Quando a actriz toma conta da quinta

A sucessão na famosa Quinta do Poial, pioneira do biológico em Portugal, está a cabo de uma actriz que luta pelo legado da mãe.

TEXTO Ricardo Dias Felner
FOTOS Ricardo Gomez

O caminho tem pouco de campestre. Para se chegar, passa-se a urbanização Casas de Azeitão e depois faz-se um gancho que vai dar à propriedade, a serra da Arrábida lá bem ao fundo. Mas uma vez ultrapassado o portão, nota-se um sossego idílico de vegetação e passarinhos.
No centro da quinta está a um barracão onde, pelas 9.30, já se preparam cabazes de hortícolas. É de lá que sai Joana Macedo, camisa aos quadrados aberta no peito, mangas arregaçadas, calções de ganga curtos e botas — como uma agricultora sensual de filme de Hollywood, acabada de acordar.
A imagem bate certo com a biografia. A jovem agricultora já foi muitas coisas aos 38 anos de idade, mas aquela que mais a entusiasma é ser actriz. Nesse papel, tem estado activa nos últimos anos ao lado dos realizadores Júlio Pereira e Leandro Scarpin, que se dedicam sobretudo a curtas-metragens. De resto, a sua formação sempre esteve toda ligada às artes: dança no Conservatório, design industrial no IADE, curso de actores em Paris.
A Quinta do Poial, venerada por chefs com estrelas Michelin e fãs do orgânico, nunca foi por isso um objectivo de vida. Aqui Joana cresceu, mas daqui partiu em 2006 para Paris, onde o seu pai vivia — e só haveria de voltar em 2014. Essa fuga para França foi também uma fuga da Quinta. “Odiava esta quinta. A minha mãe não tinha tempo para mim. Não ia às minhas reuniões de escola, não ia ver as minhas peças de teatro”, atira.

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Uma mudança brusca de vida
O sentimento de rejeição haveria, contudo, de mudar abruptamente em 2016. Com a morte da mãe, Maria João Macedo, a quinta caiu nos braços da actriz. De repente, Joana tinha sobre si a responsabilidade de cultivar 200 variedades de legumes e frutas, parte das quais nem sabia que existia. Algum trabalho já estava feito e Joana admite isso. “Quando viemos para aqui, a terra era toda areia”, exemplifica Joana. Ainda hoje se percebe isso, basta olhar para o chão na zona de estacionamento. “Foi a minha mãe quem transformou areia numa quinta onde podem crescer coisas. Nesta terra estão 30 anos de trabalho”, assume.
O desafio continua, no entanto, a ser grande. Para além da responsabilidade de fornecer uma dezena de restaurantes com estrela Michelin — ”fora os que não se preocupam com guias” —, Joana ainda tem de gerir mão-de-obra, máquinas agrícolas, encomendas, pragas — bem como as travessuras do clima, particularmente prejudiciais neste ano.
Logo ali, na ala sul virada a sul, estão três estufas de tomates, cada uma com uns 100 metros de comprimento, ex-libris da quinta. Ao todo, Joana estima ter mais de 80 variedades do fruto. “Aqui os pink thai egg, aqueles são os tomate pêra, ali os indigo negro, o zebra, o orange banana, o green envy”, lista, enquanto vai puxando as plantas para cima e as enrolando em torno de fios presos ao topo da estufa.

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Muitos ramos estão deitados porque “não se conseguiu gente” para fazer o trabalho. Isso e um ano com pouco calor até finais de Agosto terá atrasado a colheita. Mas agora eles estão no ponto e a estimativa é que haja tomate do Poial até meados de Outubro, assim o nematode do tomate, um parasita, se mantenha afastado.
A forma como a horta está construída ajuda a manter pragas à distância. Por todo o lado, entre os tomateiros há cravos-túnicos plantados com a finalidade de manter bichos indesejáveis à distância. Outro trunfo da quinta tem a ver com excremento. “Não conseguimos ter animais aqui”, confessa Joana, “mas usamos guano”. E o que é guano? “Cocó de morcego. Vem de Angola. É uma bomba. Cara”.

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Tomates para todos os gostos e feitios
Seja ou não pelo guano, à medida que vamos correndo os tomateiros vamos comprovando a sua boa saúde. Há vários tomate cereja, todos destinados a negar a tese de que não passam de bolinhas reluzentes e sensaboronas de supermercado. A variedade, ao contrário do que se possa pensar, é muito antiga e abarca diversos primos saborosos. Os preferidos de Joana são os micro-cereja de framboesa, pequenos berlindes caprichosos e delicados: Para apanhá-los sem os danificar é preciso ter dedos de veludo, paciência e tempo. “Fui obrigada a aumentar o preço de nove euros o quilo para doze euros o quilo. Senão nem dava para pagar a mão-de-obra de os apanhar”.
As facturas passaram a ser coisas com que Joana tem de se preocupar. Recentemente, comprou umas máquinas manuais, uma espécie de bicicleta com arado que corta as ervas daninhas. Fala com muito orgulho dessa inovação, mas não esquece o preço. “Perto de 5.000 euros”, concretiza, ao mesmo tempo que faz uma demonstração do equipamento. Da mesma maneira, Joana tem na ponta da língua o valor que paga de electricidade durante os meses de Verão. “É preciso bombar muita água do furo. Estamos a falar de 800 a 1.000 euros por mês em electricidade”. A inexistência de um charco na propriedade é uma falha que quer suprimir, até porque ele garante a presença de um ser vivo extraordinário, essencial ao ecossistema biológico da quinta. “As libelinhas. As libelinhas são fantásticas para comer os outros insectos”.

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Tendo este empenho no projecto, Joana assume que gere a quinta de maneira diferente da da mãe. “Ela não era boa a delegar. Queria fazer tudo sozinha. E eu não sou, nem nunca fui agricultora”, conclui, deixando claro que isso não significa que o Poial esteja em risco. É uma questão de honrar o passado, de honrar a sua mãe, sem ressentimentos. “Farei tudo para que este projecto não vá por água abaixo”.

 

Edição Nº30, Outubro 2019

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