Geographic Wines: Uma entrada à la volée

geographic wines

O projecto Geographic Wines nasce da vontade de Nuno Morais Vaz em viver o mundo do vinho todos os dias de forma intensa. Quem o conhece, seja a fazer lotes, a acompanhar a vindima, ou a promover os seus vinhos, não fica com dúvidas, tanto é o seu entusiasmo. Quis o sentido da vida que […]

O projecto Geographic Wines nasce da vontade de Nuno Morais Vaz em viver o mundo do vinho todos os dias de forma intensa. Quem o conhece, seja a fazer lotes, a acompanhar a vindima, ou a promover os seus vinhos, não fica com dúvidas, tanto é o seu entusiasmo. Quis o sentido da vida que se juntasse a Daniela Matias, enóloga que, quando se conheceram, trabalhava no projecto Villa Oeiras, da responsabilidade da Câmara Municipal de Oeiras. Nuno e Daniela fazem o par dinâmico que suporta a criatividade da Geographic Wines, numa relação que se estende à a vida pessoal e familiar. Nuno é o mentor do projecto, faz dezenas de milhares de quilómetros por ano, tanto na busca das melhores vinhas, como na promoção entusiasta dos vinhos que concebe, desde os rótulos (bonitos, modernos e engraçados) aos lotes finais. Daniela acredita na ciência e no estudo, adora o trabalho da adega, mas sempre preferindo intervenções minimalistas. Ambos dizem que procuram criar vinhos únicos, tendo por base a autenticidade, a sustentabilidade social e ambiental, e a preservação e divulgação dos diferentes terroirs. Até aqui tudo muito bem… e, naturalmente, aplaudimos. Como aplaudimos também o facto de a empresa produzir vinhos em várias regiões do país, permitindo, assim, uma espécie de viajem dentro do país vitivinícola, mas com enfoque no Norte, mais concretamente na Bairrada, Douro e Vinhos Verdes.

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Há cerca de um ano, provámos as primeiras edições dos vinhos, da colheita de 2021, criados por este jovem casal e centrados na marca Landcraft, um Sauvignon Blanc da Bairrada (de uma vinha próxima de Sangalhos) e dois Vinhos Verdes, um Alvarinho e um Loureiro. Esse trio repete-se agora na colheita de 2022, juntando-se ao portfólio a gama Lento — com um rótulo de belo efeito à semelhança de todos os produtos da empresa — na versão branco (surgirá um tinto que está a estagiar), e dois espumantes bairradinos, um branco e um rosé. Os Vinhos Verdes confirmaram as boas impressões da colheita anterior, apesar do ano difícil de 2022, com o Alvarinho, desta vez, em destaque. O Lento é produzido a partir de uvas de vinhas velhas, em field blend (com Rabigato, Síria, Folgazão, Viosinho, Malvasia, entre outras), de solos tendencialmente arenosos e com muito quartzo, e oferece uma versão duriense de um branco sofisticado e com patine (perfeito para fine-dining), a um preço muito ajustado. Todavia, foram mesmos os espumantes que deslumbraram, ambos a um nível muito alto, sendo a versão rosé absolutamente imperdível.

(Artigo publicado na edição de Julho de 2023)

Lagoalva: Fernão Pires de primeira linha

Quinta da Lagoalva

A quinta possui cerca de 42 hectares de vinha (num total de 5.500 hectares com muitos outros cultivos e produções, desde cortiça a azeite, passando por cavalos), plantados junto ao rio Tejo e constituídos por uma grande variedade de castas, nacionais e mundiais. Como não poderia deixar de ser, dada a região onde está, as […]

