12 Sugestões de Vinhos Verdes até 15€

Vinhos frescos, leves e perfeitos para dias de calor, fins de tarde em esplanadas, terraços, jardins e sobretudo…. Férias! Ficam aqui algumas sugestões de vinhos verdes provados ao longo deste ano, todos com o selo Boa Escolha!

Vinhos frescos, leves e perfeitos para dias de calor, fins de tarde em esplanadas, terraços, jardins e sobretudo…. Férias!

Ficam aqui algumas sugestões de vinhos verdes provados ao longo deste ano, todos com o selo Boa Escolha!

Sugestão: Os (outros) licorosos de Portugal

licorosos

Se estivéssemos a fazer um script para um filme sobre este tema, poderia ser mais ou menos assim: Cena 1: Um grupo de amigos a fazer uma prova de vinhos. Eu também estava presente. Coisa caseira, sem pretensões, apenas para desfrutar o vinho e, como dizem em Angola, estar junto. A certa altura, e após […]

Se estivéssemos a fazer um script para um filme sobre este tema, poderia ser mais ou menos assim:

Cena 1:
Um grupo de amigos a fazer uma prova de vinhos. Eu também estava presente. Coisa caseira, sem pretensões, apenas para desfrutar o vinho e, como dizem em Angola, estar junto. A certa altura, e após alguns vinhos terem sido degustados em prova cega, eu trouxe para a mesa um vinho já decantado. Retinto, percebia-se que era um generoso. De imediato começou o jogo: Porto Vintage ou LBV? Logo aí houve alguma controvérsia porque não era evidente se seria de um tipo, ou de outro. Pelo perfil logo se puseram de lado quer os Madeira quer os Moscatéis; era claramente um vinho retinto engarrafado novo. O segundo momento foi tentar perceber quem seria a casa produtora: seriam empresas inglesas de vinho do Porto, seria um perfil mais tradicional português? Se sim, qual poderia ser a empresa? Novamente várias opiniões, tudo algo baralhado. Resultado da prova: não era um vinho do Porto, era um licoroso de Borba!

Cena 2:
Almoço no Porto, no restaurante Gaveto. Convidador: Dirk Niepoort. À mesa estaríamos uns 8 ou 10, quase todos ligados ao vinho do Porto e vários da própria empresa. Para a sobremesa, Dirk serve o vinho às cegas: logo ali a primeira discussão foi se seria Niepoort ou de outra firma. Um dos presentes, o senhor Nogueira – “cheirista” encartado da Niepoort e já então acabado de se reformar, vaticinou: este seguramente não é o estilo Niepoort! A conversa continuou, a cada cabeça sua sentença. Resultado: era um licoroso da África do Sul, apelidado de Cape Fortified. Vinho notável, a todos os títulos, se a memória não me falha.

Cena 3:
Tenho em minha casa para jantar Dirk Niepoort e David Guimaraens, então acabados de chegar a Lisboa após uma passeata de mota pelo país, uma versão Easy Ryder do séc. XXI. A certa altura do serão servi um vinho bem carregado na cor, rústico de perfil, mas impressionante no conjunto. Ambos entraram em modo de dúvida, sobre que tipo de Porto seria e de quem, ou seja, a conversa do costume nestas coisas das provas cegas. Às tantas um deles, que não recordo quem, disse: espera, este é capaz de ser o licoroso do Mouchão que provámos ontem quando estivemos na herdade! Era mesmo!

 

 

sugestão licorosos

Eram dezenas as destilarias no Bombarral e a grande quantidade de aguardente produzida destinava-se ao Porto e, também, aos licorosos locais.

 

 

 

Vamos casar mosto com aguardente?

As três cenas ajudam-nos a perceber que o universo dos licorosos pode ser desafiante. Podemos encontrar um de dois perfis que, ainda mais, ajudam a confundir com o “universo” Porto; um perfil engarrafado mais jovem e que lembra, de facto, um Vintage ou LBV, e um outro tipo, mais longamente envelhecido em casco e que pode fazer-nos pensar se não estaremos perante um Porto Tawny ou, em alguns casos, um Madeira.
Há razões que ajudam a perceber porque é que nos podemos enganar; em primeiro lugar, as castas: o tal licoroso de Borba era feito de Aragonez e o licoroso da África do Sul era elaborado com castas do Douro, para lá levadas em tempos idos. Se a este “factor casta” juntarmos a forma como são feitos, ou seja, interrupção da fermentação por adição de aguardente vínica, igual à que se usa para vinho do Porto, percebemos melhor que todos estamos desculpados por termos sido iludidos com o licoroso.

Alguns dos vinhos aqui provados entram na designação Abafado: tratam-se de licorosos em que, cumprindo o que a legislação determina, se interrompe a fermentação no início da mesma, por adição de aguardente; se o mosto não chegar mesmo a fermentar, então estamos perante uma Jeropiga.
Algumas casas – como a Companhia Agrícola do Sanguinhal ou o Mouchão têm já uma história secular na produção de vinhos licorosos. No Mouchão a tradição remonta ao início do séc. XX (1901) e, no caso do Sanguinhal há que lembrar que a firma de Abel Pereira da Fonseca, ainda nos finais do séc. XIX, tinha uma empresa de vinho do Porto; e a partir do momento em que adquiriu as 3 quintas na zona do Bombarral – Sanguinhal, Cerejeiras e S. Francisco – dedicou-se a produzir vinhos licorosos. Estávamos então na segunda década do séc. XX. Além desta grande empresa, outras como os Patuleia e Vinhos Bernardino eram destiladores de aguardente. Eram dezenas as destilarias na região e enorme a quantidade de vinhos que ali eram “queimados”; a aguardente destinava-se sobretudo a beneficiar o Vinho do Porto. Era assim tentador fazer algo semelhante nos vinhos da região. Na Companhia Agrícola do Sanguinhal a tradição manteve-se até hoje e as reservas mais antigas que são usadas na preparação dos lotes têm, segundo o actual proprietário, mais de 80 anos.

Já no caso das adegas cooperativas estamos em crer que o desejo dos sócios de terem um vinho de sobremesa, não para imitar nem substituir o vinho do Porto, mas que pudesse ser a expressão das virtudes da região, levou à proliferação deste tipo de vinho um pouco por todo o país, incluindo Tejo e Algarve, onde os licorosos chegaram a ter alguma projecção.
Enquanto consumidores que somos, não devemos perder de vista o que, de original, se vai fazendo aqui e ali. Nota final: estes, como outros vinhos do mesmo tipo, devem ser consumidos frescos. E se tem a sua garrafa há muito tempo em casa (há que a conservar ao alto), não hesite em decantar primeiro porque pode ter criado depósito no fundo da garrafa. Boas provas!

