Sugestão: O movimento rosa

sugestão rosés

Provámos rosés provenientes do norte, centro e sul, litoral e interior do país, passando pelas ilhas. Por todo o território novos vinhos emergem, lado a lado com aqueles que foram pioneiros. Vinhos sérios, ambiciosos, diferentes, num movimento rosa apaixonante. Aqui fica uma vintena de sugestões menos óbvias, para partir à descoberta. TEXTO Nuno de Oliveira […]

Provámos rosés provenientes do norte, centro e sul, litoral e interior do país, passando pelas ilhas. Por todo o território novos vinhos emergem, lado a lado com aqueles que foram pioneiros. Vinhos sérios, ambiciosos, diferentes, num movimento rosa apaixonante. Aqui fica uma vintena de sugestões menos óbvias, para partir à descoberta.

TEXTO Nuno de Oliveira Garcia

Apesar do tempo que levamos a compilar selecções anuais de rosés, a verdade é que a cada ano somos surpreendidos com novos vinhos. De néctar de nicho e aposta pessoal de produtores de vanguarda – casos de Dirk Niepoort (‘Redoma’), Domingos Soares Franco (‘Coleção Privada Moscatel Roxo’), Júlio Bastos (‘Dona Maria’) e, mais recentemente, Ravasqueira (‘Premium’) e Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo (agora só com uma referência, tendo sido suprimido o Reserva) – o vinho rosé de perfil sério e elegante passou a modelo quase obrigatório numa gama. O exemplo mais acabado desta tendência é a empresa Wine & Soul que lança agora, na gama Manoella, precisamente um rosé para completar o branco e os tintos desta magnífica propriedade duriense. O mesmo tinha acontecido com a Quinta da Pacheca que lançou também um rosé reserva ambicioso não há muito tempo, fechando o seu portefólio de vinhos. 

A cada ano somos também surpreendidos pelas novidades das regiões cuja aposta num rosé de qualidade é particularmente levada a sério, seja pela sua frequência e ocupação turística, seja por uma inata propensão para este tipo de néctar vínico. Casos notórios do Algarve e dos Açores que contribuem com duas referências cada para a nossa lista. Com efeito, a procura de vinhos leves e frescos por parte de clientes internacionais faz com que os rosés sejam uma seleção quase natural, em especial para o produtor tipo algarvio que invariavelmente esgota os seus rosés poucos meses depois de os ver lançados no mercado. A par das indicadas na nossa selecção, ambas estreias absolutas, diga-se, destacamos ainda as marcas algarvias Cabrita e Quinta do Barranco Longo (o mais interessante é a versão ‘Oaked’), cujos produtores levam já várias colheitas de experiência.

sugestão rosésNa região do Tejo, de enorme projeção nos mercados internacionais, há muito que se levou a sério os seus rosés gulosos e atractivos, propícios para a exportação e não só, aspecto bem visível em produtores como Quinta da Lagoalva de Cima, Quinta da Alorna, Fiuza, Casal Branco, e até no irreverente Areias Gordas. Outra região muito bem-sucedida, e também na exportação, é o Alentejo, região que nos últimos anos tem vendido um valor próximo de 2,5 milhões de garrafas de rosés, e apenas nos referimos aos vinhos certificados. Marcas como Lima Mayer (sempre num registo estruturado) e Alento (Luís Louro/Monte Branco), bem como Herdade do Rocim (Rocim) e Paço do Infantes, estes dois últimos feitos a partir de Touriga Nacional, são referências deliciosas e obrigatórias.

Mais a norte, no Douro, o preço elevado do quilo da uva, em especial da Touriga Nacional, e a atenção maioritária dada a tintos (DOCs e Portos), fez com que durante muitos anos os rosés fossem tudo menos uma prioridade. Até há bem pouco tempo, para o protótipo produtor duriense, os rosés eram um vinho desinteressante e que não prestigiava a região (nada de mais errado, todavia). Tudo isso tem vindo mudar, com rosés cada mais ambiciosos e sedutores que em vez de desabonar a região, abrem-na a novos clientes. A par dos selecionados abaixo, vinhos como ‘Redoma’, verdadeiro pioneiro, ‘Vinha Grande’, ‘Vallado Touriga Nacional’, ‘Quinta Nova’, ‘Avidagos Reserva’ são óptimas compras.

Em busca da frescura

Mas quanto a regiões, a verdade é que existem terroirs mais propícios a rosés que outros… É certo que, como desenvolveremos adiante, um bom rosé é, sobretudo, um vinho feito na adega e vindimado na altura perfeita para obtermos um vinho gracioso e leve. Sucede, que existem regiões no nosso país que, sobretudo pelo seu clima, propiciam a produção de néctares muito frescos e de acidez vibrante. Neste domínio, as regiões atlânticas de Lisboa e da Bairrada ganham destaque, sendo que desta última vêm vários dos melhores rosés nacionais, como sejam ‘Aliás de Outrora’ (João Soares e Nuno Mira do Ó), ‘Giz’ (Luis Gomes, o fundador de um dos mais excitantes projetos da região), ‘Quinta do Poço do Lobo Reserva’ (Caves S. João) ou, mais recentemente, ‘Buçaco’ (Alexandre de Almeida) e ‘Casa de Saima’ (Graça da Silva Miranda), quase todos com recurso à casta Baga e/ou Pinot Noir. Também o exclusivo ‘Principal Tête de Cuvée’ – uma estrela no firmamento nacional de rosés, como atesta a nota na nossa seleção – é bairradino e 100% feito de Pinot Noir, com última edição ainda no mercado a ser a de 2010 (mas atenção, a segunda marca é igualmente de qualidade, de nome ‘Colinas’ cujo último rosé no mercado é de 2015).

Menos atlântica, mas ainda temperada e com alguma altitude, a região do Dão apresenta também um número significativo de bons rosés, casos do Quinta do Perdigão, Fonte de Ouro, Quinta de Lemos ‘Nélita’, ‘Elpenor’, entre outros. Um dos vencedores do nosso painel, ‘Tirados a Ferro’, provém precisamente da região, no limite sul, no terroir de Midões, outrora famoso pelos brancos. Um aviso: trata-se apenas de uma barrica (o que deveria ser “proibido” até, dada a escassez!) e o preço escalda… Quanto a castas, são várias na região a permitem a criação de vinhos elegantes e florais, como seja a Touriga Nacional, o Alfrocheiro e a Tinta Roriz, e a temperatura média – mais fresca que outras regiões vizinhas – ajuda no perfil elegante. 

sugestão rosésPor falar em castas, é notório que o actual perfil de rosé de gama alta privilegia uvas que proporcionam cor clara, aroma e prova de boca delicados, e com boa acidez. A casta Baga é daquelas que consegue preencher todos esses requisitos com relativa facilidade e, por isso, não espanta os bons resultados que almeja em rosé. Mais a norte, a casta Espadeiro é utilizada pela mesma razão, assim como a Negra Mole no Algarve, casta na qual cada cacho tem uvas em diferentes estados de maturação e cor. A omnipresente Touriga Nacional, quando vindimada cedo, contribui com os seus aromas florais muito elegantes, a Tinta Francisca apresenta cor aberta e fruto bonito, e a uva francesa Pinot Noir – com pouca cor, fruto elegante e por vezes fresco e subtil – também funciona bem, sobretudo em terroirs atlânticos. 

