Escolha do Mestre – Sauvignon Blanc, a casta que o mundo quer adorar

O exotismo da Sauvignon Blanc tem originado um enorme sucesso junto de produtores e consumidores um pouco por todo o mundo. Portugal não é excepção, com resultados muito interessantes, mas há ainda trabalho a fazer no conhecimento da casta no terreno (atenção ao excesso de calor!), de forma a intervir menos na adega e deixar […]

O exotismo da Sauvignon Blanc tem originado um enorme sucesso junto de produtores e consumidores um pouco por todo o mundo. Portugal não é excepção, com resultados muito interessantes, mas há ainda trabalho a fazer no conhecimento da casta no terreno (atenção ao excesso de calor!), de forma a intervir menos na adega e deixar a uva exprimir o local onde está plantada.

Texto: Dirceu Vianna Junior MW

São poucas as pessoas capazes de distinguir entre um Sancerre e um Pouilly-Fumé ou discernir entre as sub-regiões neozelandesas de Awatere e Wairau numa prova à cega. Enquanto a uva Riesling é capaz de expressar o terroir com facilidade, a Sauvignon Blanc é uma casta maleável, onde as decisões tomadas pelo enólogo durante a vinificação são muitas vezes o factor dominante no estilo do vinho. Entre os melhores atributos da casta Sauvignon Blanc estão as suas impressionantes qualidades aromáticas juntamente com seu frescor penetrante. O sucesso global pode ser atribuído, pelo menos parcialmente, à reação dos consumidores entediados com estilos tradicionais de Chardonnay pesados, demasiadamente amadeirados e que actualmente buscam um perfil mais leve. É impossível ignorar na Sauvignon Blanc a incrível capacidade de expressar aromas e sabores exóticos que saltam do copo, dançam no paladar e deixam um final de boca persistente e refrescante. Esta é a razão pela qual a área total de vinhedos plantados no mundo em 2000 representava 65.000 hectares (ha), atingiu 110.000 ha uma década mais tarde e as plantações desta antiga casta continuam crescendo. A primeira menção ocorreu em 1534 sob um de seus sinónimos “Fiers” no Vale do Loire. Como Sauvignon, há uma menção específica no início do século XVIII em relação à pequena vila de Margaux, em Bordéus. A casta é conhecida por vários sinónimos, incluindo Blanc Fumé e Sauvignon Fumé no Loire. Na Áustria e na Alemanha é referida como Muskat-Silvaner e na Califórnia como Fumé Blanc, um termo inventado por David Stare de Dry Creek Vineyard em Sonoma.
Evidências históricas juntamente com análises de DNA sugerem o Vale do Loire como o berço da casta que nasceu devido ao cruzamento entre um pai desconhecido e Savagnin, portanto Sauvignon Blanc é meio irmão da casta Verdelho e genéticamente próximo à Sémillon. Além de ter alcançado fama por conta própria, Sauvignon Blanc, juntamente com Cabernet Franc, são os pais da Cabernet Sauvignon. É provável que esse cruzamento tenha ocorrido na região de Bordéus no século XVIII.
Sauvignon Blanc possui pele esverdeada, bagos pequenos e cachos compactos. É altamente vigorosa, mas relativamente fácil de cultivar. Brota tarde e amadurece cedo. Porta-se bem em climas ensolarados, mas não gosta de calor excessivo. Responde melhor quando plantada em porta-enxertos de baixo vigor e solos não muito férteis. A Sauvignon possui uma variedade de clones com personalidades distintas. Existem mais de 20 clones registados na Universidade de Davis na Califórnia, no entanto estima-se que a maioria das plantações na Califórnia e no mundo assentam no clone Wente FPS 01, originário do Chateaux d’Yquem.

Zambujeira Velha, Cortes de Cima

Os estilos clássicos de França e Nova Zelândia

A região do Vale do Loire, em França continua sendo a grande referência com exemplos puros, elegantes e expressivos oriundos das famosas vilas de Sancerre e Pouilly-Fumé. Entre os produtores de Sancerre destacam-se Alphonse Mellot, Domaine Lucien Crochet e Domaine Vacheron. Bons exemplos de Pouilly Fumé incluem Chateau de Tracy e Domaine Didier Dagueneau. Os vinhos destas denominações tornam-se cada vez mais caros e consumidores astutos buscam alternativas nas denominações vizinhas de Menetou Salon, Reuilly, Quincy e Coteaux du Giennois, bem como Sauvignon de Touraine, onde é possível encontrar vinhos leves e elegantes por uma fracção do preço, como Domaine Joël Delaunay. Sauvignon Blanc é cultivado no clima marítimo de Bordéus onde é possível encontrar vinhos leves, elegantes e bem feitos na sub-região de Entre-Deux-Mers, mas os melhores exemplos estão em Graves e Pessac-Léognan. Esses vinhos podem conter proporções de Semillon e Muscadelle e frequentemente são fermentados e envelhecidos em carvalho produzindo um estilo mais exuberante que além de envelhecer bem, se porta bem com comida. Domaine de Chevalier, Smith-Haut-Lafitte e Haut Brion Blanc são exemplos clássicos. Sauvignon é plantada perto da vila de Chablis sob a denominação de St Bris, onde produz vinhos notoriamente secos, magros com alta acidez e persistentes notas minerais. Um facto surpreendente é que a maioria dos 29.000 ha de Sauvignon Blanc plantados em França se encontram em Languedoc-Roussillon, região mais conhecida pelos seus tintos.
Semelhante ao Alicante Bouschet que teve origem em França e foi adoptado por Portugal, onde produz excelentes vinhos, a casta Sauvignon Blanc encontrou a sua segunda casa na Nova Zelândia, onde foi plantada pela primeira vez na década de 1970. O estilo pungente foi bem recebido pelo consumidor internacional e o país tem sido extremamente bem-sucedido, o que resultou num aumento significativo nas plantações, que hoje atingem 21.400 ha. O solo e as condições climáticas são perfeitos. O clima é ensolarado e seco, mas não excessivamente quente. Os solos pesados produzem vinhos herbáceos a partir de uvas que amadurecem mais tarde. As vinhas plantadas em solos mais pobres e rochosos amadurecem mais cedo, transmitindo notas tropicais exuberantes com nuances minerais. Marlborough, no extremo norte da Ilha Sul, é tida como referência para esse estilo, mas as plantações estão espalhadas por todo país, particularmente Martinborough, Gisborne, Hawkes Bay e Waipara Valley. De forma geral, os Sauvignon da ilha do Norte são mais maduros, com notas de frutas de caroço e melão em comparação aos vinhos do sul que tendem a ser mais leves com notas herbáceas. Entre os bons produtores destacam-se Clos Henri, Craggy Range, Dog Point, Greywacke, Huia, St. Clair, Seresin Estate, Vavasour, Villa Maria e novo projeto de Steve Smith MW chamado Smith & Sheth.

Adega Mãe

Sauvignon Blanc nas Américas…

Nos Estados Unidos, as primeiras plantações de Sauvignon Blanc foram introduzidas na adega Cresta Blanca em Livermore Valley, na Califórnia. Devido à aversão dos consumidores americanos pelo caráter herbáceo e alta acidez, os produtores desenvolveram um estilo chamado Fumé Blanc. Os vinhos são mais maduros, encorpados, enriquecidos por estágio em carvalho e muitas vezes contêm açúcar residual. Segundo a Universidade de Adelaide, existem cerca de 6.600 ha de Sauvignon nos EUA, principalmente em Sonoma, Napa e Vale Central. O Estado de Washington faz bons exemplos, mas é no Vale de Santa Ynez que o efeito do nevoeiro ajuda refrescar o clima e criar Sauvignon Blanc com mais delicadeza, tensão e frescor. Entre os melhores exemplos encontram-se Araujo Eisele, Chalk Hill, Duckhorn e Robert Mondavi To Kalon, um dos melhores exemplos de Sauvignon Blanc do mundo. Logo ao norte, no Canadá, bons exemplos de Sauvignon podem ser encontrados na Península de Niágara e na Colúmbia Britânica, como Clos du Soleil e Burrowing Owl Estate Winery.
O Sauvignon Blanc é uma das castas brancas mais importantes do Chile com 15.200 ha plantados, embora historicamente a varietal tenha sido confundida com Sauvignon Vert (Muscadelle) e com Sauvignonasse (Friulano na Itália). Essas castas ainda representam uma proporção significativa das plantações em Curicó e Maule e estão sendo gradualmente substituídos pelo verdadeiro Sauvignon Blanc. Em termos de estilo, os vinhos tendem a mostrar notas tropicais e sabores herbáceos geralmente com mais corpo do que os exemplos da Nova Zelândia. Os melhores vêm do Vale de Leyda e Vale de San Antonio, a poucos quilómetros do Oceano Pacífico. Entre os melhores produtores do Chile estão Casa Marin, Amayna, Montes, Matetic, Errázuriz, De Martino e Laberinto. Apesar de ser uma varietal menos difundida na Argentina, produtores como Zorzal, Pulenta Estate, Doña Paula e Finca Sophenia merecem reconhecimento. No Brasil, a casta mostra potencial na região de altitude de Santa Catarina com a Vinicola Thera a produzir um exemplo convincente.

