Haut-Brion, a jóia de uma brilhante coroa

A empresa Vinitrust, que representa algumas das grandes marcas de vinho em Portugal, organizou uma masterclasse de vinhos da Domaine Clarence Dillon, com presença de Guillaume-Alexandre Marx, o director comercial dos três châteaux emblemáticos do grupo – Haut-Brion, La Mission Haut-Brion e Quintus.

O banqueiro norte-americano Clarence Dillon, apaixonado pela França, não hesitou quando recebeu uma proposta para comprar o lendário Château Haut-Brion, na sub-região de Graves em Bordeaux. Com esta aquisição de uma propriedade icónica, um terroir excepcional e um pedaço da história vínica de França, nasceu, em 1935, o Domaine Clarence Dillon, agora gerido pela quarta geração da família, representada pelo Príncipe Robert de Luxemburgo. Em 1983, a família expandiu a sua presença em Bordeaux ao integrar o Château La Mission Haut-Brion, também em Graves, e, em 2011, ao adicionar ao portefólio o Château Quintus, localizado em Saint-Émilion.

 

Haut-Brion

Embora o Château Haut-Brion e o Château La Mission Haut-Brion partilhem raízes e terroirs semelhantes, cada um tem uma identidade distinta

 

Haut-Brion e La Mission, duas expressões de terroir

Poucos nomes no mundo dos vinhos evocam tanto respeito e admiração quanto o Château Haut-Brion. Provavelmente, não há enófilo que não tenha os vinhos desta propriedade histórica na sua bucket list.

Haut-Brion é um dos château mais antigos e célebres de Bordeaux. A produção regular de vinhos teve início em 1521, embora registos históricos indiquem a presença de vinhas na propriedade desde o início do século XV. Ganhou reconhecimento internacional ainda no século XVII, tendo sido mencionado no livro de adega de 1660 do Rei Carlos II e, em 1663, referenciado no famoso diário de Samuel Pepys, um grande apreciador e coleccionador de vinhos, que o descreveu como possuindo “um gosto bom e muito particular, como nunca antes experimentara”.

O Château Haut-Brion foi pioneiro em práticas enológicas que hoje são amplamente adoptadas. Nos meados do século XVII, ao atestar os cascos para evitar oxidação e realizar transfegas regulares, retirando o vinho das borras durante o estágio, era uma autêntica inovação que resultava num vinho final mais limpo e aromático. O estágio prolongado nestas condições permitiu a criação de vinhos mais refinados, com maior complexidade e potencial de guarda.

Localizado em Pessac-Léognan, é a única propriedade fora do Médoc a figurar na famosa Classificação de 1855 como Premier Grand Cru Classé, um dos cinco châteaux no topo absoluto da hierarquia de Bordeaux. Quase cem anos mais tarde foi também incluído na Classificação de Graves, sendo o único château a figurar em duas classificações.

Curiosamente, o branco do Château Haut-Brion, altamente exclusivo e de produção muito limitada (apenas poucas centenas de caixas de 12 garrafas), não consta na Classificação de Graves. No entanto  supera o tinto a nível de preço, sendo o vinho branco mais caro do mundo.

O Château La Mission Haut-Brion também foi fundado no início do século XVI por Jean de Pontac, o mesmo proprietário do Haut-Brion. Mais tarde foi adquirido pela Ordem dos Lazaristas, que manteve a propriedade durante 130 anos. Daí o nome “La Mission”.

Embora não tenha entrado na classificação de 1855, que incluiu apenas os vinhos do Médoc e o incontornável Haut-Brion, de Graves, La Mission Haut-Brion é reconhecido como Cru Classé de Graves. A partir de 1927 juntou ao seu portefólio vinho branco, que continua a ser um dos grandes brancos de Bordeaux, rivalizando com o do Château Haut-Brion.

Ambas as propriedades estão localizadas em Pessac-Léognan, a menos de 500 metros uma da outra, separadas por uma estrada, e têm um terroir semelhante, com diferenças subtis. O solo de cascalho assenta sobre um subsolo de argila, calcário e areia com fragmentos de conchas.

A presença de Merlot e Cabernet Sauvignon nas vinhas do Haut-Brion é igual, 45% de cada, e o resto é Cabernet Franc, conta o director comercial. Desta forma diminui a dependência de uma casta só e consegue-se a flexibilidade necessária para manter a consistência dos vinhos independentemente do ano. Para além dos 51 hectares com castas tintas, três hectares são dedicados às variedades brancas: Semillon e Sauvignon Blanc. No La Mission Haut-Brion, com 25 hectares, há alguma prevalência do Cabernet Sauvignon. As mesmas castas brancas são plantadas numa área com mais de quatro hectares.