Já que nos referimos a castas francesas, nos solos calcários e barrentos do sul de França – regiões de Bandol, Bergerac, Corbière – vingam as uvas Mourvèdre, Cinsault e Carignan. Alguns dos melhores produtores de rosé do mundo produzem precisamente na Provence os seus vinhos que são vendidos um pouco em todo o mundo como produtos sofisticados que são. Já no Ródano – regiões de Tavel e Lirac – é a Grenache que reina também nos rosés, e um pouco por todo o país a Syrah faz parte de lotes de rosés conceituados, tal como sucede no nosso país. A fruta encarnada do Aragonez/Tinta Roriz também proporciona, sobretudo em lotes, rosés de muito bom nível no nosso país, e o mesmo sucede em Espanha, na versão Tempranillo, sendo que o mercado espanhol tem sido palco de uma autêntica revolução rosa nas últimas três colheitas. Com efeito, depois de anos a privilegiarem tintos concentrados e maduros, os produtores espanhóis viraram-se para produtos mais leves e frescos, sendo a aposta em rosés de qualidade uma consequência natural dessa evolução. 

Criar ambição

A regra é, portanto, evitar utilizar castas rústicas e com muita cor, como seja as francesas Alicante Bouschet, Petit Verdot, Grand Noir, a georgiana Saperavi ou a lusitana Vinhão. A uva Cabernet Sauvignon, salvo exceções, também não é uma das preferidas para rosé, sobretudo pelas notas vegetais que pode aportar ao lote final e pela quantidade de antocianinas na película que tingem significativamente o líquido (por isso, aliás, não há hábito de fazer brancos de Cabernet…). Uma alternativa à utilização exclusiva de castas tintas passa pela inclusão de uvas brancas no lote final, solução que em Portugal foi seguida pelo conhecido produtor Soalheiro misturando Pinot Noir e Alvarinho, com a versão de 2019 a ser talvez a mais bem conseguida até hoje. Outros produtores nacionais também incluem uma pequena parte de vinho branco nos rosés, mas não o referem nos rótulos ou contrarrótulos. Mais assumida é a política de utilização de borras de vinho branco na elaboração de rosés sempre com belíssimos resultados, contribuindo tanto com cremosidade como com acidez crocante para o vinho final. Na verdade, existem nos rosés de topo de gama com tendências comuns evidentes, como seja a utilização de bica aberta (evitando-se a sangria de tintos) e a fermentação (em parte ou totalmente) em barrica.

Tal como escrevemos no passado, um dos maiores desafios dos rosés em Portugal é ser levado a sério enquanto vinho, e ser vendido um preço relativamente alto. Em todo o caso, como a nossa selecção demonstra, já são vários os rosés em Portugal acima de 10€ e mesmo de 20€. Em França, os melhores produtores (não necessariamente os mais famosos…) – como seja Domaine Hauvette Domaine de Terrebrune ou Clos Cibonne –, raramente ultrapassam o preço de €30 a garrafa, e o mesmo sucede com os melhores rosés espanhóis como ‘Pícaro del Aguilla’ (que na verdade é um clarete), e ‘Viña Tondonia Gran Reserva’ (Lopez de Herédía), este um pouco mais caro e vendido sempre com mais de 5 ou 6 anos a contar da vindima. Nos Estados Unidos da América, aí sim, a moda de rosés explodiu faz já alguns anos fazendo com que seja difícil encontrar um topo de gama abaixo de $50, sobretudo se constar da famosa lista dos 100 melhores vinhos do mundo…

sugestão rosésOutro desafio é a definição do conceito ou tipo de rosé, sempre que falamos de um néctar topo de gama. Será um rosé de guarda, gastronómico ou de terroir? De terroir é mais difícil de concordar, pois não só se produzem bons rosés em todo o território nacional, como os rosés são, por regra, menos marcados pelas nuances e diferenças entre regiões do que brancos e tintos. A explicação para esse fenómeno reside no facto de as uvas serem colhidas muito cedo (por vezes mais cedo do que as uvas brancas), bastante antes de a maturação fenólica estar completa. Por outro lado, como as uvas são vindimadas cedo, as temperaturas altas e a perda de acidez típicas das regiões mais a sul não costumam ser um problema. Isso faz com que o líquido, quase sempre lágrima apenas, seja muito leve e fresco, mas relativamente indiferenciado e incaracterístico quando à casta ou ao solo… Na verdade, um bom rosé depende mais dos cuidados e exigências na (data da) vindima e na adega do que do ano agrícola ou das particularidades de uma região. Mas este facto em nada deve afastar o consumidor deste tipo de vinho, muito pelo contrário. A razão de termos cada vez melhores rosés portugueses é o maior nível de profissionalismo por parte de produtores e enólogos no nosso país. Paralelamente, a razão de termos cada vez mais e diferentes rosés é o consumidor cada vez estar mais esclarecido e sem preconceitos. Não queira ficar de fora…

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Vinhos Leves: Quando o simples sabe bem

vinhos leves

Os Vinhos Leves, na região de Lisboa, surgiram no século passado, por necessidade, devido à viticultura da época. Hoje, a categoria solidifica-se nos vinhos regionais e é representada por vinhos aromáticos, leves, descomplicados, perfeitos para usufruir nestes dias mais quentes. TEXTO Valéria Zeferino O mundo já conhece vinhos com este perfil há muito tempo, basta […]

Os Vinhos Leves, na região de Lisboa, surgiram no século passado, por necessidade, devido à viticultura da época. Hoje, a categoria solidifica-se nos vinhos regionais e é representada por vinhos aromáticos, leves, descomplicados, perfeitos para usufruir nestes dias mais quentes.

TEXTO Valéria Zeferino

O mundo já conhece vinhos com este perfil há muito tempo, basta lembrar os Rieslings da Alemanha na sua versão mais simples. A existência dos vinhos leves na região de Lisboa deveu-se, inicialmente, à dificuldade de amadurecimento das uvas, associada a vários factores como a forte influência atlântica e humidade elevada, sobretudo em certas zonas menos protegidas; e também solos férteis e castas menos nobres e altamente produtivas, incluindo alguns híbridos, criados na Estação Agronómica de Dois Portos na década de 1950.

Os mostos com um teor alcoólico baixo, que não chegavam aos 11% fixados como o limite mínimo para os vinhos “comuns”, obrigavam os produtores fazer lotes com outros vinhos de maior graduação, ou simplesmente adicionar álcool ou aguardente vínica. Para resolver esta questão, o Ministério da Agricultura através da Portaria 547/85 de 6 de Agosto, autorizou a produção de vinhos de grau mais baixo, devendo estes conter na rotulagem a menção “vinho leve” ou “baixo grau”. Esta medida, na altura, não estava relacionada com a região de produção.

vinhos levesMais tarde, com a Portaria n.º 351/93 de 24 de Março, a menção tradicional “Leve” ficou associada, em exclusivo, às regiões de Lisboa (antiga Estremadura) e Tejo (antigo Ribatejo). A menção destinava-se a vinhos regionais com grau até 10% e acidez mínima de 4,5g/l. Devido à evolução das condições edafoclimáticas da região de Lisboa, em 2018 o limite máximo do título alcoométrico volúmico adquirido do vinho com direito à menção Leve foi aumentado em 0,5% até os 10,5%.