 

(Artigo publicado na edição de Maio de 2023)

Páscoa doce: o que beber com as sobremesas da época

Páscoa Doce

Não há dúvida de que um dos pontos mais altos de uma refeição de Páscoa é o momento em que se adoça o palato. Dos bolos de chocolate aos queijos, passando pelos doces de ovos ou de amêndoa, muitas são as sobremesas portuguesas típicas desta época, com variações de região para região. Aqui fica uma […]

Não há dúvida de que um dos pontos mais altos de uma refeição de Páscoa é o momento em que se adoça o palato. Dos bolos de chocolate aos queijos, passando pelos doces de ovos ou de amêndoa, muitas são as sobremesas portuguesas típicas desta época, com variações de região para região.

Aqui fica uma selecção de vinhos para harmonizar com doces de diferentes famílias de sabores – avaliados por vários provadores da Grandes Escolhas –  com preços que não vão levar ninguém à ruína finaceira.

 

BOLOS DE CHOCOLATE:

 

DOCES COM AMÊNDOA E OUTROS FRUTOS SECOS:

 

DOCES COM LARANJA:

 

DOCES DE OVOS E BOLO DE MEL:

 

FOLARES DE ERVA – DOCE OU CANELA:

 

QUEIJOS AZUIS OU PICANTES:

 

OUTROS QUEIJOS:

12 rosés para celebrar a Primavera

Na Grandes Escolhas somos fãs de Rosés e por isso sugerimos 12 vinhos rosados, em diferentes segmentos de preço. Uma forma de dar as boas-vindas à Primavera!

Na Grandes Escolhas somos fãs de Rosés e por isso sugerimos 12 vinhos rosados, em diferentes segmentos de preço. Uma forma de dar as boas-vindas à Primavera!

Sugestão: Os brancos de Outono e Inverno

brancos outono inverno

Mais ricos, cremosos, texturados, encorpados, concentrados. Mais ambiciosos também. Em pé de igualdade com os tintos pela capacidade de alinhar com pratos mais gordos e elaborados e de despoletar experiências sensoriais mais intensas, são assim os brancos de Outono/Inverno. Aqui deixamos 13 sugestões de primeira linha, vinhos com profundidade e longevidade, para os meses mais […]

Mais ricos, cremosos, texturados, encorpados, concentrados. Mais ambiciosos também. Em pé de igualdade com os tintos pela capacidade de alinhar com pratos mais gordos e elaborados e de despoletar experiências sensoriais mais intensas, são assim os brancos de Outono/Inverno. Aqui deixamos 13 sugestões de primeira linha, vinhos com profundidade e longevidade, para os meses mais frios que virão.

 Texto: Valéria Zeferino  Notas de Prova: Painel de Prova GE     Fotos: D.R.

 

Em Portugal produzem-se mais tintos do que brancos, a única excepção é a região dos Vinhos Verdes. No mundo, em geral, é assim. E a sazonalidade é forte: nos brancos pensa-se mais no verão, à beira da piscina ou ao almoço leve na praia. No outono e inverno preferem-se os tintos, esquecendo-se que temos excelentes brancos para acompanhar estas estações do ano.

Antigamente, em Portugal dizia-se que “o vinho é tinto; e também há branco”, conta o incontornável produtor bairradino Luís Pato. Hoje ainda é parcialmente assim, mas muito menos. Mario Sérgio Nuno, da Quinta das Bágeiras, lembra-se que quando era menino, as pessoas diziam “bebo branco quando não há tinto” e que às vezes para vender 10 caixas de tinto, o distribuidor era “obrigado” a levar 10 caixas de branco.

As técnicas de produção de brancos também eram “muito agressivas” – partilha Manuel Vieira, responsável de enologia durante muitos anos na Quinta dos Carvalhais e agora na Caminhos Cruzados. Os cachos e as massas vínicas sujeitavam-se à acção mecânica violenta, os equipamentos usados na altura eram fonte de oxidações, as temperaturas não se controlavam… enfim… muitas vezes os vinhos não aguentavam mais de um ano em garrafa (com honrosas excepções de alguns brancos antigos que chegam aos nossos dias em perfeita saúde).

brancos outono inverno
Anselmo Mendes levou a uva Alvarinho e o terroir de Monção e Melgaço até ao topo.

No final dos anos 80 e início dos anos 90 do século passado a tecnologia começou a entrar nas adegas com o controlo de temperatura e cuidados no sentido de proteger o vinho contra as oxidações. Proliferação de cubas de inox e aposta na fruta primária conduziram a vinhos mais limpos aromaticamente, mas bem acabados. O nível geral de qualidade dos brancos subiu e tornou-se um padrão.

Quando Mario Sérgio lançou o seu primeiro Quinta das Bágeiras Garrafeira 2001, um branco mais compenetrado do que extrovertido, fermentado em tonel antigo e preparado para anos de guarda e vocacionado, foi contra a corrente. Já o Guru, da Wine & Soul, nasceu em 2004 com a ideia da Sandra Tavares e Jorge Borges de fazer um grande branco do Douro com potencial de guarda, pois na altura havia poucos.

Hoje, os produtores têm à sua disposição um vasto leque de técnicas para fazer vinhos brancos adequadas a qualquer ocasião. Com mais ou menos intervenção, fermentações expontâneas ou controladas, diferentes abordagens técnico-filosóficas, com qualidade altíssima e por vezes surpreendente, não nos podemos queixar.

Como um branco Outono/Inverno é um oposto de “leve e crocante”, procura-se criar condições para o vinho ter solidez, estrutura, textura e potencial de guarda. A intensidade dos aromas primários não é o principal objectivo, a palavra-chave é complexidade. Normalmente, recorre-se ao estágio em madeira de diferentes tipos e capacidades, tosta e tempo de uso, para dar as nuances que o produtor deseja e que a matéria prima permite. Não existe uma “receita”. A escolha das barricas depende da sensibilidade de cada enólogo e da matriz do vinho em função da casta, terroir e até o ano de produção. E esta sensibilidade e preferências podem mudar ao longo do tempo, alterando o perfil do vinho.

Fermentação e estágio em madeira

 O contacto com madeira molda o vinho de certa forma, promovendo a microoxigenação contínua (estabiliza e amacia o vinho) e modificando os seus aromas com os compostos vindos da tosta da madeira (baunilha, canela, cravinho entre outros) de maneira que a fruta deixa de ser óbvia e o vinho ganha complexidade olfactiva. Quanto maior for a capacidade do vasilhame, menos marca deixa; e quanto menor for o grau da tosta, menos aromas transfere para o vinho. A barrica nova permite mais troca gasosa por ter os poros limpos, mas também deixa a sua marca mais evidente no vinho.

Se a madeira for em excesso, pode arruinar o vinho, sobrepondo-se às suas virtudes e deixando uma sensação de secura e amargor dos taninos elágicos da madeira. Aplicada ajuizadamente, beneficia e confere complexidade.

“Bom trabalho de barrica”, “barrica bem integrada” ou “barrica de luxo” são expressões frequentes nos comentários dos enófilos e notas de prova dos vinhos. “Amadeirado”, “madeira em excesso”, “marcado pela madeira” são os epítetos do lado oposto da escala.

