Apesar de alguns fazedores de opinião terem resolvido diabolizar os vinhos com madeira, a verdade é que o consumidor continua apreciando, comprando e voltando para comprar de novo. E há boas razões para isso.
TEXTO Dirceu Vianna Junior MW FOTOS Ricardo Palma Veiga
O papel do vinho nas nossas vidas é dar prazer. Princípios básicos de harmonização servem para ajudar-nos a determinar o vinho adequado para servir com certo prato. Muitas vezes essa selecção é feita exclusivamente em função do prato a ser servido não levando em consideração a estação do ano e raramente o clima no momento do consumo.
A tendência natural de um consumidor seria beber vinhos tintos, principalmente os mais encorpados, durante o inverno. Talvez essa seja uma explicação do facto de países Nórdicos preferirem vinhos mais robustos, estilo ‘ripasso’ italiano, cujo teor alcoólico pode servir para ajudar aquecer os dias de frio intenso do inverno. Vinhos brancos oferecem a proposta de refrescar os dias mais quentes de verão. Entretanto, quando as circunstâncias pedem um vinho branco em tempos mais frios, a solução seria buscar estilos mais encorpados, mais densos e, por que não, amadeirados.
Para muitas pessoas uma recomendação como essa pode ser considerada ultrapassada visto que sommeliers de vários cantos do mundo estão na onda de falar sobre vinhos naturais, vinhos vulcânicos e vinhos laranja.
Para esse pequeno, mas às vezes influente grupo de pessoas, o estilo deve ser seco, sem madeira e ter acidez suficiente para tirar pelo menos uma camada de esmalte de seus dentes. Jornalistas parecem não cansar de escrever sobre as propriedades malignas da madeira. Apesar disso, o consumidor continua comprando, apreciando e retornando para adquirir vinhos com características de carvalho. Em degustações que conduzi nas últimas semanas para centenas de consumidores tanto na Europa como América do Sul, onde foram apresentados lado a lado vinhos sem influência da madeira em comparação com vinhos envelhecidos em barrica, a preferência foi clara e arrasadora em favor de vinhos amadeirados. Essas pessoas, incluindo desde iniciantes até profissionais da indústria, demonstraram preferir os atributos que o envelhecimento em carvalho confere ao vinho tanto em relação à textura quando aos aromas, sabores e maior complexidade.
O que consumidores não gostam é do uso indiscriminado e excessivo da madeira, muito vezes escondendo outros atributos positivos que o vinho tem a oferecer. Quem já degustou vinhos brancos da Austrália ou Califórnia da década de 90 lembra-se bem disso. Quem não teve essa oportunidade, é fácil imaginar um vinho dourado escuro com aromas intensos incluindo notas de baunilha, coco e especiarias doces. O primeiro copo era um ataque nos seus sentidos, o segundo copo era cansativo devido aos aromas intensos e uni-dimensionais; chegar ao terceiro era quase impossível.
As diferentes madeiras
O uso da madeira não é nada de novo no mundo do vinho. Os romanos já usavam barris de madeira para medir, armazenar e transportar vinhos, mas apenas nos últimos 50 anos os avanços tecnológicos, juntamente com conhecimento científico, nos permitiram entender com mais eficiência os atributos positivos que o carvalho pode transmitir ao vinho.
Além de ter peso leve, em comparação com outros materiais, ser maleável, relativamente impermeável e reciclável, a madeira pode ceder ao vinho aromas e sabores de baunilha, cedro, café, avelã e várias outras notas de especiarias dependendo da origem da madeira, nível de tosta, tempo de envelhecimento, tamanho e idade da barrica. Por exemplo, os carvalhos de origem francesa das florestas de Allier e Nevers são madeiras que possuem em sua composição grãos apertados e adicionam ao vinho notas suaves de baunilha; já o carvalho da floresta de Vosges é um carvalho branco, também de grão apertado, e bastante aromático, onde muitas vezes se sentem notas de avelã.
O carvalho de origem americana é composto de componentes voláteis mais intensos e confere ao vinho aromas e sabores mais óbvios de coco e baunilha. Por isso necessita cuidado por parte do enólogo para evitar que acabe marcando demais o vinho.
Críticos e sommeliers parecem não favorecer a madeira americana. Mas, no entanto, esse tipo de madeira é usado em grandes vinhos franceses desde Cru Classe de Bordéus até excelentes brancos da borgonha como Domaine de Maltroye in Chassagne-Montrachet, mesmo que em pequena proporção. Em Portugal, David Baverstock é responsável pela elaboração do conhecido Esporão Reserva Branco. O vinho é composto de 30% Roupeiro, 30% Arinto, 30% Antão Vaz e 10% Semillon. A maior parte (60%) do vinho é vinificado em inox, ajudando manter a frescura. Cerca de 40% do lote passa por madeira e desse, grande parte (70%) é fermentado e envelhecido em madeira Americana nova por seis meses. Esse vinho demonstra que madeira Americana, quando bem julgada, pode melhorar a qualidade e conferir ao vinho complexidade, sem se lhe sobrepor.