O primeiro Vinho Leve Regional Estremadura foi produzido sob a marca Sôttal pela Companhia Agrícola do Sanguinhal e, segundo o seu director comercial Diogo Reis, queria dizer “eu sou o tal” do Sanguinhal. A marca já existia antes, desde os anos 20 e 30 do século passado, sendo utilizada para diversos vinhos. 

Inicialmente, os Vinhos Leves eram brancos e tintos. O tempo e as preferências do mercado vieram a corrigir o estilo. Enquanto os se tintos procuram encorpados, os rosés começaram a ganhar terreno.

De acordo com os dados da CVR Lisboa “o crescimento exponencial das vendas nos últimos 5 anos (duplicaram, chegando em 2019 a 56 milhões de garrafas), em especial dos vinhos tintos que representam 75% da produção da região, levou os produtores, a orientarem as suas produções de tintos para vinhos “não leves”.

Ao mesmo tempo “as preferências dos consumidores e a própria avaliação dos críticos de vinho que reconhecem no branco leve e rosé leve uma mais valia qualitativa, o mesmo não sucedendo com o tinto”, levaram os produtores a fazer as suas escolhas a favor de brancos e rosés.

Dos 126 engarrafadores de vinhos de Lisboa presentes actualmente no mercado, cerca de 20 produzem Vinho Leve. As vendas de Vinho Leve têm-se mantido estáveis ao longo dos anos, variando entre 2 e 3 milhões de garrafas por ano. A maior parte é comercializada nas grandes superfícies (80%), tendo também uma boa presença na restauração local e alguma exportação. 

O Presidente da CVR Lisboa, Francisco Toscano Rico, nota que o volume de produção e consequentemente das vendas, está fortemente condicionado pelas condições climatéricas, sendo que o aumento das temperaturas leva a que cada vez seja mais difícil produzir mostos com um grau alcoólico tão baixo.  Ou seja, o potencial produtivo desta categoria de vinho está logo à cabeça condicionada pela própria natureza, não se perspectivando que no futuro este cenário se venha a inverter. 

Ao mesmo tempo, nota-se uma melhoria substancial no nível qualitativo destes vinhos, contribuindo para isso a vindima no momento certo e a escolha de castas mais nobres. O próprio branding tem melhorado muito entre alguns produtores que apostam neste segmento, com rótulos que comunicam muito bem a ideia de “vinho leve”, transmitindo a sua essência na imagem. 

Como se faz um Vinho Leve?

Os vinhos leves muitas vezes são feitos de castas aromáticas, como Moscatel Graúdo ou Fernão Pires, se bem que esta última é mais difícil de colher atempadamente, com teor alcoólico mais baixo. 

Miguel Móteo, enólogo da Companhia Agrícola do Sanguinhal, conta que na utilização de Moscatel esta casa foi uma das primeiras. Na região de Lisboa, a casta é bastante produtiva o que leva a nunca atingir os valores elevados de maturação em termos de açúcar, mantendo-se nos níveis de 9-10%. O facto de ser vindimado mais cedo, penaliza um pouco a parte aromática, o que é compensado pela maceração com películas. Diz que quando se fermenta o Moscatel, “a adega parece um laboratório de perfume”. O Moscatel contribui com 50% do lote e para o Vinho Leve vindimam as uvas de certas parcelas, pois do outro lado da Serra de Montejunto já é mais quente e as maturações sobem. O Arinto amadurece lentamente e mantém a frescura. Entra com 40% e na altura da vindima para Vinho Leve tem 8 g/l de acidez. Vital é uma casta com mais corpo. Matura bem e desidrata facilmente devido à pelicula fina. É melhor para os vinhos DOC, por isto só entra em 10% no lote.   

vinhos leves

Carlos Nicolau, da Casa Agrícola Nicolau confessa que a casta Moscatel não foi a primeira opção. Aconteceu mesmo uma história engraçada. Como muitas casas agrícolas na chamada “região Oeste”, a Casa Agrícola Nicolau também tem produção frutícola. Plantaram a casta Moscatel, que também é apreciada como uva de mesa, a pedido de um parceiro seu. Mas só se conseguiu vender uma vez, pois as uvas eram pouco doces. A partir daí, foram redireccionadas para produzir o vinho leve (e com sucesso) já há cerca de 20 anos. 

Outras castas da região, como Arinto, Malvasia Rei, Jampal, Seara Nova, Vital, Tamarez e outras também entram nos lotes de acordo com a preferência de cada produtor.

O vinho é feito como se fosse uma base para espumantes: fermenta até ficar seco e depois acrescenta-se o mosto concentrado para o fazer ligeiramente mais doce. O nível de doçura não está indicado pela regulamentação e fica à consideração do produtor. Costuma variar entre 10 e 17 g/l, compensados e equilibrados pela acidez sempre bem elevada.

É óbvio que com o grau de álcool baixo e com açúcar residual, o vinho tem de ser bem estabilizado microbiologicamente através de processos térmicos, filtrações rigorosas e adições de conservantes como DMDC ou sorbato de potássio para evitar o crescimento de microorganismos. Cabe ao produtor adaptar a técnica mais adequada para o seu caso.  

Os Vinhos Leves não são todos iguais. Para além das castas utilizadas, com ou sem maceração pelicular, varia o nível de acidez, a sensação de gaseificação (no Mundus nota-se muito menos, do que no Solar da Marquesa, por exemplo, onde as bolhas vão subindo do fundo do copo a lembrar um espumante). A maior parte dos vinhos fermenta em cubas de inox, mas o Mundus Evolução da Adega da Vermelha tem um toque de madeira para conferir alguma complexidade ao vinho.

3 razões para repensar o Vinho Leve

Um vinho que abre o caminho para o mundo dos vinhos

Este tipo de vinho faz muito mais pelo vinho do que possamos pensar. É uma alternativa a refrigerantes e até à cerveja junto dos consumidores na faixa dos 20+ anos. É uma introdução ao mundo do vinho, mais adaptada ao paladar mais jovem. Há quem não goste de cerveja por ser amarga, mas um vinho simples, aromático, com uma ligeira doçura e um bocadinho de gás até vai muito bem. Não é um vinho que obrigue a um grande exercício sensorial, mas cumpre a sua missão de ser agradável e proporcionar um momento de socialização, quando é bem-feito e servido bem fresco à volta de 8-10˚C. É um vinho também leve para carteira, não ultrapassando os €4 PVP, e também acessível na restauração.

Um vinho adequado para uma vida saudável

Tem uma gradução alcoólica mais baixa do que os vinhos “não leves”, não ultrapassa os 10,5%, situando-se maioria dos Vinhos Leves entre os 9 e 10%, o que o torna bem menos calórico do que o habitual.

Um vinho flexível que desafia preconceitos

Gostar de vinho não é só beber vinhos caros de produtores famosos ou mais bem pontuados. Um verdadeiro enófilo não marginaliza nenhum tipo de vinho e sabe beber um vinho adequado a contextos diferentes. Quando vamos à praia, levamos um fato de banho e não um vestido de noite ou smoking. Numa esplanada junto à piscina quem consegue apreciar devidamente um Porto Vintage, por exemplo? O Vinho Leve parece que foi desenhado para estes momentos descontraídos e de socialização.

O Vinho Leve à mesa

Sendo leves e equilibrados, tornam-se autosuficientes numa esplanada ao pé da praia ou piscina. Ideal para uma conversa descontraída, fazem companhia sem atrair muita atenção. Entretanto, podem acompanhar umas entradas simples, como umas tostas barradas com um paté, humus ou guacamole, sushi ou marisco. Uma pizza havaiana que inclui pedaços de ananás é outra aposta segura. Comida indiana ou chinesa, que contém especiaria ou alguma doçura no sabor funciona sempre muito bem.