Sandra Tavares, enóloga e produtora da Wine & Soul, conta que na primeira edição do Guru de 2004 foram utilizadas apenas barricas novas. Em 2016 a percentagem da barrica nova baixou quase para metade e o 2019 tem apenas 9% de barrica nova de 500 litros, tosta média-leve. A origem da barrica também ganhou outra importância. Agora começam a usar fudres de maior capacidade.

António Maçanita, o enólogo e produtor da Fita Preta, para o seu Chão dos Eremitas escolhe barricas de, pelo menos, terceiro uso, pois pretende-se a acção mais delicada do estágio em madeira sem ser muito óbvia. E também apenas 40% estagia em barrica, o resto fica em inox.

Se o Quinta das Bágeiras Garrafeira estagia em tonéis antigos de madeira de 2500 litros, ao Pai Abel o produtor queria dar um pouco mais de estrutura e de volume através do estágio em barricas muito usadas da Borgonha, com bâtonnage.

Já o Parcela Única de Anselmo Mendes estagia em madeira nova, mas a barrica é escolhida a dedo em função da proveniência (da floresta de Bertranges perto de Sancerre) e feita à medida, com uma tosta ainda mais leve do que é usada para os Grand Grus da Borgonha.

Ao falar da madeira, pensamos normalmente em carvalho, mas não é a única opção possível. Luís Pato, por exemplo, para o seu Vinha Formal prefere o castanho que na sua opinião não marca os brancos com baunilha. E argumenta que a madeira de castanho é mais porosa do que o carvalho, permitindo maior contacto com oxigénio durante o estágio pelo que o vinho fica mais resistente a oxidação a longo prazo; para além de ser tradicional na região e mais barato.

brancos outono inverno
Nas vinhas velhas do Chão dos Eremitas, António Maçanita descobre verdadeiros tesouros.

Normalmente o contacto com a barrica começa na fermentação, o que permite que a madeira a integre melhor. Entretanto, Manuel Vieira prefere arrancar a fermentação em inox para ter mais controlo sobre a temperatura (16˚C no início) e aos 1050 de densidade transfere o mosto para a barrica, onde acaba a fermentação e depois fica a estagiar.

Já agora, a temperatura de fermentação destes vinhos mais ambiciosos nunca é muito baixa (12-13˚C) para não evocar aromas de bananas e fruta tropical, que podem ser bem vindos nos brancos frescos de Verão, mas não transparecem nem a casta, nem o terroir. Normalmente, a temperatura de fermentação ronda os 18˚C, mais coisa menos coisa.

Outra variável importante é o tempo que o vinho permanece na barrica. Nem sempre o estágio mais prolongado resulta em vinhos excessivamente amadeirados. O Teixuga é um grande exemplo: passa 19 meses na barrica e não fica marcado pela madeira. Manuel Vieira explica que há sempre um momento durante o estágio, um pico, quando o vinho fica dominado pela madeira. Muitos neste momento tiram o vinho da barrica para o “salvar”, mas na realidade, se o vinho permanecer na barrica mais tempo, acaba tudo por integrar, afirma.

Borras e curtimentas

As borras representam a fração sólida no meio (mosto) acumulada durante a fermentação alcoólica. Numa primeira trasfega as borras mais espessas, normalmente, são removidas, deixando em suspensão os compostos mais pequenos, chamados de borras finas. São maioritariamente compostos pelas células das leveduras mortas.

Quando o vinho estagia sobre borras, a parede celular das leveduras é destruída, libertando polissacáridos, manoproteinas e outros compostos para o meio, que não só protegem o vinho contra as oxidações durante o estágio, mas também melhoram as suas características organolépticas (textura, volume, cremosidade e aromas) e faz com que a acção da madeira seja menos intrusiva no vinho.

A agitação das borras com um bastão – bâtonnage – mantêm-nas em suspensão e homogeniza a sua acção, intensificando os efeitos mencionados. Geralmente, as borras são levantadas com maior frequência no início do estágio, abrandando ou até mesmo cessando mais tarde.

O Alvarinho no Parcela Única estágia com borras totais. Desta forma Anselmo Mendes providencia uma maior quantidade de biomassa para garantir a melhor protecção do vinho da acção da madeira nova. “Juntar potência com elegância” – diz o mestre. Em sua opinião, isto não funciona com castas como o Chardonnay ou o Sauvignon Blanc, porque reduzem bastante nestas condições, mas o Alvarinho aguenta-se bem. A frequência da bâtonnage é feita com grande precisão em função do consumo de oxigénio no vinho durante o estágio.

Já António Maçanita não fez bâtonnage no Chão dos Eremitas, mas prefere manter as cubas, onde estagia 60% do vinho, na horizontal para, desta forma aumentar a distribuição das borras.

Para além do estágio em madeira existem outras formas de realçar as características sensoriais do vinho. A curtimenta é uma delas e agora esta técnica está na moda. Mas Paulo Nunes conta que até aos anos 80 do século passado, na Casa da Passarella os brancos habitualmente faziam-se como os tintos – fermentavam-se com películas. E na altura não se chamavam “orange wine”…

No Casa da Passarella O Fugitivo Curtimenta as uvas não são desengaçadas, pois Paulo Nunes vê o benefício na transferência de algum tanino na percepção organoléptica, procurando mais sensação táctil, de “textura e até algum amargo para contrastar com vinhos muito limados”.

brancos outono inverno
Na Quinta das Bágeiras, o Pai Abel fermenta em barricas muito usadas vindas da Borgonha.

Castas e regiões

 A região de origem, na realidade, não é grande indicadora do estilo do vinho – em todas as regiões de Portugal podemos encontrar vinhos brancos estruturados e sérios. E a casta nem sempre define inequivocamente perfil. Um Chardonnay da California com estágio em barrica nova, amanteigado e untuoso, não tem nada a ver com um Chablis, feito da mesma casta. No nosso caso, Arinto ou Alvarinho vinificados em inox serão mais leves e crocantes do que os seus homólogos que passaram uma boa parte da sua vida em barrica, por exemplo.

Felizmente, temos muito por onde escolher em termos da região e das castas. No Dão, Encruzado presta-se particularmente bem para vinhos com dimensão. Manuel Vieira trabalha com esta casta já há mais de 30 anos. Quando entrou na Quinta dos Carvalhais em 1990, resolveu fazer um branco “à borgonhesa”, com fermentação em barricas de carvalho e estágio sobre borras. Fez uns ensaios de vinificação com cinco castas do Dão em separado, e foi o Encruzado que se mostrou melhor por não se deixar “comer” pela madeira.  Os grandes brancos da Bairrada são, geralmente, feitos do Bical, Maria Gomes e Cercial em várias combinações. No Douro, um típico blend inclui Viosinho, Gouveio, Rabigato, Códega e outras castas em proporções diferentes.

