QUINTA DA BADULA: Onde o tempo “manda” no vinho

QUINTA DA BADULA

Os antigos contam que, há 100 anos, a agora chamada Quinta da Badula, localizada em Arrouquelas, no concelho de Rio Maior, tinha vinha e ali se faziam grandes vinhos. Com a passagem do tempo e as demandas do Homem, aquela acabou por extinguir-se. Os octogenários António Filipe e José Diogo são os guardiões desta vetusta […]

Os antigos contam que, há 100 anos, a agora chamada Quinta da Badula, localizada em Arrouquelas, no concelho de Rio Maior, tinha vinha e ali se faziam grandes vinhos. Com a passagem do tempo e as demandas do Homem, aquela acabou por extinguir-se. Os octogenários António Filipe e José Diogo são os guardiões desta vetusta memória outrora partilhada com o amigo José Marques, o detentor desta propriedade vitivinícola inserida na região dos Vinhos do Tejo.
A designação advém do proprietário daquela época, conhecido pela alcunha de Badula. “Como queríamos um nome que fosse fácil de dizer em todas as línguas, porque, desde logo, apostamos na exportação, descobrimos que se trata de uma família de flores. Uma vez que não se via o laranja nos rótulos, e queríamos usar uma cor que chamasse a atenção por sermos novos no mercado, usamos a flor laranja, que é um hibisco, a imagem de marca, e fazer a analogia entre a badula e a espécie de flores”, explica a filha, Élia Marques Vitorino, responsável pelos departamentos administrativo e comercial da Quinta da Badula, negócio familiar, com origem em Rio Maior, no qual, cabem ainda a mulher, Lurdes Marques, e o genro, Emanuel Vitorino.

No início, eram tintos

Mas o que faz o proprietário de uma pequena fábrica de artefactos de cimento, situada em Rio Maior, no mundo do vinho? A pergunta é desmistificada de imediato por José Marques. A paixão pelo vinho foi o ponto de partida para muitas viagens pelo país, nomeadamente pelas regiões do Douro e do Alentejo, o que lhe permitiu reunir conhecimento acerca desta matéria. Tamanha curiosidade determinou ainda as múltiplas idas a Espanha e França, sempre com o objetivo de provar mais e mais vinho.
Destas rotas didáticas cá dentro e d’além fronteiras, resultou a compra gradual da atual propriedade em Arrouquelas, explorada, desde 1999, por José Marques, que ali tinha instalado uma central de lavagem de areia. Contudo, houve a necessidade de corrigir a orografia do terreno, para facilitar o trabalho de campo e, apesar do solo arenoso e consequentemente pobre, típico da zona da charneca da região do Tejo, decidiu avançar, em 2007, com a plantação de quatro variedades de uva tintas: Castelão, Touriga Nacional, Alicante Bouschet e Syrah. “As castas foram escolhidas por mim. Lia as revistas dos vinhos e via de onde saiam os grandes vinhos”, justifica o nosso anfitrião.

Mas quando, em 2009, a época da vindima estava quase à porta, não havia adega nem enólogo. Foi através de um amigo que conseguiu o contacto do enólogo António Ventura, que inicialmente, mostrou alguma relutância, mas quis conhecer o projeto in loco. “Quando passou aqui, provou as uvas e observou o terreno, que, apesar de pobre, denotava potencial para a colheita de matéria-prima de qualidade”, conta o proprietário da Quinta da Badula.
O Quinta da Badula Reserva tinto 2009, feito a partir de Touriga Nacional, Syrah e Alicante Bouschet, foi produzido em lagares, ainda em Rio Maior, e marcou a estreia no portefólio desta empresa familiar. Entra no mercado a 8 de março de 2012, ao mesmo tempo que é apresentado o Quinta da Badula Colheita Selecionada tinto 2010, elaborado com as castas Castelão, Touriga Nacional e Alicante Bouschet, na primeira adega, instalada no espaço agora ocupado pela oficina da propriedade. Conta Élia Marques Vitorino que este último é distinguido, em maio de 2012, com uma medalha de ouro no Concurso Mundial de Bruxelas. “Foi uma notícia inacreditável!” O prémio deu alento à família, para prosseguir com o projeto, à época, com cinco anos.
Em 2012, chegou a vez da seleção das castas brancas, lista preenchida por Arinto, Fernão Pires, Moscatel Graúdo, Alvarinho e Gouveio. Esta nova etapa da Quinta da Badula obrigou o proprietário a avançar para as provas de vinho branco, vinho que não apreciava por aí além… “Neste caso, a escolha foi do engenheiro António Ventura”, confessa José Marques. Dois anos mais tarde, deu-se início ao portefólio de vinhos brancos, com o Quinta da Badula Reserva, feito a partir das variedades Alvarinho e Arinto. Em 2015, ocorreu a estreia do Badula rosé, com Touriga Nacional e Syrah.