Não foram encontrados produtos correspondentes à sua pesquisa.

Artigo da edição nº40, Agosto 2020

O que guardar de 2020

Luís Lopes

Editorial da revista nº47, Março 2021 Como fazemos todos os anos, a edição de março é dedicada aos Prémios Grandes Escolhas. Aqui distinguimos os vinhos, as pessoas, os agentes económicos, os projectos, as organizações que em 2020 deixaram marca junto de profissionais e consumidores. E hoje, talvez mais do que nunca, este reconhecimento é merecido […]

Editorial da revista nº47, Março 2021

Como fazemos todos os anos, a edição de março é dedicada aos Prémios Grandes Escolhas. Aqui distinguimos os vinhos, as pessoas, os agentes económicos, os projectos, as organizações que em 2020 deixaram marca junto de profissionais e consumidores. E hoje, talvez mais do que nunca, este reconhecimento é merecido e necessário. 

Luís Lopes

Que 2020 não foi um ano normal (nem 2021 o está a ser), já todos o sabemos. Fiquemos por aqui. Recuso-me, nestas linhas, a utilizar as palavras que leio e oiço todos os dias, as palavras que devoram todas as outras como se mais nenhumas houvesse para escrever ou dizer. Não as irão ler nesta página. 

Prefiro falar do que de bom aconteceu em 2020. Dos belíssimos vinhos que provámos e bebemos (e foram tantos!); das pessoas que deram o máximo do seu talento e conhecimento, realizaram sonhos, lançaram marcas, recuperaram tradições, comunicaram histórias de sucesso, transformaram produtos da terra e do mar em vinhos e comidas que vieram alegrar as nossas mesas; das empresas que se dinamizaram, inventaram ou reinventaram, criaram ou mantiveram empregos, contribuíram para o desenvolvimento regional ou nacional, levaram mais longe o nome da qualidade “made in Portugal”. Vamos, pois, falar de coisas boas. 

Permitam-me que comece pelos vinhos e que, entre os muitos que premiámos, destaque apenas quatro, os eleitos para liderar cada categoria. E que grandes vinhos são o espumante Murganheira Vintage 2011, o branco Guru NM, o tinto Quinta das Bágeiras Pai Abel 2015 e o fortificado Sandeman Vintage 2018! 

Não foi por 2020 ser 2020 que deixámos de poder apreciar e avaliar a excelência na cozinha, na mesa, ou na sala. E muito impressionados ficámos com o trabalho dos restaurantes Toca da Raposa, Marmoris Narcisus Fernandesis e JnCquoi Asia. Conceitos e estilos bem distintos, o mesmo empenho e arte. Arte que não falta ao esmerado e competentíssimo serviço de vinhos de Fernando Ruas. Nem à escrita de Alexandra Prado Coelho que, todas as semanas, e sem precisarmos sair do ninho, nos transporta para um mundo de prazeres gastronómicos, como tão bem o fazia o mestre das letras David Lopes Ramos que dá o nome ao prémio com que foi distinguida.  

Em 2020 visitámos espaços de referência onde os vinhos se sentem em casa, como a garrafeira Wines 9297 e a Enoteca 17.56 (curiosa coincidência, esta coisa dos números), ou onde o vinho é a casa, como o World of Wine. E mesmo um espaço virtual que entra em nossa casa, como a loja gourmet online Unique Flavours. 

No lado das empresas e organizações também há muitos motivos para aplaudir. Desde o salto, nos números e no mercado, por parte da região do Tejo, para o qual a Comissão Vitivinícola Regional muito contribuiu, até ao elevado desempenho da Vercoope, um dos motores dos Vinhos Verdes e da Sogevinus, referência no vinho do Porto. Sentimos e aplaudimos a fantástica revolução e dinâmica operadas na Quinta do Gradil (Lisboa) e Falua (Tejo). E que dizer da recuperação da mais profunda matriz cultural e vinícola do Alentejo, materializada nas ânforas da Adega José Piteira, na Amareleja, e da XXVI Talhas, em Vila Alva? Ou do enorme impacto da nova estrela do Dão, a Taboadella 

Deixei para o fim o princípio, as pessoas que pensam e moldam os vinhos. Profissionais talentosos, sabedores, criativos, que na vinha, na adega, na sala de provas, nas caves de estágio, fazem acontecer. Amândio Cruz, na viticultura, Manuel Lobo e Domingos Soares Franco, na enologia, possibilitaram aos apreciadores momentos inesquecíveis. E Anselmo Mendes, cujas qualidades humanas, capacidade de trabalho e conhecimento técnico recolhem respeito e admiração unânime entre enófilos e colegas de ofício, é o nosso grande Senhor do Vinho. 

Devemos a todas estas pessoas e entidades o nosso profundo reconhecimento, merecido e necessário, por tudo o que nos deram em 2020. E é isto, sobretudo, que devemos guardar do ano que passou. 

Red line

Luís Lopes

Editorial da revista nº46, Fevereiro 2021 Figurativamente, a linha vermelha representa uma fronteira, uma demarcação, um limite. Ultrapassada essa linha, existem sempre consequências, e normalmente não são boas. No entanto, muitas das mais geniais obras da humanidade derivaram precisamente da capacidade de arriscar, de caminhar sobre a linha vermelha. E no vinho não é diferente.  […]

Editorial da revista nº46, Fevereiro 2021

Figurativamente, a linha vermelha representa uma fronteira, uma demarcação, um limite. Ultrapassada essa linha, existem sempre consequências, e normalmente não são boas. No entanto, muitas das mais geniais obras da humanidade derivaram precisamente da capacidade de arriscar, de caminhar sobre a linha vermelha. E no vinho não é diferente. 

Luís Lopes

Gosto das pessoas e das coisas que são diferentes, quando são boas. Prefiro, de muito longe, algo diferente e bom do que algo apenas bom. A diferença mexe comigo, faz-me pensar, questiona-me, desafia-me. Isto é válido para tudo, da pintura ao futebol, da literatura aos comportamentos sociais, da comida ao vinho. Porém, é impossível fazer a diferença sem correr riscos. A segurança está, sem dúvida, na base da eficácia e até, admito, da perfeição. Mas dificilmente é um caminho para a singularidade 

Tenho por isso uma admiração sem limites por aqueles que arriscam e que, na sua vida ou na sua actividade, caminham na chamada red line. É uma linha muito fina, onde é extremamente difícil manter o equilíbrio. Um passo em falso, e o que podia ser brilhante transforma-se numa coisa sem préstimo. 

Deixem-me puxar pela minha paixão futebolística para fazer uma analogia com dois jogadores de vanguarda, Zlatan Ibrahimovic, sueco de ascendência bósnia e croata, e Mario Balotelli, italiano de ascendência ganesa. Dois egos do tamanho do mundo, ao ponto de um e outro, frequentemente, se compararem a deuses. Dois talentos extraordinários com a bola, duas personalidades complexas, no limite do risco na sua vida pessoal e profissional. Zlatan sempre caminhou na red line, deslizando na borda do precipício. Aos 39 anos, joga no Milan (equipa que lidera o campeonato italiano) e ainda esta época já marcou por cinco vezes dois golos numa partida. Mario, que tinha tudo para chegar ao mesmo nível e jogou nas melhores equipas do mundo, foi expulso de quase todas por comportamentos inaceitáveis recorrentes e, aos 30 anos, joga (até ver…) no Monza, segunda divisão italiana.  