No Alentejo, Antão Vaz e Arinto, por regra, funcionam bem em conjunto. O Alvarinho também já marca a sua presença nesta região. Nós escolhemos aqui uma casta diferente, pouco conhecida, de propósito para mostrar que qualquer variedade pode brilhar se for bem trabalhada. Alicante Branco (aka Boal de Alicante ou Boal Cachudo), foi uma variedade importante no Alentejo antes da filoxera. António Maçanita teve o contacto com esta casta quando começou a explorar uma parcela plantada em 1970 com várias castas (um field blend organizado) sem rega. Como muitas outras variedades do Sul, tem acidez baixa e um perfil aromático neutro o que despertou o interesse do produtor para uma experiência, adaptando o processo de vinificação à casta.

Na região de Lisboa, obviamente, brilha o Arinto e ultimamente, a casta Fernão Pires, oriunda do Tejo, tem surpreendido bastante na região vizinha. Na região dos Vinhos Verdes, o Alvarinho e o Loureiro com estágio em barrica, são os principais protagonistas para a nossa selecção de brancos para acompanhar as almoçaradas e os serões outonais.

Selecionar sempre

A idade das vinhas e as particularidades da parcela podem influenciar as características da matéria-prima e proporcionar vinhos diferenciados. Como a concentração é bem-vinda nestes vinhos, muitas vezes preferem-se as uvas das vinhas velhas, onde a produção é reduzida naturalmente pela idade das videiras. É o caso do Guru, proveniente de uma vinha com 70-80 anos em Porrais, na zona de transição de xisto para o granito e com muito quartzo. Sandra Tavares considera que o xisto dá estrutura e tensão, enquanto o granito e o quartzo – pureza e final de boca mais fino.

Entretanto, para fazer o Pai Abel branco, Mário Sérgio optou pela vinha nova (que agora tem cerca de 30 anos), mas reduzindo drasticamente a produção – fazendo a primeira colheita mais cedo para espumante.

A precisão na escolha da matéria-prima não se limita pela idade das vinhas, o terroir também entra em jogo. Luís Pato escolheu o Bical da Vinha Formal, que comprou em 1998, plantada em solo argilo-calcário na encosta de Óis do Bairro. As uvas desta zona sempre davam vinho de melhor qualidade, destinado à exportação, chamado no século XIX “Vinho de Embarque”.

O Parcela Única de Anselmo Mendes é autoexplicativo, vem de uma parcela de 4,5 ha da Quinta da Torre, que dava sempre vinho vibrante, que não cheirava muito e tinha uma óptima acidez. Nesta zona o solo é de textura mediana composta por argila, limo, pedra e areia mais grossa. São terraços fluviais, ricos em minerais e com capacidade de retenção. E mesmo dentro da melhor parcela, a selecção de cachos é muito rigorosa. É feita na vinha na altura da vindima em função da fisiologia da videira e não no tapete de escolha, quando já é tarde. Colhem-se apenas os cachos da base e das varas bem atempadas. Como é óbvio, para uma vindima tão precisa é necessário ter o núcleo duro do pessoal experiente.

brancos outono inverno
Na Quinta da Teixuga, da Caminhos Cruzados, os vinhos reflectem um Dão moderno.

No caso do Curtimenta, a casta deixa de ter importância, sobretudo a nível de aromas varietais, porque a técnica de vinificação anula a componente aromática. Mas a selecção de uvas certas para este vinho é importante. Paulo Nunes vai buscar a uva das vinhas onde muitas castas têm acidez elevada – Uva Cão, Cerceal Branco, Terrantez, para dar equilíbrio à estrutura e a dimenção de boca dos vinhos de curtimenta.

Na mesa

 Mencionamos no início que o que chamamos de brancos de Outono/Inverno, corresponde sempre a vinhos extremamente gastronómicos. Como tal, deixamos algumas sugestões de boas parcerias à mesa.

De um modo geral, têm que ser pratos com alguma estrutura, textura e intensidade. Os crustáceos mais densos podem ser uma boa opção – santola ou sapateira, lavagante ou lagosta. Não esquecemos o arroz de polvo ou de marisco. Peixe grelhado ou no forno, bacalhau assado, migas de bacalhau, açorda ou sopas elaboradas, como a sopa de pedra, são harmonizações a experimentar. Outras alternativas podem ser pratos de galinha, perdiz ou peru. Embora tradicionalmente seja acompanhado com espumantes ou colheitas tardias, eu também não excluia foie-gras pela intensidadde de sabor, gordura e textura.

Agora só faltam os queijos! Paulo Nunes, recorda que na Serra da Estrela o queijo com o mesmo nome era muitas vezes acompanhado com vinhos brancos, com alguma idade. E faz todo o sentido.

Os vinhos brancos com estas características não devem ser servidos muito frios. A temperatura de serviço pode ser entre os 10˚C e 12˚C, tendo em conta que o vinho vai sempre aumentar no copo 2-3˚C o que, no caso dos vinhos mais complexos até vai trazer benefícios. Ajuda abrir a complexidade aromática e apreciar a textura.

E para finalizar, chamar-lhes “brancos de Outono/Inverno” é uma força de expressão: bebem-se lindamente noutras estações do ano, basta querer e combinar com a comida certa.

(Artigo publicado na edição de Setembro de 2022)

 

Alfrocheiro, a casta mistério

Alfrocheiro casta mistério

Não se conhece o pai, mas filhos não lhe faltam A casta que alegra os vinhos do Dão e dá brilho aos do Alentejo é hoje uma referência dos vinhos portugueses. E com muito futuro pela frente.  Texto: João Paulo Martins Fotos: DR Ao lermos hoje os contra-rótulos das garrafas de tintos da região do […]

Não se conhece o pai, mas filhos não lhe faltam A casta que alegra os vinhos do Dão e dá brilho aos do Alentejo é hoje uma referência dos vinhos portugueses. E com muito futuro pela frente.

 Texto: João Paulo Martins

Fotos: DR

Ao lermos hoje os contra-rótulos das garrafas de tintos da região do Dão deparamo-nos com a quase omnipresença de quatro castas tintas: a Jaen, a Touriga Nacional, a Tinta Roriz e a Alfrocheiro. Deste quarteto, há três que são muito tradicionais na região e depois há a Tinta Roriz, introduzida, sobretudo, a partir dos anos 90 do século passado. Sobre a Roriz não é agora o momento de falar dela, mas registe-se que gera tantos ódios como aplausos. Este quarteto acabou por vir a destronar algumas castas que tinham tradição na região mas que os novos ventos levaram da boca do palco para o segundo balcão. É o caso da Tinta Pinheira, também conhecida por Rufete na Beira Interior e que foi em tempos casta muito importante no Dão. Bento Carvalho, no seu Guia dos Vinhos Portugueses, 1982, Ed. Presença, nem sequer elenca a Alfrocheiro nas castas da região. Ali, as chamadas “castas tradicionais regionais” incluíam Tourigo, Tinta Pinheira, Tinta Carvalha, Baga de Louro, Alvarelhão e Bastardo. E, apenas por curiosidade, nos brancos (e no mesmo livro) a Encruzado nem é referida, mas sim Dona Branca, Arinto, Barcelo, Fernão Pires e Cerceal. Mudam-se os tempos…

