Xisto, melhor do que nunca

“Um encontro de amigos”. É desta forma que as famílias Roquette e Cazes resumem o processo que levou à criação do Xisto. A colheita de 2018, agora apresentada nas renovadas instalações do icónico Château Lynch-Bages, em Bordéus, é porventura a melhor de sempre. Texto: Luis Lopes Fotos: Luis Lopes e R&C A nova adega do […]
“Um encontro de amigos”. É desta forma que as famílias Roquette e Cazes resumem o processo que levou à criação do Xisto. A colheita de 2018, agora apresentada nas renovadas instalações do icónico Château Lynch-Bages, em Bordéus, é porventura a melhor de sempre.
Texto: Luis Lopes
Fotos: Luis Lopes e R&C
A nova adega do Château Lynch-Bages, na pitoresca aldeia de Bages, comuna de Pauillac, é algo de assombroso. Pelo conceito, que replica as adegas “de gravidade” do século XIX, pela eficácia da simplicidade, pela tecnologia de ponta orientada no sentido da menor manipulação possível de uvas, massas e vinhos. Descrevê-la em detalhe implicaria várias páginas carregadas de entusiástica adjectivação e não é esse o tema deste trabalho, mas sim os vinhos que ali nos foram apresentados em finais de fevereiro: Roquette & Cazes tinto 2019 e Xisto tinto 2018.
O “encontro de amigos”, frase-assinatura que abre sempre a comunicação dos vinhos da empresa, teve início em 2002 e os amigos eram (e são) Jean-Michel Cazes (dos châteaux Lynch-Bages, Ormes de Pez e Haut-Batailley) e Jorge Roquette, da Quinta do Crasto. Na base do projecto, a complementaridade do conhecimento vitivinícola das duas famílias, para criar, em conjunto, um grande vinho do Douro, um vinho que tivesse “o poder e o sol de Portugal conjugados com a elegância de Bordeaux”, como na época o definiu Jean-Michel Cazes.

O primeiro Xisto nasceu na vindima de 2003, tendo sido apresentado ao mundo, com grande sucesso, na Vinexpo de 2005. O objectivo inicial era fazer Xisto todos os anos (menos nas colheitas de insuficiente qualidade, claro), e assim aconteceu nas colheitas seguintes, 2004 e 2005. Na vindima de 2006 surgiu o “irmão mais pequeno”, chamado Roquette & Cazes e, a partir daí, o conceito do Xisto cresceu em ambição, ficando definido que apenas seria engarrafado nas colheitas verdadeiramente extraordinárias. Assim, de então para cá, só houve Xisto em 2009, 2011, 2013, 2015 e, agora, 2018.
Ao longo destas quase duas décadas várias coisas foram, naturalmente, acontecendo. Desde logo, o alargamento da amizade e compromisso familiar à geração seguinte, corporizada por Tomás Roquette e Jean-Charles Cazes, que são hoje a face mais visível deste projecto; depois o estreitar da colaboração entre os enólogos das duas casas, Manuel Lobo e Daniel Llose, que se juntam em animados debates nas vinhas, adega, sala de barricas e sala de provas da Quinta do Crasto, onde os vinhos da parceria Roquette & Cazes são vinificados; finalmente, ocorreram alterações na origem das uvas, com as primeiras colheitas de Xisto a virem de vinhas arrendadas especificamente para este propósito, no Cima Corgo, passando ao longo da década de 2010 a incorporar, em cada vez maior grau, as uvas produzidas nas novas quintas do Douro Superior adquiridas pelas famílias Roquette (Quinta da Cabreira) e Cazes (Quinta do Meco).
Base Douro Superior
As duas quintas são vizinhas, situadas ambas no concelho de Vila Nova de Foz Côa. As parcelas que deram origem à Quinta da Cabreira começaram a ser adquiridas em 2000, com a plantação de novas vinhas entre 2004 e 2009. São 140 hectares de terreno, onde hoje estão 114 hectares de vinhedos, maioritariamente expostos a norte e em cotas que vão dos 115 aos 430 metros de altitude. Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz, as castas base do projecto Roquette & Cazes, são das variedades com maior implantação, entre muitas outras brancas e tintas.
O entusiasmo de Jean-Michel Cazes pelo Douro levou-o, nos anos de 2006 e 2007, e com o apoio “logístico” da família Roquette, a comprar no mesmo local diversas parcelas contíguas. Um longo processo de aquisições, a doze proprietários diferentes, resultou no que é hoje a Quinta do Meco, composta por 42 hectares de terreno e 25 hectares de vinhas plantadas a partir de 2010, com exposição nascente e norte. Tal como na Cabreira, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz são as variedades dominantes.
Assim, o novo Roquette & Cazes tinto de 2019, é elaborado quase todo a partir de uvas do Douro Superior, sobretudo da Quinta do Meco, mas também da Cabreira. 60% é Touriga Nacional, com 25 de Touriga Franca e 15 de Tinta Roriz. Fermentadas em cubas inox troncocónicas, o vinho que originam é depois estagiado 18 meses em barricas de carvalho francês, 65% das quais novas.
O Xisto 2018 usa as mesmas castas, mas oriundas de vinhas mais velhas, conjugando uvas do Cima Corgo (das vinhas arrendadas) e do Douro Superior. Fermentado no mesmo tipo de cubas, tem um estágio mais longo em barrica (20 meses) e maior percentagem (90%) de barricas novas. O processo de vinificação destes vinhos é, claramente, de “escola bordalesa”, com contacto bastante prolongado com as películas (25 a 28 dias) e extrações muito suaves. Consequência prática deste modelo assente em longas macerações, enquanto uma cuba de Crasto faz três fermentações durante uma vindima, a mesma cuba de Xisto faz apenas uma. O estágio prolongado em barrica é parte da identidade destes vinhos (o mesmo se passa com os Crasto, aliás) o que leva a que o parque de barricas ao cuidado de Manuel Lobo seja imenso: cerca de 3000 vasilhas, das quais 900 pertencentes à Roquette & Cazes. Uma (boa?) dor de cabeça para Tomás Roquette que vai muito em breve investir novamente na ampliação da vinificação e armazenagem.
No que respeita à empresa Roquette & Cazes, o projecto tem vindo a crescer de forma contínua e bastante sustentada. 2021 foi o melhor ano de sempre em vendas (estão em 42 países) e enchem cerca de 80 mil garrafas/ano, 7 mil de Xisto e 73 mil de Roquette & Cazes. Dado o preço médio elevado, é negócio bem interessante. Os dois vinhos agora colocados no mercado vão certamente contribuir para potenciar ainda mais a imagem da marca, em particular no mercado nacional, onde ainda não terá atingido o índice de notoriedade que a qualidade do produto justifica. Roquette & Cazes 2019 e Xisto 2018 são grandíssimos tintos do Douro e, seguramente, este último, vai posicionar-se entre os melhores vinhos portugueses do ano.
(Artigo publicado na edição de Abril de 2022)
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Esteban & Tavares: Quando dois mundos colidem