A Cabernet Sauvignon e a Chardonnay, respetivamente, tinta e branca, foram as eleitas da última plantação, em 2018. “Quando plantar mais vinha, irei plantar mais Castelão”, garante José Marques, que, ao longo destes 18 anos, contabilizados desde a plantação da vinha, tem vindo a absorver o saber-fazer com o mestre da enologia da casa. No entanto, é António Ventura quem determina o dia da vindima, com base nas análises feitas às uvas em laboratório e prova das uvas no terreno.
Hoje, a vinha ocupa uma área de 25 hectares, estendendo-se numa encosta suave e rodeada maioritariamente por floresta. A parte voltada a nascente ficou reservada às castas tintas, “porque os tintos precisam de mais grau e de mais estrutura”; as videiras das variedades de uva branca estão expostas a norte, uma vez que, segundo o nosso anfitrião, “os brancos não precisam de tanto grau”.

Entreajuda nas vindimas

José Marques marca presença assídua na vinha e faz questão de, entre outros trabalhos, coordenar e colaborar na monda, que entra em ação na fase do pintor. “Chego a tirar 20 cachos de cepa”, diz, e deixa apenas um quando se tratam das parcelas de uvas tintas com potencial para os vinhos Reserva e Grande Reserva.
A minúcia com que se dedica a esta atividade traduz-se numa ação morosa. Esta seleção tem como finalidade diminuir a produção de uva por hectare, para garantir a qualidade da matéria-prima. Caso contrário, “não temos grau, não temos estrutura, não temos nada”, elucida o proprietário da Quinta da Badula, dando como exemplo o comportamento da casta Castelão. Paralelamente, a fertilidade baixa causada pelo solo arenoso, permite, por si só, que esta variedade de uva produza em quantidades reduzidas.

A vinha, situada a cerca de 20 quilómetros do mar, em linha reta e desenhada com base no sistema de condução bilateral, tem cerca de 1,5 metros de altura. O excesso de folhagem é propositado, acima de tudo, no topo e no lado em que a exposição solar é direta. Serve para proteger os cachos, sobretudo à hora em que o termómetro mostra maior risco de calor.
“Gostamos de ver aqui os ninhos dos passarinhos, as lebres, os coelhos e as perdizes, e os meus netos andam por aqui sem qualquer perigo. Por isso, não usamos herbicidas”, assegura. Sem seguir os parâmetros da viticultura biológica, José Marques prefere optar por “produtos menos ofensivos”. É o caso da calda bordalesa e enxofre. “O enxofre é usado contra o oídio e a calda bordalesa é para o míldio”, descreve.

A humidade não é um problema, graças ao vento, que ajuda a secar as videiras, e a exposição favorável a norte. Mesmo assim, há a necessidade de recorrer ao sistema de rega gota a gota, suportada pela charca da propriedade, para manter a humidade do solo durante o verão. “Quando está muito sol, o sol incide nos seixos, vai espelhar e, consequentemente, queimar os cachos. Portanto, a água mantém a humidade, o que impede a acumulação de calor no solo. É dispendioso e dá trabalho, mas compensa na qualidade das uvas.”
Em contrapartida, as noites frescas permitem que os vinhos sejam mais frescos e tenham acidez, característica enaltecida por José Marques. “Foi por isso que escolhemos este terreno, para plantar vinha.” Além disso, são um bom pretexto para iniciar a vindima mais cedo, pelas seis da manhã, de modo a colher as uvas a baixa temperatura.

Uma parte da vindima é feita com o auxílio de uma máquina vinda de França. Os cachos destinados aos Grande Reserva e Reserva tinto, bem como para o Reserva branco e o espumante, são colhidos à mão, mas “como não conseguimos apanhar tudo de noite, colocamos em caixas, dentro do frio, e as uvas só são processadas quando estiverem mesmo frias. Se esmagarmos as uvas quentes, perdemos parte dos aromas que precisamos no vinho”, esclarece José Marques. “O nosso objetivo é produzir vinhos de grande qualidade. Para o efeito, temos de controlar as uvas”, acrescenta Élia Marques Vitorino.
Todos os anos, esta fase da cultura da vinha e do vinho é apoiada pela população de Arrouquelas, que faz questão de participar na colheita das uvas. Entre crianças, jovens e mais velhos, há um enorme espírito de entreajuda, e até há uma espécie de horta comunitária, com uma variedade considerável de hortícolas e fruta. E, claro, os amigos António Filipe e José Diogo não faltam!