Uma última analogia, esta vinda da experiência pessoal: todos os que fazem ou fizeram competição automóvel sabem que, para ambicionar resultados, é preciso arriscar e andar muitas vezes na faixa vermelha do conta rotações. Mas também conhecem as consequências de um motor partido… 

Tudo isto para, finalmente, falar de vinho. Cada vez aprecio mais vinhos diferenciadores, vinhos que me surpreendem com aromas e sabores que fogem do habitual. Para os fazer, é preciso arriscar, é necessário assumir um certo descontrolo controlado. Ao contrário do que muitos pensam e dizem, a menor utilização de produtos químicos nas videiras e nas cubas, que eu defendo em absoluto, deve corresponder sempre a uma muito maior intervenção física na vinha e na adega. A chamada “enologia de não intervenção ou intervenção mínima”, é uma irresponsabilidade que conduz, quase inevitavelmente, a maus vinhos.  

Só quem sabe muito de viticultura e enologia se pode dar ao luxo de abdicar da segurança e correr riscos. Mas só correndo riscos se criam vinhos que nos seduzem e impressionam pela sua qualidade, originalidade, personalidade. E mesmo com todo o conhecimento, talento e atenção, quem caminha na linha vermelha sabe que, por vezes, as coisas correm mal. Aí há que admitir o falhanço, descartar o vinho, e tentar de novo. Andar na red line não é para todos. Uns são Zlatan. Outros, Mario.

Baga, paixão e razão

Luís Lopes

Editorial da revista nº45, Janeiro 2021 Há poucas variedades de uva com um carácter tão distintivo quanto a Baga. Difícil na vinha, irreverente na adega, é base de vinhos tão marcantes e inconfundíveis quanto difíceis e polarizadores, sempre de acidez elevada, frequentemente de taninos vigorosos. Não buscando unanimidades, a Baga oferece, cada vez mais, qualidade, […]

Editorial da revista nº45, Janeiro 2021

Há poucas variedades de uva com um carácter tão distintivo quanto a Baga. Difícil na vinha, irreverente na adega, é base de vinhos tão marcantes e inconfundíveis quanto difíceis e polarizadores, sempre de acidez elevada, frequentemente de taninos vigorosos. Não buscando unanimidades, a Baga oferece, cada vez mais, qualidade, identidade, notoriedade e valor, a produtores e apreciadores que procuram tudo isso 

Luís Lopes

A casta Baga e os vinhos que origina (sobretudo) na Bairrada está longe de ser consensual. E não é difícil perceber porquê. A forte personalidade dos seus tintos afasta-a completamente da grande maioria dos consumidores que, muito naturalmente, prefere vinhos com fruta madura e doce e sabor suave e polido. Mas esse mesmo vincado carácter atrai uma legião de fãs, dentro e fora de portas, que ali encontra aromas e sabores que saem fora do mainstream”, independentemente do estilo adoptado por cada produtor. 

Visitei a Bairrada pela primeira vez, na pele de director de uma revista de vinhos, em 1989. Numa época em que pouquíssimos consumidores sabiam o que era uma casta de uva, foi nessa visita que percebi verdadeiramente a Baga. Acostumado a vinhos com alguma idade e de perfil austero e clássico (em 1984, aos 23 anos, o meu primeiro salário de jornalista foi comemorado com uma garrafa de Pasmados!) os tintos da Bairrada foram para mim uma revelação. E nomes como Casa de Saima, Luis Pato, Quinta da Dôna, Quinta de Baixo, Sidónio de Sousa e Quinta das Bágeiras saltaram para o topo das minhas preferências vínicas. Essa paixão pelos Baga da Bairrada solidificou-se com o tempo e com o conhecimento. E ampliou-se mesmo, nos últimos cinco ou seis anos, devido a dois motivos: o aparecimento de novos produtores apostados traduzir a plasticidade da uva em diferentes interpretações, sem perder a identidade que a caracteriza; e a “explosão” dos espumantes Baga-Bairrada que vieram dar outra dimensão e popularidade à casta e, ao mesmo tempo, resolver o problema da Baga inadequada (que existe!) para vinho tinto.  

O trajecto da Baga na Bairrada não tem sido fácil. Se nos anos 90 era inquestionável, nos anos 2000 passou a ser demonizada, culpada de todos os males, acusada de estar desenquadrada das tendências de mercado e ocasionar o descalabro nas vendas dos tintos da região. Pessoas desesperadas tomam, compreensivelmente, medidas desesperadas. De um momento para o outro, a Bairrada tornou-se na Denominação de Origem portuguesa mais permissiva em termos de castas, ao ponto de hoje um Bairrada tinto poder ser feito de, entre outras, Syrah, Cabernet Sauvignon, Merlot, Petit Verdot ou Pinot Noir. E, no entanto, os grandes tintos de Baga, elaborados a partir de vinhas plantadas no local certo e com produção controlada através de monda, mantiveram o seu percurso, continuaram a ganhar notoriedade e valor. Quase duas décadas passadas de uma “liberalização” que regiões como Dão ou Douro, por exemplo, nunca aceitariam, os vinhos mais reputados e valorizados da Bairrada são, hoje e cada vez mais, baseados em Baga. Para chegarmos aqui, no entanto, convém não esquecer aqueles que, rejeitando o canto da sereia dos Merlot e afins, se mantiveram irredutíveis no seu caminho, até o tempo (e o mercado) acabar por lhes dar razão. Luis Pato e Mário Sérgio Nuno, sobretudo eles, são, sem sombra de dúvida, os grandes guardiões da Baga, conseguindo através do seu exemplo de sucesso mudar práticas e mentalidades. Sem eles, a Bairrada seria outra coisa. A entrevista que publicamos nesta edição e que, pela pela primeira vez, fazem em conjunto, é bem ilustrativa do seu percurso, do que os separa, do que os une.  

Na Bairrada, a Baga nunca poderá fazer vinhos baratos e de volume. Mas pode assumir-se, enquanto casta identitária, como determinante para a valorização e notoriedade dos vinhos da região. Num mercado que busca, cada vez mais, a diferença com qualidade, a Baga pode ser, ao mesmo tempo, paixão e razão. 

Que venha 2021

Luís Lopes

Editorial da revista nº44, Dezembro 2020 O ano que agora caminha para o final, claramente, não deixa saudades. Há doze meses, nesta mesma página, procurando antecipar as tendências vínicas para 2020, escrevia eu que “todos esperam ou desejam que o novo ano seja melhor do que o anterior”. Estávamos muito longe de imaginar o que […]

Editorial da revista nº44, Dezembro 2020

O ano que agora caminha para o final, claramente, não deixa saudades. Há doze meses, nesta mesma página, procurando antecipar as tendências vínicas para 2020, escrevia eu que “todos esperam ou desejam que o novo ano seja melhor do que o anterior”. Estávamos muito longe de imaginar o que aí vinha. 2020 termina, porém, com alguns sinais de esperança e alento. Vamos, pois, virar vigorosamente a página e, em conjunto, fazer de 2021 um ano (muito) melhor. 