Não é ponto-cruz, não é macramé… é Tricot e Crochet. Dois vinhos que são produto da amizade, mas sobretudo criação de duas das enólogas mais talentosas de Portugal, Sandra Tavares e Susana Esteban. Agora nas colheitas 2017 e 2019, respectivamente. Texto: Mariana Lopes Fotos: Esteban e Tavares Vinhos Sandra Tavares nasceu nos Açores e cresceu […]
Não é ponto-cruz, não é macramé… é Tricot e Crochet. Dois vinhos que são produto da amizade, mas sobretudo criação de duas das enólogas mais talentosas de Portugal, Sandra Tavares e Susana Esteban. Agora nas colheitas 2017 e 2019, respectivamente.
Texto: Mariana Lopes
Fotos: Esteban e Tavares Vinhos
Sandra Tavares nasceu nos Açores e cresceu na região de Lisboa, e Susana Esteban nasceu em Tui, Espanha, mas, em 1999, o destino ditou que se encontrassem no Douro, altura em que eram duas das raras mulheres a fazer vinho nesta região, ambas integrando a equipa de enologia de projectos de renome: Sandra na Quinta Vale D. Maria e Susana na Quinta do Côtto e, posteriormente, na Quinta do Crasto. Hoje, além de enólogas consultoras noutras empresas, têm as suas próprias, a primeira com a casa de família em Alenquer, Quinta de Chocapalha, e com a Wine&Soul, em Vale de Mendiz, no Douro (ao lado de Jorge Serôdio Borges); e a última com o projecto homónimo em Portalegre, na Serra de São Mamede. Pelos anos de vivências em conjunto, floresceu a amizade, e dela a ideia de criar um projecto comum. Assim, em 2011, nasce a Esteban e Tavares com um tinto do Douro, o Crochet, o primeiro a materializar o conceito da dupla: transmitir o terroir ao máximo, fazer um vinho que, quando provado, se revelasse inequivocamente “Douro”, neste caso de vinhas junto ao rio Torto. A imagem do Crochet, desenvolvida em conjunto com Rita Rivotti, foi inspirada, segundo as próprias, “num universo muito feminino onde, naturalmente, duas mulheres se juntam para fazer… Crochet!”. E foi três anos depois, em 2014, que esta visão se estendeu a mais um tinto, o Tricot, desta feita com origem no Alentejo, em Portalegre, também com o objectivo de comunicar esta sub-região através de uma garrafa de vinho.
Já com várias edições de cada, o Crochet e o Tricot entram agora no mercado nas colheitas de 2019 e 2017, respectivamente, e o lançamento à imprensa foi feito com uma prova vertical de cada um, onde foi claramente possível perceber a consistência de perfil dos vinhos, todos com carácter muito vincado. Começou-se pelo Tricot, cujo 2014 se mostrou ainda bem jovem, muito fresco na fruta silvestre, com pimenta branca, vegetal delicado e um lado balsâmico. Super tenso, elegante e poderoso em simultâneo. Já o 2015 apresentou-se mais mentolado, perfil de bosque, pureza e frescura na fruta. Bem intenso, suculento e estruturado. O 2016 surgiu sedutor no nariz profundo, com muita especiaria, agulha de pinheiro, contido mas puro na fruta, com uma tensão gigante. O primeiro Crochet da prova foi o 2012, cheio de fruta e de sabor, também esteva, com um lado lácteo muito atractivo. O 2015 revelou o mesmo perfil lácteo, tanto no nariz como na boca, fruta bastante suculenta, envolvente, e com imensa presença de boca. Na mesma linha mas mais balsâmico e com levíssimo floral e fruta pura no nariz, o 2017 apareceu super elegante na boca e com muita frescura e intensidade de conjunto.
O Tricot 2017 — que originou 2900 garrafas de 75cl — tem, tal como as colheitas anteriores, 50% de vinha velha da Serra de São Mamede, com castas tradicionais, e 50% de Touriga Nacional. Fez maceração pós-fermentativa em inox e o estágio foi de 18 meses em barricas de carvalho francês, 30% novas e as restantes usadas. Já o Crochet 2019 — com 3360 garrafas 75cl e 300 magnum — tem no lote 50% de Touriga Nacional, 40% de Touriga Francesa e vinhas velhas. Também fez maceração pós-fermentativa, durante quatro semanas, e estagiou em barricas de carvalho francês, 20% novas e 80% de segundo e terceiro ano, durante 18 meses.
(Artigo publicado na Edição de Abril de 2022)
Alfrocheiro, a casta mistério