QUINTA DA BADULA

 

José Marques mostra as madeiras de maior qualidade das tanoarias francesa Seguin Moreau e portuguesa J.M.Gonçalves

 

Tanoaria de topo

Sobre as duas últimas castas plantada na propriedade, aguarda-se a estreia do vinho, cujo lote incluirá a Cabernet Sauvignon, visto que os monovarietais não têm lugar cativo no portefólio da Quinta da Badula. “Talvez um dia…” Já a Chardonnay foi plantada com o pretexto de se fazer espumantes, cuja estreia aconteceu em 2020, com o Quinta da Badula Espumante Reserva Brut Nature. Esta primeira edição inclui 10% de Arinto, enquanto na segunda, de 2022, a percentagem desta casta branca subiu para os 20%. “Só fazemos espumante quando temos uvas de muita qualidade. É feito de uma forma muito especial, em que o cacho vai inteiro para a prensa pneumática, daí que tenha de estar em perfeitas condições”, afirma José Marques.

O proprietário da Quinta da Badula compara a produção do espumante, em que o dégorgement é feito por uma empresa externa, com o vinho maior do portefólio, o Quinta da Badula Grande Reserva tinto, com o registo de apenas três colheitas: 2014, 2015 e 2017. “Temos colheitas de 2017 a 2024. São vinhos de grande qualidade, alguns ainda estão em barrica, mas ainda não decidimos o que vai para Grande Reserva”, revela o nosso anfitrião, ou não fosse a enologia comandada pelo tempo. Some-se o contentor com aproximadamente 600 garrafas de Quinta da Badula Reserva 2016 colocado, em 2021, na charca, o qual gera expectativa aos proprietários.

Com o propósito de aprofundar a diferença entre os tintos, no que ao tempo de estágios diz respeito, José Marques revela que o Grande Reserva permanece por 21 meses em barricas novas e o Reserva é submetido a 12 meses em madeira de segundo ano, enquanto o Colheita Selecionada está nove meses. A par com a aposta em descansos longevos nestes vinhos, o nosso anfitrião enfatiza a importância da pisa a pé, em lagar, nas uvas tintas, “para que o vinho tenha mais extração e estrutura”. A “qualidade de excelência” realçada por Élia Marques Vitorino tem como marco o prémio “Excelência”, na categoria dos tintos, atribuído ao Quinta da Badula Grande Reserva tinto 2017, por ocasião do XV Concurso dos Vinhos do Tejo. “Esteve dois anos em barrica, de onde tiramos, para ir decantando, porque não fazemos colagens nos vinhos, daí que mantenhamos os vinhos por mais tempo na adega. Fazemos uma ligeira filtração de placa aberta, para evitar a passagem de impurezas, mas é o menos filtrado possível, para que não haja interferência na cor e na estrutura do vinho”, fundamenta José Marques.

Nos brancos, o topo de gama é o Quinta da Badula Reserva, com um tempo de estágio de seis meses em barricas novas. Mas nem sempre há colheitas desta referência. Quando não acontece, fica a garantia da produção de um Quinta da Badula Colheita Selecionada, submetido a três meses em madeira usada. Nos dois casos, o vinho estagia em barricas de madeira “topo de gama”.
Na adega da propriedade, concebida em 2012 para trabalhar por gravidade, onde está instalada, a 10 metros de profundidade, a cave das atuais 300 barricas, José Marques mostra as madeiras de maior qualidade das tanoarias francesa Seguin Moreau e portuguesa J.M. Gonçalves. “Cada uma é usada em 50%”, afirma o nosso anfitrião, que distingue ambas da seguinte forma: “a tanoaria portuguesa dá mais estrutura aos vinhos, enquanto a francesa, dá mais elegância.”

Quer nas barricas, quer nos depósitos de inox, os vinhos estão separados por castas. O lote, que difere de ano para ano, é feito no final. Posteriormente, é colocado nas cubas destinadas para o efeito e engarrafado na máquina, também preparada para a rotulagem. “Nós fazemos todo o trabalho internamente. Se corre alguma coisa mal, a responsabilidade é nossa, mas a se a máquina for de fora, nunca saberemos de onde veio o problema”, remata José Marques.
A capacidade de produção anual ultrapassa os 100.000 litros e destina-se às lojas gourmet, garrafeiras e restaurantes. No âmbito da exportação, constam os Países Baixos, considerado o melhor mercado no universo da Quinta da Badula, bem como a Bélgica, a Suíça, a Alemanha, o Brasil e, “esperamos nós”, novamente a China, mercado outrora importante na casa.

Nota: A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico.

