20 anos de Santa Cristina

Ao completar 60 anos de idade, o empresário António Pinto entendeu que era tempo de encontrar um espaço agrícola de lazer onde pudesse reunir a família e os amigos. A sua esposa, Rosa Maria Pinto, foi decisiva na escolha de Celorico de Basto e da vertente vitivinícola, herdando de seu pai, viticultor, algumas parcelas de vinha e a paixão pelo vinho.
António Pinto não queria, no entanto, mais um Vinho Verde comum. Pretendia um produto de qualidade elevada e de que se pudesse orgulhar. Com o objectivo de fazer bem feito e mente, recorreu ao enólogo Jorge Sousa Pinto, profissional de primeira linha, com provas dadas na região. A história é contada por este último em poucas palavras: “Quando conversei com o senhor António Pinto, em plena vindima de 2004, gostei muito do projecto e do seu empenho e disse-lhe que ia ajudar no que fosse preciso. Pensava eu que era para começar no ano seguinte. Afinal era para começar a trabalhar no dia seguinte, às sete da manhã já lá estava, na cave da sua residência, a receber uvas…”
A coisa, entretanto, foi ganhando outra escala e condições. Em 2008 começaram a fazer espumante, em 2013 construiu-se uma adega moderna, com tudo o que é preciso. A “brincadeira” de António Pinto transformou-se em 50 hectares de vinha, com mais de 400 mil litros produzidos em cada ano. “Nunca pensei que isto tomasse a dimensão que tomou”, confessa António Pinto. Entretanto, a sua filha Mónica Pinto tomou a direcção do projecto, assumindo a gestão e coordenação de toda uma equipa profissional dedicada ao negócio vitivinícola. Negócio que tem vindo a crescer de ano para ano.
A Quinta de Santa Cristina situa-se no coração de Basto, sub-região dos Vinhos Verdes. Entre vinha e floresta são cerca de 60 hectares, na margem direita do rio Tâmega, um espaço rodeado pelas serras de Fafe, Marão, Alvão e Cabreira, convidando ao sossego e harmonia entre vinhos e natureza. Na verdade, e como é habitual no modelo de minifúndio minhoto, o nome Santa Cristina serve de chapéu a diferentes propriedades, dispersas por três concelhos: Celorico de Basto, Cabeceiras de Basto e Ribeira de Pena. Assim, a Quinta de Santa Cristina propriamente dita, dispõe de 8 hectares de vinha, plantada com castas brancas e tintas: Alvarinho, Fernão Pires, Sauvignon Blanc, Espadeiro, Trajadura e Padeiro de Basto. A quinta da Capela são 5 hectares, com Trajadura, Avesso e Batoca. Na Tecla estão 3,5 hectares, com Alvarinho e Chardonnay, enquanto Fermil representa 2,3 hectares exclusivamente plantados com Arinto. Juntam-se, a estas, mais três quintas (as de maior dimensão) num total de sete: quinta de Salgueiros são 11 hectares, plantados com Trajadura, Loureiro, Azal e Padeiro de Basto; quinta de Agúnchos tem 10 hectares de Arinto, Alvarinho, Vinhão e Fernão Pires; e quinta de Parada, outros 10 hectares, com Arinto, Alvarinho, Azal e Loureiro. Todas estas vinhas encontram-se assentes no típico solo granítico da região, variando as altitudes (dos 200 metros de Fermil aos 500 metros de Salgueiros, com a média a rondar os 350 metros) e a exposição solar, ainda que esta seja maioritariamente Nascente/Sul. A cintura de serras de que acima falámos protege dos ventos marítimos mais agrestes, dando a esta região atlântica alguma influência continental.

Mónica Pinto, com os pais António e Rosa Maria, gere o dia da dia da empresa. 