Não se conhece o pai, mas filhos não lhe faltam A casta que alegra os vinhos do Dão e dá brilho aos do Alentejo é hoje uma referência dos vinhos portugueses. E com muito futuro pela frente. Texto: João Paulo Martins Fotos: DR Ao lermos hoje os contra-rótulos das garrafas de tintos da região do […]
Não se conhece o pai, mas filhos não lhe faltam A casta que alegra os vinhos do Dão e dá brilho aos do Alentejo é hoje uma referência dos vinhos portugueses. E com muito futuro pela frente.
Texto: João Paulo Martins
Fotos: DR
Ao lermos hoje os contra-rótulos das garrafas de tintos da região do Dão deparamo-nos com a quase omnipresença de quatro castas tintas: a Jaen, a Touriga Nacional, a Tinta Roriz e a Alfrocheiro. Deste quarteto, há três que são muito tradicionais na região e depois há a Tinta Roriz, introduzida, sobretudo, a partir dos anos 90 do século passado. Sobre a Roriz não é agora o momento de falar dela, mas registe-se que gera tantos ódios como aplausos. Este quarteto acabou por vir a destronar algumas castas que tinham tradição na região mas que os novos ventos levaram da boca do palco para o segundo balcão. É o caso da Tinta Pinheira, também conhecida por Rufete na Beira Interior e que foi em tempos casta muito importante no Dão. Bento Carvalho, no seu Guia dos Vinhos Portugueses, 1982, Ed. Presença, nem sequer elenca a Alfrocheiro nas castas da região. Ali, as chamadas “castas tradicionais regionais” incluíam Tourigo, Tinta Pinheira, Tinta Carvalha, Baga de Louro, Alvarelhão e Bastardo. E, apenas por curiosidade, nos brancos (e no mesmo livro) a Encruzado nem é referida, mas sim Dona Branca, Arinto, Barcelo, Fernão Pires e Cerceal. Mudam-se os tempos…
Na Enciclopédia dos Vinhos Portugueses (Ed. Chaves Ferreira) e no volume dedicado ao Dão, o autor, Virgílio Loureiro, já tem outra atitude em relação à casta Alfrocheiro, reconhecendo que não é casta muito antiga na região e que terá sido introduzida nas replantações pós-filoxera. Pelo destaque que lhe dá percebemos que se tornou uma variedade muito acarinhada e de grande importância nas novas plantações que o Dão conheceu a partir dos anos 90 quando despertaram um conjunto de produtores-engarrafadores que puseram a Alfrocheiro no mapa regional. Falamos da Quinta dos Roques, Carvalhais, Pellada, Casa de Santar, entre outros que surgiram então na região. Não foram, assim, precisos muito anos para que esta variedade passasse a integrar o quarteto-maravilha dos encepamentos do Dão. Tudo isso sem prejuízo de continuarem a ser muito plantadas a Jaen, a Baga e também, ainda que em muito menor proporção, a Tinto Cão e mesmo a Alvarelhão, casta que conhece actualmente algum impulso, em virtude de vivermos numa época em que os vinhos mais abertos de cor voltaram a ter mais aceitação junto dos consumidores.
Do Dão ao Alentejo
Esta variedade encontra-se disseminada em várias regiões portuguesas, mas é sobretudo no Dão e no Alentejo que se encontram as maiores concentrações. No Douro é praticamente ignorada e alguns enólogos desconhecem-na totalmente. Recordo-me de uma conversa que tive com Charles Symington a propósito da casta. Ele só a conheceu quando a empresa Symington adquiriu a propriedade em Portalegre e recordo-me o entusiasmo que mostrou pelas qualidades que a Alfrocheiro apresentava naquela zona alentejana; para ele uma total surpresa. Também Paulo Laureano a usa na Vidigueira e lhe reconhece os méritos: “é exigente no solo (melhor no xisto negro) e requer equilíbrio na produção porque pode ter tendência a ser muito produtiva originando vinhos descorados; requer vindima rápida porque tem uma janela de 3 ou 4 dias para ser apanhada no ponto óptimo; gera vinhos elegantes, com foco em fruta azul de qualidade, de excelente acidez e que pode funcionar muito bem em lote”, destacando Laureano a ligação com a Trincadeira, Aragonez e Alicante Bouschet. Também Luis Cabral de Almeida, enólogo na Herdade do Peso (Sogrape) lhe nota as virtudes: “já tivemos um varietal de Alfrocheiro mas agora não temos (mas vamos voltar a plantar); é muito exigente na viticultura porque pode apodrecer com facilidade mas gera vinhos com uma fruta muito elegante que até pode lembrar a Pinot Noir”. Curiosamente esta característica tornou-se muito evidente no vinho da Quinta da Pellada que provámos.

Já no Dão, há muito anos que ela é trabalhada por Manuel Vieira, em tempos na Quinta dos Carvalhais e actualmente na empresa Caminhos Cruzados. Sobre a casta disse-nos, que “na vinha exige muitos cuidados: é atreita à podridão pelo formato fechado do cacho que incha com a chuva e rebenta. É preciso muito controle na produção porque tende a produzir mais do que é possível para se fazer um bom vinho. Por isso, é preciso bom trabalho na condução da cepa e na monda precoce que deixe os cachos bem arejados evitando o encavalitamento”. E na adega, gosta muito da acidez da Alfrocheiro, “é muito viva e dá alegria ao lote. É uma casta que precisa de algum tempo, os aromas não se mostram logo, é ao fim de um ano que eles se tornam mais evidentes”, refere.
A casta tem sido objecto de estudo no âmbito da PORVID que mantém um campo de clones em Pegões. António Graça, investigador da vinha e uma das caras daquela associação, confessou-nos que “é uma casta com pouca diversidade, o que indicia uma origem recente em termos evolucionários (mesmo assim podemos estar a falar de vários séculos) e ADN de tipo ibérico (clorotipo A). Sabemos que um dos progenitores é o Savagnin Blanc, o outro é ainda desconhecido (podem já não existir exemplares). Mas também sabemos que é um Don Juan das vinhas, tendo profusa descendência de ambos os lados da fronteira: em Portugal, Camarate Tinto, Carrega Tinto, Casculho, Castelão, Casteloa, Castelã, Concieira, Cornifesto, Douradinha, Jampal, Malvarisco, Malvasia Fina, Malvasia Preta, Moreto, Parreira Matias e Trincadeira das Pratas. E em Espanha (onde é conhecido pelo sinónimo Bruñal): Allaren, Mencia e Mouratón”. A PORVID tem conservados 237 genótipos (conjunto da informação genética de uma planta ou clone) da casta. Segundo dados que a PORVID conseguiu apurar, em 2019 existiam cerca de 1 200 hectares plantados com esta casta.
Na prova que fizemos foi notório que o Dão é a zona onde mais varietais de Alfrocheiro existem; em tempos também houve em Lisboa e, no Tejo, a Quinta da Lagoalva produz igualmente vinhos de referência desta casta.
Na nossa prova, foi evidente que há alguns traços comuns, em todas as regiões: os vinhos são elegantes e estão, também por isso, em linha com a actual moda de tintos menos concentrados, mais finos e muito mais gastronómicos. Têm, como se pode ver, um preço médio que se pode considerar muito convidativo. E são belíssimos representantes dos tintos onde o diálogo fruta/barrica/extracção/taninos parece estar mais bem conseguido.
Não posso deixar de referir a pequena estória que era a imagem de marca de um escritor de vinhos que, infelizmente, nos deixou há alguns anos – Matos Cristóvão. Dizia ele que numa situação de aproximação tentadora a uma mulher “com Alfrocheiro é tiro e queda!” Quem somos nós para duvidar…
(Artigo publicado na edição de Abril de 2022)
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Casa da Passarella Enxertia
Tinto - 2017 -

