O que poderia parecer à partida uma desvantagem comercial para a Bairrada – ter produtores com diferentes filosofias e estilos, e várias castas tintas por utilizar – é, afinal, mais uma razão para seguir de perto a região. Dos vários perfis a partir da emblemática uva Baga aos blends com Touriga Nacional e castas francesas – difícil é escolher.
TEXTO Nuno de Oliveira Garcia
FOTOS Ricardo Palma Veiga
A ideia tradicional que alguns dos consumidores ainda poderão ter da Bairrada – que se trata de uma região pouco dinâmica e com vinhos uni-direcionados – não poderia estar mais longe do momento em que a mesma atravessa do ponto de vista vitivinícola. É certo que existem outras regiões com um maior número de vinhos lançados por ano, e outras que assentam num protótipo regional mais característico ou identificativo. Mas dificilmente encontramos tanta diversidade, com qualidade e bom preço, como nesta região do centro-norte do país que se espraia entre Coimbra e Aveiro.
Até na excelência dos vários tipos de vinho que produz – espumantes, tintos (maioritários) e brancos (para não falar das aguardentes e dos abafados) – se comprova que, na Bairrada, como acima começamos o texto, o mais difícil é escolher… É certo também que a região ainda não se libertou totalmente do estereótipo de fazer tintos “pouco amigos” do consumidor, difíceis, ácidos, adstringentes. Mas também é verdade que, atualmente, não existe enófilo exigente que não reconheça as qualidades e o forte carácter dos fantásticos vinhos da região. E os números do crescimento entre os consumidores estão aí para o provar.Podemos, pois, afirmar que tem existido mudança e inovação na Bairrada, e não começou nos dias de hoje. Produtores como Luís Pato e Carlos Campolargo, entre outros, tudo fizeram para que a região, ainda antes dos anos 90 do século passado, mantivesse uma aura de qualidade e modernidade e cativasse consumidores. Do primeiro, surgiram os mais relevantes ensaios com o estágio da Baga em barricas de carvalho francês, e do segundo provieram vinhos apelativos e modernos com base, em muitos casos, em castas menos comuns, algumas estrangeiras.
A par destes produtores, outros como Mário Sérgio Nuno (Quinta das Bágeiras), Sidónio de Sousa e João Póvoa (Quinta de Baixo e, atualmente, Kompassus), iam produzindo alguns dos vinhos mais míticos da região do início dos anos 90 também. Mais recentemente, produtores de uma geração mais nova alcançam sucessos dificilmente imaginados há algum tempo junto da crítica especializada, como sucede com os vinhos Vadio, de Luís Patrão, ou os Outrora, de João Soares e Nuno do Ó, verdadeiros blockbusters internacionais, com destaque para Filipa Pato, que viu o Nossa Calcário Baga 2015 obter a melhor classificação de sempre para um vinho da região na “Wine Advocate”.
De resto, vários dos produtores emblemáticos da região também parecem não querer perder o foco recente que o público está a dar à Bairrada, curiosamente com lançamentos num estilo que procura recuperar tradições mais antigas, como sucede com os vinhos centrados na designação Garrafeira ou na categoria Clássico (neste caso, sendo indispensável que, nos tintos, a Baga entre em, pelo menos, 50% no lote e o vinho estagie 3 anos, um dos quais em garrafa), como acontece com as propostas mais recentes das Caves São João, Aliança, Caves São Domingos e Messias.
Ainda no passado mês de maio, a Adega de Cantanhede – um dos projetos com maior dinamismo e modernidade – divulgou que, desde o início do ano, os seus vinhos foram galardoados com 74 medalhas em concursos internacionais; isto depois do anúncio de que 2017 terminou com um novo recorde de vendas. E se ainda houvesse dúvidas do que se vem escrevendo sobre o crescimento da atenção para com a região, há cerca de meia dúzia de anos (no final de 2012), a Bairrada viu uma das suas mais conhecidas propriedades ser adquirida pela Niepoort Vinhos, o que, só por si, revela bem o potencial da região aos olhos de uma das mais empreendedoras empresas durienses.Toda esta vitalidade foi-nos ainda confirmada pela Comissão Vitivinícola da Bairrada, que nos avançou dois dados muito interessantes; a saber: em primeiro lugar, refere-nos José Pedro Soares, presidente da Comissão, que as vendas dos vinhos Bairrada têm crescido, nos últimos dois anos e de forma continuada, na restauração e hotelaria (vulgo canal Horeca); em segundo lugar, e talvez ainda mais relevante, revelou que a Bairrada foi a região no país cujos vinhos sentiram, nos últimos anos, um maior crescimento de valor no preço médio.
