Está na hora de alguém assumir que os jornalistas não trabalham. Principalmente os da imprensa especializada em vinho e gastronomia, que não fazem mais do que comer e beber. Uma vida folgada, está-se mesmo a ver.
JORNALISMO não é trabalho. Escrever não é medicina nem engenharia nem advocacia, muito menos hotelaria, agricultura, construção ou qualquer outra coisa que obrigue a puxar pela cabeça ou pelo corpo. Os jornalistas são preguiçosos e só se mexem quando querem, não ficam acordados até tarde com o peso da responsabilidade, das preocupações e dos prazos. Quando acham que precisam descansar, podem fazê-lo à vontade porque o mundo pára e deixa de haver novidades e acontecimentos para noticiar, principalmente na área do vinho e da gastronomia, com o ritmo lento a que saem novos vinhos e se fazem eventos gastronómicos em Portugal.
Tempo para escrever e para pensar? Porquê? Como qualquer ser humano, os jornalistas estão constantemente no pico da sua criatividade e, se não conseguem escrever as suas dezenas de textos de segunda a sexta-feira, das oito da manhã às seis da tarde, é porque são todos uns langões. Que diabo, é só isso que têm para fazer! E não é difícil.
De entre os profissionais da escrita, os jornalistas e críticos de vinho e gastronomia são os que levam a melhor vida. É só viagens, passeios, festas, almoçaradas e jantaradas, muitas e longas, um constante forró. Ninguém à volta dos jornalistas sofre com isso porque, apesar das múltiplas ausências e de todas as refeições que não passam em casa, toda a gente sabe que os jornalistas nunca conseguem manter uma família por muito tempo. E os que a têm não são exemplo para este caso, porque é sabido que os jornalistas ganham tanto dinheiro que as suas mulheres, os seus maridos e os seus filhos são encaminhados de férias para a Polinésia Francesa enquanto eles se divertem à conversa com produtores, enólogos, cozinheiros, comendo e bebendo do melhor nos intervalos.
Os críticos, esses, entretêm-se a dizer mal de tudo, até do próprio trabalho. Nos seus muitos momentos de ócio, críticos de vinho e de gastronomia divertem-se a deitar abaixo o trabalho dos produtores e chefes de cozinha que se esfalfaram para fazer um vinho ou conceber um prato. Provas de vinho? Deixem-me rir. Como é que alguém pode considerar isso trabalho? Os vinhos são todos iguais e provar, classificar e descrever cinco, vinte ou cinquenta vinhos de seguida é coisa que qualquer um faz. Cheira-se, prova-se, escrevem-se umas notinhas sobre isso e já está. Não requer esforço ou talento e não exige responsabilidade. Chamar trabalho a isso? Os jornalistas não trabalham.