Terra d’Alter Alf
Tinto - 2021 -

Guadelim
Tinto - 2014 -

Adega de Penalva
Tinto - 2017 -

Quinta dos Termos Vinha das Colmeias
Tinto - 2018 -

Quinta do Perdigão
Tinto - 2013 -

Quinta de Lemos
Tinto - 2013 -

M.O.B.
Tinto - 2018 -

Madre de Água
Tinto - 2019 -

Caminhos Cruzados
Tinto - 2016 -

Taboadella
Tinto - 2019 -

Quinta da Pellada
Tinto - 2019 -

Quinta das Marias
Tinto - 2019 -

Quinta dos Carvalhais Parcela 45
Tinto - 2017
O Alentejo de Manuel Lobo

Conhecido, sobretudo, pelo talento que empresta como enólogo aos grandes vinhos que faz no Douro e no Tejo, Manuel Lobo assume-se agora, também, enquanto produtor no Alentejo, liderando a casa de sua família, Lobo de Vasconcellos. Texto: Luís Lopes Fotos: Lobo de Vasconcellos e Luís Lopes A família de Manuel Lobo de Vasconcelos possui propriedades […]
Conhecido, sobretudo, pelo talento que empresta como enólogo aos grandes vinhos que faz no Douro e no Tejo, Manuel Lobo assume-se agora, também, enquanto produtor no Alentejo, liderando a casa de sua família, Lobo de Vasconcellos.
Texto: Luís Lopes
Fotos: Lobo de Vasconcellos e Luís Lopes
A família de Manuel Lobo de Vasconcelos possui propriedades no Tejo e no Alentejo desde há várias gerações. A vocação vitivinícola familiar vem, na verdade, desde o séc. XVIII, com maior expressão no século XIX, quando da construção da adega da Quinta do Casal Branco, em Almeirim. A chegada ao Alentejo aconteceu mais tarde: foi em 1968 que o avô de Manuel Lobo, adquiriu a Herdade da Perescuma, com 543 hectares, na Vendinha. No início dos anos 80, coube ao pai de Manuel, Francisco de seu nome, adquirir para a família a Herdade do Zambujal do Conde, perto de Évora, com 512 hectares. Cereal de sequeiro, pecuária, floresta, caça, foram as principais actividades agrícolas destas duas herdades ao longo de várias décadas. Tal como muitas outras, também estas terras foram ocupadas na sequência da revolução de 1974, tendo a última parcela sido devolvida apenas em 2014. Em 2020, fizeram-se partilhas dentro da família, tendo o tio de Manuel Lobo, José Lobo de Vasconcelos, ficado com a Quinta do Casal Branco, da qual é, desde há muitos anos, o administrador. Ao seu irmão Francisco coube o património alentejano.
Manuel Lobo tem na Herdade da Perescuma muitas das suas memórias de infância, ali passando largas temporadas em família. “Foi aqui, nas estradas de terra batida e sem trânsito, que aos 12 anos aprendi a guiar um carro”, confessa. A paixão pela agricultura ali nasceu também, mas, ao contrário das três gerações que o antecederam, não seguiu a carreira de agrónomo, optando pela enologia, concluindo o curso da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro em 1999. O gosto pela vinha e pelo vinho fê-lo plantar as primeiras videiras em Perescuma ainda durante a sua formação na UTAD. A adega foi construída em 2006, aproveitando alguns financiamentos da União Europeia. No entanto, apesar de terem, na sequência lançado o tinto Perescuma, nunca se apostou muito na marca, rentabilizando a adega através do aluguer a algumas das maiores casas do Alentejo. Hoje, para fora, fazem apenas prestação de serviços. Paralelamente, um contrato com um gigante espanhol da olivicultura ocupa parte da propriedade com olival intensivo.
As partilhas efectuadas em 2020, com a separação patrimonial entre o Casal Branco e as propriedades alentejanas, foram o “click” para o arranque de um novo ciclo vitivinícola nas Herdades da Perescuma e Zambujal do Conde, hoje reunidas debaixo da mesma empresa e assinatura: Lobo de Vasconcellos Wines.
A profunda e enriquecedora experiência de vinha, adega e negócio de vinho alcançada por Manuel Lobo ao longo da sua vida profissional, sobretudo na Quinta do Casal Branco e na Quinta do Crasto (casas onde se mantém como responsável de enologia) foi determinante para o levar a assumir este desafio de criar de raiz uma nova marca no Alentejo, espelhada, num primeiro momento, nas iniciais que representam o nome de família, LV.
Entretanto, foi necessário mexer nos vinhedos. A fase vitícola inicial da Perescuma assenta em plantações de 1995 e 2000, feitas, parte, sob orientação da ATEVA e outra parte sob nfluência dos estágios de Manuel Lobo em Austrália e Bordéus, reflectindo assim a sua cultura vínica. Dessas primeiras plantações, desapareceram, entretanto, o Castelão, e também, Trincadeira, Aragonez e Bastardo, estas últimas “com muita pena, pois a culpa não era das castas, estavam em terrenos inadequados”, diz Manuel Lobo. Mantiveram-se, porém, as parcelas de Alicante Bouschet, Cabernet Sauvignon (plantado com varas de Pauillac), Syrah (da Côte du Rhone) e Touriga Nacional (da quinta do Vale Meão). As plantações mais recentes em produção são de de 2018, e incluem Touriga Franca, Touriga Nacional e Sousão. Em 2021, foram plantados mais 10 hectares, incluindo agora castas brancas, com Touriga Nacional, Verdelho, Sauvignon Blanc e Viosinho. Na Perescuma encontramos hoje 38 hectares, aos quais se somam os 8 hectares de Zambujal do Conde, plantados em 2006 com as variedades Alicante Bouschet, Petit Verdot, Cabernet Sauvignon, Touriga Nacional, Syrah e Verdelho. No total, são 46 hectares de vinha (85% de uvas tintas), prevendo-se neste ano de 2022 a plantação de mais 23 hectares, recuperando aí as variedades tradicionais entretanto desaparecidas da herdade, nomeadamente Trincadeira e Aragonez. Enquanto as novas vinhas não estiverem a produzir, a empresa arrenda e trabalha alguns vinhedos próximos, com uvas de castas que necessitam, como é o caso da Arinto.
Ambas as propriedades estão inseridas na DOC Alentejo-Évora e, como é habitual na região, espelham uma grande heterogeneidade de solos, com diversos perfis de argilas, areias e calcários. As vinhas são tratadas em modo “eco friendly”, recorrendo à produção integrada, com o mínimo de recurso a herbicidas, e respeitando a biodiversidade, com incremento da flora natural e disponibilidade de abrigos e alimento à fauna local.

Na Lobo de Vasconcellos, o trabalho de Manuel Lobo apoia-se numa equipa de profissionais experientes e motivados, com destaque para a enóloga Joana Lopes (que com ele trabalha também em Casal Branco) e Diogo Grilo, como enólogo residente.
Para já, a marca Perescuma ficou “congelada”, e foram colocadas no mercado em junho de 2021 quatro referências LV, dois brancos e dois tintos, Colheita e Reserva, num total de cerca de 40 mil garrafas. A casa transforma toda a sua produção de uva em vinho, mas apenas uma parte fica para as marcas LV, sendo o restante vendido a granel. Ainda assim, o volume de engarrafamento tem vindo a aumentar, acompanhando o crescimento das vendas, andando agora pelas 60 mil garrafas.

