Monte Xisto: a ciência encontra a tradição

O Cais Novo, no Porto, foi o sítio ideal para o lançamento de um vinho com o selo Nicolau de Almeida. Debaixo de abóbadas de pedra maciça que encerram em si tempos idílicos, conhecemos o Quinta do Monte Xisto tinto 2015.

 

TEXTO Mariana Lopes NOTA DE PROVA Luís Lopes FOTOS Anabela Trindade

“O nascimento do nosso vinho é como a eleição do Papa: fechamo-nos todos numa sala e, se sair fumo branco, vamos em frente!” As palavras de João Nicolau de Almeida descortinam a seriedade que a sua família coloca em cada projecto, desde a criação do grande Barca Velha, pelo seu pai Fernando Nicolau de Almeida, passando pela enologia e administração da Casa Ramos Pinto pelo próprio, até à Quinta do Monte Xisto, criação conjunta com a sua esposa os seus três filhos. Este “fumo branco” refere-se à nova colheita, 2015, do tinto Quinta do Monte Xisto, quinto da sua linhagem, lançado agora para o mercado.

Os 40 hectares da Quinta do Monte Xisto começaram a ganhar forma em 1993, mas só em 2004 se encetava o processo de plantação dos 10 hectares de vinha da propriedade. Numa grande mancha de cereal em Vila Nova de Foz Côa, no Douro Superior, o solo era virgem e pronto para explorar. Por esta altura, os filhos de João Nicolau de Almeida, Mateus e João, estavam prestes a acabar os estudos em enologia e viticultura e foram, desde logo, incluídos no seu desafio: plantar as vinhas em altitude (entre 200 e 300 metros), numa área bastante reduzida. A filha Mafalda, por sua vez, assumiu a comunicação e a imagem do projecto.

Dizer que foi fácil seria mentir. O patriarca vinha com o seu próprio método e com o hábito de muitos anos e de umas quantas revoluções vitivinícolas na região do Douro, e os filhos frescos e com novas abordagens… mas a convergência era inevitável. “Algumas coisas foram feitas às minhas escondidas!”, confessou João Nicolau de Almeida em tom de brincadeira e, simultaneamente, de ternura. Imediatamente, Mateus repeliu: “É verdade, mas o meu pai sempre se interessou pela descoberta de novas aproximações à vinha. É muito gira, esta constante procura.”

Esta relação tão especial, entre eles e com a própria vinha, levou-os a enveredar pelo regime biológico com princípios de biodinâmica. “Quanto mais tempo passamos na vinha, melhor percebemos o que ela quer”, explicou Mateus, enquanto mostrava fotografias das parcelas. A biodiversidade era óbvia nas imagens, com os tons de lilás e vermelho das flores a sobressaírem entre os verdes e castanhos das videiras.

O novo Quinta do Monte Xisto tinto 2015 é a expressão disto mesmo, da terra e das pessoas. De Touriga Nacional, Touriga Franca e um pouco de Sousão, o vinho foi fermentado em lagares com pisa muito leve. Referindo-se aos seus filhos, Mateus Nicolau de Almeida brincou: “Para este efeito utilizamos crianças, é mais barato, mais leve e levanta menos problemas”, e todos nos rimos. O estágio foi feito em barricas, por 18 meses, na cave de rocha e ferro, debaixo do chão. Pelo semblante francamente feliz e descontraído de João Nicolau de Almeida, percebemos a sua sensação de dever cumprido. “O que pretendemos aqui é aplicar a ciência aos valores tradicionais. Acho que, com este vinho, cumprimos o objectivo que tínhamos: um vinho firme, que se aguentasse muitos anos, fácil de beber mas que contivesse em si todos os bons atributos.” Acho que “mestre João” até foi modesto…

 

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