Batoca faz diferença
De entre a multitude de castas plantadas é de destacar a Batoca, uma casta autóctone e praticamente limitada à sub-região de Basto. Casta muito produtiva, encontrava-se sobretudo nas antigas ramadas, mas tem a vantagem, segundo Jorge Sousa Pinto, de oxidar lentamente e crescer na garrafa. Para o enólogo, a Batoca representa uma parte importante da herança vitivinícola local. “Ao longo do tempo, esta casta foi sendo esquecida e tornando-se quase extinta”, refere. “A Quinta de Santa Cristina dedicou-se à sua recuperação e preservação, e orgulhamo-nos de ser o único produtor a engarrafar esta variedade em separado.” De qualquer forma, do total plantado, 30% é Alvarinho, seguindo-se, por ordem de grandeza, Arinto, Trajadura e Loureiro. Tendo em vista os resultados alcançados por cada casta e os objectivos pretendidos, a enologia identificou já um excesso de Trajadura, que vai substituída, sobretudo, por Avesso e Arinto.
Em termos de modelo vitivinícola, foi adoptado o Sistema de Produção Integrada e Global, implicando seguir determinadas regras e boas práticas agrícolas, priorizando a preservação ambiental, a segurança e o bem-estar dos trabalhadores, a gestão de resíduos e a segurança alimentar. A título de exemplo, Jorge Sousa Pinto aponta a recuperação dos resíduos da poda, triturados e deixados no campo como matéria orgânica, reforçando o compromisso da quinta com práticas sustentáveis. A adega, construída de raiz em 2013, tem uma capacidade instalada para um milhão de litros, vinificando actualmente menos de metade, entre brancos, tintos, rosés e espumantes. Para além das incontornáveis cubas inox e sistemas de frio, Jorge Sousa Pinto e o enólogo residente, Bernardino Magalhães, contam com dois lagares de granito (com controle de temperatura) para a pisa e fermentação dos tintos mais clássicos, uma área de fermentação e estágio em barrica e ainda uma outra dedicada aos espumantes, que começaram a ser produzidos em 2008. A ideia é a marca Quinta de Santa Cristina aparecer unicamente em referências que signifiquem valor acrescentado. Diz António Pinto: “Queremos experimentar, testar, perceber o consumidor e só depois lançar no mercado um vinho que faça a diferença. Fazer bom e barato não é objectivo.” Corroborando a afirmação, é significativo que, desde 2023, todos os vinhos da Quinta de Santa Cristina, mesmo os considerados “entrada de gama”, sejam engarrafados sem qualquer adição de gás ou açúcar.

Verdes de garrafeira
Mais significativo ainda, o lançamento da linha Cave, que tem, como propósito, introduzir valor e mostrar, a quem ainda duvida, que os Vinhos Verdes podem ser grandes brancos, vinhos que ultrapassam a prova do tempo. Ao contrário de outros produtores da região que relançam agora vinhos que já estiveram no mercado há alguns anos, os vinhos da linha Cave assentam num conceito distinto. “São especificamente feitos para crescer em garrafa e lançar com dois ou três anos de idade. Não são vinhos que ficaram para trás”, acentua Jorge Sousa Pinto. Assim, todos os anos chegarão ao mercado vinhos varietais ou de lote baseados neste modelo. E há vinhos que vão esperar dois anos e outros esperam três, quatro, cinco ou mesmo seis anos, o que diz bem da confiança do enólogo e da capacidade de António e Mónica Pinto esperar pelo retorno do investimento.
Os vinhos da Quinta de Santa Cristina estão, sobretudo, no canal Horeca. A exportação representa já 40% do negócio, com mercados como Alemanha, Inglaterra, Polónia, Holanda, Suíça, Suécia e, mais recentemente, EUA e Japão, na linha da frente.
Desde 2015 que um dos focos da empresa tem sido o enoturismo, cujo espaço foi alvo de grande reformulação em 2020, com novas infra-estruturas (incluindo cozinha industrial) e um renovado programa dos espaços arquitectónicos, criando três ambientes que interligam vinhas e adega, um espaço multiusos com capacidade para 150 pessoas, um wine-bar e uma ampla loja. Para além das provas e da experiência gastronómica, os visitantes podem desfrutar de um vasto programa de actividades, incluindo visitas às vinhas (a pé, bicicleta ou TT), adega e cave, criação de lotes, e piqueniques na vinha ou nos jardins, aproveitando a paisagem natural.
Duas décadas transformaram a Quinta de Santa Cristina de espaço privado de lazer a ambicioso produtor de Vinho Verde, uma casa que conjuga como poucos três factores fundamentais: escala, qualidade e diferença. Uma importante mais-valia para uma região que tem cada vez mais coisas boas para nos mostrar.

Santa Cristina

(Artigo publicado na edição de Agosto de 2024)

 

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