Em termos de volume, o objectivo de Manuel Lobo passa por engarrafar com a sua marca todo o vinho que produz. No que ao perfil dos vinhos respeita, quer diferenciar e expressar os diferentes terroirs que ali encontra e potenciar as características que mais o entusiasmam nos vinhos na casa, em particular a acidez natural e a mineralidade. “Não me preocupo muito com a fruta”, diz, “quero vinhos sérios, frescos, que possam crescer na garrafa”. Mas quatro referências chegam para mostrar tudo isso? Manuel admite que tem alguns trunfos na manga. “Queremos ir mais além, claro. Para já, precisámos evidenciar algum volume e consistência com estes LV Colheita e Reserva. É uma marca nova, que necessita ser implementada, solidificando o nome e o posicionamento. Mas já temos na adega algumas novidades e vinhos ainda mais ambiciosos. Aliás, para nós, a vindima de 2021 foi extraordinária, trouxe muitas coisas que vão dar que falar”. Fica a promessa.
(Artigo publicado na Edição de Março de 2022)
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Foz Côa debate alterações climáticas no Douro Superior

Os desafios das alterações climáticas para viticultura No âmbito das actividades que integram o Festival do Vinho do Douro Superior (FVDS), decorrerá no dia 28, Sábado, pelas 10.00 horas no auditório da ExpoCôa um Colóquio-Debate com um tema que pensamos ser do interesse de todos os viticultores e produtores do Douro Superior: «As Alterações Climáticas […]
Os desafios das alterações climáticas para viticultura
No âmbito das actividades que integram o Festival do Vinho do Douro Superior (FVDS), decorrerá no dia 28, Sábado, pelas 10.00 horas no auditório da ExpoCôa um Colóquio-Debate com um tema que pensamos ser do interesse de todos os viticultores e produtores do Douro Superior:
«As Alterações Climáticas e os «Desafios para a Vitivinicultura do Douro Superior»
Com a participação de dois reputados técnicos da ADVID (Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense) , propomos-mos aqui debater os problemas que as alterações climáticas levantam numa sub-região fustigada por secas crónicas e aumento das temperaturas, com consequências importantes na produção de uvas e na qualidade dos vinhos. Como ponto de partida para o debate, são apresentadas duas comunicações de grande qualidade.
«Medidas de Adaptação da Viticultura Duriense às Alterações Climáticas», por Luis Marcos, Eng. Agrónomo pela UTAD e Director dos Serviços Técnicos da ADVID
Atendendo ao histórico do clima, ao adicionarmos as projeções para o clima futuro, com um agravamento generalizado destas condições, o desenvolvimento de trabalhos no âmbito das medidas de adaptação reveste-se da máxima importância, possibilitando uma mais eficiente adequação das condições de crescimento das plantas e de otimização da produção e da qualidade das uvas.
A apresentação versará em duas componentes: a) análise das condições climáticas da Região Demarcada do Douro e perspectivas do clima futuro com base na informação de modelos de projecções de alterações climáticas e os potenciais impactos decorrentes desse agravamento de condições; b) discussão de um conjunto de estratégias/medidas de adaptação que permitam reduzir esses mesmos potenciais efeitos negativos, para que o sector vitivinícola esteja precoce e celeremente adaptado para fazer face aos desafios das Alterações Climáticas.
«Sistemas de suporte à decisão: Ferramentas de adaptação do Douro Superior às alterações climáticas?» por Leonor Pereira, Doutorada em Genética Molecular Comparativa e Tecnológica pela UTAD, Mestre em Genética Molecular pela UM e Licenciada em Engenharia Biotecnológica pelo IPB. colaboradora do CoLAB Vines&Wines, ADVID, sendo responsável pela área de mecanização, sensorização, automação e digitalização.
A viticultura enfrenta actualmente uma série de desafios, entre os quais podemos apontar a necessidade de soluções tecnológicas e mecanizadas, a carência de mão de obra, a instabilidade Global, e o cenário de alterações climáticas que estamos a vivenciar neste momento, sendo que este último aspecto assume particular relevância na região do Douro Superior. Nesse sentido, as ferramentas de suporte à decisão têm grande relevância, tendo sido nos últimos anos apontadas como uma solução transversal a muitas das dificuldades enfrentadas pelo sector vitivinícola. Será discutida a importância deste tipo de ferramentas, com base na apresentação de casos concretos.
A participação neste Colóquio -Debate é livre para todas os produtores participantes no FVDS mas obriga a inscrição prévia.
Inscreva-se e garanta desde já o seu lugar neste importante e útil Colóquio-Debate.
(lugares limitados à lotação da sala)
Email para inscrição: geral@grandesescolhas.com
Adega de Redondo: Nova imagem, vinhos surpreendentes

