos DOC Douro sendo apenas usada para fazer Vinho do Porto. A produtividade, apesar de estar autorizada até aos 55hl/hectare, situa-se por norma nos 30 hectolitros, o que mostra a baixa produção que é característica da região.

Edição Nº31, Novembro 2019