20 anos de Quinta Nova Vinha Centenária

Recordo-me bem, corria o início de verão de 2007, de chegar pela primeira vez à Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo. A propriedade, que até dois anos antes fazia parte do portefólio da J.W. Burmester, era uma típica quinta do Douro produtora de Vinho do Porto. Totalmente típica não…, pois a sua dimensão numa das melhores zonas no Cima Corgo – 120 hectares ao longo de 1,5 km de rio – era bem superior ao habitual na região. À frente da quinta estreava-se Luísa Amorim e, já nesse tempo, bastavam pouco minutos de conversa para concluir que muita coisa iria mudar na propriedade. E mudou!

A propriedade combina agora uma imaculada adega topo de gama e uma unidade de turismo de luxo com 11 quartos

Referenciada desde a primeira demarcação pombalina, em 1756, a Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo foi propriedade da Casa Real Portuguesa até 1725, e tornou-se uma “quinta nova” pela junção de duas quintas (o que explica a sua dimensão). Durante os séculos XVIII e XIX, viveram na quinta várias famílias portuguesas que mantiveram vivas a produção de uva e vinho, fruta e azeite. Mais recentemente, já no século XX, produzia exclusivamente uvas para Vinho do Porto. Quase vinte anos volvidos da primeira vez que lá fomos, basta olhar de cima, na estrada que serpenteia e circunda a propriedade, para notar que muito mudou na Quinta Nova. Desde logo, no que respeita ao edificado, principescamente restaurado, e albergando um dos melhores hotéis da região do Douro, inserido na prestigiada insígnia Relais & Châteaux. A propriedade, que era exclusivamente agrícola e vitícola até chegar às mãos de Luísa, combina agora uma imaculada adega topo de gama e uma unidade de turismo de luxo com 11 quartos (para a qual há um projeto de expansão, mas que, por enquanto, está no segredo dos Deuses) e um restaurante. Antes de chegarmos à casa senhorial que alberga o hotel, encontramos um conjunto de edifícios tradicionais com largas portas de madeira por onde, no passado, passavam as pipas de Vinho do Porto para os carros de bois. Hoje, esse espaço acolhe um wine bar lindíssimo, com os melhores copos disponíveis no mercado. Foi aí que tivemos a oportunidade de percorrer a prova vertical dos dois topos de gama batizados de Vinha Centenária.

Mas voltemos alguns anos atrás, regressando a 2007. Foi nesse início de verão que provei vários lotes dos primeiros vinhos DOC desta quinta, na altura quase todos da colheita de 2005. Provei-os numa adega bem diferente e mais modesta que a atual. Logo no início, após a separação da quinta da marca Burmester, quem começou na enologia foi Rui Cunha, apesar do pouco tempo disponível que as suas consultadorias lhe permitiam. Nesse ano de 2007, foi já Francisco Montenegro, enólogo da quinta até 2010, quem nos deu a provar o Grande Reserva 2005, um tinto magnífico com Touriga Nacional e alguma vinha velha, um vinho que, provado agora em vertical, continua em grande forma. Entretanto a área de vinha aumentou e, atualmente, já após replantações, a quinta tem uma mancha única de 85 hectares de vinha, toda ela tinta. Hoje, a produção ascende a 650 mil garrafas, grande parte centrada na gama premium, num posicionamento propositalmente alto e ambicioso, diz-nos Luísa Amorim.

Mudança e evolução são uma constante nos projetos chefiados por Luísa Amorim. Mas uma coisa mantém-se, ainda que se ajustando à passagem do tempo: os icónicos Vinha Centenária

 

As vinhas antigas

Aos comandos da enologia desde a colheita de 2011 e até março de 2025, tem estado Jorge Alves, que tem contado com a preciosa ajuda de Duarte Costa e Sónia Pereira. Como acima dissemos, muito, muito mesmo, mudou nesta magnifica propriedade da margem direita do Douro. Dir-se-ia até que mudança e evolução são uma constante nos projetos chefiados por Luísa Amorim. Mas uma coisa mantém-se, ainda que se ajustando à passagem do tempo: os icónicos Vinha Centenária.

Com efeito, se algo não mudou foram as vinhas mais antigas da propriedade que, sendo um património invulgar, foi preservado pelos cuidados da viticóloga Ana Mota, que conhece a propriedade e as vinhas como ninguém. Algumas dessas vinhas remontam da primeira plantação monovarietal na região do Douro, que resultou de um estudo realizado entre 1979 e 1981, em conjunto com o Ministério da Agricultura. À época, foram selecionadas três parcelas em patamares com as melhores exposições solares para a plantação de três grandes castas tradicionais, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz. É, pois, desta iniciativa pioneira que nascem as duas referências ícones, primeiro denominadas de Grande Reserva e, desde a colheita de 2018, de Vinha Centenária. A primeira colheita foi em 2005 a partir de Touriga Nacional. A versão com base em Tinta Roriz surgiu em 2008. Existem outros topos de gama da propriedade – caso do Aeternus (homenagem familiar ao empresário Américo Amorim) e do Mirabilis – mas são os Vinha Centenária que continuam a ser o retrato do terroir que os viu nascer e acomodam, em si, a história da modernização do Douro e todo o passado da Quinta Nova.