Em Portugal muitos conhecem a marca icónica Porta da Ravessa, mas talvez nem todos saibam que o vinho é produzido pela Adega de Redondo, pois a fama desta brand ultrapassou o seu criador. Sofreu uma transformação recentemente e agora apresenta uma nova imagem aliada a significativo acréscimo qualitativo. Texto: Valéria Zeferino Fotos: Adega Coop. de […]
Em Portugal muitos conhecem a marca icónica Porta da Ravessa, mas talvez nem todos saibam que o vinho é produzido pela Adega de Redondo, pois a fama desta brand ultrapassou o seu criador. Sofreu uma transformação recentemente e agora apresenta uma nova imagem aliada a significativo acréscimo qualitativo.
Texto: Valéria Zeferino
Fotos: Adega Coop. de Redondo
O moderno conceito de storytelling obriga hoje em dia muitos produtores a inventar histórias à volta das suas marcas para comunicar ao consumidor. Mas há empresas que não precisam de inventar nada, pois a história da sua marca é bem real e antiga. É o caso da icónica Porta da Ravessa responsável por cerca de 50% da faturação da empresa. Aliás, é um verdadeiro case study em como a popularidade da marca tornou célebre o lugar histórico em que foi inspirada. Mas vamos por partes.
A marca Porta da Ravessa surgiu na década de 90 do século passado, a seguir à Real Lavrador, lançada pela Adega de Redondo em 1985. Na altura foi uma inovação em relação à prática de colocar nos rótulos simplesmente o nome do produtor e da origem. A primeira marca homenageava o Rei D. Dinis, “O Lavrador”, figura incontornável na história de Portugal e particularmente de Redondo, concedendo à vila a carta de foral em 1318. Hoje a marca Real Lavrador já não tem conotação com realeza, mas com os verdadeiros lavradores, sendo a imagem do rei substituída pelas pegadas de botas, deixadas na terra.
A história da Porta da Ravessa está ligada ao Castelo de Redondo de traços góticos no centro da Vila. O acesso ao interior do recinto faz-se por duas portas, reforçadas por duas torres de cada lado: a Porta do Postigo virada a poente, por onde sai o caminho em direcção a Évora, e a Porta da Ravessa virada a nascente que dava acesso à feira da povoação. Em cima da porta fica o brasão das armas de Portugal e na pilastra que sustenta o arco do lado direito encontra-se gravado o padrão das medidas lineares utilizadas no Portugal medieval para comercializar tecidos: a vara, correspondente a cinco palmos (110 cm) e o côvado correspondente a três palmos (66 cm). Estas marcas do século XIV são bem visíveis ainda hoje.
No final dos anos 90 houve um grande investimento em comunicação e marketing incluindo anúncios na rádio e TV, patrocínio dos jogos de futebol e desportos motorizados (com Pedro Lamy nas competições de Fórmula 1 e Carlos Sousa no Paris Dakar). A adega tinha uma equipa de ciclismo profissional que em 2000 ganhou a Volta a Portugal com Vitor Gamito. Esta estratégia deu os seus resultados e em 2004 a Porta da Ravessa era uma super brand não só no Alentejo, mas em Portugal inteiro e claramente contribuiu para a popularidade dos vinhos do Alentejo no mercado interno. Os turistas, ao visitar o Castelo de Redondo, impreterivelmente procuram a tal Porta da Ravessa retratada no rótulo.
Na altura de 2010/2011 a Adega de Redondo passou por um período difícil e teve que fazer um saneamento financeiro e rever a sua estrutura de custos. Todo o reconhecimento que a marca ganhou, conseguiu-se manter ao longo dos anos, graças à excelente relação qualidade/preço. Ainda há 3 anos de acordo como índice Nielsen, a Porta da Ravessa era a terceira marca mais vendida em volume e quinta em valor.
No ano passado, no meio de pandemia, decorreu silenciosamente uma grande renovação da imagem de todas as marcas e da própria adega. A imagem da Porta da Ravessa no rótulo ficou mais estilizada com traço moderno, destacando os elementos gráficos do brasão das armas em cima e da vara e côvado. A nova apresentação visa ser apelativa na conquista do consumidor mais jovem.
Equipa jovem e dinâmica
A Adega de Redondo é o maior empregador privado do concelho e conta com 57 funcionários, entre os mais antigos, como o adegueiro que trabalha lá há 40 anos e dizem a brincar que “está casado com a adega”, e mais recentes, jovens e dinâmicos, competentes e dedicados como o Director Geral Nuno Pinheiro de Almeida e o Director Comercial Bernardo Malhador.
A enóloga Mariana Cavaca é responsável de produção. Ao finalizar o Mestrado em Enologia e Viticultura no ISA, estagiou na Quinta do Crasto e reconhece Manuel Lobo como o seu primeiro orientador na profissão escolhida. Depois trabalhou na Solar dos Lobos e Tiago Cabaço Winery. Em 2016 ingressou na Adega de Redondo, no início a trabalhar com Pedro Hipólito, que também considera seu mentor. Desde 2021 assumiu a responsabilidade como Directora de Enologia.
O trabalho de Mariana não tem nada a ver com glamour de estar numa propriedade com um nome sonante. Na altura de vindima, entram 600 toneladas de uva por dia! A produção de vinho em grande volume não deixa margem para passos arriscados, nem perdoa a falta de profissionalismo. A consistência é a palavra chave. Produzir cerca de 15 milhões de garrafas por ano, coerentes em diversas gamas, mantendo a consistência colheita após colheita, é obra. Juntemos aqui a dificuldade acrescida de trabalhar com duas centenas de sócios, sendo que para muitos deles a viticultura é uma actividade adicional. O que vale é que 40 sócios são responsáveis por 80% da produção (32 sócios têm mais de 20 ha cada). Estes já têm uma visão mais empresarial e noção que quanto melhor for a qualidade de uva que entregam, melhor será para a Adega e, consequentemente, para eles. A Adega de Redondo, por sua vez, tem uma atitude de acompanhamento e aconselhamento, não de imposição.

A equipa de viticultura levou a cabo o cadastro de vinhas e castas de todos os sócios, que é actualizado anualmente. Isto permite a gestão de perfis de vinhos, a consistência de qualidade e separação de uva logo na vindima por via de conhecimento sobre o potencial da matéria prima por parcela, por casta e por sócio.
Para assegurar a qualidade de colheita em cada ano, foi elaborado o Programa de Qualidade para vinhos tintos, brancos e rosés que estabelece requisitos de qualidade e os incentivos relacionados, que é actualizado todos os anos pela equipa de enologia e viticultura.
Por exemplo, de acordo com o Programa de Qualidade, as uvas deverão apresentar um bom estado sanitário e estar maduras, mas sem sobrematuração, ou seja as castas brancas têm de apresentar o álcool provável entre as 11 a as 12,5%, com excepção do Arinto que pode ser vindimado com 10,5% para contribuir com a sua acidez natural aos lotes; as referências para as castas tintas podem variar dos 13 às 15%. Privilegia-se a entrega por casta e não em conjunto, pois isto permite uma melhor gestão dos lotes na vinificação (a Tinta Caiada, por exemplo, está mesmo proibida de entrar misturada com outras castas). Se houver problemas fitossanitárias, a uva não vai para a produção de vinho, segue para destilação. Ao fazer lotes também é preciso paciência e concentração. Ensaiam primeiro tudo na sala de provas, pois “30-40 mil litros fazem diferença nos 4 milhões”, explica Mariana.
As instalações são bem equipadas e para além de cubas de cimento antigas de uma arquitectura bonita e pouco comum, dispõe de cubas de inox e 10 cubas com sistema Ganimede capazes de receber 120 toneladas de uva e que dão óptimos resultados – uma remontagem bem feita, extração de cor e parte aromática sem dilaceração de películas, fermentação rápida, grande poupança da energia, exigindo pouca mão-de-obra. Na unidade de acabamento de vinhos, brilha um filtro tangencial para uma filtração delicada e de baixo impacto ambiental. Também há uma sala de barricas para o estágio dos topos de gama da Adega.
Metodicamente investe-se na modernização. Os investimentos mais recentes incluem um novo armazem destinado a produto acabado, o que permite aumentar o tempo de estágio, e uma nova linha de engarrafamento com capacidade para 14 mil garrafas/hora.
É claro que há sempre mais algum “brinquedo” que Mariana gostava de ter na sua sala de vinificações para realizar novas ideias, porque há sempre espaço para introdução de melhorias nos processos enológicos. Contudo, está satisfeita com o seu trabalho. “Sinto-me orgulhosa a provar os vinhos da nossa adega” – diz a enóloga e tem toda a razão, pois as gamas são bem definidas, com consistentes patamares de qualidade dentro de diferentes referências (tem mais marcas para além da Porta da Ravessa e Real Lavrador). Alguns dos vinhos só têm um problema – são escandalosamente baratos. Por exemplo, se me dissessem que o Porta da Ravessa Reserva branco com PVP 6 euros, custava 10 ou 12 euros, não me sentiria defraudada pela qualidade que apresenta e prazer que proporciona. Infelizmente, a guerra de preços dos vinhos neste país, com a pressão dos hipermercados e a aplicação de “descontos” absurdos de 50-70%, deixa os produtores de mãos atados.
Com forte presença dos vinhos da Adega de Redondo no mercado nacional, a exportação corresponde apenas a 15-17% de produção. O mercado nº1 é o Brasil, e também há operações nos Estados Unidos, Rússia, Polónia e “mercado da saudade”. Curiosamente, é mais fácil vender os vinhos lá fora, nota Bernardo Malhador, porque não existe o “estigma” dos “vinhos de adegas cooperativas” e o consumidor não faz juízo de valor em relação ao produtor ser mais ou menos “nobre”: se gosta do vinho, compra-o.
(Artigo publicado na edição de Março de 2022)
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Editorial: Uma oportunidade para os rosés