A quinta possui cerca de 42 hectares de vinha (num total de 5.500 hectares com muitos outros cultivos e produções, desde cortiça a azeite, passando por cavalos), plantados junto ao rio Tejo e constituídos por uma grande variedade de castas, nacionais e mundiais. Como não poderia deixar de ser, dada a região onde está, as vinhas mais velhas são de Fernão Pires e têm cerca de 70 anos, sendo de destacar também as vinhas de Syrah, plantadas em 1984, das primeiras em Portugal. A longa tradição da Quinta da Lagoalva como produtora de vinho é atestada em 1888, na Exibição Portuguesa de Indústria, onde esteve presente com 600 cascos de vinho. Todavia, é mesmo a referida data de 1989 que consagra o primeiro registo como produtor engarrafador no IVV, então com a marca “Cima” (aliás, a propriedade girou muitos anos com a marca Lagoalva de Cima), com a primeira certificação atribuída pela Comissão Vitivinícola Regional do Tejo a ocorrer pouco depois, em 1992, então já como “Quinta da Lagoalva”. Mais de 3 décadas volvidas, e já com uma história significativa no universo vitivinícola português, elegeu 2023 como um ano de mudança. Essa mudança foi materializada, desde logo, no rebranding do logótipo e dos rótulos do seu portefólio de vinhos, que vão chegar ao mercado até ao final do ano, à medida que são lançadas novas colheitas. Actualmente, a produção de vinhos ronda as 650 mil garrafas, a representar cerca de 1,5 milhões de euros de faturação em 2022. As vendas em Portugal correspondem a 65% do negócio, sendo os restantes 35% alocados a mercados de exportação, com maior destaque para Alemanha, Bélgica, Brasil, China e Polónia.

Quinta da Lagoalva

A nova imagem foi desenvolvida pela agência portuguesa OM Design, em estreita colaboração com as equipas de enologia, comercial e enoturismo da Quinta da Lagoalva, num processo que demorou um ano a concretizar. Isso mesmo nos confirmou Pedro Pinhão, o actual coordenador de enologia do projecto que já leva 2 décadas ao serviço da Lagoalva, e que, desde há pouco tempo, beneficia da ajuda do jovem enólogo Luís Paulino. Os novos rótulos retratam a casa e palácio, e procuram homenagear o legado da icónica propriedade, com 830 anos de história e 660 hectares contíguos, e beneficiaram de contributos de toda a família (assumindo o legado histórico, os rótulos passaram a integrar a menção “Circa 1193”, data do primeiro registo da Quinta da Lagoalva).

A par deste rebranding foi lançado um vinho em estreia absoluta, nada menos nada mais do que um Grande Reserva Fernão Pires da colheita de 2021. As uvas deste Fernão Pires provêm da referida vinha velha com 70 anos, sujeitas a prensagem dos cachos inteiros, e fermentação em barricas usadas (de 2.º, 3.º e 4.º anos) de carvalho francês com capacidade 500 litros, nelas estagiando durante 12 meses com bâtonnage semanal durante 2 meses. A surpresa não vem propriamente do uso da casta, que é maioritária aliás na região, mas no facto de ser usada em estreme e logo posicionada como topo de gama, algo menos comum na região do Tejo, mas que é de aplaudir. Tanto mais que este lançamento se insere no âmbito do movimento de promoção desta casta, promovido pela Comissão Vitivinícola Regional do Tejo, a nível nacional e internacional, movimento que se aplaude com entusiasmo.

Foi também tempo de conhecermos as novas de parte do portefólio do produtor, caso dos colheitas do Lagoalva branco, rosé e tinto; Lagoalva Sauvignon Blanc; Lagoalva Reserva branco e tinto (ambos bi-varietais). Revelaram-se todos muito atraentes, sendo de destacar uma clara tendência para redução do álcool (vários vinhos abaixo dos 12%) e maior percepção da acidez (com uma excepção, todos os vinhos acima dos 6 g/L), aspectos que muito nos agradaram, e que revelam a atenção do produtor às novas tendência de consumo.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2023)

Dos Santos: Um novo player no Vinho do Porto

Dos Santos

Criar uma empresa de Vinho do Porto é uma aventura difícil de concretizar, face às exigências legais, em termos de stock obrigatório de 75 000 litros. Se juntarmos a isso a necessidade de criação de entreposto alfandegário e os efeitos da lei do terço que só autoriza que se comercialize por ano um terço do […]