 

 

Vinhos do Alentejo e ASAE controlam autenticidade das uvas

Vinhos do Alentejo e ASAE

A Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA) e a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) celebraram um Protocolo de Cooperação, com o objectivo de reforçar a fiscalização da produção vitivinícola, assegurando a autenticidade e a conformidade dos vinhos com Denominação de Origem (DOC) e Indicação Geográfica (IG) do Alentejo. A articulação reforçada entre ambas as […]

A Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA) e a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) celebraram um Protocolo de Cooperação, com o objectivo de reforçar a fiscalização da produção vitivinícola, assegurando a autenticidade e a conformidade dos vinhos com Denominação de Origem (DOC) e Indicação Geográfica (IG) do Alentejo.

A articulação reforçada entre ambas as entidades incidem na realização de ações conjuntas de controlo, sobretudo no período das vindimas, no sentido de proteger a origem das uvas e enfatizar a confiança no selo “Alentejo”. Em suma, “a colaboração com a ASAE reforça a credibilidade do setor e a proteção da região vitivinícola”, afirma Luís Sequeira, Presidente da CVRA.

A CVRA foi criada em 1989, é responsável pela certificação e controlo da origem e qualidade, promoção e fomento da sustentabilidade, bem como pela proteção e defesa da DOC Alentejo e da Indicação Geográfica Alentejano, e detém uma iniciativa pioneira, o “Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo”. Este território vitivinícola abrange uma área de vinha de 23,3 mil de hectares e é uma das duas únicas regiões do mundo que produz Vinho de Talha há mais de dois mil anos.

VICENTINO: Vinhas e hortas à beira-mar

Vicentino

As vinhas, ainda que ocupando 60 hectares, parecem ser um parceiro muito discreto neste gigante universo agrícola, muito vocacionado para exportar quase toda a produção. Dizemos discreto, porque a vinha está ali, sossegada no concelho de Odemira, na Costa Vicentina, enquanto o frenesi de chegada e partida de carregamentos em camiões TIR impressiona o visitante. […]

As vinhas, ainda que ocupando 60 hectares, parecem ser um parceiro muito discreto neste gigante universo agrícola, muito vocacionado para exportar quase toda a produção. Dizemos discreto, porque a vinha está ali, sossegada no concelho de Odemira, na Costa Vicentina, enquanto o frenesi de chegada e partida de carregamentos em camiões TIR impressiona o visitante. Falamos da FRUPOR, empresa responsável por alguns alimentos frescos que encontramos no supermercado e muitas das verduras das floristas.

O gosto do vinho era antigo e o norueguês Ole Martin Siem, o proprietário, começou a interessar-se pelas potencialidades daquela zona localizada perto do mar, para gerar vinhos de grande qualidade. Mas, tal como nos confirmou, mais importante do que começar por fazer uma adega state of art, era ter boas uvas e boa maneira de as fazer chegar nas melhores condições à adega. Durante vários anos, tiveram de recorrer a adega alugada (Perescuma), mas, finalmente, a nova adega está a funcionar, “sem ousadias arquitectónicas, uma vez que o mais importante é a câmara de frio para arrefecer as uvas, as boas condições da adega, com cubas de inox e cimento, barricas quantas as necessárias. Tudo funcional”, relembra-nos o produtor. É secundado por Bernardo Cabral, o enólogo responsável pelos vinhos e líder de uma equipa, da qual faz parte Ana Rita Bouça, enóloga, que também assegura os comandos do laboratório e com quem já tinha trabalhado com ele nos Açores, além de Jorge Martins, na viticultura, e Pedro Cavaleiro, na área comercial.

Vicentino
Ole Martin Siem

Contrariamente ao que é habitual, a adega está sobredimensionada, porque há ainda o objectivo de fazer prestação de serviços para terceiros. Não tem um restaurante associado, mas, na loja, podem servir-se petiscos regionais, para acompanhar os vinhos servidos aos visitantes. Foi aí exactamente que fizemos as provas. Ter a adega no meio da vinha tem enormes vantagens. Bernardo Cabral recorda: “como temos boas câmaras de frio podemos ir programando a vindima paulatinamente, parcela por parcela.” A vindima estende-se, assim, por um mês e meio, sem pressas.

Nesta zona de forte influência marítima, os brancos ganham uma enorme importância, nomeadamente os que são feitos a partir da casta Sauvignon Blanc. As neblinas que trazem a maresia para terra fazem toda a diferença, “e quando elas não vêm, os vinhos ficam diferentes e menos ricos”, explica o enólogo. A Sauvignon Blanc tornou-se assim a casta-emblema da casa, produzida pela primeira vez em que 2014, logo seguida, em 2015, pela Pinot Noir, a tal casta difícil, grande apreciadora de climas mais frescos. Era também inevitável que a Alvarinho aportasse, agora que se tornou uma variedade a que todos querem chegar. Para complementar este ramalhete, destacam-se a Chardonnay, variedade procurada por todos, na tentativa de fazer um branco de carácter borgonhês.