Niagara, EUA

…e no resto do Mundo

A África do Sul tem uma longa história com Sauvignon Blanc. O estilo combina a exuberância de frutas dos vinhos do novo mundo com a elegância do velho mundo. As plantações estão distribuidas por várias regiões, especialmente Stellenbosch, Walker Bay e Elgin, totalizando cerca de 9.500 ha. Alguns dos melhores produtores são Mulderbosch, Klein Constancia, Neil Ellis, Strandveld, De Grendel, Diemersdal, Steenberg e Graham Beck. Na Austrália, o Sauvignon Blanc tem-se tornado popular devido ao sucesso da Nova Zelândia. Apesar da maioria das regiões serem demasiadamente quentes, existem cerca de 7.000 ha plantados. Um dos melhores é feito por Shaw e Smith em Adelaide Hills. Outros bons exemplos podem ser encontrados na Tasmânia e partes mais frias de Victoria e New South Wales. A parte oeste do país é responsável por um estilo distinto, onde a Semillon frequentemente faz parte do lote ajudando produzir vinhos mais encorpados como Cape Mentelle. A Itália possui cerca de 4.000 ha de Sauvignon Blanc, principalmente espalhados no nordeste do país, Alto Adige e Friuli. A Espanha tem uma área de plantação semelhante à Itália, apesar de que as condições climáticas sejam demasiadamente quentes para essa varietal. Existem plantações principalmente em em Castilla-La Mancha e Rueda. Outras regiões da Europa onde Sauvignon é encontrado inclui Roménia, Moldávia, Suíça, Eslovênia, República Checa, Rússia e Alemanha, especialmente em Württemberg, Franken e Pfalz. A região de Styria na Áustria é responsável por vinhos subtis e cremosos e a Hungria é fonte de Sauvignon Blanc de boa qualidade e preços acessíveis.

Nova Zelândia

A Sauvignon Blanc e o estilo português

Dados do Instituto da Vinha e do Vinho mostram que a parcela mais antiga de Sauvignon Blanc em Portugal foi estabelecida pela Sociedade Agrícola da Quinta da Lagoalva de Cima em 1977. Actualmente existem 1.305 ha espalhados pelo país, predominantemente no Alentejo (383 ha), Tejo (328 ha) e Lisboa (222 ha). O desejo de explorar o potencial da casta dentro das características climáticas portuguesas foi um dos motivos que levaram produtores a plantar Sauvignon Blanc. Francisco Baptista, enólogo e sócio da empresa Saven, explica que a Sauvignon Blanc em Barcelos, região dos Vinhos Verdes, apresenta características similares às da baía de Arcachon, em Bordéus. Devido à sua proximidade ao oceano atlântico e solos mais profundos origina vinhos frescos. Outro motivo do interesse pela casta foi tentar capitalizar na oportunidade comercial. Paula Fernandes, enóloga residente da Quinta da Boa Esperança, explica que no início do projeto, pensando na internacionalização da marca, optaram em plantar a casta pelo facto de ser reconhecida internacionalmente acreditando que poderia ser uma vantagem comercial.
Vasco Rosa Santos, enólogo responsável pelos vinhos do Monte da Ravasqueira refere que o estilo do Sauvignon da casa é fruto da experiência adquirida em adegas Neo-Zelandesas. O objectivo é simplesmente reflectir as características da casta e buscar um perfil fresco com notas herbáceas, caracter cítrico e mineral. Paula Fernandes cita a região de Sancerre no Vale de Loire como inspiração e adianta que em Lisboa os solos argilo-calcáreos e o clima moderado com influência atlântica imprimem aos vinhos estrutura, acentuada acidez e mineralidade. Pedro Lufinha, Director Geral da Quinta da Alorna, diz que não procura estilo específico, mas gosta dos componente exóticos, tropicais e, ao mesmo tempo, aprecia o lado vegetal e mineral da casta. O importante é que o vinho seja harmonioso. Para isso, o controlo da maturação e o momento da colheita da Sauvignon Blanc, mais do que em muitas outras castas, é crucial, explica Pedro. Após a vindima manual as uvas são desengaçadas e vão directamente à prensa sem qualquer maceração pelicular. A fermentação é mantida numa temperatura de cerca de 17 a 18ºC e feita com leveduras selecionadas que possuem melhor capacidade de revelar os tióis. O vinho permanece em inox até a data do enchimento.
Na adega do Monte da Ravasqueira, o enólogo Vasco Rosa Santos prefere inibir as enzimas responsáveis pela oxidação dos compostos aromáticos, usando baixa temperatura desde a hora do esmagamento. A temperatura de fermentação é cerca de 4 ou 5 graus mais baixa em comparação ao Sauvignon Blanc da Quinta da Alorna. Subsequentemente as borras finas são colocadas em suspensão para dar melhor textura e corpo ao vinho.

Sancerre, França

Um sucesso no mercado

No que respeita ao desempenho comercial dos Sauvignon Blanc portugueses, Francisco Baptista mostra-se positivo e explica que no mercado nacional o vinho é vendido maioritariamente em locais turísticos principalmente Algarve e Lisboa, mas 88% da produção é comercializada no mercado externo. O mesmo acontece com o Monte da Ravasqueira Sauvignon Blanc onde 60% da produção é vendida no mercado externo, especialmente Irlanda, Polónia e Rússia. Ao invés, tanto as vendas da Quinta da Boa Esperança como da Quinta da Alorna são dominadas pelo mercado nacional, 80% e 75% respectivamente. Devido ao seu potencial gastronómico e à facilidade do consumidor estrangeiro em identificar a casta, o vinho é comercializado principalmente no canal HORECA. Comparando a qualidade do Sauvignon Blanc português com de outros países, Vasco Rosa Santos considera a qualidade muito boa e realça o perfil diferente do dos famosos vinhos do Loire e Marlborough. Na sua opinião, o Sauvignon Blanc nacional raramente é influenciado por madeira, portanto é mais acessivel. Paula Fernandes está convencida que Portugal tem capacidade de produzir excelentes Sauvignon Blanc. Apesar de ser um país de pequena dimensão, mostra condições distintas e cada uma dessas regiões possui microclimas onde podem ser produzidos Sauvignon Blanc de estilo “Novo Mundo”, com aromas tropicais, untuosos e com acidez menos marcada, até vinhos com perfil mais clássico, como os do Vale de Loire, com mineralidade, acidez vincada e aromas elegantes e cítricos. Sendo assim é capaz de agradar qualquer tipo de consumidor, o que se torna uma vantagem competitiva.

Loire, França

O futuro

Levando em consideração tendências comerciais e ameaças trazidas pelas mudanças climáticas, Pedro Lufinha faz uma análise sensata, declarando que a casta não deixará de existir, mas também não será auspiciosa tendo em conta o vasto património vitícola e a preferência do consumidor português pelas castas autóctones que o país oferece. Paula Fernandes considera o Sauvignon como uma casta de clima fresco e acredita no seu poder de adaptabilidade. Sendo assim a tendência será sua transição para latitudes mais elevadas e locais mais próximos do mar, onde as amplitudes térmicas são menores e o índice de humidade mais elevado, como é o caso da região de Lisboa.
Apesar dos Sauvignon Blanc portugueses ainda não apresentarem uma personalidade definida, ao contrário dos clássicos franceses ou neo-zelandeses, a qualidade dos Sauvignon Blanc nacionais, de forma geral, é solida. Além de satisfazer a demanda do mercado interno é capaz de aventurar-se no comércio internacional. Mas embora sejam elaborados com competência, ainda não estão no patamar de qualidade dos grandes clássicos mundiais. De forma geral, os estilos ainda são muito heterogéneos e manifestam sobretudo a filosofia do enólogo. Até vinhos da mesma região reflectem mais as decisões tomadas na adega do que o terroir que lhes deu origem. Produtores que apostaram na casta precisam continuar valorizando a qualidade acima de tudo, para evitar competir com Sauvignon Blanc de países onde os custos de produção permitem atingir faixas de preço inferiores, como é o caso do Chile. Para assegurar sucesso ao longo prazo, é preciso ir em busca de uma personalidade própria. E para isso é necessária paciência e muito trabalho. Trabalho que vai gerar conhecimento e confiança. Confiança para interferir menos e fazer o máximo para que a casta consiga expressar da melhor forma o terroir português.

Edição Nº26, Junho 2019

A Escolha do Mestre – Álcool e tendências de consumo

O sector do vinho está a ser alvo de várias campanhas internacionais que apontam o álcool como malefício e não distinguem entre o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e a apreciação responsável de um vinho. Uma boa parte dos produtores reage, fazendo vinhos com menor teor alcoólico, mas outros apostam precisamente no contrário, para criar […]

O sector do vinho está a ser alvo de várias campanhas internacionais que apontam o álcool como malefício e não distinguem entre o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e a apreciação responsável de um vinho. Uma boa parte dos produtores reage, fazendo vinhos com menor teor alcoólico, mas outros apostam precisamente no contrário, para criar diferenciação.

TEXTO Dirceu Vianna Junior MW

FOTOS Arquivo

Por séculos, o álcool tem desempenhado um papel importante nas nossas interações sociais auxiliando pessoas a relaxarem, diminuindo inibições, ajudando a criar relacionamentos e melhorando amizades. É provável que o consumo de bebidas alcoólicas se tenha originado no período Paleolítico. De acordo com a revista National Geographic, a evidência mais segura e antiga de consumo de bebida alcoólica vem de Jiahu na China por volta de 7000 a.C onde agricultores fermentavam uma mistura entre arroz, uvas, bagas de espinheiro e mel em potes de barro. O álcool teve um papel considerável no desenvolvimento da nossa cultura, influenciando diversos aspectos incluindo linguagem, arte e religião.