Criar uma empresa de Vinho do Porto é uma aventura difícil de concretizar, face às exigências legais, em termos de stock obrigatório de 75 000 litros. Se juntarmos a isso a necessidade de criação de entreposto alfandegário e os efeitos da lei do terço que só autoriza que se comercialize por ano um terço do que se tem em stock, percebe-se que o investimento inicial é tremendo e isso tem sido um factor impeditivo do surgimento de novas empresas no sector. Por tudo isto, é sempre uma boa notícia o anúncio de um novo operador. Alexandre Botelho é então o rosto desta nova empresa e o negócio faz-se, como referiu, “pelos contactos com produtores da região e com o recurso a uma adega em Alijó onde, em prestação de serviços, conseguimos vinificar, estagiar, lotar e engarrafar os vinhos.” Neste momento o stock contempla cerca de 60% vinho tinto e o resto, branco. Como ainda não dispõe de entreposto, Alexandre usou as instalações e o entreposto da Quinta do Portal para poder começar a comercializar. A situação é provisória e de horizonte curto já que, refere, “sei que dentro de, no máximo, um ano, tenho de ter tudo regularizado”. A procura de armazém continua, entretanto, mas se vai ser em Gaia ou no Douro ainda não está definido. E as chamadas “dores de crescimento” já por aqui deram sinais, porque na vindima de 2022, confessa, “vou ter 15000 litros e vou precisar desesperadamente de local onde possa ter tudo. Já é muita coisa!”

 

O foco da nova empresa são os vinhos das gamas de entrada, Tawny e Ruby, Tawny com indicação de idade e Late Bottled Vintage. O Vintage surgirá a seu tempo.

Dos Santos
O foco da nova empresa são os vinhos das gamas de entrada, Tawny e Ruby, tawnies com indicação de idade e Late Bottled Vintage; como nos disse, o Vintage surgirá a seu tempo e neste momento apenas o LBV foi apresentado.
A marca teve origem no séc. XIX, quando Joaquim Ferreira Pinto decidiu criar uma empresa de Vinho do Porto tendo em vista o abastecimento do mercado brasileiro. O nome Dos Santos era o apelido de sua mulher. O negócio foi depois continuado pelos descendentes, não da melhor forma e chegados a 1920 coube a uma descendente, Margarida dos Santos, pôr ordem no caos, liquidar as contas e vender a empresa. No Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto a empresa é omissa, tal como a marca emblemática que se vendia no Brasil – Dona Othilia – que ilustra este texto.
Foi em 2022 que Alexandre Antas Botelho, bisneto de Margarida dos Santos, recriou a marca Porto dos Santos. Sem vinhas e sem stock de família, só com muita vontade de continuar uma tradição familiar. Alexandre não esconde que “sou filho da região, o Douro é a minha prioridade e esta empresa é tudo o que tenho, não é um assunto acessório”, como que a sublinhar o empenho total neste projecto. Alexandre assume-se como enólogo e blender e tem a apoiá-lo um amigo de longa data e com créditos firmados no sector do vinho do Porto, Jaime Costa que, actualmente é técnico na Vasques de Carvalho e foi durante anos o enólogo da Burmester. Por ora, não está no negócio dos DOC Douro e na apresentação do projecto, para além dos vinhos agora lançados, provaram-se três lotes de Porto com origem em três zonas diferentes – Valdigem, Tedo (ambos margem esquerda e letra A) e Roncão, também letra A mas margem direita. A ideia era ensaiar um lote, partindo-se das diferenças de estilo de cada um dos vinhos. No fundo, uma brincadeira que procura reproduzir a tarefa do master blender que, tentativa após tentativa, tem de, em primeiro lugar, encontrar o equilíbrio do lote final e, em segundo, fazer com que esse lote corresponda depois ao “estilo da casa”, algo que no caso da Porto dos Santos é ainda um work in progress.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2023)

Trois: 1, 2, 3, Setúbal nasce outra vez

Trois Setúbal

Filipe Cardoso, Luís Simões e José Caninhas são os Trois, e querem mudar o Mundo. Pode não ser o Mundo inteiro, mas o mundo onde nasceram, cresceram e hoje trabalham: a Península de Setúbal. Além de uma amizade bonita, à qual a enternecedora diferença de idades confere carácter, o trio partilha uma visão muito única […]