Luís Lopes

Antecipar tendências em anos “normais” é sempre difícil e falível. Num quadro de tantas incertezas é-o muito mais. No caso concreto do sector do vinho, nunca ninguém pensou que o comportamento dos consumidores, das empresas ou dos mercados, pudesse estar dependente de uma coisa tão simples quanto uma vacina. Mas este é o novo normal, e é com ele que vamos viver em 2021. 

Algumas tendências assinaladas para 2020 vão manter-se no próximo ano. Acredito, por exemplo, que os espumantes vão continuar a crescer, depois da quebra acentuada que certamente ocorrerá na quadra festiva condicionada que se aproxima. Também estou certo de que vectores como a sustentabilidade ambiental (a noção do efémero leva-nos a olhar com mais atenção para o que realmente importa), os vinhos brancos de topo (de castas como Alvarinho ou Encruzado, terroirs especiais ou lotes com alguma idade), as transacções de propriedades (inevitáveis com a descapitalização das empresas menos “almofadadas”) vão acentuar-se em 2021.  

Por outro lado, as tremendas dificuldades que a HORECA enfrenta, em particular nos segmentos mais orientados para o “fine dining” e para o turismo, bem como a menor afluência presencial às lojas de vinho (parcialmente mitigada pelas vendas online), vieram desvalorizar o aconselhamento personalizado que encontramos naqueles pontos de venda e consumo e, ao mesmo tempo, reforçar desmesuradamente o peso da chamada distribuição moderna, super e hipermercados. A esmagadora maioria dos vinhos são ali vendidos em promoção, com descontos monumentais. E se nos habituámos, nos últimos anos, a ver algumas marcas de menor estatuto (mas que fazem números impressionantes) em “promoção permanente, agora deparamo-nos com marcas clássicas, algumas com várias décadas de idade, a entrar no mesmo modelo. Implanta-se a fidelização à promoção e não à marca. Ou seja, o cliente dos hipers compra apenas o vinho que estiver em promoção e não a marca que reconhece; e as marcas tradicionais promocionadas arriscam nunca mais poder voltar aos seus preços de referência.  

Mas há coisas boas que se vão manter. O consumidor de nicho vai, muito provavelmente, continuar a procurar a diferença. Os vinhos de talha estão em alta (quem diria…), quando há pouco mais de uma década, em muitas casas alentejanas reconstruídas para os novos proprietários citadinos, as talhas eram partidas para fazer entulho. Os brancos de curtimenta, brancos de tintas, vinhos de castas raras ou de vinhas centenárias, orgânicos, “naturais”, “pet nat” e outros que tais, vão manter a procura, alicerçada nas redes sociais e na venda online. 

Estes vinhos diferenciadores são importantes para assegurar a vitalidade e diversidade de um sector que provavelmente se vai bipolarizar, entre os “promocionados” dos hipermercados que ocupam quase todo o espaço e os “alternativos” que ficam com as especialidades. Dificuldades acrescidas para muitos dos melhores e mais consistentes vinhos portugueses, que não são nem “promocionados” nem “alternativos”, e que correm o risco de ficar encalhados em terra de ninguém. Deixo dois conselhos aos seus produtores: resistam o mais que puderem, mantenham-se firmes no projecto que criaram, nas vinhas e nos vinhos que amam como se filhos fossem; e aprendam a construir e a contar uma boa história, utilizando para a comunicar todas as plataformas que estão ao vosso dispor. Pela nossa parte, continuaremos a apoiá-los e a ajudar a estreitar os laços entre quem produz e quem consome. 

Termino com um prognóstico que não deve falhar: 2021 será melhor do que 2020. Que chegue depressa o novo ano. Saúde para todos, fiquem bem. 

Online

Luís Lopes

Editorial da revista nº43, Novembro 2020 A internet aumentou desmesuradamente o seu peso nas nossas vidas profissionais (e pessoais!) desde março de 2020. No sector do vinho, a verdade é que o online, não resolvendo nada e, muito menos (longe disso), substituindo a interação pessoal, atenua os efeitos que o distanciamento social nos impõe. E […]

Editorial da revista nº43, Novembro 2020

A internet aumentou desmesuradamente o seu peso nas nossas vidas profissionais (e pessoais!) desde março de 2020. No sector do vinho, a verdade é que o online, não resolvendo nada e, muito menos (longe disso), substituindo a interação pessoal, atenua os efeitos que o distanciamento social nos impõe. E em algumas áreas, quando bem usadas, as soluções online são de tal forma eficazes que, acredito, nunca mais voltaremos a trabalhar como antes da pandemia.

Luís Lopes

Reuniões, apresentações, vendas, muito do que fazemos hoje deixou de ser presencial e passou a virtual. No meu caso, nunca acreditei naqueles que, quando o covid-19 dinamitou os negócios, apontaram o e-commerce como solução milagrosa. Hoje, a grande maioria dos produtores de vinho portugueses possui uma loja online ou trabalha com um parceiro nessa área, mas quase todos confessam que as vendas são residuais.  

No que respeita à comunicação produtor/líderes de opinião ou produtor/consumidor, também, confesso, desconfiei da eficácia do online. As muitas apresentações de vinhos a que assisti através das habituais plataformas (Zoom, Teams...) reforçaram essa desconfiança. Algumas foram absolutamente patéticas, com produtores calados e estáticos enquanto meia dúzia de jornalistas e sommeliers provavam, igualmente sisudos, o vinho que fora enviado para casa, interrompendo o desconfortável silêncio com uma ou outra pergunta do tipo “que grau tem este vinho? mostrando que nem a ficha técnica do produto se tinham dado ao trabalho de consultar. No entanto, no meio de tudo isso, uma ou outra apresentação dinâmica, bem conseguida, interventiva, sugeriu-me que o online poderia funcionar como ponte de comunicação, desde que bem utilizado. Recentemente, dois eventos completamente distintos, derrubaram as minhas dúvidas e revelaram-me o enorme potencial da ferramenta que temos em mãos.  

Num deles, participei como convidado na adega de um produtor, enquanto através do Zoom era feita a apresentação de um vinho para um grupo de 20 jornalistas e sommeliers de topo no Brasil. Não foi uma apresentação vulgar. Espalhados pela gigantesca metrópole de São Paulo, esses 20 profissionais receberam, ao mesmo tempo, um kit composto por um prato de bacalhau elaborado por um famoso restaurante de cozinha portuguesa e um frappé selado com garrafa e gelo. Na adega, um ecrã de grande formato revelava as caras dos participantes, incluindo o importador local. O almoço decorreu como se estivéssemos todos na mesma sala. O produtor, e eu próprio, fomos bombardeados com perguntas interessantes e interessadas, ouvidas e respondidas mais facilmente do que se nos encontrássemos numa comprida mesa. Saí dali a pensar que: primeiro, a acção deve ter saído muito mais barata ao produtor do que se tivesse voado para São Paulo e pago a refeição num restaurante; segundo, muitas daquelas pessoas nem sequer iriam comparecer no restaurante e ali estavam todas, confortavelmente, em suas casas; terceiro, nenhum deles se vai esquecer nem do momento nem do vinho. 

O outro evento foi muitíssimo mais ambicioso, na escala e nos meios envolvidos. Nunca, no mundo, se fez algo como o Vinhos de Portugal, realizado nos dias 23, 24 e 25 de outubro e transmitido online para os domicílios de quase 1100 pessoas, que compraram os bilhetes (com a opção de packs de vinhos) no Brasil e em Portugal. O evento dos jornais Público, O Globo e Valor Económico, em parceria com a Viniportugal, e em que tive o privilégio de participar como um dos orientadores das sessões, realizou 62 lives/entrevistas de 25 minutos com produtores e 16 provas temáticas de 60 minutos. A milhares de quilómetros do local da acção, grupos de amigos e famílias abriam as garrafas recebidas, assistiam às provas, questionavam oradores e produtores.  

