Há novidades em tons de branco e tinto na Casa de Saima. Numa
casa que sempre fez grandes vinhos, o desafio é manter a tradição
– na filosofia de trabalho e no estatuto de porta-estandarte da
região. O enólogo Paulo Nunes conduziu uma prova que nos fez
viajar no tempo, com vinhos “de classe mundial”.
TEXTO Luís Francisco FOTO Ricardo Palma Veiga NOTAS DE PROVA Luís Lopes
FALTAM dez minutos para a hora marcada e somos os primeiros a chegar à Casa de Saima, o segundo produtor bairradino incluído no programa de visitas da feira BAIRRADA Vinhos & Sabores 2017. O portão está aberto e ao silêncio do pátio contrapõem-se os ruídos vindos da cozinha. Entramos e somos recebidos por Graça Miranda, a proprietária, que depressa desfaz quaisquer tentativas de pedir desculpa pela “invasão”: “A porta está sempre aberta… Isto é a Bairrada!”
E é mesmo. Muito mais do que apenas uma filosofia de hospitalidade, a “Bairrada” aqui é a marca de excelência que a região tanto tem procurado (re)afirmar nos últimos anos. Há duas/três décadas, quando a notoriedade e a percepção de qualidade da Bairrada andavam muito por baixo, a Casa de Saima foi um dos poucos produtores que se mantiveram firmes na tarefa de remar contra a maré de desânimo e descaracterização. E foi desses anos que nos chegaram algumas pérolas que, nas palavras do enólogo Paulo Nunes, “justificam as opções agora tomadas”, nomeadamente o lançamento de duas novidades em tons de branco: um Vinhas Velhas e o primeiro Garrafeira de sempre da casa – só havia tinto.
Mas antes de bebermos e suspirarmos por mais, há que conhecer as instalações e perceber um pouco melhor a filosofia do trabalho neste produtor situado em Sangalhos, com 20 hectares de vinhas (na sua maioria bem velhinhas – as mais antigas têm 80 anos) e uma adega assumidamente rústica, “rudimentar no bom sentido”. Paulo Nunes não deixa dúvidas: “Todos os procedimentos são iguais aos que se seguiam há 40/50 anos.”
Isto traduz-se, por exemplo, na fermentação em lagar sem controlo de temperatura, quando falamos de tintos. Ou de brancos trabalhados sem protecção contra a oxidação. Opções que se traduzem numa palavra: personalidade. Os vinhos de Saima são eles mesmos, atravessam tendências, ignoram modas e estabelecem padrões de qualidade.
Provamos o branco Vinhas Velhas 2015 (6.600 garrafas, preço a rondar os 8/9 euros) e o Garrafeira branco 2015 (3.200 garrafas, 15/16 euros), antes de recuarmos à década de 1990 com paragens em 1997, 1995 e 1993 (este verdadeiramente soberbo). A seguir chegam os tintos: Colheita 2014 (5€), Reserva 2012 (8€), Pinot Noir 2015 (outra estreia absoluta, 9/10€) e daqui passamos aos Baga – Colheita Tonel 10 de 2013 e 2014 (ambos a 10€), Grande Reserva 2014 (16€) e os Garrafeira 1997, 2001 e 2008 (30€).
Este último foi o primeiro feito por Paulo Nunes na Casa de Saima em nome próprio (começou em 2010; antes colaborava ao serviço de uma empresa, a Vines & Wines) e ele próprio explica a importância deste momento: “É dos vinhos que mais marca a minha carreira, pela responsabilidade de pegar numa marca desta dimensão.” Paulo é um homem do Dão (responsável, entre outros, pelos vinhos da Casa da Passarella), mas que se apaixonou pela Bairrada. “Longevidade e grande qualidade. Quantas regiões do mundo fazem estes vinhos de forma simples?”, questiona, durante a prova. “Isto dá a dimensão do potencial de uma região.”