Filipe Cardoso, Luís Simões e José Caninhas são os Trois, e querem mudar o Mundo. Pode não ser o Mundo inteiro, mas o mundo onde nasceram, cresceram e hoje trabalham: a Península de Setúbal. Além de uma amizade bonita, à qual a enternecedora diferença de idades confere carácter, o trio partilha uma visão muito única para os vinhos locais, sobretudo os não-fortificados, campo onde acredita haver potencial para se fazer muito melhor do que o ”bom vinho a bom preço” por que afina grande parte da região. E esta não é uma visão qualquer, mas sim a de três enólogos que falam com propriedade e que fazem, ou já fizeram, parte das equipas técnicas (e das famílias, nalguns casos) de importantes casas da Península de Setúbal, como Quinta do Piloto, Casa Horácio Simões, Quinta Brejinho da Costa ou Sociedade Vinícola de Palmela.

É convicção dos Trois que a região pode produzir, utilizando as vinhas certas e combinando de forma inteligente os métodos tradicionais e ancestrais com o conhecimento científico de hoje, grandes vinhos brancos e tintos, capazes de resistir ao teste do tempo e que espelhem verdadeiramente o carácter da Península de Setúbal e dos vários terroirs que a caracterizam. Para o comprovar, o primeiro vinho da Trois – Vinhos com Identidade, um Castelão de 2015, foi lançado em 2016, e a partir daí, ninguém os parou. O foco do projecto é, precisamente, esta casta tinta e a branca Fernão Pires, e também nas vinhas velhas, dos próprios e de viticultores com quem o trio mantém estreita relação. Estas estão localizadas em diferentes zonas e terroirs da região, desde as areias de Palmela às de Melides, passando pelos solos argilosos e calcários da Arrábida, mas, porque nem tudo é tão linear assim, e como explica Filipe Cardoso, “as zonas de transição também existem”, e algumas destas vinhas situam-se precisamente nesses locais.

Trois Setúbal

Agora, saem para o mercado mais três vinhos, as novas colheitas dos dois DOC Palmela Trois Curtimenta Fernão Pires e Trois Castelão, de 2021 e 2018, e um Moscatel Roxo de 2017, da marca de “entrada” Flor de Trois. O Fernão Pires (vinha com 40 anos), fermentado em lagar com curtimenta total e estagiado 12 meses em barricas de carvalho francês usadas, é o resultado da convicção destes enólogos de que a casta atinge o seu auge quando sujeita a vinificações mais tradicionais. Mas com uma advertência. “Um branco de curtimenta não tem de ter características de oxidação e cor dourada. Temos a sensação de que a generalidade das pessoas acha que é assim que deve ser um branco deste tipo, mas acreditamos que a curtimenta, como os nossos antepassados faziam, pode conferir coisas positivas e que não são necessariamente essas”, sublinha José Caninhas. O Castelão, de vinhas velhas, fermenta também em lagar e estagia um ano em barricas de carvalho francês usadas, e 6 meses, no mínimo, em garrafa. No copo, consegue-se sentir o seu lado clássico vinoso, mas num perfil de elegância e precisão que se coaduna com as exigências do mercado moderno. Era esse o objectivo com este vinho, e foi indubitavelmente cumprido. O Moscatel Roxo de Setúbal, por sua vez, vem responder à necessidade de um vinho deste género na gama Flor de Trois, com preço competitivo mas, de acordo com o trio, a mostrar alguma complexidade e sem se cair na tentação (frequente) de carregar na doçura.

Ao assistir à dinâmica entre os três enólogos, percebe-se que são pessoas muito diferentes, unidas por uma causa, e é isso — além dos excelentes vinhos que têm colocado no mercado, obviamente — que dá graça ao grupo. José Caninhas, uma década mais novo do que Filipe e Luís e com passado no sector agro-alimentar, assume-se como “rato de laboratório” e é nele que encontra conforto. A par disso, curiosamente, é através das emoções que sente os vinhos e admite que estes podem transportar-nos para locais e momentos específicos, “como a casa dos avós”. O copo do laboratório é o seu melhor amigo, e é neste que mais gosta de provar os vinhos. Por outro lado, Luís Simões imprime no grupo uma componente enológica “pura e dura”, fala sem rodeios e com a experiência que acumulou ao longo de anos na área. Já Filipe Cardoso harmoniza em si os dois lados, cruzando a experiência com a emoção, o que resulta no sorriso e boa disposição que apresenta onde quer que vá. Todos concordam: “Tentar dar o exemplo numa região, tem tanto de duro como de gratificante…”.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2023)

