Henri Giraud Ay + Pinot + barrica = grande Champagne

Legenda da foto: As ânforas de grés potenciam a micro-oxigenação e interação do vinho base com as borras finas.

Robert Parker classificou, um dia, os vinhos da casa Henri Giraud como “o maior Champagne de que nunca ouviu falar”. O elogio vale o que vale, mas a verdade é que os Champagnes desta empresa familiar merecem (e muito) ser falados e, sobretudo, apreciados. Algo agora mais fácil de conseguir neste cantinho ocidental da Europa, uma vez que são importados e distribuídos em Portugal pela Disalto.
A casa Henri Giraud é relativamente recente, pois foi registada enquanto “Negociant-Manipulant” apenas em 1975, o que significa que cria as suas próprias uvas e compra uvas a terceiros. As suas raízes, porém, remontam 1625, quando François Hémart e sua família se instalaram em Ay, onde o Champagne nasceu no século XVIII e uma das 17 Grand Cru entre as 323 “villages” que compõem a região. A família Hémart produziu uvas e vinhos ao longo de muitas gerações, até que a filoxera, primeiro, e a Primeira Guerra Mundial, depois, arruinaram o seu principal sustento.

No princípio do século XX, Léon Giraud casou com Madeleine Hémart e dedicou-se a reconstruir todo o património vitivinícola familiar, que viria a ser desenvolvido e ampliado pelos seus descendentes, o filho Henri Giraud e o neto Claude Giraud, membro da 12ª geração.

Henri Giraud
As 2000 barricas de carvalho da floresta de Argonne, são essenciais ao estilo da casa.

Reputação e estilo

Foi Claude que desenvolveu a reputação e o estilo Henri Giraud, assentando-o em três pilares: vinhos Grand Cru Ay; uvas Pinot Noir; e barricas de carvalho de Argonne. Este último é hoje absolutamente definidor do estilo da casa. Claude reintroduziu progressivamente a fermentação em barrica a partir de 1993, algo que, com poucas excepções (Krug, Bollinger…) foi abandonado pelas casas de Champagne desde os anos 50. Mas, para Claude, não bastava fermentar todos os seus vinhos em barrica, objectivo atingido em 2016. Era fundamental fazê-lo em barricas construídas a partir de carvalhos da histórica floresta de Argonne, plantada no século XIV a 60 km de Reims, onde tiveram origem as clássicas barricas de Champagne. Convencido de que “não existem grandes vinhos que não estejam associados a uma grande floresta”, Claude levou mais de duas décadas estudando e selecionando carvalhos muito antigos (de grão super fino e alta densidade), encarregando-se de tostar directamente as madeiras, depois levadas à Tonnelerie de Champagne para o fabrico das barricas cuja certificação oficial Argonne alcançou. Ao mesmo tempo, lançou-se na recuperação da floresta de Argonne, abandonada a partir dos anos 60 do século XX, assumindo, perante a organização florestal do estado francês, a sua gestão. Como resultado, a casa Henri Giraud patrocinou a replantação em Argonne de 50.000 árvores nos últimos 10 anos.

A empresa orgulha-se de ser a única casa de Champagne a utilizar exclusivamente barricas da floresta de Argonne. E não são poucas. Na cave alinham-se cerca de 2000 barricas, usadas durante apenas 8 a 10 anos, para fermentar e estagiar os vinhos base que irão ser espumantizados, contribuindo decisivamente para a cremosidade, complexidade e carácter “boisé” dos champanhes Henri Giraud. Para algumas cuvées mais singulares, a empresa usa igualmente pequenas ânforas de grés (arenito com terracota e caulino), no sentido de potenciar a micro-oxigenação e interacção do vinho base com as borras finas. Outro factor distintivo é a baixa pressão dos seus Champagnes, a rondar os 3,6 bar (o mínimo legal é 3,5 bar e a média em Champagne anda pelos 5,5 bar), o que acentua a voluptuosidade e sensação de volume dos vinhos.
Expulso da fermentação, na Henri Giraud o inox mantém, no entanto, uma função: conservar intocada aquela que é um dos grandes ex libris da casa, a chamada “reserva perpétua”, constituída a partir de 1990 e considerada como um “segredo de família”. Consiste em 28 tanques quadrangulares, de 10 mil litros cada um, enterrados no solo, contendo vinhos velhos sem sulfuroso e com dezenas de anos de idade. A uma temperatura constante de 10,5ºC, estes vinhos não “mexem”, envelhecendo com enorme lentidão. Em cada ano, 20% do vinho velho é retirado para o blend, sendo atestado com vinho novo.

No entanto, o carácter dos champanhes Henri Giraud não começa na cave, mas sim na vinha e, em particular, no terroir de Ay. A quase totalidade é Pinot Noir de encosta (nada de Pinot Meunier) com uma pequena quantidade de Chardonnay de zonas mais baixas do vale do Marne. Toda a uva utilizada tem origem no Grand Cru, com uma camada superficial (por vezes 20 centímetros) de terra arável sobre a rocha de giz, profundamente calcária. Cerca de 10 hectares pertencem à empresa, trabalhando 30 hectares de outros proprietários, mas com o seu próprio pessoal.

Cuidado com o detalhe
Este cuidado com o detalhe associado a uma identidade muito própria é algo que tem sido possível manter graças à pequena dimensão (entre 300 e 350 mil garrafas/ano) e ao carácter intrinsecamente familiar: para além de Claude Giraud, os outros pilares da empresa são sua filha Emmanuele Giraud, na gestão, e o seu genro Sébastien Le Golvet, enólogo principal.

“Ne s’interdire à rien, ne s’obliger à rien, faire du bom vin naturellement” (não se proibir de nada, não se obrigar a nada, fazer o bom vinho naturalmente) era o lema de Henri Giraud, que os seus descendentes têm procurado seguir. A tradição e a inovação coexistem bem neste conceito, como o demonstram os vinhos que Stephane Barlerin, director comercial da casa, nos apresentou recentemente e onde se incluem, para além de champanhes de primeiríssima linha, uma Ratafia Champenoise, ou seja, uma irreverente e imprevista…jeropiga, criada por Claude para acompanhar o seu charuto. “Fazemos vinhos complexos, mas não complicados”, diz Stephane. Para Portugal estão alocadas 3000 garrafas de Champagne Henri Giraud. É aproveitar.

(Artigo publicado na edição de Outubro de 2024)

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