O projecto pode ser viável, até porque existe uma amizade pessoal entre o produtor do Vicentino e Henri Boilot, conhecido e famoso produtor da Borgonha. Da sua propriedade foram trazidas varas daquela casta, bem como barricas de segunda utilização, para aqui se fazer um Vicentino de perfil “afrancesado”. O projecto está em curso, o vinho já existe, mas não o incluímos nas notas de prova, uma vez que sugere precisar de tempo em garrafa para afinar; a prova fica para mais tarde. A curiosidade foi Henri Boilot, que marcou presença e provou o vinho produzido com a casta Sauvignon Blanc, ter afirmado: “finalmente, provei um bom Sauvignon Blanc!” À frase é preciso descontar o pouco valor que em França se dá aos vinhos de outra região que não a própria… Fica o comentário elogioso, sem dúvida.

 

A casta Sauvignon Blanc tornou-se a marca-emblema da casa, o vinho foi produzido pela primeira vez em 2014, logo seguido, em 2015, pelo Pinot Noir

 

Sauvignon em destaque

O vinho de Sauvignon Blanc produzido pela Vicentino integra-se na família das Sauvignon de perfil aromático pleno de vegetais verdes, com notas apimentadas, no qual estão ausentes as notas de fruta tropical mais habituais nos vinhos mais gordos e mais maduros, mais característicos do interior do que da costa. A influência do mar, da neblina e a temperatura mais amena são determinantes para o perfil da casta. Os estafados descritores relacionados com o sal podem ser usados com propriedade, já que estamos a escassas centenas de metros do mar, em arribas selvagens e inóspitas, mas, também por isso, tão atractivas.

Aquando da nossa visita, a vinha estava em plena “explosão” vegetativa, com um crescimento “que se vê dia-a-dia”, como nos disse Jorge Martins, também muito satisfeito com o trabalho de reenxertia de algumas castas, a qual se optou por abandonar, como a Fernão Pires. Estar perto do mar tem vantagens, mas é uma dor de cabeça permanente em virtude da propagação das doenças da vinha, como o míldio e o oídio. Optou-se por uma atitude racional e não fundamentalista: quando é preciso intervém-se, com o objectivo último de salvar a produção. As vinhas mais novas têm herbicida nas linhas, porque o entre-cêpas acaba por cortar tudo a eito e a dimensão da vinha não permite um trabalho manual. Já nos espaços entre as filas de videiras, houve o cuidado de permitir o desenvolvimento vegetativo, que possa enriquecer, arejar e vivificar o solo, permitindo uma competição (moderada) com a cêpa.

Se o gosto do consumidor for para vinhos tintos muito estruturados, concentrados e muito ricos, com forte presença de madeira e taninos em evidência, então este não é destino certo. Favorecidos pelo mar, o conceito é outro, mais elegante, mais fino, menos denso. Para sorte (ou não) de Ole Martin Siem, esta é a tendência actual. Provavelmente por isso, as exportações têm cada vez mais significado, quer para a Europa Central, quer para os Estados Unidos e o Brasil. A sorte, como sabemos, dá imenso trabalho e esse, por aqui, não falta.

Da Borgonha trouxeram-se varas e barricas para fazer aqui um Chardonnay de inspiração francesa

 

500 hectares em produção

A vinha onde se colhem as uvas utilizadas na produção do vinho Vicentino está inserida num complexo agrícola de grandes dimensões. É aqui, bem perto da Zambujeira do Mar e a poucas centenas de metros da falésia, onde encontramos a casa outrora pertença de Amália Rodrigues, que ficam os campos agrícolas e as estufas de Ole Martin Siem, há quatro décadas em Portugal. O proprietário recorda-nos: “quando aqui cheguei, eu era o único estrangeiro. Hoje, temos trabalhadores de 15 nacionalidades no nosso projecto”.

A actividade agrícola estende-se desde a produção de couve chinesa e cenouras baby, até fetos, eucaliptos ornamentais e verduras para os ramos de flores que compramos nas floristas. Falamos então de 500 hectares de terra e 400 trabalhadores. A alimentação de tanta gente é assegurada, quer pela cantina fixa, quer pelas cantinas móveis, que se dirigem às zonas mais afastadas onde estão os funcionários da empresa. A actividade e circulação de pessoas é intensa e são diários os camiões TIR que ali carregam caixas com legumes ou verduras, posteriormente exportadas para os Países Baixos e de lá distribuídas para toda a Europa. Ao fim da tarde, chegam vários autocarros de passageiros, que levarão de volta os trabalhadores aos seus aposentos. O complexo funciona de uma forma muito “oleado” e inclui um espaço de turismo rural. Em breve, este alojamento será alargado a um hotel. A vinha ocupa 60 hectares e a selecção de castas foi muito abrangente, incluindo nacionais e de fora. Assim, temos Alvarinho, Arinto, Viosinho, Sauvignon Blanc e Chardonnay, nos brancos e, nos tintos, Touriga Nacional, Aragonez, Pinot Noir, Syrah, Alicante Bouschet e Merlot. Actualmente, são 16 as referências que constam no portfolio, as quais são distribuídas por cinco gamas: Poente, Nascente, Neblina, Luar e Naked (gama de vinhos sem madeira).