Verallia e Grandes Escolhas estabelecem parceria na feira Vinhos & Sabores

VERALLIA

A Verallia Portugal S.A. e a revista Grandes Escolhas estabeleceram uma parceria de colaboração no âmbito da feira Grandes Escolhas Vinhos & Sabores, que irá decorrer de 14 a 16 de outubro na Feira Internacional de Lisboa (FIL), localizada no Parque das Nações, em Lisboa. A feira Vinhos & Sabores é o maior evento de […]

A Verallia Portugal S.A. e a revista Grandes Escolhas estabeleceram uma parceria de colaboração no âmbito da feira Grandes Escolhas Vinhos & Sabores, que irá decorrer de 14 a 16 de outubro na Feira Internacional de Lisboa (FIL), localizada no Parque das Nações, em Lisboa.

A feira Vinhos & Sabores é o maior evento de vinhos de Portugal, eleita para proporcionar uma experiência única a milhares de visitantes, tendo oportunidade de interagirem com os mais de 400 produtores portugueses presentes, provando em primeira mão vinhos e sabores únicos.

Durante a feira serão abertas para degustação e prova cerca de 10 mil garrafas de vidro que, através da parceria, serão recolhidas pela Verallia Portugal S.A. e encaminhadas para reciclagem, garantindo o seu correto destino.

Com a recolha destas garrafas, as duas entidades têm como objetivo sensibilizar os consumidores em geral e a restauração em particular para a importância do processo de reciclagem. Assim, garantimos a produção de novas garrafas de vidro através da utilização do vidro reciclado.

Tanto a Verallia como a Grandes Escolhas partilham dos mesmos valores de responsabilidade social, da promoção da sustentabilidade e defesa do ambiente e dos recursos naturais, aliando-se em ações como estas, que permitirão um mundo melhor.

SOVIBOR: A Talha, como deve ser

Sovibor talhas

A Sociedade de Vinhos de Borba foi fundada em 1968 e chegou a ser uma das maiores empresas da região ao longo das décadas seguintes. Como tempo, porém, foi perdendo relevância, entrando lentamente em decadência na viragem do século. Foi preciso um homem de Vale de Cambra vir ao Alentejo para dar uma nova vida […]

A Sociedade de Vinhos de Borba foi fundada em 1968 e chegou a ser uma das maiores empresas da região ao longo das décadas seguintes. Como tempo, porém, foi perdendo relevância, entrando lentamente em decadência na viragem do século. Foi preciso um homem de Vale de Cambra vir ao Alentejo para dar uma nova vida à Sovibor. O empresário Fernando Tavares tem as suas raízes no norte do país, onde gere o seu negócio na área de distribuição de vinhos – a Sotavinhos. Teve uma grande ligação a Borba desde há muito e o momento de viragem aconteceu em 2014 com a aquisição da Sovibor. Desde então, com o apoio incondicional de sua mulher, faz semanalmente o trajecto até Borba, para onde se mudou a filha Rita, enquanto gestora enóloga residente. A consultoria enológica é confiada ao experiente António Ventura; e Luís Sequeira é responsável pela gestão administrativa e comercial.
Desde o início Fernando sonhou seguir a tradição alentejana de produzir vinhos em talha. Dedicou-se a investigar localmente as práticas ancestrais e eliminou desde logo a possibilidade de usar talhas revestidas de epoxy, porque são completamente estanques, “é como fazer o vinho em inox”, refere. Prefere talhas revestidas com pez louro (uma mistura de resina de pinheiro, cera de abelha e azeite), que permite uma troca gasosa muito doseada.

Sovibor talha
Fernando Tavares e a filha Rita, enóloga do projecto.