Na Enciclopédia dos Vinhos Portugueses (Ed. Chaves Ferreira) e no volume dedicado ao Dão, o autor, Virgílio Loureiro, já tem outra atitude em relação à casta Alfrocheiro, reconhecendo que não é casta muito antiga na região e que terá sido introduzida nas replantações pós-filoxera. Pelo destaque que lhe dá percebemos que se tornou uma variedade muito acarinhada e de grande importância nas novas plantações que o Dão conheceu a partir dos anos 90 quando despertaram um conjunto de produtores-engarrafadores que puseram a Alfrocheiro no mapa regional. Falamos da Quinta dos Roques, Carvalhais, Pellada, Casa de Santar, entre outros que surgiram então na região. Não foram, assim, precisos muito anos para que esta variedade passasse a integrar o quarteto-maravilha dos encepamentos do Dão. Tudo isso sem prejuízo de continuarem a ser muito plantadas a Jaen, a Baga e também, ainda que em muito menor proporção, a Tinto Cão e mesmo a Alvarelhão, casta que conhece actualmente algum impulso, em virtude de vivermos numa época em que os vinhos mais abertos de cor voltaram a ter mais aceitação junto dos consumidores.

Do Dão ao Alentejo

Esta variedade encontra-se disseminada em várias regiões portuguesas, mas é sobretudo no Dão e no Alentejo que se encontram as maiores concentrações. No Douro é praticamente ignorada e alguns enólogos desconhecem-na totalmente. Recordo-me de uma conversa que tive com Charles Symington a propósito da casta. Ele só a conheceu quando a empresa Symington adquiriu a propriedade em Portalegre e recordo-me o entusiasmo que mostrou pelas qualidades que a Alfrocheiro apresentava naquela zona alentejana; para ele uma total surpresa. Também Paulo Laureano a usa na Vidigueira e lhe reconhece os méritos: “é exigente no solo (melhor no xisto negro) e requer equilíbrio na produção porque pode ter tendência a ser muito produtiva originando vinhos descorados; requer vindima rápida porque tem uma janela de 3 ou 4 dias para ser apanhada no ponto óptimo; gera vinhos elegantes, com foco em fruta azul de qualidade, de excelente acidez e que pode funcionar muito bem em lote”, destacando Laureano a ligação com a Trincadeira, Aragonez e Alicante Bouschet. Também Luis Cabral de Almeida, enólogo na Herdade do Peso (Sogrape) lhe nota as virtudes: “já tivemos um varietal de Alfrocheiro mas agora não temos (mas vamos voltar a plantar); é muito exigente na viticultura porque pode apodrecer com facilidade mas gera vinhos com uma fruta muito elegante que até pode lembrar a Pinot Noir”. Curiosamente esta característica tornou-se muito evidente no vinho da Quinta da Pellada que provámos.

Alfrocheiro casta mistério
No Alentejo, António Maçanita é um fã de Alfrocheiro.

Já no Dão, há muito anos que ela é trabalhada por Manuel Vieira, em tempos na Quinta dos Carvalhais e actualmente na empresa Caminhos Cruzados. Sobre a casta disse-nos, que “na vinha exige muitos cuidados: é atreita à podridão pelo formato fechado do cacho que incha com a chuva e rebenta. É preciso muito controle na produção porque tende a produzir mais do que é possível para se fazer um bom vinho. Por isso, é preciso bom trabalho na condução da cepa e na monda precoce que deixe os cachos bem arejados evitando o encavalitamento”. E na adega, gosta muito da acidez da Alfrocheiro, “é muito viva e dá alegria ao lote. É uma casta que precisa de algum tempo, os aromas não se mostram logo, é ao fim de um ano que eles se tornam mais evidentes”, refere.

A casta tem sido objecto de estudo no âmbito da PORVID que mantém um campo de clones em Pegões. António Graça, investigador da vinha e uma das caras daquela associação, confessou-nos que “é uma casta com pouca diversidade, o que indicia uma origem recente em termos evolucionários (mesmo assim podemos estar a falar de vários séculos) e ADN de tipo ibérico (clorotipo A). Sabemos que um dos progenitores é o Savagnin Blanc, o outro é ainda desconhecido (podem já não existir exemplares). Mas também sabemos que é um Don Juan das vinhas, tendo profusa descendência de ambos os lados da fronteira: em Portugal, Camarate Tinto, Carrega Tinto, Casculho, Castelão, Casteloa, Castelã, Concieira, Cornifesto, Douradinha, Jampal, Malvarisco, Malvasia Fina, Malvasia Preta, Moreto, Parreira Matias e Trincadeira das Pratas. E em Espanha (onde é conhecido pelo sinónimo Bruñal): Allaren, Mencia e Mouratón”. A PORVID tem conservados 237 genótipos (conjunto da informação genética de uma planta ou clone) da casta. Segundo dados que a PORVID conseguiu apurar, em 2019 existiam cerca de 1 200 hectares plantados com esta casta.

Na prova que fizemos foi notório que o Dão é a zona onde mais varietais de Alfrocheiro existem; em tempos também houve em Lisboa e, no Tejo, a Quinta da Lagoalva produz igualmente vinhos de referência desta casta.

Na nossa prova, foi evidente que há alguns traços comuns, em todas as regiões: os vinhos são elegantes e estão, também por isso, em linha com a actual moda de tintos menos concentrados, mais finos e muito mais gastronómicos. Têm, como se pode ver, um preço médio que se pode considerar muito convidativo. E são belíssimos representantes dos tintos onde o diálogo fruta/barrica/extracção/taninos parece estar mais bem conseguido.

Não posso deixar de referir a pequena estória que era a imagem de marca de um escritor de vinhos que, infelizmente, nos deixou há alguns anos – Matos Cristóvão. Dizia ele que numa situação de aproximação tentadora a uma mulher “com Alfrocheiro é tiro e queda!” Quem somos nós para duvidar…

(Artigo publicado na edição de Abril de 2022)

Sugestão: O movimento rosa

sugestão rosés

Provámos rosés provenientes do norte, centro e sul, litoral e interior do país, passando pelas ilhas. Por todo o território novos vinhos emergem, lado a lado com aqueles que foram pioneiros. Vinhos sérios, ambiciosos, diferentes, num movimento rosa apaixonante. Aqui fica uma vintena de sugestões menos óbvias, para partir à descoberta. TEXTO Nuno de Oliveira […]

Provámos rosés provenientes do norte, centro e sul, litoral e interior do país, passando pelas ilhas. Por todo o território novos vinhos emergem, lado a lado com aqueles que foram pioneiros. Vinhos sérios, ambiciosos, diferentes, num movimento rosa apaixonante. Aqui fica uma vintena de sugestões menos óbvias, para partir à descoberta.