LUÍS LOPES “Give peace a chance”, a famosa frase/canção de John Lennon é hoje, infelizmente, mais actual do que nunca. Mas permitam-me que a tome emprestada para evidenciar um tema muito menos sério: os vinhos rosados. Vinhos que, incensados em público, desvalorizados em privado, também precisam de uma oportunidade. Editorial da edição nº61 (Maio 2022) […]
LUÍS LOPES
“Give peace a chance”, a famosa frase/canção de John Lennon é hoje, infelizmente, mais actual do que nunca. Mas permitam-me que a tome emprestada para evidenciar um tema muito menos sério: os vinhos rosados. Vinhos que, incensados em público, desvalorizados em privado, também precisam de uma oportunidade.
Editorial da edição nº61 (Maio 2022)
O tema de capa desta edição da Grandes Escolhas é o vinho rosé. No caso, através de um trabalho de Nuno de Oliveira Garcia (NOG) que procura, com a apresentação e prova de 46 rosados, mostrar que esta categoria de vinhos pode, e deve, ser encarada pelo consumidor mais exigente com o mesmo respeito com que encara brancos e tintos. O que, convenhamos, não é tarefa fácil. Para tal, NOG propõe-se, através de bem fundamentada argumentação (ou não fosse o autor, na sua vida profissional, um dos mais ilustres advogados fiscalistas da nossa praça) desmontar os quatro “dogmas” ou, diria eu, preconceitos, que limitam a ascensão dos rosés ao mais elevado grau de respeitabilidade vínica: são feitos com menos cuidados; têm origem em uvas ou castas menos nobres; evoluem mal e mostram menor qualidade absoluta; são, sobretudo, vinhos baratos e bons para beber no Verão.
A argumentação e prova dão inteira razão ao NOG: produzimos neste momento em Portugal, numa grande diversidade de regiões, um conjunto de vinhos rosados capazes de ombrear com o que de melhor fazemos em brancos e tintos. Os rosés de superior ambição não existem em grande número, é certo, mas acredito que, ano após ano, serão cada vez mais.
A desvalorização do rosé não é, longe disso, um problema exclusivo do mercado português. Nunca mais me esqueço das palavras que ouvi, há quase duas décadas, de um famoso jornalista nórdico: “não há nada que um rosé faça que um branco ou um tinto não possam fazer melhor.” Confesso que, enquanto fervoroso consumidor de rosés, a frase me chocou de início. Mas depois, e ao longo de vários anos, dei-lhe razão. Dissecando o meu consumo de rosés, percebi que os encarava como um vinho de momentos. Bom para um aperitivo; bom para um salmão, uns enchidos, umas sardinhas; bom para relaxar numa tarde de Verão; bom para isto ou aquilo, bebido com frequência, mas nunca encarado como verdadeiramente “grande”. Que diabo, se os rosés fossem assim tão bons, porque é não representavam nem 2% da minha garrafeira?
O que é que mudou desde então, para hoje olhar para os rosés com outros olhos? Na verdade, quase tudo, a começar pelos vinhos em si. Primeiro, a qualidade média subiu muitíssimo, em todos os segmentos de preço. Depois, no patamar mais elevado do mercado, em preço e ambição, surgiram em Portugal rosés de grande categoria. Finalmente, diversos produtores começaram, eles próprios, a valorizar o que produziam, posicionando o seu rosé de topo, pelo menos, ao nível do seu branco de topo (os tintos continuam, regra geral, no cimo da pirâmide de marcas).
Na verdade, os rosés nacionais valem tudo isso. Por vezes, até valem mais do que isso. Sobretudo quando comparados com os sobrevalorizados Provence que, acreditem, na sua grande maioria, estão muito abaixo dos seus congéneres portugueses que custam menos de metade do preço.
O que falta, em resumo, para que o mercado, como um todo, valorize os rosés nas lojas, nos restaurantes, em nossas casas? Provavelmente, apenas tempo. Tempo para os rosés fazerem o seu percurso natural no comércio; tempo para os produtores testarem castas e clones na vinha e diferentes técnicas na adega; e, talvez mais importante do que tudo, tempo de estágio em casa dos apreciadores. Somente ultrapassando a prova do tempo, um vinho, branco, rosé ou tinto, pode denominar-se grande.
Vamos então dar uma oportunidade aos rosés? Não porque o Verão esteja a bater à porta. Apenas porque são muito bons.
Adega do Monte Branco: São os LouCas de Estremoz…