Fomos confrontar Miguel Pereira (Messias) com esses dados e este corroborou-nos que na restauração, sobretudo em Lisboa, o crescimento das vendas dos vinhos Bairrada nas gamas premium e ultra-premium é surpreendente. Para este responsável comercial, têm sido os vinhos da Bairrada a estrela dos últimos anos no que respeita ao portefólio da Messias, que inclui também vinhos do Douro e Dão. Quanto ao aumento da certificação dos vinhos, esse é igualmente notável, com um crescimento constante de 10% por ano. As mesmas boas notícias surgem do lado da exportação, que regista um aumento de 17%.
No mesmo sentido, releva destacar que, até ao início anos 90, a Bairrada (a par do Dão) era a grande região de vinho de mesa, sendo que os principais players se abasteciam de uvas e vinhos um pouco por todo o país. A este respeito importa não esquecer que a Bairrada nunca foi uma região de pouca produção, bem pelo contrário. Prova disso mesmo é que teve um dos mais pujantes sectores cooperativos do país, com 6 cooperativas a funcionar em simultâneo (atualmente apenas duas se encontram em funções, Cantanhede e Souselas).
Talvez por isso, o primeiro sintoma da modernização da região tenha sido, precisamente, o abandonar da produção de grandes lotes de vinho de origem dispersa, para o controlo de áreas de vinha dentro da própria região, algo que sucedeu com as empresas Aliança, Messias, Caves São João (um desses primeiros passos foi, sem dúvida, a aquisição da Quinta do Poço do Lobo pelas Caves São João, ainda nos anos 70 do século passado) e Caves São Domingos, que passaram a olhar para a vinha e não apenas para a comercialização.
E dúvidas não nos restam de que é esse o futuro da região, no sentido em que produzir um grande vinho na Bairrada pode ser mais dispendioso do que noutras regiões. Afinal, o clima da região, e as próprias características da casta-rainha Baga, obrigam a um redobrar de atenções na vinha e na adega. Algo que nos é confirmado por Francisco Antunes, enólogo da Aliança, que menciona as chuvas de setembro, no equinócio de Outono, como um dos maiores riscos no que respeita ao ano agrícola, sobretudo por na região reinarem castas tardias como a Baga, a Touriga Nacional e o Cabernet Sauvignon (ver caixa). No caso da Baga, salienta o enólogo, são mesmo precisos muitos tratamentos, e no seu devido tempo, uma vez que o cacho apertado dificulta a condição fitossanitária no mesmo. Por tudo isto, as últimas colheitas, desde 2011 (ano perfeito em todo o país), têm sido muito desafiantes para a Bairrada, apesar de se poder concluir que a qualidade geral dos tintos não se ressentiu, em especial em 2017, ano do qual se prevêem vinhos de grande qualidade.
Por isso, o posicionamento da região não deve ser procurar competir no melhor preço ou na maior produção por hectare (nesses parâmetros outras regiões são mais eficientes). Luís Patrão, do projeto Vadio, confirma as dificuldades com a casta Baga, tardia e vigorosa, e realça que vinicultura da região é ainda pouco organizada, com uma média de área por produtor muito inferior a um hectare. Luís Patrão, que tem ao seu dispor apenas 4,5 hectares, lembra que foi sempre esse o paradigma da região, onde em cada casa havia uma adega e, assim sendo, nos dias que correm, é difícil produzir grandes vinhos em quantidade e a baixo preço. Para produzir mais, e ter melhores preços, diz-nos que é preciso ser muito profissional na vinha, em especial ter cuidado nos tratamentos, e podar convenientemente privilegiando arejamento do cacho da Baga.
Com tantos desafios, não admira que a quota de mercado na moderna distribuição – na qual o preço é o fator principal de compra – tenha vindo a diminuir para a região, algo compensado, como acima se referiu, pelo aumento significativo nas vendas noutros canais. Dúvidas não restam de que a Bairrada tem condições para produzir vinhos únicos, de perfis diferentes e tendencialmente mais frescos do que o resto do país. Essa unicidade é sobretudo valorizada junto da restauração e da distribuição mais clássica (como garrafeiras ou charcutarias finas). E, note-se, esse posicionamento não implica a venda de vinhos caros, nem a criação apenas de produtos para elites. Pelo contrário, e como resulta do presente painel, são vários os topos de gama bairradinos que não ultrapassam os 15€. Boas notícias, portanto!
Por isso, o posicionamento da região não deve ser procurar competir no melhor preço ou na maior produção por hectare (nesses parâmetros outras regiões são mais eficientes). Luís Patrão, do projeto Vadio, confirma as dificuldades com a casta Baga, tardia e vigorosa, e realça que vinicultura da região é ainda pouco organizada, com uma média de área por produtor muito inferior a um hectare. Luís Patrão, que tem ao seu dispor apenas 4,5 hectares, lembra que foi sempre esse o paradigma da região, onde em cada casa havia uma adega e, assim sendo, nos dias que correm, é difícil produzir grandes vinhos em quantidade e a baixo preço. Para produzir mais, e ter melhores preços, diz-nos que é preciso ser muito profissional na vinha, em especial ter cuidado nos tratamentos, e podar convenientemente privilegiando arejamento do cacho da Baga.