(Artigo publicado na edição de Agosto de 2025)

 

José Maria da Fonseca dá cartas no enoturismo

José Maria da Fonseca

A Casa-Museu José Maria da Fonseca, em Vila Nogueira de Azeitão, no território vitivinícola da Península de Setúbal, e a Adega José de Sousa, em Reguengos de Monsaraz, na região do Alentejo, foram distinguidas com o prémio Travellers’ Choice Awards do Tripadvisor. Além da produção vitivinícola, ambas fazem parte da oferta enoturística da José Maria […]

A Casa-Museu José Maria da Fonseca, em Vila Nogueira de Azeitão, no território vitivinícola da Península de Setúbal, e a Adega José de Sousa, em Reguengos de Monsaraz, na região do Alentejo, foram distinguidas com o prémio Travellers’ Choice Awards do Tripadvisor. Além da produção vitivinícola, ambas fazem parte da oferta enoturística da José Maria da Fonseca, que, neste contexto, vê a primeira a conquistar este prémio pelo 11º ano consecutivo e a segunda a repetir a mesma proeza pela terceira vez. A classificação é igual: 4,5 estrelas.

A dupla distinção “demonstra a consistência do nosso trabalho e a confiança que os visitantes depositam nas experiências que oferecemos”, nas palavras de Sofia Soares Franco, responsável pelo enoturismo desta empresa familiar. As portas permanecem abertas a visitantes nacionais e internacionais de Abril a Outubro, entre as 10h00 e as 17h30m, e de Novembro a Março, das 10h00 às 16h30m, na Casa-Museu José Maria da Fonseca. Na Adega José de Sousa, as visitas tem hora marcada às 11h00, 15h00 e 17h00, de Abril a Outubro, enquanto de Novembro a Março, ocorrem às 11h00 e às 15h00.

De 25 a 27 de Novembro, o SITEVI, evento dirigido aos profissionais dos sectores do vinho, da azeitona e da fruta, terá lugar no Parque de Exposições de Montpellier, no Sul de França. Com o propósito de esmiuçar as temáticas abordadas durante os três dias da edição de 2025 deste certame e conhecer as mais-valias para os operadores portugueses, a Grandes Escolhas entrevistou o CEO, Guillaume Schaeffer.

Diversificar, inovar e antecipar são as premissas desta edição do SITEVI. Pode explicar as razões que determinaram a selecção destas premissas para o certame de 2025?

Estas três palavras representam as realidades com que se confrontam actualmente os profissionais do sector vitivinícola, oleícola e frutícola. A diversificação, em primeiro lugar, é uma resposta directa à evolução das expectativas do mercado: assistimos ao desenvolvimento de produtos como os vinhos sem álcool, os circuitos curtos de distribuição e o agroturismo. Em segundo lugar, a inovação é uma necessidade no terreno: é o que nos permite melhorar o desempenho e a sustentabilidade, e resistir melhor aos imprevistos. Depois, há a antecipação. Sabemos que os modelos económicos tradicionais são minados pelas alterações climáticas, pela volatilidade dos preços e pela pressão regulamentar. O nosso objectivo com o SITEVI 2025 é proporcionar um fórum onde estas questões possam ser analisadas, discutidas e traduzidas em soluções concretas.

De que forma as soluções digitais são consideradas uma mais-valia para os sectores aqui representados?

A tecnologia digital é, actualmente, uma ferramenta de gestão essencial para os agricultores. Permite-lhes gerir melhor a água e os factores de produção, recolher e analisar dados meteorológicos, antecipar e corrigir. Tornam-se também um verdadeiro suporte para a automatização de certas tarefas ou para o controlo à distância. São tecnologias que nos permitem continuar a ser competitivos, aliviando a nossa carga de trabalho. É igualmente importante sublinhar que estas ferramentas estão a tornar-se cada vez mais acessíveis, mesmo para as pequenas estruturas.

Preços, alterações climáticas e concorrência internacional. Em que medida este certame apoia os profissionais na redefinição dos modelos de negócio?