Quando o projecto se iniciou, não havia talhas na Sovibor. Hoje tem uma das maiores adegas de talhas no Alentejo, contando com 85 ânforas de vários tamanhos, muitas delas centenárias, fabricadas, sobretudo, em S. Pedro de Corval.
Na região de Borba, a Sovibor trabalha cerca de 200 hectares de vinha própria ou em parceria com viticultores locais. Os vinhos da gama Mamoré da Talha têm origem, exclusivamente, nas vinhas de sequeiro com idade superior a 50 anos, localizadas sobretudo na zona de Orada. Dão 1-1,5 kg por cepa. As uvas são vindimadas e vinificadas por parcela, pisadas a pé em pequenas tinas de inox de 200-300 kg e a fermentação na talha é feita com 40% a 60% do engaço. Quando a fermentação (com leveduras indígenas) se inicia, fazem-se calcamentos diários para homogeneizar as massas e impedir a sua compactação na boca da talha. Embora o regulamento do DOC Alentejo Vinho de Talha permita “abrir” as talhas a partir do dia de S. Martinho (11 de Novembro), a Sovibor mantém o vinho nas talhas até Março, deixando o Inverno passar por ele. As massas assentam no fundo da talha e servem de filtro natural, quando o vinho é retirado por uma torneira na base da ânfora. Volta para a mesma talha e o processo é repetido até que o vinho, saia completamente limpo. Este ano, a Sovibor adicionou uma novidade absoluta na região – a primeira aguardente bagaceira elaborada a partir de bagaços frescos de uvas tintas vinificadas em talha. Depois de uma dupla destilação, feita num majestoso alambique pacientemente reconstruído por Fernando Tavares, demorou dois anos a desdobrar o álcool até aos 46% de teor alcoólico final. Foram produzidas apenas 1800 garrafas.

 

A arte da pesgagem
A pesgagem é um processo de revestimento de talhas com uma mistura de pez louro (resina de pinheiro), cera de abelha e azeite que permite a sua impermeabilização. A receita pode variar em percentagem dos ingredientes, influenciando mais ou menos o perfil organoléptico do vinho; e normalmente as talhas para vinho branco não são usadas para fazer vinho tinto. Nesta operação extremamente artesanal e pesada estão envolvidas várias pessoas. Primeiro uma talha vira-se de boca para baixo em cima de uma estrutura com fogo aberto. Quando é aquecida, coloca-se de lado e depois de bem limpa por dentro, unta-se o interior com a tal mistura impermeabilizante natural. Finalmente, rola-se a talha para uniformizar tudo.

Uma prova inédita

Tradicionalmente, os vinhos feitos em talhas, quer brancos quer tintos, bebiam-se novos, a partir do momento em que eram “abertas” as talhas, na altura de S. Martinho. Não eram considerados vinhos de guarda. Por isso, uma prova de vários tipos de vinhos de talha, de diversas castas, brancos e tintos, produzidos desde 2016, é extremamente curiosa e didáctica. O resultado das muitas experiências efectuadas por Fernando Tavares mostrou que os vinhos de talha podem evoluir perfeitamente em garrafa quando são bem-feitos; e também que nem todas as castas se adaptam bem à vinificação em talha.
Nos brancos começámos com o Mamoré da Talha branco 2016, um blend de castas típicas da região – Antão Vaz, Rabo de Ovelha e Tamarez. Com uma cor dourada/âmbar no nariz lembra laranja e casca de laranja, tangerina, notas florais e de pólen, maçã, marmelo e ervas aromáticas. Um vinho muito seco, com frescura e salinidade, um leve amargo que refresca e fica bem neste contexto. (17). O 2018 da mesma vinha apresentou uma acidez mais pronunciada, notas de nêspera e marmelo, muita tangerina e laranja, alperce e pêssego. Muito fresco, vinho com grande textura e amplitude. (17,5). O Talha da Rita 2018 feito maioritariamente de Antão Vaz da vinha velha de sequeiro com 10% de Arinto de uma vinha com 25 anos. É mais resinoso com mais barro no nariz. Dourado na cor, revela notas de marmelo e ananás salgado. Com teor de álcool de 15% e incríveis 7 g/l de acidez tem corpo, equilíbrio, textura e frescura, com tanino e força. (18)

