Enoturismo: Madeira – Uma pérola cheia de surpresas

Legenda da foto: Quinta das Vinhas

A ilha da Madeira oferece, aos seus visitantes, uma experiência única e bastante diversificada no que se refere ao turismo vitinícola. Para além de permitir mergulhar a vista em paisagens de sonho e absorver uma cultura vínica ancestral, o seu principal encanto é precisamente a possibilidade de uma vivência de experiências contrastantes, todas elas ricas de histórias e autenticidade.

Estamos em presença de uma nova forma de conhecer a ilha, desfrutando de espaços que oferecem serviços e funcionalidades que podem ir de uma simples visita com prova de vinhos, a actividades recreativas, passando por experiências eno-gastronómicas e alojamentos em sítios idílicos. Há de tudo, para todos os gostos e (quase) todas as bolsas e não faltam bons exemplos de novas abordagens e descobertas inovadoras. Nesta edição trazemos ao leitor a primeira parte de uma visita memorável.

Boneca de Canudo

Foi no meio de uma disputa familiar sobre o destino a dar a uma pequena  parcela de vinha em Santo da Serra, pitoresco vilarejo dividido entre os concelhos de Santa Cruz e Machico, que Elsa Franco, engenheira civil de formação, impôs a sua vontade de se dedicar à produção de vinhos tranquilos e, depois, de vinhos da Madeira. A expressão zombeteira com que foi, na altura, mimoseada – “Lá vem esta boneca de canudo” – serviu de mote e inspiração ao projecto, que hoje lidera com visível orgulho.

Como acontece quase sempre na Madeira, estamos a falar de pequenas áreas de vinha que totalizam 13 hectares, divididas por Santo da Serra, Machico e Ponta do Sol. Tudo começou em 2006, quando Elsa Franco começa a conversão das vinhas para produzir vinhos secos: Touriga Nacional, Merlot e Syrah são as tintas escolhidas. Nas brancas mantém o tradicional Verdelho, mas arrisca a inovação de introduzir o Chenin Blanc. Em 2013 faz a sua primeira vindima e, no ano seguinte, começa a comercialização dos primeiros vinhos produzidos, apenas 500 garrafas. No processo de produção Elsa teve o apoio da Justino’s, mas está em projecto a edificação de um nova adega em Machico, daqui a três anos. Entretanto uma nova experiência, com uvas da casta Caracol vindas da ilha de Porto Santo, permitiu fazer, em 2022, um vinho branco singular que, parafraseando o poeta, “primeiro estranha-se e depois entranha-se”. O próximo passo é a produção de um vinho Madeira nas versões de meio doce e meio seco que tivemos oportunidade de provar. A intenção de crescer é evidente e a distribuição, que até agora tem estado confinada a alguns restaurantes na Madeira, arrisca agora na exportação e no mercado do continente, de que a sua presença na última edição da feira Grandes Escolhas Vinhos & Sabores foi um exemplo de vontade.

Na Boneca de Canudo, o Enoturismo ainda está a dar os primeiros passos. Disponível para já estão as instalações de Santo da Serra, onde estivemos, em que o visitante pode ter uma experiência com visita às vinhas e ao pomar, uma prova de vinhos acompanhada por pão caseiro, queijos, enchidos e frutos secos, para além de chocolates próprios, azeite e mel.

Boneca de Canudo

Morada: Santo da Serra, Machico

E-mail: geral@bonecadecanudo.com

Tel.: + 351 969 237 520

Prova de Essência – Inclui vinhos, queijos, enchidos regionais, pão e frutos secos: 25€

Enoturismo Madeira

A oferta inclui visita às vinhas e ao pomar e prova de vinhos acompanhada por pão caseiro, queijos, enchidos e frutos secos, para além de chocolates próprios, azeite e mel

Quinta de Santa Luzia

Nos arredores do Funchal, dispondo de uma vista soberba sobre a cidade e a baía, a Quinta de Santa Luzia é uma propriedade agrícola na posse da família Blandy há quase 200 anos (adquirida em 1826). Possui uma pequena área de vinha arrendada, de apenas um hectare, num patamar ligeiramente inclinado de rara beleza. As vinhas são destinadas à produção de vinho da Madeira, pelo que as castas plantadas são as tradicionais: Terrantez, Sercial, Boal e Verdelho, sendo que estas duas últimas são as mais adaptadas ao local. Integrada nesta propriedade está a unidade de Agro Turismo denominada Quinta das Malvas, que possui alojamento com seis quartos com nomes de ervas aromáticas e mais uma villa independente com oito quartos. No dia da nossa visita fomos recebidos e guiados, num curto mas interessente passeio, por Emily Blandy, responsável pelo Enoturismo da Madeira Wine Company, de que a Blandy’s faz parte.