Guillaume-Alexandre Marx confirma que os efeitos do aquecimento global já são perceptíveis, resultando em colheitas com maior maturidade e consistência. Por enquanto, não está previsto alterar as variedades plantadas. A equipa monitoriza de perto o desempenho de cada parcela vinificada, e, quando percebem que alguma não apresenta um bom desempenho ao longo de alguns anos, optam por deixá-la em repouso por três anos antes de replantá-la, geralmente com a mesma variedade. Em alguns casos, contudo, há uma substituição de Cabernet Sauvignon por Merlot, ou vice-versa, de acordo com as condições observadas.

A viticultura nos châteaux não é certificada como orgânica, mas os seus responsáveis procuram actuar de forma mais ecológica possível, reduzindo o número de tratamentos, não usando insecticidas e promovendo a biodiversidade.

Abordagem enológica e consistência

Nas propriedades com uma rica história e tradição é essencial preservar os valores e o legado ao longo das diferentes épocas. No Château Haut-Brion e La Mission Haut-Brion, a continuidade e a consistência são garantidas pela sucessão da responsabilidade enológica, actualmente nas mãos de Jean-Philippe Delmas, a terceira geração da família Delmas.

Embora as técnicas de vinificação sejam semelhantes em ambos os châteaux, a seleção das uvas e o blend final são cuidadosamente ajustados para realçar os estilos únicos e característicos de cada propriedade.

A vindima começa em Setembro e acaba no início de Outubro. O primeiro a vindimar é sempre o Haut-Brion. “Vinificamos separadamente por parcelas”, conta o director comercial. Ao completar a fermentação alcoólica e maloláctica, a cada depósito/parcela é atribuido o nível de qualidade com base na prova sensorial: 1 – primeiro vinho, 2 – segundo vinho, 3 e 4 – para vender. Guillaume-Alexandre Marx explica que, ao contrário de muitos châteaux, a abordagem não se baseia nas parcelas em si, mas na qualidade que entregam em cada ano e na possível combinação. “Simplesmente lotear todas as melhores parcelas nem sempre se traduz num grande vinho. Por vezes uma parcela que, sozinha, não dá grande prova, contribui com algo muito particular ao conjunto final. E estas decisões são tomadas na sala de provas entre as quatro pessoas”, conta Guillaume-Alexandre Marx. As sessões de loteamento decorrem entre meados de novembro e de dezembro, mais cedo do que em muitos outros châteaux.

O estágio em barrica dura entre 16 e 18 meses, sendo ajustado com base em provas regulares. Para o primeiro vinho utilizam normalmente 75% de barricas novas e 30% para o segundo. As barricas são, em grande parte, fabricadas na tanoaria própria, e cerca de 20% são adquiridas, geralmente à Seguin Moreau.

Embora o Château Haut-Brion e o Château La Mission Haut-Brion partilhem raízes e terroirs semelhantes, cada um tem uma identidade distinta. Haut-Brion é a expressão suprema de elegância e finesse, enquanto La Mission Haut-Brion exibe uma força sedutora e uma opulência marcante.

Ambos os châteaux produzem o segundo vinho: tintos Le Clarence de Haut-Brion e La Chapele de La Mission Haut-Brion e um branco La Clarté de Haut Brion, feito com as uvas das duas propriedades.

No Château Haut-Brion e La Mission Haut-Brion, a continuidade e a consistência são garantidas pela sucessão da responsabilidade enológica, actualmente nas mãos de Jean-Philippe Delmas.

 

Château Quintus – o novo nome em Saint-Émilion

Após a aquisição pela Domaine Clarence Dillon, em 2011, a propriedade foi renomeada para Quintus. A área de vinhas foi ampliada de 15 hectares iniciais para os atuais 45 hectares, através da incorporação de duas propriedades próximas do château. A composição das vinhas é predominantemente da casta Merlot (75%), com o restante a ser ocupado por Cabernet Franc. O antigo Cabernet Sauvignon, presente nas vinhas, foi gradualmente substituído por Cabernet Franc. A idade média das videiras ronda os 30 anos, embora algumas parcelas sejam quase centenárias.

A filosofia de vinificação é conduzida pela equipa liderada por Jean-Philippe Delmas. O processo é orientado pelo equilíbrio, evitando extração excessiva ou o uso exagerado de barricas, onde a madeira nova geralmente não ultrapassa 50%.

Em 2022, a Domaine Clarence Dillon organizou uma prova cega com 8 colheitas do Château Quintus, onde estas foram avaliadas lado a lado com os vinhos icónicos de Saint-Émilion, como o Château Angélus, Château Ausone, Château Cheval Blanc, Château Figeac e Château Pavie. Apesar da forte concorrência, o Château Quintus mostrou-se à altura dos grandes nomes.

(Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2025)

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