SITEVI é uma plataforma para a transição. Funciona como uma ponte entre as questões estruturais, como o clima, os preços e a concorrência, e as soluções que os profissionais podem implementar actualmente. No salão, destacaremos as alavancas concretas: robotização, agricultura de precisão, valorização dos subprodutos e abertura de novos mercados. Mas a força do SITEVI reside também na riqueza dos seus conteúdos. As conferências, os ateliers temáticos, os intercâmbios com os centros técnicos e os parceiros institucionais oferecem uma visão estratégica que não deixa de estar enraizada na realidade. É uma abordagem pragmática, concebida para ser útil e imediatamente acionável.

Quão eficaz é esta rede de contactos no âmbito dos sectores da viticultura, da arboricultura e da olivicultura?

Acima de tudo, o SITEVI é um salão reconhecido pela riqueza e qualidade da sua rede. É um dos poucos eventos na Europa capaz de reunir toda a cadeia de valor num só lugar: dos investigadores aos produtores, dos fabricantes de equipamentos aos distribuidores. Com cerca de 1000 expositores, mais de 55 000 visitantes de 73 países e uma dimensão verdadeiramente internacional, criamos encontros direccionados e eficazes, que conduzem a parcerias concretas. O que os profissionais procuram são ligações, poupanças de tempo e soluções partilhadas. O SITEVI dá-lhes a oportunidade de levar os seus projectos para a frente, de se inspirarem uns nos outros e de trabalharem em conjunto, com a finalidade de encontrarem soluções para os desafios que os seus sectores enfrentam atualmente.

O que se pode esperar da edição de 2025 do SITEVI em matéria de sustentabilidade, bem como de inovação?

Este ano, optámos por privilegiar a inovação útil, acessível e sustentável. São expectativas fortes por parte dos profissionais e são também o que nos permite ter um verdadeiro impacto positivo no sector. Isto traduz-se em soluções que respondem a desafios muito reais: reduzir a pegada de carbono, com sistemas de destilação com baixo teor de carbono ou motores alternativos, por exemplo; gerir melhor os recursos, nomeadamente a água, com sistemas de irrigação inteligentes; ou desenvolver a readaptação e a reciclagem, para prolongar a vida útil dos equipamentos. Mas esta dinâmica de inovação não se fica pela tecnologia. Também estamos a promover abordagens sustentáveis que englobam toda a cadeia de valor, desde o cultivo à transformação. E a inovação social terá o seu lugar de destaque, nomeadamente com soluções concebidas para pequenas estruturas, explorações familiares ou projectos de transferência.

Em que sentido o certame deste ano vai acrescentar valor aos operadores portugueses?

Para os operadores portugueses, o SITEVI é, antes de mais, um fórum de troca de ideias com outros operadores europeus, num ambiente que favorece o diálogo profissional e os contactos direcionados. É uma oportunidade para conhecer melhor a evolução do mercado, antecipar as tendências técnicas e económicas e comparar as estratégias implementadas pelos diferentes sectores. O SITEVI permite ainda às empresas portuguesas, sejam elas fornecedoras, cooperativas ou produtores, posicionarem-se num certame de elevado valor acrescentado. Isto pode passar pela observação de tecnologias, mas também pela participação em conferências, masterclasses e intercâmbios com potenciais parceiros. Sabemos que os profissionais portugueses estão muito atentos às alterações regulamentares e às novas práticas, e o salão oferece-lhes um quadro concreto para as decifrar e planear a sua adaptação. Por fim, o SITEVI é também um factor de visibilidade para os expositores portugueses que pretendem chegar a um público internacional. Atrai um público altamente qualificado e redes profissionais poderosas, nomeadamente nos domínios das máquinas, do equipamento das adegas e da consultoria agronómica. É um terreno fértil para estabelecer pontes entre França, Portugal e, mais amplamente, os mercados do Sul da Europa.

Que visão de futuro tem o SITEVI e qual será o panorama dos referidos sectores nos próximos tempos?

Queremos apoiar as transições que estão a ocorrer nos sectores atuais, mantendo-nos o mais próximo possível do terreno. Acima de tudo, queremos oferecer soluções concretas e práticas que se dirijam tanto às grandes como às pequenas explorações agrícolas. Queremos continuar a promover uma inovação que seja acessível, útil e inclusiva. A vocação do SITEVI é ser um catalisador, um momento-chave, em que os profissionais podem encontrar-se, trocar ideias e construir o futuro do seu sector. Esperamos vê-lo em Montpellier, de 25 a 27 de Novembro de 2025, para uma edição excepcional do SITEVI, sob o signo da inovação, da sustentabilidade e das grandes transições nos sectores do vinho, da azeitona e da fruta!