O enorme sucesso desta iniciativa substitui o contacto pessoal e a interacção numa sala de provas? Não, definitivamente. Mas evidenciou-se como um modelo alternativo, agora, e complementar, no futuro. O online é uma ferramenta, como um martelo ou um automóvel. Posso estragar uma parede quando queria pregar um prego ou atropelar alguém quando apenas pretendia levar-me a um local. No fundo, o online não é mais do que o reflexo das pessoas que o usam. 

Atípico

Luís Lopes

Editorial da revista nº42, Outubro 2020 Enquanto martelo o teclado, já se vão lavando a maior parte dos cestos da colheita de 2020. Como profissional da escrita de vinhos, esta foi a trigésima primeira vindima que acompanhei, percorrendo vinhas e adegas de todo o país. São muitas colheitas, todas diferentes, cada uma com particularidades e […]

Editorial da revista nº42, Outubro 2020

Enquanto martelo o teclado, já se vão lavando a maior parte dos cestos da colheita de 2020. Como profissional da escrita de vinhos, esta foi a trigésima primeira vindima que acompanhei, percorrendo vinhas e adegas de todo o país. São muitas colheitas, todas diferentes, cada uma com particularidades e perfis de vinhos bem distintos.

Luís Lopes

Fazendo um esforço de memória, recordo-me de todas as trinta e uma vindimas que experienciei, bem como das características mais marcantes dos anos vitícolas a que estão associadas. Posso agrupá-las de muitas e variadas maneiras: as vindimas frescas; as vindimas quentes; as vindimas molhadas; as vindimas secas; as vindimas escassas; as vindimas abundantes; a vindimas precoces; as vindimas tardias. E, claro, posso igualmente categorizá-las em termos da qualidade média dos vinhos a que deram origem. Porém, uma vindima nunca se se integra numa única categoria. Uma dada vindima pode ser, ao mesmo tempo, quente, escassa e precoce, por exemplo. Os anos vitícolas também ficam marcados por uma grande diversidade de factores: as temperaturas médias ou a pluviosidade em fases decisivas do ciclo da videira – abrolhamento, floração, pintor, maturação…; acidentes climatéricos muito localizados (geada, granizo) ou um pouco mais generalizados (escaldão); ou ainda, a maior ou menor incidência de pragas e doenças da videira.  

As variáveis ao longo de um ano vitícola que culmina na colheita são inúmeras, tornando cada vindima completamente diferente da anterior. E sendo certo que assim é, não se torna fácil perceber de imediato a razão pela qual tantos viticultores e produtores de vinho, sobretudo ao longo da última década, escolhem a mesma palavra para definir a vindima que acabaram de viver: atípica. Foi assim em praticamente todas as colheitas desde 2014. Curiosamente, ninguém classificou 2011 como um ano atípico. No final dessa vindima, “excelente” era a expressão que se ouvia de todas as bocas e que desde logo se colou aos vinhos desse ano 

Mas afinal o que é uma vindima “típica, por oposição à “atípica”? Não será, no fundo, uma vindima idealizada? Ou seja, aquela que resulta de um ano em que a chuva caiu na quantidade e época certa, granizos e geadas, pragas e doenças não fizeram grandes estragos, o verão foi ameno, com noites frescas e maturação a decorrer sem pressas, culminando numa colheita genericamente seca, com alguns chuviscos pontuais que refrescaram as uvas, possibilitando colher todos os cachos no momento perfeito de equilíbrio entre açúcar, acidez e taninos. Que maravilha! O problema é que essa vindima perfeita é coisa cada vez mais rara, e talvez tenhamos de nos habituar a uma “tipicidade” feita de excessos climatéricos, estações do ano desnorteadas e, sobretudo, um elevado nível de imprevisibilidade.  

Mas mesmo aceitando esse “novo normal como dado adquirido, não sei como classificar a colheita de 2020, a não ser como a mais insana de que me lembro. Desde logo, porque foi a vindima da covid-19, com tudo o que isso implicou em termos logísticos, económicos, psicológicos, até. Foi uma vindima associada a um ano de desavinho, granizo, oídio, míldio, cicadela, escaldão, desidratação, vagas de calor prolongadas. Foi uma vindima em que as maturações pareciam não querer avançar e depois dispararam quase incontroláveis, perdendo-se a preciosa acidez nas castas mais precoces. Foi um ano de enorme heterogeneidade entre regiões, mas também heterogeneidade na mesma vinha, na mesma cepa, no mesmo cacho. Um ano em que se colheram tintos antes de brancos, uma vindima onde açúcares e ácidos desafiaram a lógica, uma colheita onde, para meu desgosto, a Touriga Nacional deu 10 a 0 à Francesa. 

O ano vitícola e a vindima de 2020 exigiram o máximo de competência, dedicação, esforço, resiliência, por parte de todos aqueles que fazem da vinha e do vinho a sua vida. Um ano atípico? Se atípico significar que, por um lado, não se vai repetir tão depressa e, por outro, que dentro das dificuldades vai originar grandes vinhos, atípico seja. 

A gente que faz o vinho

Luís Lopes

Editorial da revista nº41, Setembro 2020 No dia em que escrevo estas linhas já as uvas estão a ser colhidas um pouco por todo o país. Em algumas regiões, a vindima vai em velocidade de cruzeiro, noutras cortam-se os primeiros cachos. Este tempo de colheita faz-me pensar no trabalho dos muitos profissionais, produtores, viticólogos, enólogos, […]

Editorial da revista nº41, Setembro 2020

No dia em que escrevo estas linhas já as uvas estão a ser colhidas um pouco por todo o país. Em algumas regiões, a vindima vai em velocidade de cruzeiro, noutras cortam-se os primeiros cachos. Este tempo de colheita faz-me pensar no trabalho dos muitos profissionais, produtores, viticólogos, enólogos, que têm agora a sua “prova de fogo”, o momento por que esperaram ao longo de um ano inteiro.  

Luís Lopes

A vindima é feita de gente. Em nenhum outro período do ano há tamanho movimento de pessoas numa propriedade vitivinícola. No meio das vinhas, de tesoura na mão ou caixa às costas, nos tractores e atrelados, nas máquinas de vindimar, descarregando as uvas nas prensas, puxando mangueiras na adega, medindo mostos no laboratório, vigiando as fermentações. Muitas destas pessoas só ali vão uma vez por ano, precisamente nestas semanas em que se cortam os cachos e se transformam em vinho. Outras, estão no local praticamente todos os dias, ajudando as videiras no seu percurso até à vindima seguinte ou acompanhando os vinhos que se fizeram na colheita anterior. 

Onde há pessoas existe pensamento e acto, reflexão e decisão. Sendo um fruto da natureza, o vinho não é feito por ela, é produto exclusivo da intervenção humana.  As uvas que agora se colhem são tanto o resultado das condições do ano vitícola como das opções que foram seguidas para mitigar, em alguns casos, ou potenciar, noutros, a obra da natureza.   