A barrica é mais-valia
O nível de tosta é extremamente importante e, por exemplo, os técnicos da tonelaria Taransaud recomendam tosta leve para vinhos mais delicados. A tosta alta pode transmitir características marcantes e exige cuidado pois pode facilmente se sobrepor à fruta e dominar o vinho. ‘Tosta média’ é recomendável para transmitir ao vinho mais complexidade e conferir harmonia. Um dos brancos amadeirados mais impressionantes de Portugal no momento, é feito a partir da casta Arinto. O bairradino Encontro 1, colheita 2013, criação de Osvaldo Amado, fermentou e estagiou em barricas de Carvalho Francês da floresta de Allier de tosta média fraca por nove meses.
Quando bem julgado, o carvalho contribui para melhorar o perfil aromático, textura, sabor e complexidade do vinho. Não restam dúvidas de que vinhos com madeira excessiva são vinhos de um estilo ultrapassado. A tendência de vários grupos buscarem vinhos mais frescos, leves e sem madeira existe e continua ganhando espaço em várias partes do mundo. Frescura e autenticidade são atributos positivos que devem ser preservados. No entanto, vinhos com fermentação e estágio em madeira, de um modo geral, são vinhos mais complexos. Para confirmar isso basta procurar um bom vinho branco francês da Borgonha de uma vila como Meursault, Puligny-Montrachet e Corton ou de Bordeaux, como um bom Pessac Leognan, por exemplo. São vinhos clássicos de grande personalidade e complexidade. Um vinho português digno de ser comparado com qualquer outro branco de alto nível em âmbito mundial é o Quinta dos Carvalhais Branco Especial. De acordo com a enóloga responsável, Beatriz Cabral de Almeida, o vinho é composto de 40% de Encruzado, 30% de Gouveio, 12% de Semillon e 18% de castas mistas do campo. A fermentação ocorreu em cubas de inox e o vinho envelheceu em barricas usadas de carvalho Francês, 57% da floresta de Allier e 43% da floresta de Vosges. O vinho é composto por componentes das colheitas de 2005 (24%), 2006 (48%) e 2009 (28%) e tem em média 10 anos de estágio em madeira.
Não restam dúvidas de que os vinhos brancos portugueses, de uma forma geral, evoluíram muito nos últimos anos e o uso apropriado da madeira contribuiu para esse desenvolvimento. Fazedores de opinião podem apontar para vinhos naturais, vinhos vulcânicos e vinhos laranja, mas a verdade é esta: o que o consumidor mais aprecia num vinho é, simplesmente, harmonia. Tendências vêm e vão como um pêndulo. Vinhos que conseguem manter autenticidade da fruta e, ao mesmo tempo, beneficiar-se do impacto positivo que a madeira pode oferecer em termos de textura sedosa e elegante complexidade, jamais sairão de moda.
Vinhos recomendados
• Quinta dos Carvalhais Branco Especial (Dão branco)
Sogrape
19 valores
PVP € 33
• Encontro 1 (Bairrada branco 2013)
Quinta do Encontro
18,5 valores
PVP € 25
• Andreza (Douro Grande Reserva branco 2014)
Lua Cheia em Vinhas Velhas
18 valores
PVP € 15
• Guru (Douro branco 2016)
Wine & Soul
18 valores
PVP € 24
• Quinta de Soalheiro (Vinho Verde Monção e Melgaço Alvarinho Reserva branco 2015)
Vinusoalleirus
18 valores
PVP € 22
• Berço (Douro branco 2012)
Alves de Sousa
17,5 valores
PVP € 28,50
• Campolargo ‘Barrica’(Bairrada Arinto branco 2016)
Manuel dos Santos Campolargo
17,5 valores
PVP € 12
• Esporão(Alentejo Reserva branco 2016)
Esporão
17,5 valores
PVP € 15
• Grainha(Douro Reserva branco 2016)
Quinta Nova N. S. do Carmo
17,5 valores
PVP € 14,50
• Herdade dos Grous(Regional Alentejano Reserva branco 2016)
Herdade dos Grous
17 valores
PVP € 55
• Quinta do Cardo Vinha Lomedo(Beira Interior Síria branco 2014)
Agrocardo
17 valores
PVP € 19,90