Nos últimos tempos, porém, o sector do vinho e das bebidas alcoólicas tem estado sob assédio. Essa perseguição vem acontecendo gradualmente e parece ter acelerado recentemente. De acordo com as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS), os homens devem limitar o consumo de álcool a quatro unidades por dia e as mulheres não devem ultrapassar três, o que equivale a um copo grande de vinho. Recentemente, Sally Davies, Chief Medical Officer da Inglaterra, afirmou que não existe nível seguro para o consumo de álcool e criticou os estudos que defendem os benefícios do vinho. Esses sinais apontam para uma campanha que visa transformar o álcool em algo negativo, ao exemplo do que foi feito com o tabaco nas últimas décadas. Esse grupo ‘anti-álcool’ cria mensagens tentando minimizar os benefícios do consumo moderado de álcool para a saúde como, por exemplo, estudos que mostram redução no risco de morte por doença cardíaca em cerca de 15 a 30%, além de outras vantagens. Décadas de evidências mostrando que pessoas que bebem moderadamente vivem mais do que abstémios estão sendo gradualmente corroídas. Kari Poikolainen, doutor em ciências médicas na Universidade de Helsínquia, examinou décadas de pesquisas sobre os efeitos do consumo de álcool e acredita que beber apenas se torna prejudicial quando o consumo é excessivo. Na sua opinião, as evidências mostram que o consumo moderado é melhor que abster-se. No entanto, beber demasiadamente é mais prejudicial à saúde do que a abstinência. Atualmente existe um plano de acção endossado pelos 53 membros europeus da OMS visando reduzir consumo de álcool e em Portugal o Plano Nacional para a Redução dos Comportamentos e as Dependências 2013-2020 acompanha essa estratégia. Embora seja indispensável alertar os cidadãos contra o uso nocivo do álcool, é importante fazer distinção entre as mensagens negativas provenientes de neo-proibicionistas que visam mudar as normas sociais e reduzir a aceitação do álcool na sociedade e uma mensagem sensata sobre os perigos do consumo excessivo. Esse grupo adopta uma abordagem radical e trata todas bebidas alcoólicas da mesma forma, apesar de o vinho ser consumido de maneira diferente do que gin, a vodka e tequila. O vinho é frequentemente consumido durante refeições. Raramente é o combustível que incendeia os centros das cidades por jovens saindo de bares e clubes nas primeiras horas do dia causando barulho, confusão e sujidade.

MUDANÇAS NA VINHA E NA ADEGA

Existem evidências que apontam para uma gradual mudança no comportamento das pessoas entre 25 e 44 anos. Brandy Rand, diretor de marketing da IWSR, responsável por fornecer estatísticas sobre o consumo global de bebidas alcoólicas, acredita que esse segmento está procurando reduzir o álcool que consome. De acordo com a Wine Intelligence, um estudo dos mercados do Reino Unido, EUA, Canadá, Suécia, Nova Zelândia e Austrália, indica que um terço dos consumidores de vinhos premium tentaram moderar o consumo de álcool nos últimos meses. Uma das opções está na busca de vinhos com menor graduação alcoólica. Além de menos intoxicantes, atraem menos impostos. Na Noruega, o imposto é calculado dependendo do teor alcoólico. Nos EUA, vinhos com mais de 16% atraem maiores impostos, o que também é o caso na Europa onde vinhos com mais de
15% são punidos. Esses são motivos pelos quais algumas empresas estão lançando vinhos com menor graduação. A Cooperativa de Plaimont, no sudoeste da França, lançou recentemente um Côte de Gascogne com 9% de álcool. “A demanda por vinhos de baixo teor alcoólico é forte”, diz Olivier Bourdet-Pees, director administrativo da empresa. A Wine Intelligence estudou onze importantes mercados de vinho para entender oportunidades para vinho sustentáveis, orgânicos e de baixa graduação e revelou que a maior oportunidade para vinhos com baixo teor alcoólico se encontra na Nova Zelândia e Austrália, em contraste com a Alemanha, Suécia e Japão onde a oportunidade é menor. Em termos de produção, existem várias maneiras de diminuir a graduação alcoólica de um vinho. No vinhedo, a escolha do material vegetativo, incluindo clones, capazes de atingir a maturação com menos açúcar é vital. A estratégia de nutrição da planta e gestão da copa podem exercer grande influência. Optar por um rendimento maior e antecipar a colheita ajudam reduzir os níveis, embora essas opções, quando não bem geridas possam causar efeitos adversos na qualidade do produto final.

Na adega, condições específicas de fermentação, tratamentos do mosto e o uso de leveduras selecionadas podem causar um impacto significativo. Por exemplo, Ionys, uma levedura descoberta pela empresa canadense Lallemand, é capaz de realizar a total conversão alcoólica atingindo redução de até 0,8% de álcool. Fazer a sangria das cubas também ajuda, pois o vinho lágrima contém mais açúcar, deixando para trás mosto com potencial alcoólico menor. Outras opções incluem fazer lote com componentes menos alcoólicos, cessar a fermentação deixando uma fracção do açúcar residual ou até mesmo diluir com água onde essa técnica é permitida como é o caso na Califórnia. Há também o uso de tecnologia, como Osmose Inversa ou Cones Giratórios que diminuem a graduação alcoólica. Na Herdade do Rocim, Pedro Ribeiro, administrador e enólogo, explica que as estratégias para fazer um vinho com a graduação alcoólica mais baixa é resultado de duas opções naturais, colheita antecipada e o facto da videira ter porte retumbante promovendo o ensombramento dos cachos, o que gera uvas com menos açúcar. Em busca de vinhos que são naturalmente mais baixos em álcool, o Programa de Pesquisa da Nova Zelândia é uma parceria entre produtores e o governo que visa o desenvolvimento de vinhos de alta qualidade que sejam naturalmente baixos em álcool. O investimento de NZD 17 milhões de dólares ao longo de 7 anos tem como objetivo aperfeiçoar o cultivo de uvas com maturação perfeita cujo potencial alcoólico seja 30% inferior. Os produtores neozelandeses, como Mt Difficulty Wines, Pernod Ricard e Villa Maria, estão entre as empresas envolvidas que tem como objetivo fazer da Nova Zelândia o líder dessa categoria até 2025.

E A QUALIDADE, COMO É?

Embora exista uma certa tendência para valorizar vinhos mais frescos, a maioria dos produtores busca a qualidade acima de tudo e a graduação alcoólica é apenas consequência. Não há dúvida que o desenvolvimento do conhecimento de viticultura nas últimas duas décadas tem ajudado viticultores a manter as uvas na vinha por mais tempo em busca de maturação fenólica. No entanto isso gera níveis de açúcar mais altos e consequentemente teores alcoólicos elevados. Esse é um tema que desafia produtores em muitas partes do mundo, principalmente nas regiões mais quentes. Novas técnicas de gerenciamento da canópia também exercem um impacto considerável. Copas abertas concedem maior incidência solar à planta e a prática da remoção das folhas ao redor dos cachos melhora a exposição. Isso, por sua vez, aumenta o açúcar. Além dessas técnicas, certas castas como Viognier e Zinfandel, são reconhecidas pelas suas capacidades de acumular altos níveis de açúcar. António Aguiar, sócio-gerente da Brites Aguiar Lda, explica que a primeira versão do vinho Bafarela 17 surgiu em 2004 quando a colheita de uma das parcelas aconteceu acidentalmente tarde. Apesar da análise apontar teor alcoólico de cerca de 14%, havia grande percentagem de uvas passas no cachos que se foram abrindo durante o processo fermentativo, resultando num vinho com 17%, eis o nome. Outro exemplo de um vinho português com alta graduação alcoólica é Carmim Primitivo tinto, com 16%. Um vinho composto por uvas de vinhedos velhos de Alicante Bouschet, Trincadeira, Aragonez e Castelão. Tiago Garcia, enólogo do Grupo CARMIM, aponta a baixa produção (3 ton/ha) e um ano quente (2017) como factores principais que deram origem ao estilo. O vinho foi elaborado em lagares com pisa a pé, leveduras indígenas e sem estágio em madeira. O teor alcoólico de centenas de vinhos testados pelo Australian Wine Research Institute subiu de uma média de 12,4% em 1984 para 14,2% em 2002 e essa tendência continua. Há cinquenta anos atrás, muitos vinhos de Bordéus tinham graduação alcoólica de 10,5%, hoje, grande parte excede 13,5%. Além de exercer impacto na nossa saúde, vinhos com álcool mais elevado, de forma geral, não harmonizam tão bem com certos pratos mas isso não parece incomodar os consumidores de Bafarela 17 cujas 13.333 garrafas da 1ª edição se esgotaram em apenas duas semanas. António Aguiar sente entusiasmo por parte do consumidor e acredita que esse estilo terá futuro duradouro. Por outro lado, na opinião de Pedro Ribeiro os mercados mais sofisticados valorizam graduação alcoólica mais baixa.

O consumo de álcool vem diminuindo, excepto nos grupos com maiores rendimentos, que representam a maior parte dos consumidores de vinho. O grupo anti-álcool que não faz distinção entre as diferentes formas de álcool e está constantemente criando mensagens negativas e confusas sobre o seu consumo. O sector precisa fazer mais para educar consumidores sobre os aspectos positivos do consumo moderado de vinho para a saúde. Sempre haverá um pequeno mercado para vinhos com alto teor de álcool, especialmente em países onde a cultura do vinho ainda está em fase de desenvolvimento. Em países onde a comercialização e o consumo de vinhos tem um maior histórico, como é o caso da maioria dos países europeus, é provável que os consumidores continuem reduzindo o consumo de álcool no futuro e essa tendência favorecerá estilos de vinhos mais frescos, mais leves, mais fáceis de beber e com menor teor alcoólico.