Muitas dessas decisões aconteceram bem antes da vindima. Já nem falo das que estiveram na base da criação da vinha e que resultam de opções estratégicas de longo prazo: onde, quando, como, o que plantar. Bastam-me todas aquelas operações que ocorrem ao longo do ciclo vegetativo da videira e que implicam processos de ponderação e decisão quase diários: podas, empas, tratamentos, desfolhas, correções de solos, rega, mondas, a lista é infindável. O ano de 2020 foi especialmente desafiante nesse sentido, com ataques de míldio e oídio difíceis de controlar e tudo isto num contexto agravado pela pandemia e os cuidados a ter na gestão do espaço e do movimento das pessoas. O trabalho do viticólogo e da sua equipa vai a exame agora, à medida que os cachos entram na adega. Não sei o que passará pela cabeça do chamado “pessoal de campo”: ansiedade, sentimento de dever cumprido, ou aquele misto de preocupação e alívio que os pais sentem quando um filho se emancipa e sai de casa?  

O fruto que uns entregam fica agora a cargo de outros, a gente da enologia, na adega. E, de novo, as decisões sucedem-se, frequentemente sem tempo para reflectir o suficiente antes de as tomar. Prensagens, pisas, fermentações, remontagens, desencubas, lagares, cubas, barricas. Em muitos casos, fruto do histórico de anos anteriores, as uvas que chegam à adega já têm um destino específico, esperam-se que origine um vinho concreto. Umas vezes cumprem, outras não. Nunca esqueço o que o enólogo Michel Rolland me disse, há quase 20 anos: partindo das mesmas uvas, a diferença entre um vinho muito bom e um grande vinho está nos detalhes. Ou seja, de cada vez que, pressionados pelas circunstâncias, decidimos por um compromisso, facilitamos num detalhe, descemos um degrau na escada que leva à grandeza.   

Opções são tomadas minuto a minuto enquanto os mostos fermentam. Assentes na experiência e no saber empírico, ou alicerçadas no conhecimento científico, são essas decisões que, somadas às que aconteceram na vinha, vão definir os vinhos que agora nascem e que vamos beber dentro de alguns meses ou daqui a muitos anos 

Neste tempo de vindima, enquanto apreciador e profissional da escrita, agradeço sentidamente a todos aqueles que fazem o vinho acontecer. O vinho tem, obviamente, uma base natural que não dominamos. Não está nas nossas mãos criar um terroir de excelência onde ele não existe, não conseguimos evitar um granizo ou um escaldão. Do mesmo modo que um pescador não domina o mar onde pesca. Mas ao contrário do peixe, o vinho é um produto transformado, fruto de decisões humanas. E é muito bom saber que algumas coisas ainda dependem de nós. 

Um vinho à procura de si próprio 

Luís Lopes

Editorial da revista nº40, Agosto 2020 O rosé, mais do que qualquer outro tipo de vinho, mostra bem a volatilidade das modas e dos estilos. Basta atentar no que tem sido o seu percurso ao longo dos últimos anos. O que hoje é verdade, amanhã é mentira, o que agora está in, daqui a pouco […]

Editorial da revista nº40, Agosto 2020

O rosé, mais do que qualquer outro tipo de vinho, mostra bem a volatilidade das modas e dos estilos. Basta atentar no que tem sido o seu percurso ao longo dos últimos anos. O que hoje é verdade, amanhã é mentira, o que agora está in, daqui a pouco está out. Cor clara ou escura? “Bica aberta” ou “sangria”? Levemente doce ou absolutamente seco? Inox ou madeira? A expressão “à vontade do freguês” nunca fez tanto sentido. 

Luís Lopes

Recuemos vinte anos, não é preciso mais. Até aí, tudo era simples, claro, objectivo, no panorama dos rosés nacionais. Havia o Mateus, o Lancers, o Casal Mendes e mais alguns outros, o perfil estava perfeitamente definido – leve, frutado, com pouco álcool, algum gás e uma boa dose de açúcar para equilibrar a viva acidez – e os rosés de Portugal vendiam muitos contentores, na exportação, claro, que por cá era visto como “vinho de senhoras” e de estrangeiros 

Depois, a pouco e pouco, o rosé foi timidamente abrindo caminho no mercado nacional, dando um salto enorme na última década com a explosão do turismo. O turista trouxe com ele, numa primeira fase, um aumento da procura interna do modelo “frutado e doce”, mas logo a seguir, o visitante mais viajado e endinheirado passou a pedir o chamado “rosé tipo Provence”, caracterizado pela cor rosada muito clara. O Algarve do sol, praia e restaurantes transformou-se num importante mercado de rosé, os vendedores que fazem essa região começaram a exigir aos produtores o rosé clarinho e a cor tornou-se no principal elemento para definir o perfil do vinho: rosa escuro/clássico (outra palavra para “antiquado” no mundo rosado) ou rosa claro/moderno. Ainda os enólogos não estavam refeitos das dores de cabeça que tiveram para afinar a cor pretendida pela equipa de vendas, já começavam a chegar outras orientações: aquele quer mais seco, este quer mais doce, um cliente diz que rosé de sangria é feito de restos, outro só quer bica aberta. Como resultado, produtores há que experimentaram tudo e mais alguma coisa até assentarem no estilo (supostamente) “certo” para o seu rosé.  

Depois dos rosés “comerciais”, chegaram aos vinhos mais ambiciosos. Objectivo: através de castas menos comuns (Pinot Noir virou um must have), vinificação (fermentação em barrica à cabeça) ou embalagem, oferecer um produto de preço superior e com maior percepção de requinte. Como quase sempre acontece, na busca da diferença extremam-se posições/perfis: de um lado, rosés praticamente sem cor e com muito pouco álcool; do outro, rosés ostensivamente corados, tipo claretes, e com álcool elevado. Por vezes, um mix dos dois, bem clarinho e com 14%… 

Neste ponto do texto, e para evitar que se pense que não gosto de rosés, devo dizer que sou um fã. Conheço muito pouca gente que beba rosé em tantas ocasiões quanto eu. Há uma dezena de anos, li uma crónica de um conhecido jornalista britânico que dizia algo como: “não há nada que um rosé faça, que um branco ou tinto não faça melhor”. Se se referia à excelência absoluta, mesmo que contrariado, tenho de lhe dar razão. Claro que há rosés muitíssimo bons (nesta edição da Grandes Escolhas provámos vários) mas com excepção de Champagne, não vejo este vinho atingir, globalmente, o mesmo nível de sofisticação, complexidade, longevidade, de um grande branco ou tinto. (Antes de alguém levantar a espada em defesa da honra dos rosados, por favor, compare o número de garrafas de branco, tinto e rosé que tem em casa...) 

Mas será que o rosé precisa mesmo desse estatuto de excelência para ter sucesso? Há imensas situações em que um rosé me sabe melhor e se mostra mais adequado do que um branco ou um tinto. Ainda há pouco tempo, num almoço com 8 amigos, só bebemos rosés, portugueses e franceses (já agora, os nossos eram bem melhores, apesar dos nomes consagrados de Provence). 

Acredito que, mais do que qualquer outro tipo de vinho, o rosé é um vinho de momentos, lugares, pessoas. E é por isso que a busca do rosé “certo” é uma quimera. Qual o rosé de que mais gosto? Geralmente, prefiro rosés secos, com álcool médio/baixo e acidez elevada, aprecio corpo e sabor, e a intensidade da cor é-me completamente indiferente. Mas tem dias…