Com tantos desafios, não admira que a quota de mercado na moderna distribuição – na qual o preço é o fator principal de compra – tenha vindo a diminuir para a região, algo compensado, como acima se referiu, pelo aumento significativo nas vendas noutros canais. Dúvidas não restam de que a Bairrada tem condições para produzir vinhos únicos, de perfis diferentes e tendencialmente mais frescos do que o resto do país. Essa unicidade é sobretudo valorizada junto da restauração e da distribuição mais clássica (como garrafeiras ou charcutarias finas). E, note-se, esse posicionamento não implica a venda de vinhos caros, nem a criação apenas de produtos para elites. Pelo contrário, e como resulta do presente painel, são vários os topos de gama bairradinos que não ultrapassam os 15€. Boas notícias, portanto!
Os produtores da região, beneficiando de uma legislação mais “aberta” do que o habitual nos DOC portugueses, utilizam uma grande variedade de castas, desde variedades antigas na região a outras vindas de outras zonas do país ou ainda as chamadas castas internacionais. Estas são algumas das mais utilizadas nos vinhos tintos bairradinos.
É a principal casta tinta da região, apesar de já ter sido mais maioritária. Terá sido introduzida na região em consequência do oídio, sendo esta casta resistente ao fungo. Tem uma maturação tardia, o que na Bairrada pode ser problemático em anos de chuvas no início de setembro, tanto mais que é sensível à podridão. Vigorosa, quando lhe é permitida produção abundante dá origem a vinhos pouco alcoólicos e com muita acidez. Com o vigor controlado e, sobretudo, em terrenos argilo-calcários com boa exposição solar, produz os melhores vinhos da região, ricos em taninos e suportando muito bem o envelhecimento.
À semelhança da Baga, é de maturação tardia e pode ser muito produtiva, apesar de pouco sensível à podridão. Permite a produção de vinhos com muita cor e taninos, com boa longevidade, as características varietais – notas apimentadas – bastante pronunciadas, adapta-se bem a lotes com castas mais suaves, como a Jaen ou o Castelão.Omnipresente no país, terá viajado do Dão para a Bairrada, entrando em muitos lotes onde a Baga também está presente. Permite mostos com teores de álcool provável e acidez médios, ricos em substâncias fenólicas e carregados de cor (com tonalidades violáceas), e muito aromáticos, com frutado intenso a frutos pretos maduros e silvestres. É essa expressão aromática, bem como permitir vinhos encorpados e o facto de ser uma casta consistente em termos da qualidade dos vinhos que origina, que a tornam um trunfo na região.Casta bordalesa de elevado rendimento e de maturação precoce, o que é uma vantagem para a Bairrada. Tem semelhanças com o Cabernet Sauvignon, mas com taninos mais suaves, permitindo elaborar vinhos encorpados, ricos em álcool e em cor, relativamente pouco ácidos, pelo que é por vezes utilizada na região para atenuar mostos mais ácidos e com taninos mais vivos provenientes de Baga.
Outra estrela um pouco por todo o país, é uma casta produtiva, mas muito apta a produzir vinhos de grande qualidade. De maturação tardia, permite mostos muito corados, de um vermelho intenso com nuances violetas durante a juventude, e sempre com grande potencial aromático. Tem-se adaptado bem à Bairrada, sobretudo nos anos mais quentes, originando vinhos pujantes e especiados.
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Mata Fidalga Estágio Longo
Tinto - 2013 -
Vigesimum
Tinto - 2014 -
Samião
Tinto - 2015 -
RS
Tinto - 2013 -
Laboeira
Tinto - 2016 -
Castelar
Tinto - 2011 -
Quinta do Poço do Lobo
Tinto - 2015 -
Quinta do Ortigão 4 dezasseis
Tinto - 2015 -
Nelson Neves
Tinto - 2013 -
Messias
Tinto - 2013 -
Grande Vadio
Tinto - 2013 -
Foral de Cantanhede Gold Edition
Tinto - 2009 -
Ataíde Semedo
Tinto - 2015 -
Aliança by Quinta da Dôna
Tinto - 2011 -
São Domingos
Tinto - 2010 -
Poeirinho
Tinto - 2012 -
Milheiro Selas
Tinto - 2012 -
MagnaBaga ( Magnum)
Tinto - 2015 -
Luís Pato Vinha Pan
Tinto - 2013 -
Casa de Saima
Tinto - 2008 -
Quinta das Bágeiras
Tinto - 2011 -
Outrora
Tinto - 2013
Edição Nº14, Junho 2018