TEXTO Nuno de Oliveira Garcia

Apesar do tempo que levamos a compilar selecções anuais de rosés, a verdade é que a cada ano somos surpreendidos com novos vinhos. De néctar de nicho e aposta pessoal de produtores de vanguarda – casos de Dirk Niepoort (‘Redoma’), Domingos Soares Franco (‘Coleção Privada Moscatel Roxo’), Júlio Bastos (‘Dona Maria’) e, mais recentemente, Ravasqueira (‘Premium’) e Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo (agora só com uma referência, tendo sido suprimido o Reserva) – o vinho rosé de perfil sério e elegante passou a modelo quase obrigatório numa gama. O exemplo mais acabado desta tendência é a empresa Wine & Soul que lança agora, na gama Manoella, precisamente um rosé para completar o branco e os tintos desta magnífica propriedade duriense. O mesmo tinha acontecido com a Quinta da Pacheca que lançou também um rosé reserva ambicioso não há muito tempo, fechando o seu portefólio de vinhos. 

A cada ano somos também surpreendidos pelas novidades das regiões cuja aposta num rosé de qualidade é particularmente levada a sério, seja pela sua frequência e ocupação turística, seja por uma inata propensão para este tipo de néctar vínico. Casos notórios do Algarve e dos Açores que contribuem com duas referências cada para a nossa lista. Com efeito, a procura de vinhos leves e frescos por parte de clientes internacionais faz com que os rosés sejam uma seleção quase natural, em especial para o produtor tipo algarvio que invariavelmente esgota os seus rosés poucos meses depois de os ver lançados no mercado. A par das indicadas na nossa selecção, ambas estreias absolutas, diga-se, destacamos ainda as marcas algarvias Cabrita e Quinta do Barranco Longo (o mais interessante é a versão ‘Oaked’), cujos produtores levam já várias colheitas de experiência.

sugestão rosésNa região do Tejo, de enorme projeção nos mercados internacionais, há muito que se levou a sério os seus rosés gulosos e atractivos, propícios para a exportação e não só, aspecto bem visível em produtores como Quinta da Lagoalva de Cima, Quinta da Alorna, Fiuza, Casal Branco, e até no irreverente Areias Gordas. Outra região muito bem-sucedida, e também na exportação, é o Alentejo, região que nos últimos anos tem vendido um valor próximo de 2,5 milhões de garrafas de rosés, e apenas nos referimos aos vinhos certificados. Marcas como Lima Mayer (sempre num registo estruturado) e Alento (Luís Louro/Monte Branco), bem como Herdade do Rocim (Rocim) e Paço do Infantes, estes dois últimos feitos a partir de Touriga Nacional, são referências deliciosas e obrigatórias.

Mais a norte, no Douro, o preço elevado do quilo da uva, em especial da Touriga Nacional, e a atenção maioritária dada a tintos (DOCs e Portos), fez com que durante muitos anos os rosés fossem tudo menos uma prioridade. Até há bem pouco tempo, para o protótipo produtor duriense, os rosés eram um vinho desinteressante e que não prestigiava a região (nada de mais errado, todavia). Tudo isso tem vindo mudar, com rosés cada mais ambiciosos e sedutores que em vez de desabonar a região, abrem-na a novos clientes. A par dos selecionados abaixo, vinhos como ‘Redoma’, verdadeiro pioneiro, ‘Vinha Grande’, ‘Vallado Touriga Nacional’, ‘Quinta Nova’, ‘Avidagos Reserva’ são óptimas compras.

Em busca da frescura

Mas quanto a regiões, a verdade é que existem terroirs mais propícios a rosés que outros… É certo que, como desenvolveremos adiante, um bom rosé é, sobretudo, um vinho feito na adega e vindimado na altura perfeita para obtermos um vinho gracioso e leve. Sucede, que existem regiões no nosso país que, sobretudo pelo seu clima, propiciam a produção de néctares muito frescos e de acidez vibrante. Neste domínio, as regiões atlânticas de Lisboa e da Bairrada ganham destaque, sendo que desta última vêm vários dos melhores rosés nacionais, como sejam ‘Aliás de Outrora’ (João Soares e Nuno Mira do Ó), ‘Giz’ (Luis Gomes, o fundador de um dos mais excitantes projetos da região), ‘Quinta do Poço do Lobo Reserva’ (Caves S. João) ou, mais recentemente, ‘Buçaco’ (Alexandre de Almeida) e ‘Casa de Saima’ (Graça da Silva Miranda), quase todos com recurso à casta Baga e/ou Pinot Noir. Também o exclusivo ‘Principal Tête de Cuvée’ – uma estrela no firmamento nacional de rosés, como atesta a nota na nossa seleção – é bairradino e 100% feito de Pinot Noir, com última edição ainda no mercado a ser a de 2010 (mas atenção, a segunda marca é igualmente de qualidade, de nome ‘Colinas’ cujo último rosé no mercado é de 2015).

Menos atlântica, mas ainda temperada e com alguma altitude, a região do Dão apresenta também um número significativo de bons rosés, casos do Quinta do Perdigão, Fonte de Ouro, Quinta de Lemos ‘Nélita’, ‘Elpenor’, entre outros. Um dos vencedores do nosso painel, ‘Tirados a Ferro’, provém precisamente da região, no limite sul, no terroir de Midões, outrora famoso pelos brancos. Um aviso: trata-se apenas de uma barrica (o que deveria ser “proibido” até, dada a escassez!) e o preço escalda… Quanto a castas, são várias na região a permitem a criação de vinhos elegantes e florais, como seja a Touriga Nacional, o Alfrocheiro e a Tinta Roriz, e a temperatura média – mais fresca que outras regiões vizinhas – ajuda no perfil elegante. 

sugestão rosésPor falar em castas, é notório que o actual perfil de rosé de gama alta privilegia uvas que proporcionam cor clara, aroma e prova de boca delicados, e com boa acidez. A casta Baga é daquelas que consegue preencher todos esses requisitos com relativa facilidade e, por isso, não espanta os bons resultados que almeja em rosé. Mais a norte, a casta Espadeiro é utilizada pela mesma razão, assim como a Negra Mole no Algarve, casta na qual cada cacho tem uvas em diferentes estados de maturação e cor. A omnipresente Touriga Nacional, quando vindimada cedo, contribui com os seus aromas florais muito elegantes, a Tinta Francisca apresenta cor aberta e fruto bonito, e a uva francesa Pinot Noir – com pouca cor, fruto elegante e por vezes fresco e subtil – também funciona bem, sobretudo em terroirs atlânticos. 