 

Edição Nº25, Maio 2019

Castas raras, orgulho de Portugal

[vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Em 1899, o escritório responsável pelas propriedades intelectuais no Reino Unido declarou: “Tudo o que pode ser inventado, já foi inventado”. Uma declaração infeliz e tão equivocada quanto um documento publicado pela empresa americana de comunicação Western […]

[vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Em 1899, o escritório responsável pelas propriedades intelectuais no Reino Unido declarou: “Tudo o que pode ser inventado, já foi inventado”. Uma declaração infeliz e tão equivocada quanto um documento publicado pela empresa americana de comunicação Western Union, que dizia em 1876: “O telefone tem muitos defeitos. Esse aparelho não tem valor nenhum”. As pessoas muitas vezes não são capazes de dar valor à certas coisas até que seja tarde demais. No mundo do vinho não é diferente.

TEXTO Dirceu Vianna Junior MW

Os produtores de vinho usam apenas uma minúscula proporção da diversidade genética que existe a nível global, o que também é o caso de outros produtos como banana, café e cacau. Apenas 1%, ou seja, doze das cerca de 1.100 castas mais cultivadas para a produção de vinho, ocupam cerca de 45% das vinhas no mundo. Entre essas estão o Cabernet Sauvignon, Merlot, Tempranillo, Syrah, Grenache e Pinot Noir. Em países como Chile, Austrália ou Nova Zelândia essa percentagem pode representar mais de 80% dos vinhedos. Caso mais extremo ainda é a China, onde 75% dos vinhedos destinados à produção de vinho são plantados com apenas uma varietal, a Cabernet Sauvignon. Fora desse grupo existe um número grande de castas como Carménère, Gamay, Sangiovese, Malbec, Nebbiolo e Zinfandel, entre outras, que desempenham um papel importante no mundo da vitivinicultura. São castas plantadas em múltiplas regiões, representando vários estilos, comercializadas internacionalmente e que adicionam diversidade ao mundo do vinho. Para além dessas, existe um número elevado de castas que são plantadas em áreas mais restritas. São varietais frequentemente cultivadas em âmbito local e raramente são comercializadas fora da região onde são plantadas. A maioria dessas castas não aparece no rótulo e, por esse motivo, raramente estão no radar dos profissionais da área, muito menos do consumidor.
Itália afirma que possui o maior número de varietais autóctones em todo o mundo. De acordo com o Ministero delle Politiche Agricole, Alimentari e Forestali (MiPAAF) existem 350 variedades oficialmente autorizadas para a produção de vinho na Itália. Fontes alternativas indicam que o número de varietais plantadas na Itália excede 500. O país possui varietais ecléticas interessantes como Nerello Mascalese do sul da Itália, Frappato da Sicília, de corpo leve, taninos sedosos e aromas de frutas do bosque e toques florais. Existe também Oseleta, uva tinta que foi salva da obscuridade na década de 1980 pelo renomado produtor Masi e também Ciliegiolo, cultivada no centro da Itália e com características similares ao Sangiovese. Levando em consideração a área de superfície da Itália, que segundo o World Atlas é 301.340 quilómetros quadrados, e comparando com o número de varietais plantadas, a Itália possui uma proporção de 1,1 casta para cada 1000 quilómetros quadrados de superficie. Comparando com Itália, Portugal tem cerca de 250 varietais plantadas numa superfície de 92.090 quilómetros quadrados, o que resulta numa relação de 2,7 variedades por 1000 km quadrados. Fazendo essa análise e levando em consideração o tamanho do país, é possivel atribuir à Portugal a honra de ser o país que possui maior grau de diversidade de varietais no mundo.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][nectar_animated_title heading_tag=”h6″ style=”color-strip-reveal” color=”Accent-Color” text=”Um património único”][vc_column_text]A lista de castas portuguesas é imensa e inclui varietais que possuem excelente potencial. Grande parte dessas varietais raramente são encontradas fora da Peninsula Ibérica. Muitas delas são cultivadas exclusivamente em Portugal, proporcionando ao país um valioso diferencial. Entre as castas raras de grande potencial podemos citar Tinta Francisca, Tinta Pinheira, Alvarelhão, Tinta Miúda, Bastardo, Tinta da Barca e Tinta Negra. Essa última, por exemplo, corresponde a 85% das vinhas da Ilha da Madeira. É uma casta notavelmente produtiva. De acordo com Diana Silva, a visionária fundadora do projeto “Ilha” na Madeira, a casta não é tão bem conceituada quanto merece pois os produtores raramente optam por diminuir o rendimento em busca de qualidade. Na opinião de Diana Silva, é necessário mudar a mentalidade dos produtores para reduzir o rendimento para quatro toneladas por hectare, de forma a que a Tinta Negra consiga expressar a delicadeza e elegância que Diana compara com Pinot Noir, exibindo notas de frutas vermelhas, pétalas de rosa e cereja, aliada à característica principal que é a sua frescura. Outro exemplo de uma casta rara cujo potencial é auspicioso inclui a Tinta Miúda, também conhecida como Graciano. Ana Cardoso Pinto, produtora e responsável pela Quinta do Pinto, em Alenquer, explica que é uma casta de ciclo tardio e rendimento baixo (4 ton/ha), mas abundantemente expressiva, com bela acidez, taninos sedosos e frutas de bosque, notas de especiarias, pimenta e frutas azuis como o mirtilo. Com o passar dos anos, desenvolve tons terrosos e notas florais. Quando envelhecida em madeira, a Tinta Miúda pode exibir notas de especiarias doces juntamente com toques chocolate e café. É uma casta com muita personalidade, tal como a Bastardo. Rita Marques, da empresa familiar Conceito, explica que essa é uma casta precoce, pouco produtiva e sensível a doenças. Exige cuidado na adega pois o mosto tem a propensão a oxidar com facilidade. Paradoxalmente, na hora da vinificação tem tendência à redução e tipicamente não responde muito bem ao estágio em madeira. Apesar de pouca cor, os vinhos possuem uma grande intensidade aromática incluindo nuances de pimenta branca, frutas vermelhas e apontamentos florais. Na boca é um vinho volumoso, com taninos arredondados numa estrutura firme. São vinhos abertos, leves, descomplicados e alegres, mas onde não falta complexidade nem personalidade, afirma Rita.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][image_with_animation image_url=”35312″ alignment=”” animation=”Fade In” border_radius=”none” box_shadow=”none” max_width=”100%”][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][nectar_animated_title heading_tag=”h6″ style=”color-strip-reveal” color=”Accent-Color” text=”Competir e vencer pela diferença”][vc_column_text]É verdade que, dados os avanços em viticultura e melhorias da tecnologia na adega, podemos dizer que a qualidade do vinho em geral nunca foi melhor. No entanto, neste oceano de vinho há uma enorme quantidade de Chardonnays comerciais insípidos e Cabernets ignóbeis. Os estilos de vinho estão ficando cada vez mais homogéneos. Basta comparar vinhos baratos do Chile, Argentina, África do Sul e Austrália para notar que está ficando cada vez mais difícil distinguir as suas origens. O negócio do vinho, especialmente para empresas multinacionais de grande porte, é desproporcionalmente voltado à produção e comercialização de produtos repetitivos, não originais e sem inspiração.
Essa é uma das razões pelas quais a geração mais jovem em vários cantos do mundo está gradualmente optando por beber cervejas artesanais e gin. Além de oferecer qualidade e óptimo custo-benefício, é essencial cativar consumidores com histórias interessantes pois o que a geração mais jovem está buscando são produtos sustentáveis e experiências autênticas.
Os produtores portugueses que mostraram uma determinação heróica ao longo dos anos, preservando uma herança de mais de 250 variedades de uvas possuem diversidade e os atributos comerciais necessários para capitalizar e fazer crescer sua quota de mercado mesmo em vista de um ambiente comercial hostil e demasiadamente competitivo.
A maioria das empresas portuguesas não tem escala para competir com grandes vinícolas internacionais, que visam comercializar grandes volumes. Isso não deve ser considerado uma desvantagem pois essa estratégia é perigosa, muitas vezes levando à baixa rentabilidade para todos os envolvidos. Além do facto de que a qualidade do produto muitas vezes sofre devido à pressão comercial para atingir determinados preços de venda.
É uma guerra que ninguém sai ganhando, incluindo o consumidor que acaba obtendo um produto de baixa qualidade. Os vinhos portugueses não devem ser vistos simplesmente como uma mercadoria qualquer, como acontece com Pinot Grigio, Sauvignon Blanc do Chile ou Malbec baratos da Argentina. Em muitos casos essa homogeneidade e falta de diferenciação conduz a uma redução de preços.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][nectar_animated_title heading_tag=”h6″ style=”color-strip-reveal” color=”Accent-Color” text=”Que imagem para Portugal?”][vc_column_text]Ana Cardoso Pinto acredita que as ‘castas raras’ poderiam ajudar Portugal a construir a sua imagem. ‘Eu acho que temos que nos vender pelas castas raras que possuimos’, afirma. Rita Marques assegura que, à medida que os clientes em todo o mundo conhecem melhor os vinhos portugueses, compreendem que não é pelas castas comuns que o vinho português se define, antes pelas suas castas autóctones e pelos lotes de várias castas. Pequenos engarrafamentos servem para mostrar a diversidade e a originalidade dos vinhos Portugueses. Diana Silva defende que Portugal não pode competir com as castas comuns do novo mundo. Portugal, pelo seu tamanho, deve vencer pela qualidade e diferenciação dos seus produtos, incluído neste caso as castas raras.
Com ferramentas tão poderosas, os produtores têm a oportunidade de capitalizar através da diferenciação. Basta ter a confiança e coragem de, quando se deparar com vinhos de castas exóticas de qualidade e com personalidade, como os vinhos abaixo relacionados, ter a convicção de engarrafar pelo menos parte da produção como varietal e não perdê-las unicamente em lotes. Vinhos como esses, aliados à uma história cativante, representam um diferencial excepcional que muitos países desejam, mas poucos possuem. Certamente será até mais desafiador do que vender vinhos elaborados com castas conhecidas como Cabernet Sauvignon, Shiraz ou Merlot, mas a longo prazo não há absolutamente dúvida alguma que este é o caminho. Não há necessidade de inventar coisas novas, basta apreciar o que já existe. Não há necessidade de seguir tendências que vêm e vão, basta saber dar valor a esses tesouros que já estão disponíveis.
Além de confiança, é necessária uma dose de orgulho. Orgulho do trabalho bem feito e também orgulho do que não se faz: vinhos homogêneos e sem inspiração não devem ser o caminho que um país com tanta diversidade de castas como Portugal deve trilhar. Produtores que optam por explorar a oportunidade que oferecem as castas raras, estarão reforçando a imagem de Portugal como um país onde reina não somente a qualidade, mas também a diversidade. Devem fazer isso com convicção e orgulhar-se disso.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_text_separator title=”Em Prova” color=”black”][vc_column_text]