Passando para os tintos, primeiro avançámos com o Petroleiro, um palhete da talha. Às castas tintas da tal vinha velha com Trincadeira, Moreto, Carignan e Castelão juntam-se 30% de castas brancas de Antão Vaz e Rabo de Ovelha. O 2016 apresentou cor granada atijolado. Delicado e delicioso com morango e flores no primeiro impacto aromático, evoluindo muito bem no copo, doce de morango e framboesa, figos frescos e goiaba. (17). O 2018 das mesmas parcelas surge ainda com mais frescura. Aroma mais intenso e balsâmico, notas de carne e ervas aromáticas. Cresceu imenso no copo, deixando transparecer notas florais e fruta mais delicada como a framboesa. Textura macia com bom corpo e muito sabor. (17,5).
Seguiram os blend de castas tintas e monovarietais também feitos em talha, que foram parte de uma experiência inicial para aprender como as diferentes castas se comportam neste processo de vinificação. Para além da tradicional Moreto, aparecem Syrah, Touriga Nacional e também Carignan, casta que, não tendo muito protagonismo, se encontra presente no Alentejo já há cerca de um século, sobretudo nos encepamentos antigos.

O 2016 é um blend de Moreto, Carignan, Trincadeira e Aragonez. Fruta vermelha, nota vegetal a lembrar pasta de tomate e certa evolução. (16,5). O 2018 estava mais fechado no nariz e com mais cor. Mentolado e floral, com fruta vermelha e tomate seco. Tanino mais presente, boa frescura a disfarçar o álcool de 15%. (17,5). O Mamoré da Talha Moreto 2018 revelou a extraordinária afinidade da casta com talha. Muito aberto na cor, mentolado, com ervas aromáticas, caruma e compota de framboesa, finesse e sedosidade, reunindo todo o carácter da tradição. (18,5). O Syrah 2018 feito em talha é algo inédito. Faz parte de uma vinha com mais de 30 anos, também de sequeiro. Cor granada bastante intensa, bem vivo e fresco com notas de chá preto, cereja, amora e mirtilo, pimenta preta, carne, eucaliptos. Tanino intenso, textura sedosa e com muito sabor. A casta afirma-se para além da talha, mantendo-se como um belíssimo Syrah cheio de carácter. (18)
Do ano 2019, o blend de Moreto, Carignan, Trincadeira e Aragonez apresentou-se com fruta vermelha e preta, mentol, bem vivo, belíssimo, vibrante e cheio de força e presença. (18,5). O monovarietal de Moreto 2019 funciona invariavelmente bem e confirma que a casta parece que nasceu para ser trabalhada em talha. Rubi de média intensidade, nariz expressivo com manjericão, geleia de framboesa, fruta intensa entrelaçada com leves notas resinosas. Envolvente, com enorme personalidade. (18,5). O Touriga Nacional 2019 evidenciou uma história diferente. A casta marca mas, ao contrário de Syrah, não alinha com talha. Sobressai com muita pimenta, especiaria, mirtilo, bergamota, deixando uma secura no final de boca. Não deixa de ser um bom vinho, mas não é um exemplo de excelência de Touriga, nem de um vinho de talha. (17). O Syrah 2019 destaca-se pela óptima acidez, estrutura e força, firmeza de tanino. (18). O Carignan 2019 veio com fruta vermelha, alguma ferrugem, ervas aromáticas a lembrar tomilho e estragão, caruma. Cheio de tanino, corpo e força, mas menos longo do que os vinhos anteriores. (17,5).

Provamos também amostras de cuba de 2022, retiradas das talhas em março. O branco blend surgiu com aroma mais delicado, salino e doce ao mesmo tempo. Marmelo, nêspera, fisális. Muita secura de tanino presente e frescura graças à acidez pronunciada, quase bone dry na percepção. O tinto de blend explodiu com fruta extremamente fresca, uma nuance de banana e de rebuçado de morango, mentolado. Tanino apertado, tudo com equilíbrio. O Moreto, fiel a si próprio, com aquela típica rusticidade intelectual. Morango selvagem, framboesa, mentolado, fresco, fino de tanino com óptima acidez. E depois, com mais calma, e no meio da vinha, provámos os agora lançados Mamoré da Talha de 2021.
No conjunto, o dia “Talha com Tradição”, proporcionado pela Sovibor, foi uma fascinante janela aberta para um mundo singular de aromas e sabores. E tornou-se também uma dupla lição: aprendemos que os vinhos de talha, quando nascem bem, envelhecem com nobreza; e que uma família do Norte pode ser excelente guardiã da mais antiga tradição vinícola alentejana.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2023)