Já que nos referimos a castas francesas, nos solos calcários e barrentos do sul de França – regiões de Bandol, Bergerac, Corbière – vingam as uvas Mourvèdre, Cinsault e Carignan. Alguns dos melhores produtores de rosé do mundo produzem precisamente na Provence os seus vinhos que são vendidos um pouco em todo o mundo como produtos sofisticados que são. Já no Ródano – regiões de Tavel e Lirac – é a Grenache que reina também nos rosés, e um pouco por todo o país a Syrah faz parte de lotes de rosés conceituados, tal como sucede no nosso país. A fruta encarnada do Aragonez/Tinta Roriz também proporciona, sobretudo em lotes, rosés de muito bom nível no nosso país, e o mesmo sucede em Espanha, na versão Tempranillo, sendo que o mercado espanhol tem sido palco de uma autêntica revolução rosa nas últimas três colheitas. Com efeito, depois de anos a privilegiarem tintos concentrados e maduros, os produtores espanhóis viraram-se para produtos mais leves e frescos, sendo a aposta em rosés de qualidade uma consequência natural dessa evolução. 

Criar ambição

A regra é, portanto, evitar utilizar castas rústicas e com muita cor, como seja as francesas Alicante Bouschet, Petit Verdot, Grand Noir, a georgiana Saperavi ou a lusitana Vinhão. A uva Cabernet Sauvignon, salvo exceções, também não é uma das preferidas para rosé, sobretudo pelas notas vegetais que pode aportar ao lote final e pela quantidade de antocianinas na película que tingem significativamente o líquido (por isso, aliás, não há hábito de fazer brancos de Cabernet…). Uma alternativa à utilização exclusiva de castas tintas passa pela inclusão de uvas brancas no lote final, solução que em Portugal foi seguida pelo conhecido produtor Soalheiro misturando Pinot Noir e Alvarinho, com a versão de 2019 a ser talvez a mais bem conseguida até hoje. Outros produtores nacionais também incluem uma pequena parte de vinho branco nos rosés, mas não o referem nos rótulos ou contrarrótulos. Mais assumida é a política de utilização de borras de vinho branco na elaboração de rosés sempre com belíssimos resultados, contribuindo tanto com cremosidade como com acidez crocante para o vinho final. Na verdade, existem nos rosés de topo de gama com tendências comuns evidentes, como seja a utilização de bica aberta (evitando-se a sangria de tintos) e a fermentação (em parte ou totalmente) em barrica.

Tal como escrevemos no passado, um dos maiores desafios dos rosés em Portugal é ser levado a sério enquanto vinho, e ser vendido um preço relativamente alto. Em todo o caso, como a nossa selecção demonstra, já são vários os rosés em Portugal acima de 10€ e mesmo de 20€. Em França, os melhores produtores (não necessariamente os mais famosos…) – como seja Domaine Hauvette Domaine de Terrebrune ou Clos Cibonne –, raramente ultrapassam o preço de €30 a garrafa, e o mesmo sucede com os melhores rosés espanhóis como ‘Pícaro del Aguilla’ (que na verdade é um clarete), e ‘Viña Tondonia Gran Reserva’ (Lopez de Herédía), este um pouco mais caro e vendido sempre com mais de 5 ou 6 anos a contar da vindima. Nos Estados Unidos da América, aí sim, a moda de rosés explodiu faz já alguns anos fazendo com que seja difícil encontrar um topo de gama abaixo de $50, sobretudo se constar da famosa lista dos 100 melhores vinhos do mundo…

sugestão rosésOutro desafio é a definição do conceito ou tipo de rosé, sempre que falamos de um néctar topo de gama. Será um rosé de guarda, gastronómico ou de terroir? De terroir é mais difícil de concordar, pois não só se produzem bons rosés em todo o território nacional, como os rosés são, por regra, menos marcados pelas nuances e diferenças entre regiões do que brancos e tintos. A explicação para esse fenómeno reside no facto de as uvas serem colhidas muito cedo (por vezes mais cedo do que as uvas brancas), bastante antes de a maturação fenólica estar completa. Por outro lado, como as uvas são vindimadas cedo, as temperaturas altas e a perda de acidez típicas das regiões mais a sul não costumam ser um problema. Isso faz com que o líquido, quase sempre lágrima apenas, seja muito leve e fresco, mas relativamente indiferenciado e incaracterístico quando à casta ou ao solo… Na verdade, um bom rosé depende mais dos cuidados e exigências na (data da) vindima e na adega do que do ano agrícola ou das particularidades de uma região. Mas este facto em nada deve afastar o consumidor deste tipo de vinho, muito pelo contrário. A razão de termos cada vez melhores rosés portugueses é o maior nível de profissionalismo por parte de produtores e enólogos no nosso país. Paralelamente, a razão de termos cada vez mais e diferentes rosés é o consumidor cada vez estar mais esclarecido e sem preconceitos. Não queira ficar de fora…

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Sugestão: Loureiro, a rainha do Lima

São várias as castas de uva que proliferam no Minho. Umas são bem conhecidas de todos, aparecendo em lugar de destaque nos rótulos das garrafas. Outras, um pouco mais obscuras, são hoje apenas curiosidades ampelográficas. Das primeiras, destacamos a variedade Loureiro, para muitos a melhor casta da região dos Vinhos Verdes. TEXTO João Paulo Martins […]

São várias as castas de uva que proliferam no Minho. Umas são bem conhecidas de todos, aparecendo em lugar de destaque nos rótulos das garrafas. Outras, um pouco mais obscuras, são hoje apenas curiosidades ampelográficas. Das primeiras, destacamos a variedade Loureiro, para muitos a melhor casta da região dos Vinhos Verdes.

TEXTO João Paulo Martins

As castas de uva têm por vezes características enigmáticas. Uma delas é a diferente apetência que mostram em querer viajar. Temos em Portugal exemplos para todas as situações, desde variedades que evidenciam muitas virtudes em todos os locais para onde foram levadas, caso da Alvarinho, mas também a Verdelho, Arinto ou Roupeiro, até outras que se quedaram na zona de origem e não deram mostras de querer viajar muito. Recordamos aqui o caso paradigmático da Encruzado e da que hoje tratamos, a Loureiro. No que respeita a esta variedade emblemática dos Vinhos Verdes, foram feitas algumas tentativas de a levar para outras zonas. Recordamos aqui que ela já esteve plantada na Quinta dos Carvalhais, no Dão, onde chegou a integrar, por uma única vez, um branco feito de lote entre Bical e Loureiro, na colheita de 2000. À época enólogo nessa quinta do Dão, Manuel Vieira disse à Grandes Escolhas que a casta produzia muito, mesmo muito, mas que “originava mostos com teor ácido baixo”, o que contraria a ideia que temos dela. A ideia de arrancar a vinha foi decisão empresarial, mas, na verdade, o tal 2000 Bical/Loureiro, ainda em 2019 dava mostras de estar em grande forma. Também na zona de Setúbal se fizeram experiências com a Loureiro. Domingos Sores Franco, enólogo da casa José Maria da Fonseca, confirmou que a casta foi para ali levada, há muitas décadas, pelo seu tio António Soares Franco. Ainda hoje tem cerca de 2ha de Loureiro plantados na zona de Azeitão, destinando-se o mosto para o lote do Quinta de Camarate branco doce, um vinho que nada tem a ver com vinhos doces de colheita tardia, mas que Domingos nos confirma ser um enorme sucesso, do qual se produzem 25.000 litros por ano. “Noto-lhe aromas de grande qualidade que lembram os que se conseguem no Minho, mas aqui tem menos acidez, tem mesmo uma certa gordura e peso na boca que funcionam muito bem no branco doce, onde a juntamos com a casta Alvarinho”, disse.