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Edição Nº23, Março 2019

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Blanc de Noir: O mundo das estrelas

O desenvolvimento dos espumantes brancos feitos a partir de uvas tintas é ainda relativamente recente em Portugal, mas parece constituir uma via cada vez mais apetecível para os produtores nacionais. A rica história do Blanc de Noir em Champagne atesta a validade do conceito. TEXTO Dirceu Vianna Junior MW FOTOS Ricardo Palma Veiga Comecemos pelo […]

O desenvolvimento dos espumantes brancos feitos a partir de uvas tintas é ainda relativamente recente em Portugal, mas parece constituir uma via cada vez mais apetecível para os produtores nacionais. A rica história do Blanc de Noir em Champagne atesta a validade do conceito.

TEXTO Dirceu Vianna Junior MW
FOTOS Ricardo Palma Veiga

Comecemos pelo princípio, com a origem e contexto histórico dos blanc de noirs. A região de Champagne, situada no nordeste da França, é sinónimo de espumantes de qualidade. A associação é tão forte que muitos associam esse local com a criação do estilo; no entanto, documentos encontrados na Abadia de St Hilaire, em Limoux, sul da França, datados no ano de 1531, constituem as evidências mais antigas associadas a este estilo de vinho. O primeiro espumante da região de Champagne tem origem em 1690. Conta-nos a história que um monge benedictino foi ouvido chamando entusiasticamente os seus companheiros para o porão da Abadia de Hautvillers sob o pretexto: ‘‘Irmãos venham, estou vendo estrelas”, referindo as pequenas borbulhas evidentes no vinho.
A verdade é que Champagne não foi um produto inventado. O processo foi consequência de uma evolução que durou vários anos e contou com contribuições de várias pessoas. O monge beneditino, conhecido como Dom Perignon, foi talvez o indivíduo que mais contribuiu para o desenvolvimento desse estilo. Pelo facto de gostar do trabalho associado à terra, o monge era um viticultor prolífico e expandiu o conhecimento sobre a poda das vinhas na região. Sendo um estudioso e um meticuloso profissional, Dom Perignon desenvolveu aspectos que ajudaram a compreensão do terroir de Champagne, selecionando as melhores parcelas e identificando onde determinadas varietais poderiam obter os melhores resultados.
Além disso, tinha muito cuidado para manter as uvas intactas e, por esse motivo, preferia que a colheita fosse executada na parte da manhã, em condições mais frescas, seguida de um processo de selecção onde uvas imperfeitas eram rejeitadas. Dom Perignon preferia que o transporte dos vinhedos à adega fosse feito por mulas e burros, citando que esses animais moviam-se mais suavemente, evitando assim a possibilidade de danificar as uvas.
Parecendo entender o impacto positivo do envelhecimento, Dom Perignon optava por deixar os seus vinhos descansando por mais tempo do que os de qualquer outro produtor na época e o resultado era obviamente superior. Numa carta escrita em Novembro de 1700 por Bertin de Rocheter, comerciante da região, destinada a M. d’Artagnan, oficial do exército, ele descreve a qualidade superior dos vinhos de Hautvillers comparando o preço médio de um produto local com o preço de um vinho feito por Dom Perignon, que era quatro vezes mais caro, atingindo, na moeda da época, 900 libras.
Nem sempre era possível obter boa qualidade, principalmente no que diz respeito aos vinhos tintos, devido à falta de maturação. Até então, devido à falta de tecnologia e know-how, não era possível fazer vinhos brancos através do uso de uvas tintas. Os vinhos produzidos na região eram denominados “Vin Gris”. Esses não eram cinza como o nome sugere, mas rosa pálido e ligeiramente turvo. Entre as contribuições feitas pelo monge beneditino, uma das mais significantes foi ter sido o primeiro a produzir um vinho verdadeiramente branco a partir de uvas tintas. A prensagem era feita o mais rápido possível, tentando minimizar a possibilidade de que o mosto fosse tingido pelos componentes fenólicos responsáveis pela cor dos vinhos rosé e tintos. A sua reputação em relação a esse assunto é incontestável. Documentos encontrados na vila de Aÿ, a poucos quilómetros de Hautvillers, na sub-região do Vale de la Marne, escritos logo após a sua morte, confirmam isso.

Blanc de Noirs vs Blanc de Blancs

Quando um vinho branco é produzido exclusivamente a partir de uvas tintas, o termo Blanc de Noirs, de origem francesa, é usado para descrever esse estilo. A polpa das uvas tintas, com poucas exceções, é de facto incolor e desde que o contacto entre o mosto e a pele seja mínimo, o resultado obtido é essencialmente um vinho branco, mesmo que a cor possa apresentar uma tonalidade rosada ou nuances de cobre devido à presença de pigmentos na pele.
Na boca, esse estilo de vinho tende a ser mais encorpado, denso e pesado e frequentemente exibe características de frutos vermelhos. O termo Blanc de Noirs é frequentemente associado com a região de Champagne, onde, entre alguns dos mais notáveis exemplos, é possível destacar Krug Clos d’Ambonnay, que tem origem num pequeno vinhedo murado de somente um hectare na vila de Ambonnay; e Bollinger ‘Vieilles Vignes Francaises’, feito pela primeira vez no ano de 1969 para comemorar o septuagésimo aniversário da Madame Bollinger. Este cuvée tem sido uma das referências em termos de estilo.
Em Champagne, as uvas em questão são Pinot Noir e Pinot Meunier. Noutras regiões produtoras existem uvas locais que podem substituir ou serem incluídas no lote, como, por exemplo, a varietal País no Chile, Cabernet Franc no Vale do Loire e Baga na Bairrada, entre muitas outras.

É possível encontrar excelentes Blanc de Noirs na maioria das regiões produtoras de vinho do mundo, como por exemplo Espanha (Juve y Camps), Itália (Contadi Castaldi), Inglaterra (Ridgeview), Alemanha (Schloss Vaux), EUA (Schamsberg), Austrália (Henschke), Nova Zelândia (Johanneshof), Chile (Bodegas RE) e Brasil (Cave Geisse).
Blanc de Blancs é o estilo oposto ao Blanc de Noirs, uma vez que é feito exclusivamente a partir de uvas brancas. Celso Pereira, que desde 1989 é responsável pela produção da Caves Transmontanas, que inclui a marca Vértice, descreve um Blanc de Blancs como um estilo mais linear, fresco e mineral. Por esse motivo, tende a ser apreciado por sommeliers e profissionais do vinho, embora possa parecer um pouco austero para consumidores iniciantes. Além de acompanhar aperitivos, esse estilo é adequado para harmonizações com pratos mais delicados, especialmente frutos do mar, devido ao seu frescor, tensão e características de salinidade. As melhores sub-regiões nos distritos de Champagne para Blanc de Blancs são a Côte des Blancs e Côte de Sézanne, onde a casta Chardonnay desenvolve-se distintamente bem, especialmente nos vilarejos de Avize, Chouilly, Cramant, Le Mesnil-sur-Oger, Oger e Oiry. Entre os exemplos mais notáveis destacam-se Krug Clos du Mesnil, Pol Roger Blanc de Blancs e Taittinger Comtes de Champagne.

Blanc de Noirs em Portugal

Em Portugal os registos históricos atestam que o primeiro espumante de método tradicional foi feito pelo engenheiro José Maria Tavares da Silva, na Escola Prática de Viticultura e Pomologia da Bairrada, em 1890, mas o período em que surgiu o primeiro Blanc de Noirs de Portugal é incerto. A Caves Messias parece ter sido um dos pioneiros desse estilo na década de 80, mas é provável que o enólogo da empresa naquela época, Adelino Pato Macedo, já utilizasse a casta Baga para lotes de espumantes vinificados no estilo Blanc de Noirs anteriormente a esse período. De facto, havia na altura muita procura para base de espumantes e em certos momentos não havia volume de castas brancas suficientes para a suprir.
Miguel Pereira, responsável comercial da Caves Messias, descreve o estilo Blanc de Noirs português como um espumante tipicamente robusto, potente, redondo, diferenciando-se sobretudo pela fruta vermelha, apresentando certa austeridade enquanto jovem e revelando textura mais palpável e complexidade com pouco tempo em garrafa. O que o torna perfeito para acompanhar canapés e pratos principais à base de aves ou peixes.
De acordo com Luís Pato, respeitado e carismático produtor da Bairrada que iniciou a sua carreira em 1980, a sua inspiração vem de Champagne. Resolveu fazer um Blanc de Noirs à base de Baga em 1990 e hoje elabora um estilo sem uso de sulfuroso ou qualquer adjuvante para retirar a cor. Na interpretação de Luís Pato, a casta Baga comporta-se de forma semelhante ao Pinot Noir e quando plantada em solos argilo-calcáreos pode desenvolver características similares aos bons espumantes da região de Champagne.
Apesar de o solo desempenhar um papel importante no estilo do vinho, existem uma série de parâmetros essenciais como, por exemplo, altitude e exposição. Celso Pereira descreve as condições naturais da vinha que foi plantada com Pinot Noir no Planalto de Alijó, com exposição nascente e altitude da ordem dos 610 metros, como factores críticos. O ciclo dessa parcela é curto. As vindimas ocorrem no final de Agosto, resultando em fruta com alta acidez e pH baixo, critérios fundamentais para elaboração de um vinho base para espumante de alta qualidade. Luís Pato descreve o seu Blanc de Noirs como um produto de um aproveitamento, visto que as uvas são oriundas de uma primeira vindima que é feita antecipadamente com o objetivo de reduzir a quantidade de cachos e melhorar a qualidade das uvas que serão destinadas ao vinho tinto. A primeira passagem é feita na época adequada para fazer espumantes, pois as uvas dispõem de mais acidez, mais leveza e menos aromas. Aromas delicados e frescor são vitais. Para o estilo Blanc de Noirs, a Cave Messias prefere a casta Baga oriunda de solos arenosos, que conferem intensidade da fruta adequada, aliada à leveza e ao frescor.