Sucintamente, o Vinha Centenária Ref P29/P21 provém, como o nome indica, da Parcela 29 plantada com Touriga Nacional entre os 170 e os 205 metros de altitude, e da centenária Parcela 21. Já o Vinha Centenária Ref P28/P21 resulta da Parcela 28 plantada com Tinta Roriz entre os 205 e os 210 metros, e novamente a vinha centenária Parcela 21. As parcelas 29 e 28 são muito pequenas – 1,65 e 1,96 hectares, respetivamente – e a vinha velha, em co-plantação com Donzelinho Tinto, não ultrapassa os 3,5 hectares. Com produções médias entre 2500 e 2700kg por hectares não admira que no mercado não sejam lançadas mais do que 5000 garrafas de cada vinho. As uvas sempre foram 100% desengaçadas para ambos os vinhos, estagiando numa média de 12 meses em barricas novas de carvalho francês. Nota final para a enorme qualidade de ambos os vinhos na edição de 2021, comprovando a qualidade do ano (mais fresco que o habitual) e uma enologia cada vez mais de precisão e contenção.

Nota: O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Vertical: Quinta Nova Grande Reserva/Vinha Centenária Ref.ª P29/P21

18,5 A

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2005

Muito fruto negro e encarnado, sente-se o ano quente com notas de compota, profundo, floral maduro e tabaco doce. Cremoso em boca, alcaçuz, tanino vivo, firme, madeira harmoniosa. Dá grande prova, mas tem ainda alguns anos pela frente. (14%)

19 B

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2007

Aroma jovem e intenso, com muito brilho na cor. Revela no nariz muito fruto, negro e azul, barrica de qualidade, tudo ainda a evoluir bem. Muito intenso em boca, fruta em camadas, leve chocolate sedutor, termina capitoso e muito jovem. (15%)

18,5 A

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2008

Aroma plenamente silvestre com notas a floresta e chão de bosque, fruto azul, turfa. Sente-se a frescura do não em boca, floral aberto, fruto encarnado, mas já bastante redondo e sedutor, talvez no seu ponto ótimo para ser bebido. (14,5%)

19 A

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2012

Muito bem no aroma, latente, sério, ameixa fresca, urze, grande integração e equilíbrio. A prova de boca segue o mesmo perfil, saboroso e redondo, muito especiado e complexo. Ótima fase de consumo, está agora no seu melhor! (14%)

18,5 B

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2013

A cor e o aroma denotam juventude. Fechado e misterioso no nariz, levemente químico, abre para notas balsâmico e alcaçuz. Muito tanino em boca, intenso e espigado, cheio de garra, meio-corpo em boca, mas com alguma frescura e muitos anos pela frente. (14%)

18,5 A

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2015

Aroma jovem, com a barrica a sentir-se na frente, secundada por fruto maduro em camadas, floral aberto, grafite, e chocolate preto. Muito bem em boca, largo e lácteo, com muito sabor, longo. Vai continuar a evoluir, mas a dar já grande prova. (14%)

18,5 B

Quinta Nova Grande Reserva tinto 2017

Aroma fantástico, com muita fruta encarnada, barrica impecável, especiados vários, e perceção de frescura. Muito intenso em boca, tanino maduro robusto, granulado e longo, é um vinho de porte aristocrático com futuro pela frente. (14%)

18,5 B

Quinta Nova Vinha Centenária Ref.ª P29/P21 tinto 2018

Aroma muito bonito, com fruto azul (mirtilo e amora), perceção frescura, profundo e balsâmico. Muito sabor em boca, revela-se jovem e com garra, ligeiramente menos concentrado, com a Touriga Nacional a marcar o conjunto magnífico. (14,5%)

19 B

Quinta Nova Vinha Centenária Ref.ª P29/P21 tinto 2019

Muito bem no aroma, todo jovem e profundo, químico (tinta-da-china), fruto negro, leve grafite. Prova de boca com muito sabor e potência, intenso com notas de alcaçuz e alcatrão, termina já longo, apesar de ter muito para crescer. (14,5%)

18,5 B

Quinta Nova Vinha Centenária Ref.ª P29/P21 tinto 2020

Fechado aromaticamente nesta fase, abre para notas latentes de fruta e barrica, algumas notas de chá e bergamota. Prova de boca em linha, diálogo entre a fruta e a barrica, tudo num perfil jovem e enérgico. (14,5%)

(Artigo publicado na edição de Maio de 2025)

SIGA-NOS NO INSTAGRAM
SIGA-NOS NO FACEBOOK
SIGA-NOS NO LINKEDIN
APP GRANDES ESCOLHAS
SUBSCREVA A NOSSA NEWSLETTER
Fique a par de todas as novidades sobre vinhos, eventos, promoções e muito mais.