Os Velhotes estão cada vez mais novos

Velhotes

Desde 1934 que três homens se sentam à mesa para beber um cálice de vinho do Porto: um Boticário, um Advogado e um Juiz. O retrato faz parte do ADN da icónica marca Velhotes e, agora, a imagem destes vinhos do Porto da casa Cálem é renovada. A nova imagem procura, segundo a empresa, “preservar […]

Desde 1934 que três homens se sentam à mesa para beber um cálice de vinho do Porto: um Boticário, um Advogado e um Juiz. O retrato faz parte do ADN da icónica marca Velhotes e, agora, a imagem destes vinhos do Porto da casa Cálem é renovada.

A nova imagem procura, segundo a empresa, “preservar o estilo clássico e tradicional de Velhotes, sem descurar uma roupagem mais contemporânea, que confere à marca o estatuto de um autêntico ‘Vintage moderno'”.

VelhotesAlém do rótulo, que ganha nova vida, destacam-se ainda as barras coloridas na parte inferior das garrafas, usadas para especificar o tipo de vinho: o vermelho cereja está para o Ruby, como o verde está para o Porto Branco. Ao todo, são sete as referências: Tawny, Ruby, White Lágrima, White, LBV, Tawny Special Reserve e Tawny 10 Anos, sendo que os três últimos pertencem ao segmento mais premium, cuja cor de fundo do rótulo foi alterada para negro, de modo a diferenciar o mesmo.

Adega do Cartaxo: A aposta está nos “detalhes”

Adega do Cartaxo

Com uma produção anual na ordem dos 7 milhões de litros, provenientes de uma área de vinha que no conjunto dos seus associados totaliza cerca de 700 hectares, a Adega do Cartaxo, tem feito um esforço consistente na sua modernização tecnológica, na melhoria das instalações e um forte investimento tanto no acompanhamento da viticultura como […]

Com uma produção anual na ordem dos 7 milhões de litros, provenientes de uma área de vinha que no conjunto dos seus associados totaliza cerca de 700 hectares, a Adega do Cartaxo, tem feito um esforço consistente na sua modernização tecnológica, na melhoria das instalações e um forte investimento tanto no acompanhamento da viticultura como nos processos enológicos. Sem descurar os seus valores tradicionais assentes em marcas históricas com forte implantação como o Bridão e Coudel Mor, às quais com o tempo foram adicionando upgrades como as categorias Reservas e Special Selection, os responsáveis da adega sentiram a necessidade de captar novos mercados e um outro perfil de consumidor, mais urbano e sofisticado, com vinhos que respondessem melhor a esses requisitos. É dentro desta estratégia que se insere o lançamento da nova marca Detalhe, nas suas versões branco e tinto. E a aposta não foi deixada ao acaso, o que se torna evidente nos cuidados especiais que rodearam a sua apresentação, onde a imagem global e a rotulagem dos Detalhes entregues à designer Rita Rivotti, alinha nesse desiderato.

O Detalhe branco 2021, feito a partir de uvas Verdelho e Sauvignon Blanc, fermentadas em barricas de 500 litros de carvalho francês e com um curto estágio de 4 meses com bâtonnage conjuga a intensidade aromática de notas tropicais do Sauvignon com a frescura e o nervo do Verdelho, resultando um conjunto bem afinado e de aceitação generalizada. Já o Detalhe tinto 2019, resulta de um lote de Touriga Nacional, Alicante Bouschet, Syrah, Merlot e Cabernet Sauvignon. Beneficiou de 10 meses de estágio em barricas, completado com mais 9 meses em garrafa. Também aqui estamos muito longe da rusticidade com que alguns consumidores persistem em associar aos vinhos do Cartaxo. Pelo contrário, é também um vinho polido, equilibrado, com boa fruta, taninos domesticados em que o elevado grau alcoólico (15%) é contrabalançado pela sua frescura.

(Artigo publicado na edição de Junho de 2023)