Os maiores desafios

Na adega, um dos maiores desafios durante a elaboração de um Blanc de Noirs, de acordo com Luís Pato, é conseguir um vinho base sem precisar de recorrer a processos como uso de carvão ou PVPP (Polivinilpolipirrolidona) para remover vestígios de cor. Celso Pereira aponta, entre os principais obstáculos, a extração e separação das diversas fracções ao longo do ciclo de prensagem, juntamente com o estágio, tanto em inox como em barricas usadas de 225 litros, como desafios permanentes. No entanto, explica que os desafios de um longo estágio, tanto na parte técnica quanto no esforço financeiro necessário, são uma das formas que encontra para diferenciar os seus produtos.
Fazer um vinho espumante diferenciado e de alta qualidade exige paciência e determinação, explica Celso Pereira. Os custos inerentes são elevados e por esse motivo comercializar um espumante que aparece no mercado nacional na faixa dos 50 euros nem sempre é fácil e em âmbito global acaba competindo directamente com um bom vinho da região de Champagne. Luís Pato explora, além da qualidade, o lado natural do produto, visto que não adiciona sulfitos e não corrige a dosagem antes de lançar o produto no mercado. Para Miguel Pereira a vantagem na hora da comercialização, mais do que ser um Blanc de Noirs, é ser um “Baga Bairrada”, pelo facto de ser uma categoria única.

Filosofias distintas resultam em vinhos bastante diferentes. Por um lado, esse aspecto enriquece a diversidade dos vinhos que Portugal tem a oferecer ao consumidor; mas, por outro, essa heterogeneidade de estilos torna a escolha complexa, pelo facto de essa categoria não oferecer um estilo consistente como acontece no caso de vinhos da região de Prosecco, Cava ou Champagne. Ainda existe um trabalho a ser feito em certos aspectos para que o consumidor venha a entender claramente o perfil do espumante português, o que tem a oferecer ao consumidor e a sua capacidade diferenciadora.
Existem exemplos de vinhos jovens, simples e refrescantes, como é o caso do espumante Baga Barrada da Caves Aliança, que certamente preenchem os requisitos de consumidores que buscam um produto bem feito, com boa relação entre custo e benefício. Espumantes como Muros Antigos Alvarelhão e Luís Pato Vinha Pan são exemplos de vinhos individuais, que demonstram criatividade e certamente poderão atrair a atenção de consumidores que buscam algo diferente e interessante para compartilhar com os seus amigos.
Ora, há evidência de que Portugal tem o terroir e a capacidade para produzir espumantes aptos a satisfazer até os paladares mais exigentes. Alguns desses Blanc de Noirs exibem qualidade e classe o suficiente que fariam até o próprio criador desse estilo sorrir e gritar aos quatro ventos: ‘‘Irmãos venham, estou vendo estrelas.”[/vc_column_text]

 

Edição Nº21, Janeiro 2019

 

Esquecidos e doces tesouros

[vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Portugal produz alguns dos vinhos doces mais reverenciados do mundo. Falo, naturalmente, dos vinhos licorosos, e em particular do Porto, Madeira ou Moscatel de Setúbal. Existe, porém, um estilo de vinho que é ainda mais desafiador para […]

[vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Portugal produz alguns dos vinhos doces mais reverenciados do mundo. Falo, naturalmente, dos vinhos licorosos, e em particular do Porto, Madeira ou Moscatel de Setúbal. Existe, porém, um estilo de vinho que é ainda mais desafiador para quem produz, mas infelizmente algo menosprezado pela maioria dos consumidores: são os vinhos doces de colheita tardia.