…Que não nos fazem duvidar, pelo contrário. Na Adega do Monte Branco fazem-se verdadeiros vinhos de Estremoz, e isso também pode significar vinhos como os LouCa: únicos, experimentais, com imensa personalidade e qualidade. Sai agora a terceira edição. Texto: Mariana Lopes Fotos: Adega do Monte Branco e Luís Lopes Luís (Lou)ro e Inês (Ca)pão são […]
…Que não nos fazem duvidar, pelo contrário. Na Adega do Monte Branco fazem-se verdadeiros vinhos de Estremoz, e isso também pode significar vinhos como os LouCa: únicos, experimentais, com imensa personalidade e qualidade. Sai agora a terceira edição.
Texto: Mariana Lopes
Fotos: Adega do Monte Branco e Luís Lopes
Luís (Lou)ro e Inês (Ca)pão são a dupla que faz nascer, na solarenga propriedade do Monte Branco, em Estremoz, os vinhos da marca que agrupa o sobrenome de ambos, os experimentais Lou e Ca, que são uma autêntica batalha amigável entre os dois enólogos: Louro faz o Lou e Capão faz o Ca, sempre na procura dos melhores vinhos possíveis de produzir com técnicas de vinificação “de boutique”, e com as castas que ambos consideram ter potencial nesse ano para originar um grande branco ou tinto.
Luís Louro, fundador (e proprietário) do projecto Adega do Monte Branco, desde 2004, quando tinha apenas 23 anos, escolheu a uva Arinto para criar o LOUca branco 2019, que originou 2200 garrafas, por acreditar que esta é a grande casta branca portuguesa. “Adapta-se com facilidade e produz grandes vinhos em todas as regiões de Portugal. O Alentejo não é excepção”, refere. Aqui, com “o objectivo de fazer um grande vinho branco, profundo, mineral e longevo”, Luís seleccionou as melhores uvas de duas parcelas distintas, uma em solo de xisto e outra em calcário. Metade do mosto, das primeiras prensas, fermentou em barricas novas de 500 litros sem clarificação, enquanto a outra parte fermentou, clarificado por sedimentação natural, em barricas usadas com a mesma dimensão. O estágio fez-se durante nove meses nas barricas.
Já o louCA branco 2019 (nesta edição os dois são brancos, mas não é obrigatório), surge quase como o conceito filosófico de Aristóteles da “tábua rasa”, teoria empirista segundo a qual o espírito, antes da experiência, não possui ideia alguma: “Com a plantação da nossa nova vinha de branco em 2017, cresceram as possibilidades para fazer várias experiências com castas sobre as quais não tinha conhecimento, e por isso quis fazer um novo vinho branco para o louCA 2019”, explica Inês Capão, que entrou na Adega do Monte Branco em 2008, depois de passar por outras empresas no Norte de Portugal. Assim, esta vinha plantada em 2017, em solo de transição com xisto e calcário, forneceu ao mais recente louCA as castas Rabigato (40%), Verdelho (30%) Arinto (15%) Galego Dourado e Esgana Cão. Com três experiências no mesmo vinho, parte dele foi feita com maceração pelicular, outra com prensa directa e clarificação, e o restante foi mosto de Arinto “mais verde e ácido”, segundo a enóloga, em curtimenta com massas maduras de Verdelho. Todas estas “experiências” fermentaram em barricas de carvalho francês usadas, com 600 litros de capacidade, e estagiaram durante nove meses. São 2500 garrafas.
A par do lançamento dos LouCa, estão agora no mercado o Alento Reserva branco 2020 e o Monte Branco tinto 2017. O primeiro é um lote de Arinto e Antão Vaz que fermenta e estagia em barricas usadas por seis meses, e o segundo, maioritariamente de Alicante Bouschet, com Aragonez, é vinificado em lagar e estagia entre 12 a 15 meses em barricas novas de 300 litros.

Um projecto em crescimento
Quando imaginou a Adega do Monte Branco, Luís Louro viu um projecto de “castas portuguesas, vinhos autênticos e respeito pela história e pela natureza”, como o próprio diz. Alentejano de nascença e criação, no mundo vínico desde os oito anos — quando o pai, Miguel Louro, se tornou produtor na Quinta do Mouro — escolheu Estremoz devido “ao seu microclima, aos solos de xisto e calcário e a uma certa altitude (cerca de 400m). É uma das regiões mais frescas do Alentejo, onde é possível fazer vinhos com grande equilíbrio, frescura, carácter e potencial de guarda”. Com esta premissa, Luís e Inês almejam mostrar que Estremoz tem uma enorme diversidade, onde é seguramente possível produzir excelentes vinhos tintos e brancos, assegurando uma produção sustentável. “No nosso perfil há cada vez mais uma influência do Alentejo dos anos 80/90, quando os vinhos eram frescos e longevos, mas sem a rusticidade que caracterizava a época”, desenvolve o proprietário.
Hoje a produzir entre 250 a 300 mil garrafas por ano, a Adega do Monte Branco foi crescendo gradualmente também em vinha própria, com um maior incremento nos últimos anos e uma clara aposta em sequeiro. Actualmente, a empresa de Luís Louro é proprietária de 30 hectares de vinha, e arrendatária de 18. Estes últimos, com o nome Vinha dos Cardeais, são ainda de onde provém a maior parte das uvas, uma plantação de 2001 em solo de xisto muito pobre e pedregoso, maioritariamente tinta, com Trincadeira, Aragonez, Alicante Bouschet, Syrah; e também Arinto, Verdelho e Antão Vaz.
Mantendo-se mais duas vinhas plantadas também em 2001, com uma parte mais velha de 1996 com mistura de quatro castas (3,2 hectares), em 2017 iniciaram-se novas plantações. Neste ano, por exemplo, surgiu a vinha que deu origem ao louCA 2019, junto à adega, quatro hectares com as brancas Esgana Cão, Arinto, Rabigato e Galego Dourado, e as tintas Alicante Bouschet, Tinta Miúda e Sousão. É neste momento a principal parcela de brancos, e só não é maior porque culmina numa zona de mármore à superfície, onde não foi possível plantar mais. Daqui vem também uma novidade absoluta ainda não lançada, que ainda precisa de mais tempo em garrafa, um branco chamado “Monte Branco Vinhas Novas”, nome “em protesto contra a ‘aldrabice’ dos supostos Vinhas Velhas que se vêm à venda”, contesta Luís Louro.
É também relevante a nova Vinha da Freira, de 2020, 12 hectares em xisto e calcário que incluem um campo de ensaios, numa zona argilosa onde, devido à erosão de uma serra próxima, o solo chega a ter 30 metros de profundidade e elevada capacidade de retenção de água. É onde foram plantadas várias castas antigas típicas alentejanas e de outras regiões. Assim, na Vinha da Freira existe Trincadeira (na zona mais alta, pobre e rochosa de xisto), Alicante Bouschet, Tinta Miúda, Moreto, Castelão, Tinta Carvalha, Marufo, Tinto Cão, Arinto e Roupeiro. Ainda de 2020, em solo calcário, de terra fértil e profunda, há a vinha da Courela Estreita, apenas um hectare com 32 castas misturadas, brancas e tintas.
Por agora, ficamos com os LouCa, com o Alento Reserva branco e com o Monte Branco tinto. Mas haverá mais novidades daqui a uns meses, além do Vinhas Novas e do Monte Branco branco. Varietalmente falando, digamos. Mas não foi de mim que “ouviram”.
(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2022)
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