Muros de Melgaço: 25 anos de sucesso

António Barreto, cientista social atento às inúmeras mudanças do nosso país, aponta a transição entre as décadas de 80 e 90 do século passado fundamentalmente como um tempo de diversidade: “o aparecimento e afirmação de uma diversidade e de uma pluralidade até aí inexistentes. Ainda há costumes arcaicos na alimentação e no vestir e já há telemóveis, sapatos de marca e garrafas de vinho grande reserva nos rótulos.”.
Como é evidente, as garrafas de vinho com a designação “grande reserva”, a que se referiu António Barreto, também estiveram ligadas a profundas transformações ocorridas neste período, que mudaram radicalmente o panorama vínico nacional.
A entrada oficial de Portugal, na então denominada Comunidade Económica Europeia, em 1986, ocasionou uma enorme torrente de fundos comunitários, que foram usados para revolucionar o sector. Durante a década de 90 assistiu-se a um enorme incremento de um fenómeno que ficaria na história como o tempo dos “vinhos de Quinta” e alastraria pelo país como uma chama imparável. Muitas das marcas nacionais, que são hoje amplamente reconhecidas dentro e fora de portas, foram criadas ou ganharam notoriedade nesta década.
Não podemos esquecer igualmente o facto da consolidação da profissão de enólogo. Muitos fixaram-se num produtor em particular, mas outros, como Anselmo Mendes, preferiram prestar os seus serviços a diversos produtores.

 

Em 1988, Anselmo Mendes teve a visão inovadora de que a casta Alvarinho podia originar vinhos ainda mais nobres e distintos quando fermentados em barricas de carvalho. Mais de 25 anos de colheitas de Muros de Melgaço provam que tinha razão.

 

Experimentalista e inovador

Em 1987, Anselmo Mendes terminou a licenciatura em engenharia agro-industrial no Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa e rapidamente ingressou no mercado de trabalho para se embrenhar na diversidade avassaladora de transformações de então. Entre 1987 e 1997 colaborou em inúmeros projectos vínicos no Norte de Portugal, ligados ao despontar do movimento dos “vinhos de quinta”, e que, ainda hoje, apresentam raízes fortemente alicerçadas em conceitos ligados à qualidade e à distinção.
Após uma visita à Borgonha, em 1988, encomendou duas barricas de carvalho francês instalando-as em casa dos pais, em Monção, para realizar algumas experiências de fermentação com a Alvarinho, a casta rainha da região que o viu nascer.
O estudo foi de tal forma aprofundado e persistente, que decorreu durante cerca de 10 anos e envolveu a compra de uma quinta. Na altura, Anselmo Mendes era um jovem produtor de vinhos com duas mil garrafas da colheita de 1998 para vender e, com ela, comprovar uma visão inovadora na região: a casta Alvarinho podia originar vinhos ainda mais nobres e distintos quando fermentados em barricas de carvalho.
O impacto alcançado pelas primeiras colheitas da marca Muros de Melgaço permitiu a continuação e o alargamento do estudo da casta usando diferentes tostas e volumes nas barricas de carvalho francês. Este êxito proporcionou, em 2008, estender a sua actividade em dois espaços distintos: a Quinta da Torre, uma propriedade com 12 hectares e uma nova adega no Parque Industrial de Melgaço. Estes novos espaços permitiram dominar a produção de uva e aprofundar as experiências com a casta alargando-os aos solos, podas e outros temas que a mente inventiva de Anselmo Mendes perscrutou. O resto é uma história de sucesso, aqui representada por nove colheitas de Muros de Melgaço, a marca pioneira, incontornável referência entre os grandes Alvarinho de Monção e Melgaço.

 

VERTICAL MUROS DE MELGAÇO

16,5 A

Muros de Melgaço Alvarinho branco 1999

Cobre na cor. Aromas e sabores a fruta cozida, mel e mineralidade. A acidez revelada empresta alguma frescura ao conjunto em notório fim de linha, ainda assim importa sublinhar que, apesar dos 25 anos de idade ainda se bebe com prazer. (13%)

18 A

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2002

Coloração acobreada revelando os 22 anos de idade. Notas evidentes a mel, chá, marmelo, funcho e leve fruta cítrica. Numa clara fase descendente, ainda assim fresco e admiravelmente bem preservado para a idade que apresenta. Para beber de joelhos em agradecimento pela forma positiva como evoluiu. (13%)

18,5 A

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2009

Este vinho apresenta uma cor dourada e aromas a favo de mel, chá, folhas secas e leve fruta cítrica envolta em leve manteiga e grande tensão. Esta referência iniciou a sua fase descendente. Ainda assim mostra um surpreendente equilíbrio entre untuosidade e frescura. (13%)

18,5 A

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2012

Fermentado e envelhecido durante seis meses em barricas de carvalho francês usadas.  Aromas a infusão cítrica e sugestão a pedra molhada. De perfil muito fresco e mineral, muito embora mostre alguma evolução em garrafa que o complexifica grandemente. Um hino à região e à casta. (13%)

18,5 B

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2015

De cor dourada. Apontamentos de lima, casca de laranja, pedra molhada e folhas secas. Mostra-se surpreendentemente jovem, muito tenso e fresco. Grande presença de boca, com muito equilíbrio e complexidade. Um grande vinho a mostrar todas as capacidades da casta na região. (12,5%)

18 B

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2016

Apresenta uma coloração amarela fruto da nobre evolução em garrafa. As notas aromáticas remetem para leve chá, folhas secas, fruta cítrica, pedra molhada e leve pimenta branca. No palato, a acidez bem vincada eleva a fruta cítrica, as finíssimas especiarias e alguma evolução. (13%)

17,5 B

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2018

Coloração amarela clara. Esta referência mostra um belíssimo equilíbrio entre os aromas a flores brancas, casca de laranja, toranja, pimenta branca e pedra molhada. Na boca denota boa ligação entre a delicada fruta cítrica e a leve barrica. Boa precisão e complexidade. (13%)

17,5 B

Muros de Melgaço Alvarinho branco 2020

Aromas florais bem marcados, casca de laranja, algum biscoito, leves especiarias e sílex. Na boca mostra fruta cítrica muito fresca e leves especiarias a amparar o conjunto bastante equilibrado, bem definido e tenso. (13%)

 

(Artigo publicado na edição de Abril de 2024)

 

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