TEXTO: Dirceu Vianna Junior MW
FOTOS: Ricardo Palma Veiga[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/2″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]A legislação europeia estabelece que para um vinho ser considerado doce (doux, dolce, dulce, süss) deve ter no mínimo 45 gramas de açúcar por litro. O vinho doce pode ser obtido por meios naturais ou através de técnicas especiais, tanto no campo quanto na adega. Um dos principais métodos consiste simplesmente em realizar a colheita quando as uvas atingirem um nível de açúcar suficientemente elevado para o estilo determinado. Algumas variações desse método incluem concentração dos açúcares na uva por desidratação, botritização ou congelamento. Além disso, é possível obter um vinho doce estilo comercial e mais barato através de adição de mosto de uva a um vinho base.
A maneira mais comum de fazer vinho doce é colher as uvas mais tarde. Na medida que a colheita é prorrogada, o nível de maturação aumenta, elevando a quantidade de açúcar na fruta. Consequentemente, durante o processo de fermentação as leveduras não são capazes de transformar todo o açúcar em álcool, ou são forçadas a parar de converter açúcar em álcool através de uma redução da temperatura seguida por uma adição de sulfuroso, deixando uma proporção significativa de açúcar residual, obtendo assim doçura no produto final.[/vc_column_text][/vc_column][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/2″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][divider line_type=”No Line” custom_height=”20″][image_with_animation image_url=”32036″ alignment=”” animation=”Fade In” border_radius=”none” box_shadow=”none” max_width=”100%”][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Este método tem sido utilizado desde os tempos do império romano. Os gregos, no entanto, preferiam colher as uvas mais cedo para preservar o frescor e deixá-las secando ao sol por alguns dias, permitindo que as uvas desidratassem e assim concentrando o açúcar. Os vinhos doces eram mais apreciados em tempos antigos do que são hoje. Desde o século XVII, o negócio de vinhos holandês já estava intensamente envolvido no mercado de vinhos doces, comercializando vinhos da parte ocidental da França, Constancia e Tokaji. Na edição de 1961 da “Larousse Gastronomique” é possível observar um comportamento diferente em relação aos vinhos doces no passado recente. Durante banquetes que se seguiam a reuniões formais, oferecia-se não apenas um Bordeaux tinto, como Lafite, ou um vinho de alta qualidade do Vale do Rhône, como Hermitage, mas os convidados também podiam desfrutar de um Sauternes, que era oferecido ao mesmo tempo dos tintos quando o prato principal era servido.
A colheita tardia permite produzir vinhos intensos, concentrados e doces, como um Vendange Tardive da região da Alsácia, por exemplo. Após um determinado período na videira, e em condições favoráveis, o amadurecimento chega ao final e as uvas começam a murchar. Em certas partes do mundo, como Itália, Creta e Austrália, um efeito semelhante e alcançado torcendo os caules dos cachos para privá-los de seiva e deixando-os secar na videira. Com a perda de água a concentração de açúcar aumenta. Esse processo de passificação que acontece na própria videira é descrito em francês como “Passerilage”. Exemplo de um vinho feito dessa maneira é encontrado em Jurançon, no sudoeste do país, aos pés dos Pirenéus. Em Portugal, a Ervideira adota um método semelhante. De acordo com Duarte Leal da Costa, diretor executivo da empresa familiar, para fazer este vinho o processo de controlo de maturação é mais rigoroso e quando as uvas já estão em forma de passa, normalmente coincidindo com o início das primeiras chuvas, é feita a colheita. [/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Uma nobre podridão
Os vinhos doces feitos a partir de uva passificada na videira são procurados por enófilos e sommeliers e frequentemente atingem excelente nível de qualidade, mesmo que muitas vezes sejam menos complexos e possivelmente menos longevos do que vinhos feitos com uvas 100% afetadas pela Botrytis cinerea. O fungo também é conhecido como “pourriture noble” em França ou “edelfaüle” na Alemanha.
Quando a forma benevolente desse fungo afeta uvas brancas, maduras e não danificadas, especialmente variedades de pele fina como Semillon, Chenin ou Furmint, é responsável por alguns dos melhores vinhos doces do mundo. Para isso acontecer, é necessário reunir condições favoráveis, como o micro-clima de Sauternes, onde o fluxo do pequeno riacho de Ciron, que possui águas mais frias, se junta às águas mais quentes do rio Garonne, formando uma névoa que envolve as vinhas de manhã. Nessas condições, o fungo é capaz de penetrar a fruta, produzindo canais microscópicos na pele. Subsequentemente o sol e calor do meio do dia eliminam a névoa e incentivam a evaporação da água através dos pequenos orifícios que foram feitos na pele. Esse processo leva normalmente entre três e dez dias para se desenvolver, dependendo das condições locais e especificas de cada colheita. No Vale do Loire, é possível encontrar essas condições em redor das vilas de Quarts de Chaume, Layon, Bonnezeaux, Vouvray e Montlouis. Em Bordeaux esse micro-clima pode ocorrer nas comunidades de Loupiac, Cadillac, St Croix du Mont, Cerons, Monbazillac, Saussinac, bem como Barsac e a mais famosa de todas, Sauternes.
No Chateau d ‘Yquem, localizado em Sauternes, durante a colheita de 1990 o processo foi rápido e homogéneo. Em contraste, a colheita de 1974 exigiu paciência e mais de dez visitas aos vinhedos para efectuar a colheita, pois o ataque da botrytis foi lento e heterogéneo.
Essas condições específicas são mais raras em Portugal e muitas vezes não acontecem. Manuel Vieira, antigo enólogo da Sogrape que por muitos anos foi responsável pelo projeto da Quinta dos Carvalhais e hoje trabalha como consultor em vários projetos, diz que tentou várias vezes fazer um colheita tardia. Obteve sucesso em colheitas como 1995, 2007 e 2011, mas nas restantes a presença essencial do fungo falhava.
Já o enólogo Peter Bright acredita que existe potencial para fazer esse estilo de vinho em locais específicos como, por exemplo, na zona de Salvaterra de Magos, distrito de Santarém, próximo do rio Tejo. A humidade proveniente do rio ajuda o fungo desenvolver-se, principalmente em uvas com a pele mais fina, como é o caso da varietal Farana, que pode ser encontrada localmente. Peter Bright lembra o sucesso que obteve durante as safras de 82, 85 e 86. Manuel Lobo, membro da família proprietária da Quinta do Casal Branco, actua como enólogo-consultor ao lado da enóloga residente Joana Silva Lopes, e cita a colheita de 2014, que foi marcada por bastante humidade, alternância entre chuvas e períodos de sol e com temperaturas médias elevadas como condições essenciais para o desenvolvimento da botrytis.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][image_with_animation image_url=”33203″ alignment=”” animation=”Fade In” border_radius=”none” box_shadow=”none” max_width=”100%”][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Botrytis e outras técnicas
A presença do fungo promove mudanças radicais no perfil do mosto. A fruta pode perder 50% da quantidade de água por evaporação, concentrando açúcares e ácidos presentes. Alguns compostos fenólicos são destruídos e outros componentes serão formados, como glicerol, ácido acético, ácido glucónico e certas enzimas como lacase e pectinase, juntamente com botriticina, uma glicoproteína que inibe o trabalho da levedura. A cor da fruta muda de um tom dourado para um tom rosado, depois roxo e finalmente castanho. O resultado no perfil de aroma será maior complexidade e os vinhos podem tornar-se extremamente longevos, como os intensos Trockenbeerenauslese, da Alemanha. No novo mundo, um dos melhores exemplos desse estilo é o Noble One, do produtor De Bortoli, na Austrália.
A técnica de passificar a fruta após a colheita com o objetivo de concentrar açúcares
é empregada na produção de vinhos doces em várias regiões de Itália. Na Toscana, as uvas são secas ao ar ou secas em pequenas caixas para produzir o famoso Vin Santo. Um processo semelhante é usado para produzir Vin de Paille em Jura. Em Jerez, Espanha, as uvas Pedro Ximenez são secas em túneis de plástico para produzir um vinho extremamente doce que será utilizado para elaborar estilos mais comerciais de Pale Cream sherry.
Os famosos Eiswein da Alemanha, Áustria e do Canadá são produzidos com uvas que foram deixadas na videira à espera que congelem. Quando a temperatura atinge 8 graus negativos as uvas são colhidas e prensadas. Grande proporção do conteúdo na forma de gelo é removida, concentrando os açúcares no mosto.
Existe um número de produtores empregando técnicas similares, usando unidades de refrigeração ao invés de esperar que o processo ocorra naturalmente. O produtor americano Bonny Doon, na Califórnia, elabora um exemplo desses vinhos congelando as uvas artificialmente. Essa alternativa significa custo baixo e menos risco, mas os vinhos parecem não ter a mesma complexidade, comparada com eiswein feito pelo método natural, que tipicamente significa um período mais longo de maturação. Esta técnica de extração, chamada crio-extração, está sendo empregada de forma mais ampla com o objetivo de concentrar mostos e até já foi adotada por vários produtores de Sauternes para aumentar a concentração em colheitas onde a presença da Botrytis cinerea é mais difícil.
Vinhos doces podem ser adicionados a um vinho seco após a fermentação para aumentar o nível de açúcar residual e alcançar nível de doçura adequada. Este método é empregado para produzir Tokaji na Hungria, através do qual uma espécie de pasta denominada Aszú (feita com uvas botritizadas) é adicionada a um vinho base. Outra maneira de obter um vinho doce inclui a adição de mosto não fermentado, como é tipicamente utilizado na produção de vinhos alemães de níveis mais básicos. Os conhecidos Liebfraumilch, que tiveram sucesso décadas atrás, eram feitos dessa maneira, adicionando “süssreserve” (reserva doce) para ajudar a equilibrar a acidez elevada.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/2″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Colheita tardia
Apesar de ser possível encontrar vinhos doces elaborados através de vários métodos, exceto eiswein feito de maneira natural, a maneira mais comum de fazer vinhos doces em Portugal é simplesmente colher as uvas mais tarde e conduzir a fermentação parcial dos açúcares. Existem exemplos de vinhos doces em Portugal comparáveis com alguns dos melhores vinhos doces do mundo, demonstrando que o país realmente possui um grande potencial. Por outro lado, existe um número elevado de vinhos doces de qualidade aceitável que poderiam tornar-se ainda melhores se tivessem um pouco mais de acidez para equilibrar o nível de açúcar residual.
Os vinhos que provei para este trabalho, elaborados através de técnicas e métodos variados, demonstram a diversidade de estilos encontrada em Portugal e possuem boa qualidade. Em termos comerciais, Duarte Leal da Costa acredita que, apesar da extrema concorrência, é fácil comercializar vinho doce contando que o padrão de qualidade seja elevado e que o preço seja justo. Além disso, ajuda em termos de diversificação do portefólio, contribuindo para que a empresa seja apetecível por parte de um importador.[/vc_column_text][/vc_column][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/2″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][image_with_animation image_url=”33204″ alignment=”” animation=”Fade In” border_radius=”none” box_shadow=”none” max_width=”100%”][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]Mas na maior parte dos casos fazer um vinho de colheita tardia representa um certo risco. Manuel Lobo confessa que durante a fase inicial havia dúvidas sobre a viabilidade comercial do projeto. A colheita de 2014 foi a primeira vez na história da empresa, que já existe há mais de 200 anos, que decidiram avançar para a tentativa de um colheita tardia. Hoje esse desafio já foi superado. Na sua opinião, o Falcoaria Colheita Tardia 2014 é um vinho diferenciado que está destinado um consumidor mais conhecedor e que valorize a harmonização gastronómica. O vinho tem tido uma aceitação muito boa do mercado e muitas vezes é o consumidor final que entra em contacto com a empresa em busca do produto. Por esse motivo, Manuel Lobo acredita que haverá sempre espaço para colheitas tardias no futuro, contando que a qualidade seja respeitada. Duarte Leal da Costa não tem dúvida de que prevalecerão sempre os tintos e brancos, mas vinhos doces são verdadeiramente diferenciadores e isso é importante para a empresa ganhar mais notoriedade.
Os vinhos doces portugueses aparecem nos mais variados estilos, representam diversas áreas do país e estão num nível de qualidade muito bom. Até um passado recente, vinhos doces eram reverenciados pelos nossos antepassados. Eram vinhos caros servidos aos reis, rainhas, czares e pessoas nobres em banquetes formais ao lado de grandes clássicos tintos. Essas verdadeiras obras de arte, em grande parte, parecem ter caído no esquecimento. No entanto, são vinhos que oferecem excelente relação entre custo e benefício, são fáceis de apreciar e certamente adicionam outra dimensão à nossa experiência gastronómica. Agora, mais do que nunca, seria um bom momento para redescobrir esses doces tesouros[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][heading]Em Prova[/heading][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]

[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row type=”in_container” full_screen_row_position=”middle” scene_position=”center” text_color=”dark” text_align=”left” overlay_strength=”0.3″ shape_divider_position=”bottom”][vc_column column_padding=”no-extra-padding” column_padding_position=”all” background_color_opacity=”1″ background_hover_color_opacity=”1″ column_shadow=”none” column_border_radius=”none” width=”1/1″ tablet_text_alignment=”default” phone_text_alignment=”default” column_border_width=”none” column_border_style=”solid”][vc_column_text]

Edição Nº 20, Dezembro 2018

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Dão, uma região em busca do seu estilo

Dirceu Vianna Junior MW

A Escolha do Mestre Não é segredo ou novidade que a qualidade dos vinhos do Dão vem crescendo nos últimos anos. A região oferece vinhos únicos, interessantes e intrigantes e com isso tem conquistado óptimos resultados em competições nacionais e internacionais. Por esse motivo achei por bem ir em busca de vinhos tintos do Dão […]

A Escolha do Mestre

Não é segredo ou novidade que a qualidade dos vinhos do Dão vem crescendo nos últimos anos. A região oferece vinhos únicos, interessantes e intrigantes e com isso tem conquistado óptimos resultados em competições nacionais e internacionais. Por esse motivo achei por bem ir em busca de vinhos tintos do Dão que realmente oferecem boa relação entre custo e benefício para aquecer as longas e frias noites de inverno.

