A Herdade do Monte da Ribeira foi pioneira no Alentejo no olival intensivo e superintensivo. A directora agrícola garante que tem preocupações de sustentabilidade e convida os “ambientalistas a irem ao terreno”.
TEXTO Ricardo Dias Felner
FOTOS Mário Cerdeira
Uma dezena de homens e mulheres vai avançando pela fileira de Cobrançosa. O ritmo é rápido e está tudo mais do que treinado. Enquanto uns puxam a rede para a árvore seguinte, outro homem coloca a máquina a postos, espécie de braço mecânico que sai do tractor com uma pinça na ponta. Essa pinça engancha no tronco e abana-o freneticamente, o som da folhagem furando o ar, os frutos caindo no solo como uma bátega de granizo. Em pouco mais de um minuto, com a ajuda de dois varejadores, os ramos largam a azeitona quase toda sobre as redes — e o grupo volta a avançar sob o olhar atento da directora agrícola, Mariana Carmona e Costa.
Aquilo que para um leigo parece um processo bastante expedito, no entanto, não satisfaz totalmente Mariana. A responsável pela Casa Agrícola Herdade Monte da Ribeira, em Marmelar, no concelho da Vidigueira, tem outro termo de comparação. “O superintensivo é muito mais rápido e simples. É um descanso na colheita”, atira, seguindo para a próxima árvore, cuidando que não pisa terrenos macios.
O solo está pesado e lamacento, mas é preciso aproveitar a brecha na meteorologia. Mariana Carmona e Costa andava há muito a monitorizar esta janela de oportunidade para tratar do olival intensivo. São 80 hectares, com uma malha de 12 metros por sete, numa área que alaga facilmente. “Se vêm as chuvas, já não entra aqui ninguém”, diz a engenheira agrícola, há oito anos à frente da Herdade Monte da Ribeira (HMR). A Cobrançosa podia ter sido apanhada mais tarde, mas isso teria também outras implicações, nomeadamente à entrada do lagar. “Nessa altura, quando fôssemos descarregar provavelmente teríamos o camião em fila de espera”. E azeitona em contentores a fermentar é tudo o que não se quer. “A tulha pode vir daí”, explica Mariana.
Quando a quantidade perfaz cerca de 10 toneladas, entra em cena Joaquim Dias, o caseiro da propriedade. Trabalha ali desde sempre, viu Mariana crescer naqueles campos. Hoje faz parte da história da casa, uma história que recomeçou há mais de 30 anos, quando o tio de Mariana comprou a herdade, hoje gerida pela Fundação Carmona e Costa. Em 2013, iniciou-se um processo de valorização da matéria-prima, com a actual directora agrícola a liderar essa reconversão e a demonstrar um carinho especial pelo olival.
Oliveiras felizes
O amor pelo azeite tem muito a ver com a sua formação. Depois da licenciatura em engenharia agrícola, integrou a primeira pós-graduação em olivicultura, ministrada por José Gouveia, no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa. Quando chegou à HMR o tio tinha-lhe deixado um brinquedo para gerir: em 2003, quando poucos sabiam o que era olival superintensivo, ele plantara 24 hectares de Arbequina. Ainda são as mesmas árvores, garante Mariana, desmentindo a ideia de que a varietal seja efémera. “Se bem tratada, com as podas certas, pode durar mais de 30 anos”. Ao lado, por sua vez, foram cultivados os tais 80 hectares de intensivo, hoje “maioritariamente de Cobrançosa, com uns apontamentos de Picual e Cordovil.” A esta matéria-prima havia ainda que juntar perto de 100 hectares com olival tradicional, onde pontificam várias árvores centenárias de galega, verdeal e bico-de-corvo, também conhecido como zambujeiro, primo selvagem da galega.
Quando Mariana chegou, a azeitona era vendida à Cooperativa Agrícola da Vidigueira, hoje Vidcavea, apenas para azeite a granel. Mas a directora agrícola achou que fazia sentido valorizar o produto e também embalá-lo com marca própria. Começou então a trabalhar em três lotes: um o Pousio, o outro o Pousio Premium e um terceiro, o Pousio Clássico. São todos de qualidade Virgem Extra, mas há diferenças. No Pousio e no Pousio Premium, procura-se que a azeitona seja colhida mais verde. No Clássico entra fruta mais madura. No grande comércio, as garrafas começaram a aparecer em 2016.
Parte dos lotes são feitos com olival tradicional, mas Mariana não esconde o seu apreço pelo superintensivo, enfrentando os críticos. Diz ser falso que o superintensivo acabe com a fauna: “Os javalis adoram-nos. E as lebres e as perdizes. Dão sombra e água.” E sublinha que as colheitas são feitas de dia e não à noite, altura em que os pássaros estão mais expostos. De resto — adianta — são usados produtos de protecção integrada e respeitam-se os limites impostos para o uso de pesticidas e herbicidas.
Questionada sobre se há fiscalização suficiente nesta matéria, Mariana admite, contudo, que o sector não tem o mesmo controlo do que outras áreas do agro-alimentar. E também não põe as mãos no fogo por outros produtores, sobretudo por quem compra terreno, mas não tem o apego à terra alentejana que têm os olivicultores locais. Aos ambientalistas que “só criticam” deixa o convite: “Eles que venham ao terreno ver como trabalhamos”.
Edição nº 33, Janeiro 2020