 

Forno d’Oro em Lisboa é uma das melhores pizzarias do mundo

Tanka Sapkota

O chef nepalês Tanka Sapkota, que, em 2022, recebeu o prémio “Restaurante Cozinha do Mundo”, da Grandes Escolhas, pelo restaurante Come Prima, em Lisboa, acaba de ver o seu Forno d’Oro, localizado também na capital portuguesa, a subir para o 61º lugar no guia 50 Top Pizza World 2025. É, por conseguinte, o único restaurante […]

O chef nepalês Tanka Sapkota, que, em 2022, recebeu o prémio “Restaurante Cozinha do Mundo”, da Grandes Escolhas, pelo restaurante Come Prima, em Lisboa, acaba de ver o seu Forno d’Oro, localizado também na capital portuguesa, a subir para o 61º lugar no guia 50 Top Pizza World 2025. É, por conseguinte, o único restaurante português a constar neste ranking internacional. Esta distinção junta-se, assim, ao reconhecimento do 50 Top Pizza Europa, no qual está nos primeiros dez lugares da respectiva tabela.

Tanka Sapkota

Radicado em Portugal há quase três décadas, Tanka Sapkota abriu o Forno d’Oro em 2014, onde a pizza napolitana ganha destaque na ementa. Aliás, o chef nepalês é conhecido pelo trabalho que tem vindo a fazer no mundo das pizzas, com o foco neste tipo de massa, projetando o nosso país no contexto mundial da cozinha italiana. O segredo? Está na massa, submetida a uma levedura com duração de 36 horas e a uma cozedura a 450 ºC, em forno a lenha revestido a folhas de ouro, para que cada pizza esteja pronta em menos de um minuto.

 

 

Reveja o momento da atribuição do prémio “Restaurante Cozinha do Mundo” atribuído pela Grandes Escolhas em 2022

100 vinhos inesquecíveis

100 vinhos

Qual a melhor maneira de uma publicação de vinhos celebrar a sua centésima edição? Com vinho, é evidente. Desde maio de 1997 passaram pelas nossas mesas de prova dezenas de milhares de garrafas, vinhos de todos os tipos, origens e segmentos de preço, descritos e avaliados por mais de uma dezena de provadores. Resolvemos agora […]

Qual a melhor maneira de uma publicação de vinhos celebrar a sua centésima edição? Com vinho, é evidente. Desde maio de 1997 passaram pelas nossas mesas de prova dezenas de milhares de garrafas, vinhos de todos os tipos, origens e segmentos de preço, descritos e avaliados por mais de uma dezena de provadores. Resolvemos agora mergulhar na nossa história vínica e escolher os 100 vinhos que mais impressionaram quem os provou. Nesta selecção, apenas a qualidade absoluta conta: estes foram, simplesmente, os vinhos que pontuaram mais alto, sem preocupações de distribuição geográfica ou representatividade.

Claro está, ainda assim, houve que estabelecer critérios. Por exemplo, é certo que repetimos produtores, (olhando para tantos milhares de provas, percebe-se que há quem tenha um compromisso bastante consistente com a excelência…), mas não repetimos referências (em muitos casos, injustamente, várias colheitas do mesmo vinho mereciam igual destaque). E em igualdade de circunstâncias demos preferência a vinhos que deslumbraram mais do que um provador.  Aqui ficam, pois, 100 vinhos que não se esquecem. E que fazem parte da nossa história.

Uma nota final: os preços indicados remetem para o momento em que o vinho foi provado. E ainda, a ordem dos vinhos apresentados nada tem a ver com as classificações obtidas, mas sim alfabética.

(Artigo publicado na edição 100 de Agosto de 2025)

 

Produção de azeites Esporão com nova liderança

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Integrada na equipa desde 2013, Ana Gaspar é quem está, agora, à frente da produção de azeites. A oleóloga soma já um percurso de 12 anos nesta casa, também produtora de vinhos localizada em Reguengos de Monsaraz, no Alentejo, o que se traduz no amplo conhecimento sobre a matéria, tendo estado envolvida em todas as […]

Integrada na equipa desde 2013, Ana Gaspar é quem está, agora, à frente da produção de azeites. A oleóloga soma já um percurso de 12 anos nesta casa, também produtora de vinhos localizada em Reguengos de Monsaraz, no Alentejo, o que se traduz no amplo conhecimento sobre a matéria, tendo estado envolvida em todas as etapas de produção e qualidade. Deste modo, e de acordo com o comunicado, tem contribuído “de forma decisiva para o desenvolvimento e reconhecimento dos azeites Esporão, tanto dentro como fora de Portugal”.

Com esta nova etapa, o Esporão espera dar continuidade à produção de azeite, trabalho em relação ao qual tem vindo a reforçar a aposta. Fica, para já, a promessa de preservar a identidade deste produto alicerçada na valorização das variedades de azeitona portuguesas, na conjugação entre tradição e inovação, e na ligação com os produtores da matéria-prima.

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