Soalheiro: Experimentar, aprender, evoluir

Para uns, clássico, para outros, moderno. É assim o produtor Soalheiro, a causar, desde que os irmãos António Luís e Maria João Cerdeira pegaram no projecto familiar, fundado pelos pais em 1982, diferentes interpretações e emoções nos consumidores de Alvarinho de Monção e Melgaço (e não só). Tudo depende dos vinhos nos quais se coloca o foco: por um lado, os Soalheiro “Clássico”, Reserva, Allo, Primeiras Vinhas ou Germinar; por outro, referências como Terramatter ou Nature, e até mesmo o Granit que, segundo Luís Cerdeira foi, na verdade, um dos primeiros sintomas da veia experimental e curiosa da equipa técnica da casa. “Tanto podemos considerar que somos o novo do Velho Mundo, ou o velho do Novo Mundo”, afirma o produtor.

Mas é agora que esta componente vem ao de cima com mais força, com o Soalheiro a apresentar ao público e à imprensa uma gama de vinhos feitos, na sua adega, com processos de vinificação que não ‘«são tão familiares, alguns deles produzidos, inclusive, em parceria com outros enólogos. Uma parte destes vinhos está já no mercado, e a outra vai (pelo menos por agora) ficar retida como instrumento de estudo e consumo não comercial.

“O Clássico Aguça o Engenho” foi o nome dado a esta viagem e aprendizagem, descrita assim pela equipa do Soalheiro: “A busca constante de conhecimento, e de vinhos que exprimam a riqueza que o território nos oferece, permanecerá, e é com esse conhecimento e engenho que os clássicos se fortalecem e se tornam intemporais”. Luís Cerdeira, que além de proprietário é responsável de enologia (apoiado pela enóloga residente Asun Carballo), explica a máxima, e recorda que “muitas coisas mudaram ao longo destes 40 anos, mas o nosso espírito criativo, curioso e exigente continuará sempre alimentar a nossa atitude, a sustentar a qualidade e consistência do que aqui criamos e a inspirar o projecto Soalheiro a valorizar o território”. Segundo Maria João Cerdeira, isto passa por dar ainda mais importância aos solos. “Este trabalho de valorização dos solos é recente e ainda há muito a fazer, mas foi também para isso que fundámos o Clube de Viticultores do Soalheiro, em 2004, para que houvesse maior partilha de conhecimento e recursos, porque só assim é que evoluímos”, desenvolve a responsável de viticultura. Actualmente, o Clube de Viticultores integra cerca de 150 famílias.

Além da colheita mais recente do Soalheiro que a casa apelida de “Clássico”, o Alvarinho de entrada de gama e um dos rótulos mais importantes (talvez o mais importante) para o negócio do produtor, na prova foram apresentados outros 10 vinhos. Dos que estão disponíveis no mercado, provou-se o Mosto Flor 2021 — “um Alvarinho feito a partir das gotas que escorrem das uvas antes da primeira prensagem”, ou seja, cujo mosto é obtido apenas a partir da pressão originada nas uvas quando estas são introduzidas na prensa, fermentando depois em inox — o Ag.hora Alvarinho 2021 — produzido em parceria com o enólogo georgiano Gio, inspirado no estilo de vinificação tradicional da Geórgia, fermentando em Terracota com leveduras espontâneas, onde faz maceração pelicular e volta para estagiar após prensa — o Pet Nat Alvarinho 2022 — excelente exemplar da categoria com rótulo igualmente bem-conseguido, uma nuvem branca em céu azul celeste, que transmite tranquilidade, leveza e expressividade — o Alvorone 2020 — Alvarinho criado em parceria com a Vinhos APRT3 “ao estilo Amarone, com as uvas desidratadas para concentrarem os açúcares e os ácidos, prensadas cerca de um mês depois”, antes de fermentarem e estagiarem um ano em barricas novas e mais 6 meses em inox — o Revirado 2020, já provado na edição de Abril — Alvarinho de solo granítico de encostas montanhosas a 400m de altitude, fermentado e muitas vezes “revirado” em barricas rotativas — e o Pé Franco 2020 — um Alvarinho que provém de vinhas não-enxertadas, plantadas há 10 anos em solo arenoso, fermentado com as películas e estagiado em barrica.

No que toca às experiências que por agora ficam apenas na “Cave de Inovação” do Soalheiro, falamos do Solo Limoso — um Alvarinho que nasce numa vinha “junto às margens graníticas e escavadas do rio Minho, em solo com grande percentagem de limo”, que fermentou em foudre e cuba de inox, e estagiou em barrica e ovo de inox — o Pet Nat Loureiro e o Pet Nat Alvarelhão — o primeiro com uvas de Valença e o segundo de uma vinha velha — e o De[Feito] — “blend feito das tinajas e terracotas de Loureiro e Alvarinho, estagiado mais de um ano em inox com as borras”, um vinho assumidamente “marado”, mas mostrado na mesma pois, segundo Luís Cerdeira, “inovar significa fazer novo, arriscar, e nem sempre corre bem!”…

(Artigo publicado na edição de Maio de 2023)

 

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