A propriedade, vocacionada para o turismo de qualidade, revela uma natureza acolhedora, onde o verde da paisagem e o azul do Atlântico, a majestade das frondosas arvores centenárias, os pitorescos recantos dos seus jardins e a arquitectura inglesa colonial dos vetustos edifícios compõem uma atmosfera singular de charme, convidativa à contemplação e ao lazer.

O empreendimento disponibiliza um conjunto alargado de serviços, que começa na prova clássica de quatro vinhos Madeira Blandy’s 10 anos, Sercial, Verdelho, Boal e Malvasia, com o custo por pessoa de 37,50€, Estão ainda disponíveis outras provas de vinho Madeira, como verticais de Verdelho e Boal com 5, 10 e 15 anos, para além do Colheita de 2011, ao preço de 60€. Pode ainda o turista usufruir de refeições privadas para pequenos grupos, confecionadas pelo chefe Filipe Janeiro, com seis momentos, harmonizadas com os vinhos tranquilos Atlantis, depois de visita guiada à quinta, pelo custo unitário de 195€. Na época própria há ainda possibilidade de programas de vindimas com a duração de quatro horas, almoço incluído. Na mansão Quinta das Malvas, renovada em 2004,  vigora o sistema de bed and breakfast, com utilização opcional de cozinha e outros equipamentos e a possibilidade de marcação de sessões de massagens e yoga.

Quinta de Santa Luzia

Morada: Rua de Santa Luzia, 113, Funchal

Site: www.quintadesantaluzia.com/pt

Tel. : + 351 291 281 663

Programas de provas de vinhos, visitas, refeições, a partir de 37,50€ por pessoa. Estadia na Quinta das Malvas em regime de bed and breakfast a partir de 90€ (época baixa)

 

Nos arredores do Funchal, dispondo de uma vista soberba sobre a cidade e a baía, a Quinta de Santa Luzia é uma propriedade agrícola na posse da família Blandy há quase 200 anos

Quinta das Vinhas

No Estreito da Calheta, encosta sul da ilha, a Quinta das Vinhas é uma propriedade com cerca de quatro hectares, pertença da família Welsh desde o século XVII. Existe documentação que situa o ano de 1675 como aquele em que esta família de ascendência inglesa tomou posse da propriedade. Esteve, desde sempre, ligada à actividade agrícola, primeiro com o cultivo da cana de açúcar e mais tarde com vinha. Nas primeiras décadas do século XX, a quinta esteve alugada ao Instituto do Vinho da Madeira, que ali implantou um campo ampelográfico experimental com a finalidade de estudar adaptação das diversas castas ao terroir da Madeira. Foi este projecto que permitiu a plantação de cerca de 70 castas vínicas e de sobremesa espalhadas por diversas parcelas e pequenos patamares,  que deu justificação ao nome que hoje ostenta. Este contrato durou até 2017, findo o qual as vinhas passaram para o controlo dos donos, que lhe imprimiram uma orientação diferente convertendo-as em biológicas seguindo os princípios da biodinâmica. Na fase actual, segundo explicou Isabel Freitas, responsável pela gestão da propriedade, procura-se um compromisso entre a preservação da herança recebida e a sua exploração, com fortes preocupações ambientais. Isto significa uma avaliação cuidada e permanente da viabilidade das diversas castas, perante condições particulares de humidade entre 60 e 70%, privilegiando, naturalmente, aquelas que demonstram mais aptidão para a produção de vinhos de qualidade.

Em 2021 foi lançado o primeiro vinho fruto da agricultura biológica, um branco Verdelho da marca Fanal, um projecto experimental feito em colaboração com a Justino’s, a que se seguiu, em 2023, um blend de Verdelho e Boal. Em sentido inverso, as castas Terrantez e a Tinta Negra têm sido abandonadas por inaptidão, enquanto aposta recente aponta para o Bastardo e Malvasia Cândida. Comum a estes desenvolvimentos é a preocupação permanente de respeitar o ecossistema e introduzir a biodiversidade, ao mesmo tempo que se adicionam, através de aquisição, novas parcelas de vinhas à propriedade.

