Paço do Conde: Vinhos do Alentejo profundo

Baleizão foi terra de cereais e hoje é sobretudo terra de olival, pastagens e vinho, sob a égide da Herdade Paço do Conde. Com um portefólio de produtos variado, este gigante agrícola do Baixo Alentejo serve paisagem numa bandeja.

TEXTO Mariana Lopes
NOTAS DE PROVA Luís Lopes
FOTOS Ricardo Palma Veiga

João Tordo, escritor português, descreveu a aldeia de Baleizão da seguinte maneira, no seu livro Anatomia dos Mártires: “É um conjunto de casas brancas com telhados em tijolo castanho, janelas de cantaria e portas extraordinariamente pequenas onde, durante as tardes, os locais se abrigam do calor. Tem uma escola, uma Junta de Freguesia e, no centro da aldeia, um busto de Catarina Eufémia sobre uma coluna branca cercada por uma pequena vedação onde, ao final da tarde, os velhos se sentam a descansar. (…) Andei ao acaso pelas ruas de alcatrão quente e as portas baixinhas, de laranjeiras podadas e cães vadios farejando as bermas.”

Ao largo desta aldeia, carregada de simbologia, encontra-se a Herdade Paço do Conde, que está nas mãos da família Castelo Branco há mais tempo do que se consegue contar. Os actuais proprietários, José António Castelo Branco, Luís Miguel Castelo Branco e Maria Luísa Castelo Branco Schmidt, são os netos do fundador da actual empresa, que nasceu em 1928. A parte materna da família já pratica agricultura tradicional na região há muitas gerações. Já a parte paterna é da Beira, especificamente de Vila Nova de Poiares. O referido avô fundador, vindo dessa zona, viu-se um dia perante uma oportunidade de investimento no Alentejo, que acabou por se concretizar na Herdade de Paço do Conde.

Um dos seus filhos, advogado de profissão, era aficionado de agricultura e da região, e o fundador, que mais tarde resolveu vender tudo, acabou por não o fazer, por essa razão. Assim, fez-se uma sociedade agrícola entre ele, o filho advogado e as duas filhas. Estas faleceram cedo, mas o filho acabou por lá casar e ser pai de José António Castelo Branco e dos irmãos. “Nasci em Lisboa, mas passava muitas temporadas em Baleizão com o meu pai, sempre que ele tinha férias”, contou José António. Na verdade, muitos proprietários, naquela altura, desertaram dali, mas a família Castelo Branco ficou, até hoje. E hoje chegam-se à frente, na gestão e na supervisão agrícola, Filipe Castelo Branco e Pedro Castelo Branco Schmidt, filhos de José António e de Maria Luísa, respectivamente.

Do Guadiana a Vilares
A Herdade Paço do Conde estende-se por cerca de 4.000 hectares com uma flora (e até fauna…) bastante diversificada. O principal negócio, o azeite, vem de 1.900 ha de olival, mas a herdade é também berço de outras culturas como o trigo, o girassol, o milho, a papoila e vários produtos hortícolas. Só 1.700 ha representam pastagem natural e semeada para alimentação das cerca de 1.000 vacas. A vinhas, todas próprias, materializam-se em 260 ha na totalidade, sendo que 50 desses são na Vidigueira, com mais 15 para breve. Em Baleizão, o solo dos vinhedos comporta muito xisto e alguma areia, enquanto que na Vidigueira são compostos, sobretudo, por argila. Para a plantação das vinhas, que se iniciou em 1995, escolheram-se as castas tintas Alicante Bouschet, Aragonês, Cabernet Sauvignon, Castelão, Merlot, Syrah, Touriga Nacional e Trincadeira; e as brancas Antão Vaz, Arinto e Viognier. Este investimento na vinha e no olival representa o esforço dos Castelo Branco em reconverter a actividade agrícola que muito passava pelo cereal de sequeiro, focando-se em culturas mais competitivas como aquelas. “Estamos a considerar entrar na amêndoa, para diversificar ainda mais a nossa oferta” contou Pedro Schmidt.

Para o desenvolvimento da actividade e da região, José Castelo Branco não esquece que “o dinamismo do Alqueva veio dar um aqui boost muito grande. Proporcionou mais investimento nas redondezas, trouxe o movimento financeiro que estava a faltar”.
Ao longo da propriedade, que acompanha as margens do rio Guadiana, existem nove pequenas barragens, nove “oásis no deserto” que embelezam ainda mais aquilo que já é um local pleno de encanto. Percorrendo os caminhos da herdade, uma surpresa a cada passo, uma perdiz a descansar na estaca de uma vinha sem preocupações, o Guadiana a espreitar, quando menos se espera, entre dois montes que o encerram como que a impedir que ele fuja, o olhar sereno de um vitelo, um campo de flores silvestres a pintar o quadro de amarelo. A produção integrada e a consciência ecológica são evidentes.

Da adega e do lagar
A adega começou a ser erguida em 2002, ano em que o Paço do Conde começa a produzir os seus vinhos, com apenas 30 a 40 ha de vinha. De construção moderna, o edifício esconde no seu interior abóbadas e arcadas, mas também uma tecnologia de vinificação com capacidade para 1.410.000 litros. A marcas Herdade Paço do Conde (marca-mãe), Encostas do Guadiana, Herdade das Albernoas (muito presente lá fora, especialmente no Canadá), Vilares e 3 Herdades perfazem, actualmente, uma produção de 1,5 milhões de garrafas, número “a duplicar em breve”, descortinou Pedro Schmidt. O tinto representa 65% da produção, e o branco 35%. Na verdade, o forte aqui ainda é a exportação, mas a vontade da família é dar cada vez mais importância ao mercado nacional. “A previsão, este ano, é ficar 50/50”, adiantou.

O enólogo, que está na empresa desde o início da actividade vinícola, é o experiente Rui Reguinga, que nos explicou: “A intenção aqui sempre foi fazer vinhos com excelente relação qualidade-preço”.
Em 1998, iniciaram a plantação do olival, selecionando as variedades Galega, Cobrançosa, Frantoio, Arbequina e Picual, e em 2007 começou a produção em lagar próprio, com capacidade para processar 650 toneladas por dia. Hoje, a produção anual é de 2 000 000kg de azeite que se divide em dois engarrafados, Herdade Paço do Conde e outro com o mesmo nome e designativo Exclusive Selection (para lojas gourmet), e uma grande parte que é vendida a granel, sendo que “Itália é um excelente mercado” para esta última. Não obstante, querem vender cada vez mais azeite engarrafado.
Pedro Schmidt foi muito claro no que toca aos objectivos actuais da empresa. “O nosso grande foco é crescer no vinho e no azeite, pois achamos que são as duas culturas que mais fazem sentido no Alentejo”. O sucesso desta sociedade agrícola, que conta já com cerca de 70 pessoas empregadas, não se baseia em nenhum segredo nem numa malha complexa de gestão. Pedro tem a fórmula, e esta é simples: “Começámos com os pés bem assentes na terra”.

 

Edição Nº15, Julho 2018

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