Unicer.

Uma casta produtiva

O vale do rio Lima, o solar do Loureiro, é bem distinto em configuração dos vales do Minho ou do Douro, importantes rios que atravessam a região dos Vinhos Verdes. O vale do Lima é amplo e largo, deixando entrar a influência atlântica bem dentro de terra.

Como já escreveu João Afonso em reportagem publicada neste revista, “em termos orográficos podemos dividir a sub-região do Lima em três zonas distintas: a zona mais litoral e ventosa de Viana, com vale aberto e pouca montanha; uma zona intermédia de Ponte de Lima (de Geraz do Lima até Jolda e Gondufe) ainda de vale aberto, mais protegido da nortada e já com traços de montanha; e a zona interior de Ponte da Barca e Arcos de Valdevez com vale mais estreito, de perfil montanhoso e com alguma continentalidade a misturar-se com o clima marítimo.”

A casta Loureiro gosta de frio, mas não aprecia vento. Segundo Anselmo Mendes, “prefere zonas mais abrigadas para evitar partir as varas e é exigente na gestão da sebe para que a vinha possa respirar. Produz bem, mas não convém deixar ir muito além das 10 ton/hectare para não perder carácter.” Esta produtividade, que se pode considerar normal na região do Verdes está, no entanto, muito acima do que encontramos noutras zonas do país, nomeadamente na vizinha região do Douro. José Luis Moreira da Siva é enólogo na quinta dos Murças (Douro) e, por via da aquisição por parte do Esporão da Quinta do Ameal, ficou também responsável pela viticultura e enologia desta propriedade minhota. As diferenças não podiam ser maiores, “é que estou a lidar com produções por hectare que são cinco vezes superiores às do Douro, com terrenos muito mais férteis e também muito mais propícios às doenças e pragas da vinha e tudo isso é um grande desafio”. José Luis confirma que apesar dessa pressão das doenças, é no Minho mais fácil assegurar uma produção regular, com solos ricos e água com fartura. A Quinta do Ameal esteve durante algum tempo certificada como bio, mas, foi-nos confirmada, essa certificação foi abandonada. O enólogo foi pragmático: “estamos a seguir tratamentos e práticas bio, mas se houver um ataque a sério avançamos com tratamentos químicos; não faz sentido perder a produção por falta de tratamentos. Estou de resto convencido que enquanto no Douro é mais fácil a certificação bio, aqui nos Verdes tenho muito mais dúvidas”.

Polivalente na adega

Na adega, a Loureiro mostra-se polivalente. Na Quinta do Ameal sempre se usou uma vinificação diferenciada, ora em inox ora em barricas usadas, praticando abundantemente a bâtonnage, mesmo no inox. Essa prática pode ser fundamental sobretudo se se pretende fazer um Loureiro que dure 20 anos na garrafa. No Ameal sempre existiu a preocupação de mostrar a longevidade da casta Loureiro, a única plantada na quinta e inúmeras provas confirmam amplamente que o tempo está muito mais ao lado da casta do que em tempos se pensava. Anselmo Mendes diz-nos que, “com o tempo, os aromas transformam-se e surgem algumas notas terpénicas que, essas sim, fazem lembrar o Riesling do Mosela”. No entanto, salienta ainda, “existem vários clones de interesse desigual, alguns originam vinhos com notas de Moscatel, mas eu prefiro uns clones que fazem vinhos mais discretos, mas que evoluem bem com o tempo”.

Quinta de Gomariz.

Além da fermentação em inox e barrica (mais usada do que nova), no Ameal estão a fazer-se ensaios com ovos e túlipas de cimento. E trabalhar com teores alcoólicos na casa dos 11,5% de “chega perfeitamente, não precisamos de mais”, confirma Moreira da Silva.

Mesmo nas outras sub-regiões dos Verdes onde a Loureiro entra em lote com outras variedades, os resultados são compensadores. É boa a ligação com a casta Arinto e está em desuso o lote com a Trajadura, uma variedade que recolhe cada vez menos adeptos. Como nos diz Anselmo Mendes, “em tempos era usada para fazer baixar a acidez do Alvarinho, mas hoje já se usa menos”. E em Valença, bem perto da zona de Monção e Melgaço, mas fora da sub-região, a casta Loureiro dá resultados muito interessantes.

Tal como acontece noutras sub-regiões dos Vinho Verdes, o Vale do Lima é a pátria da casta Loureiro, é ali sem dúvida que melhor se expressa e também a casta que melhor expressa as virtudes daquele terroir. Já na sub-região do Sousa impera a Arinto, em Baião a Avesso, exemplos que nos mostram que, embora viajantes, as castas encontram por vezes razões de sobra para não saírem de onde estão. 

 

SABIA QUE…
Loureiro, uma variedade das terras frias

A casta Loureiro é, do ponto de vista económico, a variedade mais importante da região dos Vinhos Verdes. É no vale do rio Lima que ela melhor mostra as suas virtudes. Casta produtiva, gosta sobretudo de zonas onde se faça ainda sentir a influência atlântica, contribuindo com elevada acidez para os mostos. Por esta razão é aqui, na sub-região do Lima, que melhores resultados origina. As zonas mais interiores, de Basto até Baião e Amarante já não lhe convêm porque perde rapidamente a acidez, característica marcante desta casta. Gera vinhos de teor alcoólico médio, mas muito aromáticos, razão pela qual é muito procurada pelos viticultores. Também presente nas Rias Baixas tem aí, no entanto, um peso muito residual, uma vez que a região é quase monocultura de Alvarinho. Apesar de gerar boas produções, não se pode deixar produzir demais porque depois perde aromas. Prefere solos férteis e abundância de água, mostrando muitas dificuldades para enfrentar o stress hídrico. Existem vários clones certificados desta casta sendo mais cotado o que gera o cacho com bagos pequenos e coloração dourada. Segundo informação da CVR dos Vinhos Verdes, existem 189 marcas válidas de vinhos varietais de Loureiro, correspondendo a 111 engarrafadores. Até aos anos 80 do século passado não existiam no mercado vinhos varietais de Loureiro e foi então nessa década que surgiram os primeiros varietais de Loureiro, da Adega Cooperativa Ponte de Lima e de alguns produtores engarrafadores, como a Quinta de S. Cláudio, Casa dos Cunhas ou Quinta do Luou.

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