Mas a Quinta das Vinhas está hoje longe de se esgotar na sua vertente agrícola. Em 1997, os proprietários procederam à recuperação da Casa Mãe e a receber, a partir daí, os seus primeiros hóspedes. Depois da restauração do edifício principal e de um outro anexo, foram recuperadas ou construídas de raiz novas habitações, chamadas Casinhas Mezanines, com quarto e kitchenette e Apartamentos mais amplos para famílias numerosas, espalhadas pelos socalcos, proporcionando alojamentos familiares independentes que garantem comodidade, mesmo para estadias mais longas, e a privacidade que o perfil dos turistas reclama. Todos os quartos estão virados a sul e têm vista para o jardim e/ou vinha, e os dos pisos superiores têm também vista para o mar. Os quartos do andar térreo da casa principal oferecem, aos hóspedes, acesso direto ao terraço e à área da piscina. No total a quinta pode alojar até 70 hóspedes. Os quartos do anexo têm vistas sobre a vinha e o mar e uma área de estar privada no exterior. Pormenor curioso revelador da filosofia do projecto é a ausência de televisão em todos os quartos. O Restaurante Bago, localizado no topo da quinta, completa a oferta turística da propriedade, oferecendo uma esplanada com vista sobre a vinha até ao mar. Aberto aos jantares, pratica uma cozinha de fusão com toque local. O visitante, além das refeições, pode fazer provas de vinhos produzidos exclusivamente a partir das uvas da quinta.

Quinta das Vinhas

Morada: Estrada Regional 223, 136, Calheta

Tel.: +351 291 824 086

E-mail: infoqdvmadeira.com

Provas de três vinhos a partir de 25€.

Restaurante aberto diariamente a partir das 17:00 horas para chá e bebidas e. a partir das 18:00. para jantares. Alojamentos a partir de 120€

Enoturismo Madeira

No Estreito da Calheta, encosta sul da ilha, a Quinta das Vinhas é uma propriedade com cerca de quatro hectares, pertença da família Welsh desde o século XVII

 HM Borges

Em pleno centro do Funchal situa-se uma das mais conhecidas empresas de produção de vinho da Madeira, a H. M. Borges. Fundada em 1877 por Henrique Meneses Borges, mantém-se, desde essa data, na posse da mesma família. Hoje, na direcção da casa encontram-se duas primas, Helena e Isabel Borges, representantes da quarta geração. O edifício contempla, no mesmo espaço físico, a sede social, o centro de visitas, caves de envelhecimento e uma loja. Está em funcionamento numa das ruas mais movimentadas da cidade desde 1924.

É um local cheio de história e tradição, onde o visitante pode mergulhar no mundo fantástico do vinho da Madeira. A casa não dispõe de vinhas próprias e compra, a mais de 100 viticultores, as uvas necessárias à produção do vinho fortificado. O centro de visitas está preparado para receber, em simultâneo, dezenas de turistas, proporcionando, a todos, um programa que começa com a apresentação da história da casa e do vinho da Madeira, e continua com a visita às caves e uma prova de vinhos no final. É ali que o visitante fica a conhecer os detalhes que fazem, do Madeira, um dos grandes vinhos fortificados do mundo. São pormenores como a condução das vinhas em latadas ou pérgolas, o sistema de condução das videiras típico da ilha, que permite a utilização dos solos por outras culturas, o trabalho dos borracheiros, assim chamados aos homens que transportavam o vinho às costas dentro de um recipiente em pele e, sobretudo, o processo de estufagem indispensável ao seu amadurecimento e envelhecimento.

É impossível esquecer a história do vinho de roda que,  depois de uma longa viagem marítima, cruzando os trópicos, voltava à casa de partida com qualidades em aromas e sabor que não tinha quando embarcava. A estufagem do vinho, em grandes tanques, elevando a sua temperatura a 35ºC durante 90 dias, tenta reproduzir, nas condições das caves, os maus tratos dessa infeliz/feliz viagem, Este processo, utilizado para vinhos de entrada de gama, feitos a partir da casta Tinta Negra até três anos de idade, é substituído, para os vinhos das castas nobres,  com objectivo de maior tempo de envelhecimento, pelo método de canteiro, em que o vinho envelhece natural e lentamente nas barricas colocadas em locais com  exposição ao calor.

A visita à cave, com os seus grande tonéis e pilhas de barricas amontoadas em altura, não deixa de impressionar o visitante que percebe, assim, o trabalho e esforço por detrás do famoso vinho. As provas de estão disponíveis na modalidade Silver (15€) para vinhos de três e 10 anos, Gold (17,50€) para vinhos de cinco e 15 anos e Diamond (34€) para seis vinhos da Madeira desde os cinco anos, chamados Frasqueiras, vinhos com mais de 20 anos de envelhecimento.

H.M. Borges

Rua 31 de Janeiro, 83, Funchal

Site: www.hmborges.com

Tel. : + 351 291 223 247

Visita e provas de vinhos desde 15€

O centro de visitas proporciona um programa que começa com a apresentação da história da casa e do vinho da Madeira, e continua com a visita às caves e uma prova de vinhos no final

 

 

(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)

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