TEXTO: Dirceu Vianna Junior MW
FOTOS: Ricardo Palma Veiga

Após tomar a decisão passei a refletir sobre a região. Qual é o seu papel? O tem a oferecer ao consumidor? Quais os seus diferenciais? E será de facto uma região onde poderíamos guiar consumidores em busca de vinhos de bom custo benefício?
O Dão é uma região em transição. Em vários projetos nota-se uma preocupação em reconverter vinhedos e modernizar adegas. Enólogos experientes esbanjam confiança enquanto os profissionais mais jovens demostram criatividade e com isso aumenta o número de produtores que se destacam. Além disso as empresas de grande porte parecerem estar cada vez mais preocupadas em fazer vinhos de qualidade ao invés de quantidade – e isso é importante para que a região continue crescendo em prestígio.
A região possui uma rica história para contar, porém esse passado nem sempre é auspicioso pois muitos consumidores ainda continuam com a percepção de que o Dão é uma região de vinhos elaborados quase só por cooperativas e empresas de grande porte. Algumas falhas do passado ainda não foram totalmente apagadas da mente do consumidor e para algumas pessoas a região ainda não possui vinhos com um perfil claramente definido. Certamente existe um trabalho a ser feito em relação à comunicação.
A região caracteriza-se pela elevada diversidade edafoclimática e predominância de castas autóctones que, juntas, combinam para fazer vinhos autênticos. Os estilos de vinhos tintos variam desde exemplos mais leves e elegantes até vinhos encorpados e com taninos firmes. Em comum os vinhos apresentam frescor e estilo de frutas frescas e vibrantes. É comum ouvir comparações com vinhos da Borgonha, apesar de os vinhos do Dão geralmente apresentarem mais cor, perfil de fruta mais escura e estrutura mais firme. Examinando as minhas notas de prova dos últimos anos, confesso que raramente encontrei um vinho do Dão que tenha perfil suficientemente semelhante para ser confundido com um leve e delicado Savigny-lès-Beaune, um subtil e perfumado Volnay, um elegante Chambolle-Musigny ou com um exótico, encorpado e sedoso Gevrey-Chambertin, por exemplo.
Talvez o que o Dão tem mais em comum com Borgonha será a complexidade de uma região extremamente fragmentada e, aliado a isso, os desafios impostos por esses minifúndios, incluindo o custo elevado da viticultura. Por esse motivo eu questionei a minha decisão de buscar vinhos de bom custo/benefício na região do Dão: será realmente uma boa aposta para o consumidor? A resposta é enfaticamente “sim”, pois oferecer um vinho que tenha boa relação entre custo e benefício é indispensável para todo e qualquer produtor. Isso não significa necessariamente que o vinho deva ser um produto de baixo custo. Essa relação pode ocorrer em qualquer faixa de preço, contando que o consumidor tenha a percepção de que está recebendo bom retorno pela quantia de dinheiro que está saindo de seu bolso.

Qualidade, preço, perfil

Acredito que os vinhos listados abaixo oferecem uma relação adequada entre custo e beneficio. São vinhos elegantes, com óptimo frescor, cujo uso da madeira é bem julgado e sem excessos. A região, de modo geral não cedeu à pressão global de fazer vinhos alcoólicos e excessivamente amadeirados.
Quando bem feitos os vinhos do Dão reflectem muito bem a região, exibindo frescor e aromas intensos e intrigantes que incluem notas de frutas escuras, ervas secas, pinho, eucalipto e especiarias doces. Esses aromas selvagens e exóticos arrancam o consumidor das suas cadeiras e transportam-nos até à região. São vinhos que expressam o terroir do Dão e mostram-se realmente inigualáveis. Apesar das suas merecidas qualidades, o obstáculo principal em relação aos vinhos na região é o facto de os taninos muitas vezes pareceres firmes demais para o consumidor internacional, que frequentemente não tem tempo, espaço ou paciência para envelhecer as suas preciosas garrafas e acabam consumindo vinhos demasiadamente jovens e muitas vezes sem comida. Enfim, os vinhos são consumidos cedo demais, antes de poderem mostrar as suas reais qualidades e atingir o seu potencial.
Os produtores deveriam reflectir e considerar seriamente refinar o perfil e estilo de vinho para determinado segmento do mercado, sem sacrificar o carácter e tipicidade. Caso optem por fazer vinhos para serem apreciados cedo, o que parece estar acontecendo na grande parte dos casos devido à realidade comercial do negócio, o processo de extração deve ser feito mais delicadamente. Assim sendo, esses vinhos certamente dariam mais prazer ao consumidor na hora de beber. Talvez assim pudéssemos voltar a pensar em fazer comparações com sedosos tintos da Borgonha, pois elegância e frescor os vinhos do Dão possuem em abundância.
Por outro lado, se o objetivo for realmente elaborar vinhos de guarda, os produtores deveriam considerar o exemplo dos grandes produtores de Brunello di Montalcino ou Piemonte e realmente fazer vinhos de guarda, vinhos estruturados, envelhecê-los nas suas próprias adegas, lançá-los no momento adequado e cobrar o preço que reflicta o trabalho, tempo e investimento necessário para elaborar grandes clássicos. Não existe motivo para que os produtores do Dão não mostrem mais ambição e se empenhem para fazer alguns dos melhores vinhos de guarda do planeta.
A região tem muito a oferecer ao consumidor, mas ficar no meio termo em relação ao seu estilo é perigoso. Potencial a região tem (e muito!) e isso já está comprovado. Basta examinar os resultados de concursos nacionais e internacionais dos últimos anos e nota-se que a região do Dão regularmente triunfa quando comparada com regiões vizinhas. Lembro-me quando há pouco tempo tive o privilégio e a responsabilidade de selecionar 50 Grandes Vinhos Portugueses para o mercado brasileiro. Vinhos de todas regiões integraram a lista final. Fiquei impressionado com a relação entre custo e beneficio oferecido por vários vinhos da região dos Vinhos Verdes ou com a consistência dos vinhos do Douro, mas entre os vinhos que mais me chamaram a atenção estavam os vinhos do Dão, devido à sua alta qualidade, carácter e personalidade distinta.

Comunicar mais e melhor

Além de melhor clareza com relação ao estilo dos vinhos, o que pode ajudar a região dar os próximos passos? Na opinião de pessoas que vivem e conhecem a região intimamente, existe um longo caminho a percorrer. José Perdigão, proprietário da Quinta do Perdigão, acredita que o trabalho de educação e divulgação deve iniciar-se dentro do próprio país. Observa frequentemente a falta de conhecimento dos consumidores quando presente em eventos nacionais e acredita que aulas básicas de iniciação à prova dos vinhos asseguradas por enólogos, críticos e sommeliers seria um bom início. Paulo Nunes, enólogo da Casa da Passarella, acredita que a região sofre devido ao facto de não ter escala para fazer grandes campanhas publicitárias e a solução é fazer um trabalho intenso de comunicação juntos dos canais específicos. Deve ser um trabalho muito focado, comparável ao trabalho feito pelos missionários na idade dos Descobrimentos, diz ele. Para Sandra Alves Soares, que está à frente da sua empresa familiar, Soito Wines, a solução para pequenos e médios produtores que não dispõem de recursos financeiros para investir em grandes campanhas de marketing é trazer consumidores para a região e tornar os seus vinhos mais visíveis, levando quem prova a associar o vinho às pessoas, à região, às tradições, à história e à paisagem vitícola. Trata-se de dar a conhecer e vender o vinho pela região, não apenas colocar o produto lá fora ao lado dos outros, como sendo apenas mais um vinho.
Pedro Mendonça, director executivo da Comissão Vitivinícola da Região do Dão (CVRD), defende que a região não é tão desconhecida em termos internacionais como muitos pensam, mas concorda que existe muito trabalho a desenvolver em termos de divulgação. Por esse motivo a CVRD está no processo de desenvolvimento de um plano estratégico de comunicação para os próximos 10 anos que pretende abranger o consumidor final, media e trade.
O que é que o Dão tem a oferecer e qual a mensagem que a região deve tentar passar ao consumidor? Pedro Mendonça acredita que as influências mediterrânica, atlântica e continental ajudam a proporcionar um ambiente único, sem paralelo em qualquer outra região no mundo. Influências climáticas, juntamente com as principais castas da região, como Touriga Nacional e Encruzado, ajudam formar um carácter regional fortemente distintivo com base na elegância e, além disso, os vinhos destacam-se também pela sua inquestionável capacidade de envelhecimento.
Para Lígia Santos, jovem CEO da adega familiar Caminhos Cruzados, o Dão tem tudo isso a oferecer e muito mais. A região precisa divulgar projectos familiares, tradicionais, sustentáveis focados na qualidade e produções controladas. Para Lígia, a região exibe uma identidade forte que não tem cedido a perfis internacionais, mantendo o foco nas suas castas e na sua tradição. Lígia vai além e diz que para consumidores que procuram vinhos diferentes, que refletem o local onde são feitos, que são elegantes, perduram e melhoram no tempo e que são ideais para a mesa, não há região como o Dão. Em conversa com produtores locais é fácil constatar a energia, paixão, orgulho e confiança de quem está trilhando o caminho certo.
Sem dúvida a região tem vinhos excelentes, diferentes e muito a oferecer aos consumidores que buscam vinhos distintos e autênticos. No entanto, o estilo precisa de ser refinado e feito com mais precisão para se assegurar que o consumidor tenha uma grande experiência toda a vez que optar por uma garrafa de vinho da região. Existem várias e boas ideias de grandes profissionais do que fazer e de como fazer para comunicar com o consumidor. Será que numa região fragmentada, onde ainda se detectam comportamentos um pouco individualistas, é possível atingir consenso e trabalhar em conjunto para o bem comum? Esperamos e acreditamos que sim. Sendo assim, mais garrafas de vinho do Dão irão aparecer nas mesas dos consumidores, não apenas em Portugal, mas também em vários cantos do mundo.